Capitulo 3 – Em que Simon decifra um enigma
— O que vamos fazer? — perguntou Simon enquanto
caminhavam pelo corredor.
— Eles estão com a Mallory — Jared disse baixinho.
Ele precisava apagar tudo o que tinha ouvido, apagar tudo de sua mente, com
exceção de Mallory. — Eles querem trocá-la pelo Guia.
— Mas nós não estamos com o livro.
— Psiu! — disse Jared. Ele tinha uma idéia, mas não
queria dizê-la em voz alta, ao ar livre. — Vamos.
Jared foi até seu armário e tirou uma toalha que
estava na mochila de ginástica. Apanhou um livro — Matemática Avançada — que era do
mesmo tamanho que o Guia e o embrulhou na toalha.
— O que você está fazendo?
— Olha — sussurrou ele, atirando o pacote embrulhado
a Simon. Ele tirou a mochila de dentro do armário. — O Tibério nos enganou com
esse truque. Talvez seja nossa vez de enganar a pessoa que levou Mallory.
Simon concordou imediatamente:
— Tudo bem. Acho que a mamãe tem uma lanterna no
carro.
***
Eles saltaram por cima de uma cerca de metal no
final do pátio e atravessaram a auto-estrada. O outro lado da estrada estava
coberto pela vegetação. Era difícil caminhar no escuro e a lanterna emitia uma
luz muito fraca.
Escalaram uma pilha de pedras, algumas delas estavam
cobertas de limo escorregadio, outras meio rachadas. À medida que prosseguiam,
Jared não parava de pensar nas palavras que tinha ouvido. Pensava nas coisas
horríveis que sua mãe acreditava a seu respeito e nas coisas mais horríveis
ainda que ela pensaria agora que ele tinha desaparecido. Tudo o que fazia só
aumentava o tamanho da encrenca. E se fosse expulso da escola? E se fosse
mandado para casa de seu pai e ele não quisesse recebê-lo?
— Jared, olhe! — disse Simon. Eles tinham chegado
à entrada da antiga mina.
A rocha tinha sido aberta de qualquer jeito;
pedaços de pedra saíam das bordas ao longo do caminho que dava para o vale
acidentado que ficava embaixo.
Chumaços de grama cresciam pelas paredes saindo
das veias da terra. A auto-estrada passava sobre a caverna, atravessando uma
ponte de pedra.
— É esquisito minerar uma rocha, não é? — perguntou
Simon. — Quer dizer, elas são só rochas.
— Provavelmente são granitos — ele continuou quando
Jared não respondeu. Simon embrulhou-se na jaqueta leve.
Jared iluminou as paredes com a lanterna, focalizando
um fio de ferrugem e um toque de ocre com a luz. Ele não tinha a menor idéia de
que tipo de pedra seria aquela.
Simon ergueu os ombros.
— Então, ah, como é que a gente vai descer?
— Sei lá. Por que você não me diz, você que é o sabe-tudo?
— replicou Jared.
— Nós podíamos... — começou a dizer Simon, mas parou
no meio e Jared se sentiu mal.
— Vamos tentar descer escalando a pedra — disse Jared,
apontando. — Podemos saltar até aquela borda e depois tentar alcançar outro
apoio.
— Isso é bem longe. Nós devíamos levar uma corda,
ou alguma coisa.
— Não temos tempo — disse Jared. — Tome, segure
a lanterna.
Confiando o cilindro de metal na mão de seu
irmão gêmeo, Jared sentou-se na beirada do rochedo. Sem a lanterna, quando
olhava para baixo, só via uma escuridão enorme. Ele respirou fundo, desceu,
deixando-se cair num pedregulho que não tinha enxergado.
Virando-se, começou a se levantar. A luz foi diretamente
em seus olhos, cegando-o. Ele tropeçou e caiu para a frente.
— Você está bem? — perguntou Simon.
Jared cobriu o rosto com as mãos e tentou manter
a calma.
— Estou. Anda. É sua vez.
Ele ouviu o barulho da terra caindo quando Simon
se deslocou. Logo, Jared saiu à frente, apalpando a terra em busca de um apoio
do qual ele se lembrava vagamente. Simon caiu pesado ao lado dele, soltando um gemido.
A lanterna escorregou das mãos de Simon e despencou
no meio da escuridão, atingindo o solo do vale com força, balançou uma vez e
depois ficou parada, iluminando um caminho estreito de terra e pedra.
— Como você pode ser tão estúpido! — Jared sentiu
a ira arrebentar como se fosse uma coisa viva dentro dele, que crescia a cada
minuto. Ele só conseguia impedir que ela o dominasse, gritando.
— Por que você não atirou a lanterna para mim? Como
é que vamos escalar a mina no escuro? E se a Mallory estiver correndo perigo? E
se ela morrer porque você é um estúpido? Simon levantou a cabeça, os olhos brilhando
com as lágrimas, mas Jared estava tão chocado quanto o irmão.
— Foi sem querer, Simon — disse ele rapidamente.
Simon concordou com a cabeça, mas afastou o rosto
de Jared.
— Acho que a outra borda fica aqui. Está vendo o
formato da rocha?
Simon ainda continuava calado.
— Eu vou primeiro — disse Jared.
Ele respirou fundo e sumiu na escuridão. Bateu
feio na segunda borda - o apoio ficava mais longe do que ele tinha imaginado. O
garoto perdeu o fôlego, e as mãos e joelhos começaram a queimar. Lentamente,
ficou de pé.
A calça jeans rasgou na altura do joelho, o
braço sofreu um ferimento e começou a sangrar muito. Mas estavam quase chegando
ao chão da mina.
— Jared? — a voz de Simon veio fraca do pedaço de
rocha onde ele ainda estava sentado.
— Estou aqui — gritou Jared. — Não se mexa. Vou
pegar a lanterna.
O garoto engatinhou pelo chão até apanhar a lanterna
e vira-la na direção de seu irmão, procurando trechos onde Simon pudesse se
apoiar ou agarrar. Lentamente, Simon desceu até chegar ao solo. Mas, enquanto
aguardava, Jared ouviu ecos, uma batida distante que parecia vir do nada e de
todos os lugares ao mesmo tempo.
Iluminando a mina com a lanterna, ele viu mais rochas
pontiagudas com leves traços de perfuratriz. Agora, ele ficava pensando como é
que eles conseguiriam sair. Mas antes que tivesse tempo de preocupar-se com isso,
a lanterna iluminou uma saliência na parede de rocha. Quando o feixe de luz
percorreu a pedra, uma mancha de fungos emitiu um brilho azulado.
— Bioluminiscência — disse Simon.
— Ah? — Jared aproximou-se.
— Quando algo produz a própria luz.
Sob a luminosidade tênue, Jared viu que um retângulo
de pedra sob a saliência fora esculpido com um padrão de sulcos entrelaçados.
Olhando para o centro da rocha, ele conseguia distinguir o topo das letras entalhadas
na pedra. Ele apontou a lanterna diretamente para elas.
DA
BEIRA RETIRAVAM DEZ BURROS E PATAS
— Um enigma — disse Jared.
— Não faz nenhum sentido — afirmou Simon.
— E quem liga para isso? Como podemos decifrá-lo?
Eles não tinham mais tempo a perder. Estavam quase
dentro, quase perto de Mallory.
— Você decifrou aquele outro enigma lá em casa —
disse Simon, sentando de costas para o irmão. — Você decifra esse também.
Jared respirou fundo.
— Olhe, desculpe pelo que eu disse antes. Você precisa
me ajudar — suplicou Jared. — Todo mundo sabe que você é mais esperto do que
eu.
Simon suspirou.
— Eu não estou entendendo esse enigma. Como é esse
negócio de burros e patas da beira de onde? Juro que não entendi.
Jared olhou novamente para as palavras. Ele não conseguia
concentrar-se. Como se pode abrir essa porta? Não seria um código? Será que o
Guia continha alguma informação sobre códigos mágicos? Ele queria tanto estar
com o livro agora...
— Ei, espere um pouco — disse Simon, dando a volta
e ajoelhando. — Me dê a lanterna.
Jared entregou a lanterna ao irmão e ficou
olhando enquanto Simon escrevia a mensagem na terra com o dedo. Depois, ele
começou a apagar algumas letras e escrevê-las num padrão diferente.
B
DEZ BURROS TVIERAM PASTAR AITAE
— O que você está fazendo? — Jared sentou-se ao lado
do irmão.
— Acho que precisamos reorganizar as letras para
chegar à verdadeira mensagem. Como naqueles quebra-cabeças que a mamãe vive
montando. Pode ser também que a gente precise trocar algumas palavras e
acrescentar outras, vamos ver.
Simon escreveu a terceira frase na terra.
BATERÁ
UM DOIS TRÊS PARA ABRIR DE VEZ
— Uau! — disse Jared.
Ele não conseguia acreditar que Simon tivesse decifrado
o enigma. Ele nunca teria sido capaz disso.
Simon sorriu.
— Foi fácil — gabou-se, caminhando até a porta e
batendo nela três vezes.
Foi então que o solo se moveu debaixo deles e os
dois gêmeos despencaram dentro do abismo que se abrira aos seus pés.
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