Capítulo 5 – Em que surgem muitos enigmas e poucas soluções
— Para que isso? — perguntou Mallory quando atravessavam a Estrada Dulac, seguindo o mapa.
— Para capturar coisas — disse Simon, desviando o olhar dela.
— Que tipo de coisas? Você já não tem bichos de-mais?
Simon deu de ombros.
— Se você trouxer para casa outra criatura nova eu dou para o Byron
comer.
— Ei — disse Jared, interrompendo a conversa. — Qual é a direção certa?
Simon estudou o mapa, depois apontou.
Simon, Mallory e Jared subiram pela encosta da co-lina. As árvores
eram raras, os troncos cresciam inclina-dos entre os trechos de grama e seixos.
Eles ficaram su-bindo por um longo tempo, quase sem conversar. Jared pensou que
um dia seria legal trazer seu caderno de de-senhos para esse lugar — mas então
se lembrou de que tinha desistido de desenhar.
Perto do topo da colina o solo nivelava e as árvores cresciam mais próximas umas das outras. Simon
virou-se repentinamente e começou a levá-los colina abaixo.
— Para onde estamos indo? — perguntou Jared.
Simon balançou o mapa diante dele.
— O caminho é esse — disse ele.
Mallory concordou com a cabeça embora não a-chasse que fosse estranho
o fato de estarem percorrendo o mesmo trajeto outra vez.
— Você tem certeza? — perguntou Jared. — Eu acho que não.
— Tenho certeza — disse Simon.
Foi então que uma brisa soprou na colina e Jared achou que ouviu
risadas vindo de baixo da terra. Ele tro-peçou e quase caiu.
— Você ouviu isso?
— O quê? — perguntou Simon, olhando ao seu re-dor, nervoso.
Jared deu de ombros. Ele tinha certeza de que ouvi-ra algo, mas agora
só restava um silêncio.
Um pouco mais abaixo Simon mudou de direção novamente. Ele começou a caminhar para cima e para a direita. Mallory o seguiu, de boa vontade.
— Para onde vamos agora? — perguntou Jared.
Eles estavam subindo de novo, indo em direção ao topo da primeira colina, e isso era bom — mas estavam se deslocando de um jeito tão estranho que
Jared não achava que estivessem se aproximando do local assinalado no
mapa.
— Eu sei o que estou fazendo — disse Simon.
Mallory seguiu sem perguntas, o que irritou Jared tanto quanto as
voltas que Simon estava dando. Ele dese-java ter o Guia em mãos. Tentou
percorrer as páginas mentalmente, procurando encontrar alguma explicação. Ele
se lembrou de algo sobre pessoas que se perdem pelo caminho, mesmo quando estão
muito perto de casa...
Jared começou a arrancar a grama em que pisava
com seus sapatos. Um fio comprido escapou para o lado.
— Grama movediça! — Ele pensou no verbete do Guia. De repente, fez
sentido o fato de apenas ele perce-ber que estavam caminhando na direção
errada. — Mallory! Simon! Virem sua camisa do avesso como eu.
— Não — disse Simon. — Eu conheço o caminho. Por que você sempre tem
que ficar mandando em mim?
— É um truque dos seres fantásticos! — gritou Ja-red.
— Esqueça. Siga-me, só pra variar.
— Simplesmente faça isso, Simon!
— Não! Você não me ouviu? Não!
Jared lançou-se contra o irmão e ambos caíram no chão. Jared tentou arrancar o suéter do irmão, mas Simon o prendeu pelos braços.
— Parem com isso, vocês dois!
Mallory os separou. Depois, para a surpresa de Jared, ela se sentou em cima de Simon e arrancou-lhe o suéter.
Ele reparou, imediatamente, que ela já tinha virado sua camisa do lado do avesso.
Uma expressão estranha cobriu o rosto de Simon quando seu suéter ao avesso foi enfiado pela cabeça dele.
— Uau! Onde é que nós
estamos?
O som de uma risada veio de cima.
— A maioria das pessoas não chega tão longe... ou tão perto, depende
— disse uma criatura empoleirada na árvore. Ela tinha corpo de macaco com pelo curto, malhado em tons de marrom, e uma longa cauda que se enrolava no galho
no qual estava sentada. Trazia um colar de pelos espessos no pescoço, mas o focinho
parecia de coelho, as orelhas eram compridas, bem como os bigodes.
— Depende do quê? — perguntou Jared. Ele não tinha certeza se era
para rir ou tremer de medo.
De repente, a criatura virou-se de cabeça para baixo de modo que as
orelhas encostaram-se na sua barriga e o queixo ficou apontando para o céu.
— Quem sabe, sabe.
Jared deu um salto.
Mallory ergueu a espada.
— Fique onde está!
— Meu deus, uma fera com uma espada! — disse a criatura, sibilando.
Ela balançou a cabeça para voltar à posição anterior, piscou os olhos duas
vezes. — Será que a fera é louca? As espadas saíram de moda há tanto tempo!
— Não somos feras — disse Jared, na defensiva.
— Então, o que são? — perguntou a criatura.
— Sou um menino — disse Jared. — E, bem, esta é
minha irmã. Uma menina.
— Isso não é menina. Cadê o vestido dela?
— Os vestidos já saíram de moda há tanto tempo — disse Mallory com
ironia.
— Nós respondemos às suas perguntas — disse Jared. — Agora queremos
as suas respostas. O que é você?
— O Cão Negro da Noite — declarou a criatura com orgulho e, antes que
a cabeça dela virasse de novo, ela os encarou com um olho só. — Uma tola ou
talvez simplesmente uma ninfa.
— O que isso quer dizer? — perguntou Mallory — É tudo bobagem.
— Eu acho que você é um phooka! — disse Jared. — Sim, agora me
lembro. Eles mudam de forma.
— Eles são perigosos? — perguntou Simon.
— Muito! — disse o phooka, balançando a cabeça vigorosamente.
— Não tenho certeza disso — disse Jared, sem fôlego. Depois, limpando a garganta, ele
dirigiu-se à criatu-ra. — Estamos procurando por pistas que revelem o
pa-radeiro do meu tio-avô.
— Vocês perderam o seu tio! Que gente descuida-da!
Jared suspirou e tentou decidir se o phooka era realmente tão louco
como parecia ser.
— Bem, na verdade, ele já sumiu há muito tempo. Há quase setenta
anos. Estamos tentando descobrir o que foi que lhe aconteceu.
— Qualquer um pode viver tanto tempo assim; é só não morrer. Mas eu
entendo que os humanos vivem mais tempo quando estão em cativeiro do que quando
estão soltos.
— O quê? — perguntou Jared.
— Quando se procura por alguma coisa — disse o phooka —, é preciso
ter certeza de querer encontrá-la.
— Ah, deixa pra lá! — disse Mallory. — Vamos continuar a andar.
— Vamos pelo menos perguntar ao phooka o que
encontraremos no vale à frente — disse Simon.
Mallory revirou os olhos.
— Ah, é, como se o phooka fosse começar a fazer algum sentido.
Simon a ignorou.
— Por favor, o senhor pode nos dizer o que nos espera no caminho?
Estávamos seguindo o mapa e de-pois nos perdemos por causa da grama movediça.
— Se a grama se move — disse o phooka —, então um garoto pode acabar
enraizado num lugar só.
— Por favor, por favor, parem de dar atenção ao phooka! — disse
Mallory.
— Elfos — disse o phooka encarando Mallory co-mo se estivesse ofendido.
— Será que preciso ser direto quando os dirijo diretamente para o caminho dos
elfos?
— O que é que eles querem? — perguntou Jared.
— Eles têm o que vocês querem e eles querem o que vocês têm — disse o
phooka.
Mallory soltou um gemido alto.
— Nós combinamos que voltaríamos para casa se as coisas ficassem
muito esquisitas. — Mallory apontou para o phooka com a espada. — E essa coisa
aí é total-mente esquisita.
— Mas não é má. — Jared olhou em direção às co-linas. — Vamos andar
um pouco mais adiante.
— Eu não sei, não — disse Mallory. — E aquela conversa de grama
movediça e da gente se perder?
— O phooka disse que os elfos têm o que queremos!
Simon concordou com a cabeça.
— Estamos chegando bem pertinho, Mal.
Mallory suspirou.
— Não gosto disso. Gostaria que nós estivéssemos espiando os elfos e
não o contrário.
Eles começaram a descer pela colina, afastando-se da estrada.
— Esperem! Voltem aqui! — gritou o phooka. — Preciso lhes dizer uma coisa.
Eles se viraram.
— O que é? — perguntou Jared.
— Nonono nonono — disse o phooka com precisão.
— É isso que você queria nos dizer?
— Não, de jeito nenhum — disse o phooka.
— Então, o que é? — perguntou Jared.
— Tudo o que um
autor desconhece poderia encher um livro inteiro — disse o phooka. Depois
disso, seu corpo subiu para o alto da árvore e sumiu.
***
As três crianças desceram lentamente
o outro lado da colina. À medida que árvores novamente formavam uma floresta
fechada, eles reparavam como o silêncio se espalhava. Os pássaros não cantavam
naquelas árvores. Pare-cia que só havia o ruído de seus passos na grama e nos
galhos.
Eles pararam numa clareira cercada
de árvores. No meio dela, havia uma única árvore, alta, cheia de espinhos,
rodeada de cogumelos imensos, vermelhos e brancos.
— Uh! — disse Jared.
—
Certo. É esquisito. Vamos embora daqui — disse Mallory.
Mas, quando se viraram, as árvores
se entrelaçaram, os galhos entraram dentro de outros galhos, formando uma cerca
de folhagem que cobria o chão inteiro da clareira.
— Ai
caramba — disse Mallory.
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