Capítulo 42
DEPOIS DE DEIXAR ALEX na
casa de Joyce, Katie finalmente dirigiu o jipe de volta à sua casa. Não queria
realmente voltar até ali, mas sabia que não podia adiar o inevitável para
sempre. Mesmo que não pretendesse ficar ali por muito tempo, ela precisava
pegar alguns de seus pertences.
A poeira se levantou do cascalho e ela sentiu as
ondulações da rua até estacionar em frente à casa. Ficou sentada no jipe —
amassado e riscado, mas ainda funcionando bem — e olhou para a porta,
lembrando-se de como Kevin havia sangrado até a morte em sua varanda, com o olhar
fixo no rosto dela.
Katie não queria ver as manchas de sangue. Tinha medo
de se lembrar, ao abrir a porta, da expressão de dor de Alex quando Kevin o
atingira com o pé de cabra. Ela praticamente podia ouvir o choro histérico de
Kristen e Josh enquanto se agarravam ao seu pai. Não se sentia preparada para
reviver tudo aquilo.
Em vez disso, ela andou em direção à casa de Jo. Em
suas mãos, ela tinha a carta que Alex havia lhe entregado. Quando lhe perguntou
por que ele havia escrito uma carta, ele balançou a cabeça.
— Não fui eu que a escrevi
— disse ele. Katie o olhou, confusa. — Você vai entender quando ler o que está
escrito.
Quando se aproximou da casa de Jo, sentiu os
resquícios de uma memória ganharem vida. Algo havia acontecido na noite do
incêndio. Algo que ela havia visto, mas que não conseguia se lembrar realmente. Quando sentia que estava quase identificando a sensação, a lembrança
parecia escapar novamente. Diminuiu o passo conforme se aproximou da casa de
sua vizinha, com uma expressão confusa marcando-lhe o rosto.
Havia teias de aranha na janela e uma das venezianas
havia caído sobre a grama, despedaçando-se com o impacto. O corrimão da varanda
estava quebrado e era possível ver algumas ervas daninhas brotando por entre as
tábuas. Seus olhos buscavam todos os detalhes, mas ela não conseguiu
processar a cena que tinha diante de si: uma maçaneta enferrujada, pendendo do
seu encaixe na porta; uma grossa camada de sujeira nas janelas, como se elas
não fossem limpas há anos.
Não havia cortinas...
Não havia capacho em frente à porta...
Não havia mensageiro dos ventos pendurado na
varanda...
Ela hesitou, tentando entender o que estava vendo.
Sentiu-se estranha e curiosamente sem qualquer peso, como se estivesse sonhando acordada. Quanto mais ela se aproximava, mais a casa parecia envelhecer e
apodrecer perante seus olhos.
Katie piscou e percebeu
que a porta tinha uma rachadura no meio, com uma ripa de madeira pregada no
sentido transversal, fixando-a ao batente da porta que já se esfarelava.
Piscou novamente e viu que uma parte da parede, em um
dos cantos superiores, havia apodrecido, deixando um buraco com bordas
irregulares.
Piscou pela terceira vez e percebeu que a parte
inferior da janela estava rachada e o vidro, quebrado. O chão estava coberto de
cacos de vidro.
Katie subiu os degraus da varanda, sem conseguir se
conter. Espiou pelas janelas, observando o interior da cabana escura.
Poeira, sujeira, móveis quebrados, pilhas de lixo.
Nada estava pintado, nada estava limpo. Com um sobressalto, Katie deu um passo
atrás, voltando à varanda, quase tropeçando no degrau quebrado.
“Não.”
Não era possível. Simplesmente não era possível. O que
havia acontecido com a Jo e com todas as melhorias que ela fizera na pequena
cabana? Katie viu Jo pendurar o mensageiro dos ventos. Jo veio até a casa de
Katie, queixando-se sobre ter que pintar e limpar. Tomaram café, beberam vinho
e comeram queijo; Jo fez comentários maliciosos sobre a bicicleta. Jo a
encontrou depois do trabalho e elas foram a um bar. A garçonete as viu juntas.
Katie pediu vinho para as duas...
“Mas Jo não tocou em seu copo de vinho”, lembrou-se.
Katie massageou suas têmporas. Sua mente estava
funcionando em uma velocidade alucinada, buscando por respostas. Ela se lembrou de que Jo estava
sentada nos degraus quando Alex a trouxera para casa. Até mesmo Alex a vira
ali...
“Será que ele realmente a vira?”
Katie se afastou da casa envelhecida. Jo era real. Não
era possível ser apenas um produto de sua imaginação. Ela não a havia criado.
“Mas Jo gostava de tudo que você fazia; bebia
exatamente o mesmo café que você preparava, gostava das roupas que você comprava e as opiniões dela sobre os funcionários do Ivan’s eram um reflexo das
suas”.
Dúzias de pequenos detalhes rapidamente começaram a
encher a mente de Katie e as vozes duelavam em sua cabeça.
Ela morava aqui!
“Por que, então, o lugar está tão abandonado?” Nós
olhamos para as estrelas, estávamos juntas!
“Você ficou olhando as estrelas sozinha. É por isso
que ainda não sabe os nomes delas.”
Bebemos vinho na minha casa!
“Você bebeu a garrafa inteira sozinha. Foi por isso
que ficou tão desorientada.”
Foi ela que me falou sobre Alex! Ela queria que
ficássemos juntos!
“Ela nunca mencionou o nome dele até que você o
soubesse. E
você estava interessada nele desde o início.”
Ela foi a psicóloga que
ajudou as crianças!
“Essa foi a desculpa que você usou para nunca falar
sobre ela a Alex.” Mas... Mas... Mas...
Uma a uma, as respostas vieram tão rápido quanto Katie
conseguia pensar nelas. O motivo pelo qual ela nunca soubera o sobrenome de
Jo, ou por que nunca a vira dirigindo um carro... a razão pela qual Jo nunca a
convidara para entrar ou aceitara sua ajuda para pintar a casa... como Jo
conseguira aparecer inesperadamente ao lado de Katie usando roupas de
corrida...
Katie sentiu algo ceder dentro de si quando todas as
peças do quebra-cabeça se encaixaram.
Repentinamente,
ela percebeu a realidade. Jo nunca chegara a existir.
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