Capítulo 3
Finley embolou o casaco de vison
e jogou os óculos Chopard Grey sobre a mesa de mármore na entrada. Ela não era
descuidada; só queria que todo mundo soubesse que os seiscentos dólares que
gastara para proteger os olhos dos raios solares não a preocupavam — ela não
dava a mínima se eles caíssem de um iate alugado no mar do sul da China, na
viagem da próxima semana.
Finley girou o piercing de
diamantes no nariz no sentido anti-horário, depois colocou uma pastilha de
hortelã na boca.
— Vou ter que andar de avião
fretado daqui para a frente. Até a primeira classe está nojenta. E os
aeroportos... eca!
Vestindo uma camiseta
cinza-chumbo como um modelo da Banana Republic, Marco colocou a bagagem dos
dois no saguão e cumprimentou Maricela e José em português, quando ambos vieram
apanhar as malas.
— Eles falam espanhol, Marco —
comentei sem emoção.
Marco tirou os óculos, sorrindo
para mim como se soubesse de uma história — ou cinco — que me contaria mais
tarde, na frente de Finley, quando estivéssemos todos bêbados.
— É bem parecido.
Olhei furiosa para Finley.
— Você o trouxe — falei,
acusadora.
— Ele vai ficar num hotel — minha
irmã respondeu, mal percebendo que Marco estava tirando a blusa dela. Em
seguida, ele se abaixou para desamarrar suas botas de neve felpudas.
Eu me encolhi.
— Para. Marco, para. Agora.
Marco tirou a segunda bota de
Finley e colocou as duas perfeitamente alinhadas, se levantando e esperando com
desejo no olhar — não o tipo de desejo que uma mulher da minha idade gostaria
de receber de um homem lindo e exótico como Marco. Ele estava esperando para me
fazer um favor, me agradar, atender a qualquer necessidade que eu tivesse, e
não por mim, por Finley. Ele não apenas se orgulhava de agradar a sua
empregadora e qualquer pessoa que a cercasse — era uma obsessão. Acalmar minha
irmã e seu séquito era sua principal especialidade, e ele adorava exibir seus
talentos.
— Posso apenas... — começou ele,
estendendo a mão para as malas da minha irmã.
— Não, não pode — falei, dando um
tapa em suas mãos. — Leve sua bagagem e vá procurar seu hotel. A Finley vai ser
capaz de respirar sozinha esta semana.
Marco ficou inquieto, sem saber
como atender ao meu pedido.
Finley sorriu para ele com uma
paciência fingida.
— Tudo bem, Marco. Pode ir.
Aproveite as suas férias.
Ele fez que sim com a cabeça
algumas vezes, confiante e inseguro ao mesmo tempo, claramente incomodado por
deixar Finley por conta própria durante mais do que alguns minutos.
Marco beijou a mão dela.
— Se precisar de alguma coisa,
srta. Edson, chego aqui em dez minutos.
Ela se afastou devagar, acenando
para ele ir embora, indiferente ao seu charme.
Marco pareceu quase arrasado
enquanto pegava a própria bagagem e fechava a porta ao sair. Suspirei.
— Essa merda está saindo do
controle.
Ela deu um sorriso cínico,
andando alguns passos para me abraçar com força.
— Você só está com ciúme.
Eu a apertei uma vez, depois me
afastei.
— Ele limpa a sua bunda? Só assim
eu teria ciúme.
Finley riu, tirando as luvas e
andando pelo corredor até a sala do piano. Ela as jogou na chaise e sentou,
relaxando e cruzando os pés, perfeitamente vestidos com meias. Seus cabelos dourados
caíam em ondas delicadas que passavam um pouco dos ombros, brilhosos e
perfeitos como deveriam estar, depois do dinheiro que ela gastava para
mantê-los assim.
— Não que ele não tenha tentado,
meu amor. Você está certa, ele provavelmente respiraria por mim, se pudesse.
— Isso não é irritante?
— Na verdade, não. Eu não me
preocupo com nada, exceto com o que tenho que me preocupar.
— Quando é que você volta ao
trabalho? O conselho do papai ainda está reclamando da sua promoção?
Ela suspirou.
— Logo, e sim. Como está a Terra
do Inverno?
Olhei pela janela. Não estava
nevando, mas o vento soprava pedaços gelados dos galhos das árvores.
— Acho que estou pronta para o
mar.
Ela me observou enquanto os
lábios vermelhos se contraíam para o lado.
— Você não me parece pronta.
Cutuquei o esmalte azul-marinho
do polegar.
— Estou desanimada. Já pegamos
sol em todas as praias e esquiamos em todos os resorts de Estes até os Alpes.
— Você está entediada? —
perguntou Finley, surpresa.
— Deslocada.
Finley revirou os olhos, cheia de
indignação.
— Não entra nessa, Ellison. O
maldito clichê da riquinha entediada com a vida, cercada por todos e por
ninguém, que se sente sozinha.
— Não me trate como se você fosse
superior. Lembro muito bem que você também passou por uma fase.
— Fiz compras e passei um mês com
você em Barbados. Não saí por aí trepando com todo mundo. Você sempre gostou de
remédios, aliás, herdou isso da mamãe, mas, pelo amor de Deus, Ellie. Arrume um
hobby. Um namorado... pode até ser uma namorada. Encontre uma causa. Encontre
Deus. Não dou a mínima, mas não reclame de ser bilionária e de ter o mundo
inteiro aos seus pés.
Eu não sabia que expressão estava
em meu rosto, mas deve ter espelhado a de Finley. Cobri os olhos e sentei no
sofá, me recostando.
— Merda, você está certa. Estou
parecendo o Sterling.
— Você não é tão ruim, mas está
quase lá... Você não está entediada, está se sentindo vazia. Pare de tentar se
preencher com cocaína e haxixe. Você sabe que essas merdas não funcionam.
Estreitei os olhos para ela.
— Que porra é essa, Finley?
Quando foi que você começou a ser adulta? Tem uma babá que mexe seu café e
agora você está me ensinando sobre escolhas de vida?
Ela se levantou, deu alguns
passos até o sofá e caiu ao meu lado, pendurando as pernas no meu colo. Em
seguida entrelaçou os dedos nos meus.
— A Betsy morreu de overdose. Não
quero que você seja a próxima.
Eu me ajeitei.
— A Betsy March?
Finley assentiu com a cabeça,
esfregando a palma da minha mão com o polegar.
— Nove meses atrás, ela estava no
mesmo estágio que você. Todos nós vimos isso.
— Eu não.
— Você está sumida, Ellie.
Ninguém mais te vê. Exceto talvez o Sterling.
— Vamos para Sanya na próxima
semana.
— Faz seis meses que eu não te
vejo. A Betsy também estava supermal. Não quero que me digam que te encontraram
na merda. Essa é uma conversa de irmãs. Você está fodendo tudo. Precisa ter
coragem e lidar com isso.
— Lidar com isso? — perguntei,
sorrindo.
Finley estava tentando manter a
linha, mas secou rapidamente o olho.
Estendi a mão para ela.
— Fin. Eu estou bem.
Ela assentiu.
— Eu sei. Todos estamos até não
estarmos.
— Vamos lá. Você viajou o dia
todo. Vamos preparar uma banheira quente, relaxar e pedir algo para comer.
Ela sorriu para mim.
— Não me surpreende você estar
entediada. Isso me parece horrível.
— Tudo bem, toma uma ducha
quente, depois vamos sair pra jantar e encontrar um bar com um monte de caras
gostosos.
Ela sorriu.
— Assim é muito melhor.
***
O Grove estava cheio, mas não
lotado. Estranho para a época de esqui, mas considerei que estávamos com sorte.
Finley dividia seu tempo entre um kir royale e as mesas ao redor, curtindo a
atenção curiosa que estava recebendo simplesmente por ser linda.
— Sempre gostei dos homens daqui.
São de um tipo sexy diferente do que estamos acostumadas. Brutos. Estou
adorando as barbas.
— A maioria não é daqui, na
verdade.
Finley deu de ombros.
— Nem nós.
O celular dela zumbiu, e ela
digitou uma rápida resposta, irritada com quem mandara a mensagem.
— É a mamãe?
Finley balançou a cabeça.
— O Marco. Só está querendo saber
de mim.
Eu me inclinei para a frente,
meus peitos quase expostos pressionando a mesa. Finley percebeu, mas só deixou
que eles a distraíssem por um instante.
— Ele está apaixonado por você? —
perguntei.
— Não sei. Provavelmente. Onde
foi que você comprou essa blusa? Faz seus peitinhos minúsculos parecerem
estranhamente atrevidos.
— Meus peitos não são minúsculos.
— Por favor — disse Finley
enquanto o garçom entregava nosso edamame. — Você mal usa tamanho 40.
— Nem todo mundo quer ter aqueles
peitos de silicone enormes, Fin.
Ela olhou para o garçom. Ele
começou a falar, mas ela o interrompeu.
— Quero outro, sim. Não, não há
nada que possa trazer pra nós agora. Sim, o edamame está uma delícia. Obrigada.
Ele fez que sim com a cabeça e
foi para a cozinha.
— Ele vai cuspir na nossa comida
— falei, observando-o desaparecer atrás de uma porta vaivém.
Ela soltou uma risada.
— Eu não fui grossa. Só deixei o
atendimento dele mais eficiente. — Seus olhos se iluminaram, e ela se levantou,
abraçando Sterling. — Olá, meu amor!
Sterling beijou seu rosto, depois
sua boca. Ela não recuou.
Ele olhou nos olhos dela, balançando
a cabeça e sorrindo.
— Fin. Você está linda.
Ela sorriu.
— Tem razão.
Sterling segurou a parte de trás
da cadeira de Finley até ela se acomodar, depois ajudou a empurrá-la. Virei o
rosto quando ele se abaixou, deixando-o beijar minha bochecha.
— Já vou avisando... eu beijei
sua irmã — disse Sterling, sentando ao lado de Finley.
Ela olhou para ele, depois para
mim.
— Do que ele está falando?
— Eu meio que o forcei a me
beijar ontem — expliquei, já sentindo a ira silenciosa de Finley.
Ela não estava interessada em
Sterling, mas ele lhe pertencia. — Para me livrar do bombeiro.
As sobrancelhas de minha irmã se
ergueram, e ela olhou para Sterling em busca de confirmação. Eles eram um casal
estranho, usando roupas e acessórios que custavam mais do que uma casa comum,
mas ambos falidos em termos emocionais e morais. Finley pode ter conseguido me
tirar de um círculo vicioso, mas tinha um bolso cheio de pessoas e um armário cheio
de coisas: todas dispensáveis. Sterling amava Finley, mas nunca imploraria por
ela, e preferia se afundar na miséria infinita a admitir a derrota e tentar
amar outra pessoa. Éramos amigos porque menos de um por cento da população
mundial poderia se identificar com a tristeza de ter muito dinheiro e muitas
oportunidades, e com o tédio de ser totalmente livre das limitações monetárias.
Podíamos confiar um no outro para
nunca esperar nada além do tempo ou da expectativa de ser convidado para a
próxima viagem. Nossas amizades nunca seriam mais relacionadas a conexões do
que a piadas internas e conversas tarde da noite. Sabíamos que, se fôssemos reclamar
do sofrimento causado pelo dinheiro, isso não aconteceria pela falta dele. Não tínhamos
nada em comum, exceto o fato de que possuíamos uma coisa a mais do que todas as
outras pessoas: dinheiro.
— Você realmente a beijou? —
Finley perguntou a Sterling.
Ele assentiu, percebendo seu erro
tarde demais. Ele estava esperando uma crise de ciúme. A raiva de Finley sempre
cozinhou lentamente, e ela estava apenas começando a ferver.
— Fin — comecei.
— Shhh. Você não tem o direito de falar.
Eu me recostei no assento,
esperando que a noite não ficasse mais constrangedora.
Comemos o robalo e a vitela,
ricota de búfala e chicória. Bebemos kir royales demais, que, de alguma forma,
se transformaram em rodadas de uísque escocês, e, depois de dar ao garçom a maior
gorjeta que ele já vira, saímos para o frio para acender cigarros e soprar
baforadas de fumaça branca no ar.
Finley parecia ter nos perdoado,
rindo das minhas piadas no peito de Sterling, mas eu sabia que não era bem
assim. Sterling a puxou mais para perto, aproveitando todas as chances de abraçá-la
que ela lhe dava. Eu os guiei pelo beco até o Turk, um bar caído com entrada
pelos fundos, difícil de achar mesmo querendo.
— Quero ver seu bombeiro de elite
— disse Finley, bêbada e tonta.
— Ele provavelmente vai estar
aqui. Eu já o vi aqui. A maioria dos moradores da região vai ao Turk.
Entramos, tiramos os casacos e as
luvas, e Paige acenou para mim do bar. Deixei que ela me abraçasse e nos
levasse a uma mesa no canto. Tyler Maddox estava lá, conforme esperado, e tinha
um jarro de cerveja só seu, com um cigarro pendurado atrás da orelha.
— Caralho — disse Finley no meu
ouvido, mas não muito baixo.
Tyler fingiu não escutar quando
se levantou, apertando a mão de Sterling e apontando para as cadeiras vazias,
inclusive a dele. Zeke e outro homem se levantaram até nós sentarmos, depois esperaram
Tyler encontrar uma cadeira adicional para levar à nossa mesa.
Paige se aproximou do meu ouvido.
— Ele estava falando de você
agora mesmo.
— Aposto que sim — concordei.
Finley se apresentou primeiro
para Tyler, depois para Zeke. O terceiro homem apertou a mão dela quando ela a
estendeu.
— Daniel Ramos — disse ele.
— Também conhecido como Docinho —
completou Tyler com um sorriso de leve.
Finley deu uma risadinha. Ela se
apaixonou instantaneamente por Tyler, e Sterling percebeu.
Ele passou com muita facilidade
da risada e do afeto para sentar imóvel entre o amor da sua vida e Paige.
Paige apoiou o queixo na mão,
sorrindo para Docinho.
— É tão previsível.
— O quê? — perguntou ele.
— Todas as transferências vêm da
Califórnia.
— Não vim pra cá com a intenção
de ficar seis temporadas — disse ele.
O cabelo roxo com penteado
pompadour de Paige brilhava sob as luzes néon do bar.
— Por que veio, então?
— Por causa de uma garota.
Zeke deu um tapa no ombro dele.
— O Docinho não é um doce?
Docinho deu de ombros e se
afastou dele.
— E onde ela está? — perguntou
Paige, tentando dar seu melhor sorriso paquerador.
— Não está aqui — respondeu ele,
inclinando-se na direção dela.
— Não tem garçonete hoje à noite?
— perguntou Finley, irritada. Foi aí que eu vi a verdade por trás do brilho de
raiva em seus olhos. Ela não tinha me perdoado e muito menos a Sterling.
Ela ia paquerar o bombeiro de
elite sobre o qual eu falara só para nos castigar.
Tyler se levantou e foi até o
bar.
— Pode deixar.
Escutei Finley e Sterling
conversarem, ao mesmo tempo em que não tentavam entreouvir Zeke e Docinho.
Docinho estava reclamando de uma garota, e Zeke mencionou outro Maddox.
— O Tyler tem um irmão? —
perguntei.
— Quatro — respondeu Zeke.
— Você consegue imaginar cinco
Tylers andando por aí? — provoquei.
— Não preciso imaginar — disse
ele. — Já vi na vida real, e é assustador pra caralho.
Balancei a cabeça.
— Coitada da mãe deles. Eu me
mataria.
Zeke se mexeu na cadeira.
— Ela morreu quando eles eram
pequenos.
Coloquei a cabeça nas mãos,
olhando para baixo.
— Merda. Isso é terrível. Sinto
muito — falei, feliz por Tyler não estar por perto para me ver enfiar a cara
num buraco.
— Tudo bem — disse Zeke. — Você
não sabia.
Tyler voltou com uma bandeja de
doses e serviu a todos. Em seguida, ergueu o próprio copo.
— Aos bons amigos e às belas
mulheres — disse Tyler. Levantamos nossos copos, quase apreciando o brinde
adorável. Mas aí ele acrescentou: — Chupando o meu pau. — Seus amigos riram, e
nós balançamos a cabeça, mas todo mundo virou o uísque.
Tyler se levantou para pegar mais
uma rodada, e Paige se aproximou de Docinho.
— Que diabos foi isso? Por que
ele está agindo como um babaca, de repente?
Docinho olhou para Finley.
— Irmãs são complicadas.
Tyler sentou de novo, baixando a
bandeja com cuidado.
— O que é isso? — perguntou
Finley, encostando no braço dele.
Docinho fez uma careta.
— Acho que não funcionou.
Paige virou para mim.
— Ele está sendo babaca para
afastar sua irmã?
— Não tenho certeza — falei,
percebendo que ele me observava.
Ele voltou a atenção para Finley
e virou o pulso, deixando-a analisar a flecha pouco acima do cotovelo.
— Essa foi Taylor quem escolheu.
— Sua namorada? — perguntou
Finley.
Tyler e Zeke riram.
— Não — respondeu Tyler. — O
Taylor é meu irmão.
— Taylor e Tyler. Que adorável —
disse Finley, mantendo os dedos no braço dele.
— Aparentemente, tem mais três —
comentei.
Finley voltou a atenção para mim,
analisando como eu sabia da vida de Tyler. Apontei para Zeke, e ela sorriu,
continuando a alisar o braço do bombeiro.
— São cinco irmãos? — ela
perguntou. — Foi assim que você aprendeu a lutar?
— Ah — disse Tyler, de repente
parecendo desconfortável. — Você soube dessa história.
— Foi?
— Em grande parte.
— Vocês já brigaram por causa de
uma garota? — perguntou ela.
Eu estava começando a sentir pena
da minha irmã. Finley estava se esforçando tanto para provocar ciúme em
Sterling e em mim que estava parecendo uma turista desesperada.
— Não — disse Tyler. — Nunca.
— Não acredito. É claro que, pelo
menos uma vez, mais de um dos cinco se sentiu atraído pela mesma garota —
provocou ela.
Tyler se remexeu no assento.
— Nenhum de nós trocou socos por
causa de algo assim. Ajuda o fato de sermos atraídos por tipos completamente
diferentes. A maioria de nós, pelo menos.
— Qual é o seu tipo? Loira? Rica?
Ninfomaníaca? — perguntou Finley, se aproximando dele.
Eu me encolhi.
— Fin...
Sterling se levantou.
— Acho que vou encerrar a noite.
— Não — reclamou Finley,
estendendo a mão para ele. — Não seja bobo. Acabamos de chegar.
Sterling jogou algumas notas
altas sobre a mesa, que facilmente pagariam as bebidas de todos e muito mais, e
foi em direção à porta. Finley franziu a testa, mas o seguiu.
Tyler me observou por alguns
segundos, depois se aproximou com o cotovelo sobre a mesa.
— Você também já vai?
Levantei meu copo e tomei um
gole, balançando a cabeça.
— Ela vai voltar. Ele não.
— Como você sabe? — perguntou
ele.
— Somos amigos há muito tempo.
Zeke riu por trás da mão,
tentando olhar para qualquer lugar, menos para mim.
Ergui uma sobrancelha.
— Alguma coisa engraçada?
Ele pigarreou, se empertigando um
pouco.
— Nada. Vocês são um trio
bizarro. Ele está com ela? Ela vai ficar com você? — Ele coçou a barba por
fazer, esperando minha resposta.
— Ela é minha irmã. Vocês
trabalham? — perguntei. — Só vejo vocês festejando, fodendo e passeando por aí
no carro do trabalho.
Tyler pediu mais uma rodada para
a mesa.
— É a caminhonete dos bombeiros.
E, sim, trabalhamos pra caralho. Só que as coisas estão devagar. Trabalhamos
para a cidade na baixa temporada.
Docinho ergueu o copo para Tyler.
— Grande verdade. Já salvamos a
cidade mais de uma vez.
Levantei meu copo bem alto.
— Ao combate ao incêndio ou
qualquer coisa assim!
— Combate ao incêndio ou qualquer
coisa assim? — comentou Tyler, parecendo ofendido.
Dei uma risada.
— Ah, por favor. Você escolheu
sua profissão. As pessoas não são obrigadas a te idolatrar por causa disso.
— Uau, bacana — disse Tyler, se
levantando. Ele pegou as costas da cadeira, os músculos do antebraço
tensionando sob a bainha da manga da camiseta. Em seguida ajeitou as pulseiras
de couro trançado surradas no pulso direito, as unhas roídas e o nó dos dedos
grossos de tanto estalar, como fizera duas vezes desde que Paige nos conduziu
até a mesa deles. Eu queria aqueles dedos dentro de mim, o antebraço ficando
tenso enquanto ele agarrava meus quadris. Eu queria algo que nunca me ocorreu:
um repeteco.
— Calma, Maddox — disse Zeke. —
Ela não está errada.
— Ah, ela está errada. Ela está
totalmente errada.
Pisquei para Zeke.
— O que você vai fazer depois
daqui?
Zeke olhou ao redor, depois
apontou para o próprio peito.
— Eu?
— É. A camisa de flanela está me
matando. Estou adorando esse estilo lumbersexual que você criou.
Zeke deu uma risadinha, depois
levou o punho até a boca, engasgando com a própria saliva quando percebeu que
eu estava falando sério.
A cadeira de Tyler caiu para a
frente, se apoiando na mesa, quando ele a empurrou para longe antes de ir até o
balcão. Ele se apoiou no bar com o cotovelo, conversando com a bartender, Annie.
Ela deu uma risadinha e balançou a cabeça, piscando.
— Não sei o que está acontecendo
entre vocês dois — disse Zeke. — Mas não me coloca no meio.
— Sábia decisão — comentou
Docinho, dando um tapa no ombro de Zeke.
— Tá bom — falei, me virando para
Paige. — O que você vai fazer mais tarde?
— Você? — disse ela com um
sorriso malicioso. Ela não se importava de ser o plano B, nem mesmo o plano C.
Sorri.
— Boa resposta.
O queixo de Zeke se ergueu,
olhando para alguém alto atrás de mim.
— Ei, Todd. Achei que você não
podia mais entrar aqui — comentou Zeke.
Todd ajeitou o peso do corpo,
exibindo uma mancha amarelada na bochecha.
— O Maddox já foi expulso mais
vezes do que eu. E você está aqui com ele.
Zeke assentiu com a cabeça.
— Tem razão. Não sei por que eu
fico fazendo isso comigo mesmo.
Docinho deu um tapinha nas costas
do amigo.
— É melhor a gente ir.
Todd se abaixou, encostando a
têmpora na minha. Fiquei mais curiosa do que ofendida, por isso esperei, sem me
mexer.
Docinho se aproximou, esperando
para reagir. Sua camisa social azul-marinho escondia o monstro por baixo. Ele
era uma parede de tijolos, talvez ainda mais do que Tyler e tão alto quanto
ele. Os dois tinham cabelo com corte militar, mas Docinho era menos um bulldog
sem coleira e mais um soldado treinado.
— Talvez a gente se junte a vocês
— disse Todd, virando para me olhar. Ele sorriu, perto
demais do meu rosto, mas não me
encolhi. Ele era imprudente, e eu precisava estar na primeira fila para
testemunhar o que ia acontecer em seguida.
— Todd — alertou Docinho —, o
Maddox andou bebendo.
— Eu também — disse Todd,
sorrindo para mim. — Qual é o seu nome, belezinha?
— Isso aí — falei, espelhando sua
expressão. — Esse é o meu nome.
— Belezinha? — perguntou ele, se
divertindo.
— Mercer — disse Tyler, a voz
ressoando por sobre a música. Ele estava parado atrás de Todd, bem perto,
provocando-o com a falta de espaço que ele oferecia.
Docinho se levantou.
— Vamos embora, Maddox.
Um dos lados da boca de Tyler se
curvou para cima, mas ele não tirou os olhos de Todd.
— Não com todas essas garotas
bonitas que acabaram de chegar.
Paige encostou na minha mão, e eu
a apertei, não porque estivesse com medo, mas porque o pico de testosterona
estava fazendo minhas partes femininas gritarem com o melhor tipo de dor.
Zeke também se levantou, e os
bartenders perceberam.
Todd e Tyler se encararam por
vinte segundos, até Todd finalmente falar.
— Estou curioso.
— Tenho certeza que posso
responder — disse Tyler.
— Se é que você vale alguma coisa
sem seu irmão por perto.
Os olhos de Tyler brilharam de
empolgação.
— Não aumenta minhas esperanças,
Mercer. Dá logo esse soco ou cala essa maldita boca.
Sem pensar, fiquei em pé entre os
dois, olhando para cima.
— Por que os caras fazem isso?
Por que eles se chamam pelo sobrenome? Dizer o nome é babaquice? É íntimo
demais?
Docinho estendeu a mão para mim.
— Vem cá, Ellie.
Meu rosto se contorceu.
— Eles não vão fazer nada.
— Não? — perguntou Todd, sem
saber se deveria ficar ofendido ou aliviado.
Encostei nos ombros dele, ficando
na ponta dos pés para dar um beijo de leve em seu rosto.
— Você vai me agradecer depois. —
Ergui o joelho, afundando-o com força em sua virilha.
Ele se dobrou, depois caiu em
posição fetal enquanto todo mundo ficou parado em volta, em estado de choque.
— Ei! Sai daqui, porra! — gritou
Annie.
Tyler segurou minha mão e saiu em
disparada, empurrando a porta e correndo pelo beco, depois pela rua. Nossos
sapatos esmagavam a neve conforme atravessávamos um pequeno tumulto. Tyler não
parou até chegarmos à sua caminhonete Dodge branca de cabine dupla, com os
amigos logo atrás.
Ele apertou o alarme da chave e
olhou para mim com um sorriso surpreso, o hálito visível no frio ar noturno.
Apontou com a cabeça para a caminhonete, enquanto as duas portas do lado do passageiro
abriram e fecharam com força.
— Entra. Vou levar os dois para
casa, e depois...
— Depois o quê?
Ele deu de ombros.
— Vou levar você.
Enfiei as mãos nos bolsos do
casaco e balancei a cabeça.
— Não. Tenho que voltar e esperar
a Fin.
— Ela está com o Sterling.
— A gente meio que deixou a Paige
lá também.
— Por que você fez aquilo? —
perguntou Tyler. — Nunca vi uma garota fazer aquilo... nunca.
Bom, talvez no ensino
fundamental, mas nunca com tanta alegria.
— O machucado no rosto dele. Foi
você?
Ele assentiu.
— Duas semanas atrás. Briga de
bar. Foi violenta.
— Mas você não se machucou.
Ele deu de ombros.
— Não gosto de levar porrada,
então não levo.
— Ninguém gosta.
— Mas eu não levo.
— Como é isso? Você é treinado ou
o quê?
— Mais ou menos. Tenho quatro
irmãos.
— Achei que você tinha dito que
vocês não brigavam.
— Não por causa de garotas.
— São todos como você? Seus
irmãos?
Ele deu de ombros de novo.
— Quase.
— Isso explica muita coisa.
Ele deu um passo na minha direção
com a mesma expressão de quando estava no primeiro degrau da minha escada.
— Você não precisava fazer
aquilo. Estava tudo sob controle.
— Não fiz isso por você. Fiz por
ele.
— Porque você sabia que eu ia
matar o cara?
Soltei uma risada e umedeci os
lábios quando o vi pegar um cigarro.
— Me dá um.
Tyler prendeu o cigarro entre os
lábios enquanto acendia o meu, envolvendo o isqueiro conforme tragava o próprio
cigarro. Soltamos a fumaça ao mesmo tempo, e eu senti meu corpo começar a
tremer.
— Vem pra casa comigo — disse
Tyler.
Balancei a cabeça.
— Vou levar a Paige pra casa. Ela
estava a fim do Docinho. Agora ela está lá dentro, sozinha, se sentindo errada,
quando na verdade ela é a coisa mais linda dessa espelunca.
— Não é a mais linda — murmurou
ele, desviando o olhar. Quando não respondi, ele virou para encontrar meu
olhar. — Quero te levar pra casa.
— Estou no clima de algo suave
hoje à noite.
Ele se inclinou, beijando meus
lábios uma vez.
— Eu sei ser suave.
Eu o inspirei, sentindo as coxas
ficarem tensas.
— Não parece que a gente consiga.
Ele deslizou os dedos na minha
nuca, me apoiando na porta, depois pressionou os lábios nos meus, me saboreando
como na primeira noite, com um desejo que fez toda a razão se derreter com o que
restava de mim.
Em seguida se afastou, passando o
polegar no meu lábio inferior.
— Foda-se a Paige.
— É o que pretendo fazer — falei,
recuando alguns passos antes de me virar.
Tyler bufou, e eu ouvi sua porta
abrir e fechar, e o motor dar partida. Atravessei a rua e voltei para o Turk.
Paige estava parada do lado de fora, fumando no beco coberto de neve, e pareceu
aliviada ao me ver.
— Você voltou — disse ela.
Meu celular zumbiu, e a tela se
acendeu. Reconheci a selfie de Finley, digna de revista, e franzi a testa.
A caminho. O Marco vai levar a gente.
Rosnei, enfiando o celular no
bolso traseiro.
— Más notícias? — perguntou
Paige.
— É só que... a garota que estava
comigo, minha irmã, Finley. Ela tem um assistente, e ela está com ele agora.
Eles vêm buscar a gente.
— A gente?
Meu rosto se suavizou.
— É. Você tem planos para as
próximas três horas? Ou até de manhã?
Paige engoliu em seco e sorriu,
balançando a cabeça. Seu rosto era muito doce. A morte de sua inocência ainda
era recente, e dava para perceber que Paige ainda gostava de fingir que ela existia.
Faróis iluminaram nossos olhos, e
levantamos as mãos.
— Que porra é essa, Marco? Apaga
o farol alto!
— Desculpa! — gritou ele do banco
do motorista.
Os faróis diminuíram, e eu
estendi a mão para Paige.
— Isso não é um felizes para
sempre. É só hoje à noite.
Ela entrelaçou os dedos nos meus
e fez que sim com a cabeça, seguindo-me até o carro alugado de Marco.
— Oi — disse Finley quando nos
ajeitamos no banco traseiro. O batom e o rímel dela estavam manchados.
Eu me encolhi.
— Eca, o que aconteceu com você?
Por favor, não me diga que você chupou o Marco por se sentir culpada.
O sorriso de Finley desapareceu,
e ela virou para a frente.
— Leve a gente para casa.
— Sim, srta. Edson.
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