Capítulo 6 – Em que as pedras falam
Jared e Simon correram, meio que puxando
Mallory, através de uma série de corredores e salas estreitas, escuras. Uma
vez, passaram por uma saliência logo acima da caverna central de onde Korting
vigiava os anões que trabalhavam colocando armas dentro de carroças. O latido
no início era bem longe, mas foi se tornando mais alto e agressivo. Eles
continuaram a correr, passando por um quarto depois do outro, escondendo-se
atrás de estalagmites toda vez que sentiam a proximidade dos anões, depois
continuavam a subida.
Jared parou numa caverna com lagos onde peixes brancos
e cegos nadavam em movimentos rápidos. Pequenas rochas equilibravam-se nas pontas
das estalagmites e o som de gotas pingando ecoava pelo espaço, num ritmo
estranho.
— Onde estamos?
— Não tenho certeza
— disse Simon. — Eu teria me lembrado desses peixes,
mas não me recordo. Eu não acho que viemos por esse caminho quando nos trouxeram
para cá.
— Onde estamos? — gemeu Mallory, balançando levemente
quando ficou de pé.
— Não podemos voltar — disse Jared nervoso. — Precisamos
continuar.
Uma figura pequena, pálida, surgiu das sombras.
Ela tinha olhos imensos e luminosos, que brilhavam no escuro. Na testa, duas
longas antenas tremiam.
— O que... o que é isso? — sussurrou Simon.
A criatura bateu na parede com um dedo longo, cheio
de juntas, depois pressionou a grande orelha contra a pedra. Jared reparou que
as unhas da criatura estavam rachadas e quebradas.
— Aspedras. Aspedrasfalam.
Aspedrasfalamcomigo. — A criatura tinha uma voz baixa como um
sussurro e Jared teve que se esforçar para compreender cada palavra. A criatura
bateu outra vez. O som era uma espécie de código Morse maluco.
— Ei — disse Jared. — Você sabe como se pode sair
daqui?
— Psiu.
— Ela fechou os olhos e fez que sim com a cabeça
concordando com algo que Jared não conseguia ouvir. Depois, ela saltou nos
braços de Jared, enrolando uma de suas fortes mãos no pescoço do menino. Jared tropeçou
para trás.
— Sim!
Sim! Aspedrascontamcomosairdaqui. — Ela apontou
para a escuridão, além dos lagos de peixe branco.
— Legal, obrigado. — Jared tentou arrancar a criatura
de seu pescoço. Finalmente, ela o soltou, arranhou a parede e começou a bater
nela outra vez.
— O que é isso? — sussurrou Simon para Jared. — Um
anão bem esquisito?
— Um protetor ou um mestre, eu acho — Jared sussurrou
de volta. — Eles vivem em minas e avisam aos mineiros quando vai acontecer um
acidente e coisas assim.
Simon fez uma careta.
— E todos eles são loucos desse jeito? Esse aí é
pior do que o phooka.
— Paravocê,JaredGrace.
— A criatura colocou uma pedra fria na mão de
Jared. — Apedraquerviajarcomvocê.
— Ah, obrigado — disse Jared. — Precisamos ir embora,
agora.
Ele se moveu em direção ao lugar escuro que o mestre-protetor
tinha indicado. À medida que Jared se aproximava, conseguia ver uma abertura.
— Espere. Como é que você sabia o nome de Jared?
— perguntou Mallory, saindo de trás dos irmãos lentamente.
Jared virou de costas, subitamente confuso.
— É. Como é que você sabia o meu nome? — perguntou ele.
A criatura bateu na parede da caverna de novo,
uma série de batidas desiguais.
— Aspedrasmecontaram.
Aspedrasabemdetudo.
— Ceeerto. — Jared continuou andando.
Na verdade, a criatura tinha apontando o lugar
de uma pequena abertura na parede da caverna. Eles não a tinham visto antes. O
orifício ficava muito perto da terra e estava escuro. Jared ficou de quatro e
começou a engatinhar. O chão da caverna era úmido e às vezes ele achava que
podia ouvir um ruído de deslizamento à sua frente. Seu irmão e irmã vinham logo
atrás. Uma ou duas vezes ele ouviu um deles suspirar, mas isso não fez com que
diminuísse os passos. Ele ainda conseguia ouvir o latido dos cães ecoando pelas
cavernas.
Eles chegaram à sala onde ficava a árvore de
ferro.
— Acho que é por ali — disse Jared, apontando para
um dos corredores.
Percorreram todo o caminho até encontrarem uma abertura
quase do tamanho de Jared. Ele olhou na escuridão. Estava tão escuro que
parecia que o túnel não tinha fim.
— Precisamos saltar! — disse Simon. — Andem!
— O quê? — perguntou Mallory.
Os latidos estavam chegando perto deles. Jared
viu olhos vermelhos na escuridão. Simon deu um passo para trás, depois saltou,
caindo no chão com força.
— Você precisa saltar! — disse Jared, e agarrou
a mão da irmã.
Saltaram todos juntos. Mallory tropeçou quando
seu pé bateu na pedra ao seu lado, mas caiu em segurança no chão da caverna.
Eles saíram correndo, esperando que os cães não conseguissem saltar como eles.
Mas essa passagem formava um círculo, e eles se viram
de volta à sala central, sob os galhos maciços e os pássaros de metal que
cantavam.
— Para onde vamos? — perguntou Mallory, empunhando
a espada.
— Eu não sei — disse Jared, retomando o fôlego. —
Eu não sei! Eu não sei.
— Eu acho que talvez seja por aqui — sugeriu Simon.
— Nós já passamos por aí e voltamos para o mesmo lugar!
O latido dos cães estava tão perto que Jared esperava
que entrassem na sala a qualquer momento.
— Como é que vocês não sabem o caminho? — perguntou
Mallory. — Vocês lembram como entraram aqui?
— Estou tentando lembrar! Estava escuro e nós estávamos
presos na gaiola! O que você quer que eu faça? — Jared chutou o pé da árvore
como se quisesse enfatizar suas palavras.
As folhas tremeram, batendo umas nas outras como
se fossem inúmeros sininhos. O som era ensurdecedor. Um dos pássaros de cobre
caiu no chão, as asas ainda batiam e o bico abria e fechava sem fazer ruído
algum.
— Ai caramba! — disse Mallory.
Cães de metal entraram pela sala vindos de
diversos corredores, os corpos delgados rapidamente cobrindo a distância entre
eles e os gêmeos. Os olhos faiscavam.
— Subam! — gritou Jared, enfiando o pé no galho mais
baixo ao mesmo tempo que estendia a mão para a irmã. Simon gritava ainda mais
alto do que os latidos metálicos, roucos. Mallory levantou-se, tonta.
— Vamos, Mallory — implorou Simon.
Ela jogou a perna por cima de um galho bem na hora
em que um cão a atacou. Os dentes dele conseguiram rasgar a ponta de seu
vestido branco. Os outros cães a cercaram, rasgando o resto do tecido. Jared
atirou a pedra que estivera segurando. Ela passou por cima da cabeça do
cachorro e rolou, sem força, até bater na parede da caverna.
Um dos cães correu atrás da pedra.
Primeiramente,
Jared pensou que talvez a pedra fosse mágica.
Então reparou que o cachorro a prendera com os dentes, a cauda de metal
balançando como um chicote.
— Simon — disse Jared. — Eu acho que o cachorro
está brincando.
Simon olhou para o cachorro durante certo tempo
e depois começou a descer da árvore.
— O que você vai fazer? — perguntou Mallory. — Cachorros-robôs
mecânicos não são bichinhos de estimação.
— Não se preocupe — respondeu Simon.
Simon caiu no chão e os cães pararam de latir repentinamente,
farejando-o como que para decidir se deviam mordê-lo ou não. Simon ficou
parado. Só de observá-lo, Jared perdeu a respiração.
— Vem cá, amigão — Simon suavizava a voz que só
tremia um pouco. — Você quer brincar? Quer apanhar a pedra? — Ele estendeu a
mão e rapidamente retirou a pedra dos dentes de metal do cão.
Todos os cães saltaram no ar ao mesmo tempo, latindo,
felizes. Simon olhou para seus irmãos gêmeos e sorriu.
— Você está brincando comigo — disse Mallory.
Simon atirou a pedra e todos os cinco cães correram
atrás dela. Um deles a apanhou com os dentes e voltou marchando,
orgulhosamente, os outros o seguiram, ansiosos. Simon debruçou-se para
acariciar suas cabeças de metal. As línguas de prata caíam para fora das bocas.
Simon atirou a pedra mais três vezes antes que Jared
o chamasse:
— Precisamos ir embora — disse ele. — Os anões podem
nos encontrar se ficarmos mais tempo por aqui.
Simon pareceu ficar desapontado.
— Tudo bem — gritou ele. Depois, apanhou a pedra
e atirou com muita força para a outra sala. Os cachorros saíram correndo para
pegá-la. — Vamos!
Jared e Mallory desceram da árvore. Todos os
três passaram pela pequena abertura na parede e espremeram-se pelo túnel,
engatinhando rapidamente. Jared colocou a mochila na entrada do túnel para bloquear
o caminho. Ele já podia ouvir os cães choramingando e arranhando o seu tecido.
Os irmãos apalparam o caminho no escuro, mas havia
uma bifurcação no túnel que eles não tinham visto antes, porque desta vez
avistaram uma luz suave, calorosa, no fim do corredor.
Perceberam que estavam de pé fora da mina, na grama
úmida de orvalho. O amanhecer avermelhava o lado leste do céu.
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