Capítulo 2 - Day

O Primeiro Eleitor está morto.
Tudo isso é meio sem graça, não é, não? O lógico seria que a morte do Eleitor fosse acompanhada por uma pomposa marcha fúnebre cheia de artigos religiosos, pânico nas ruas, luto nacional, desfiles de soldados disparando tiros em direção ao céu. E também um enorme banquete, bandeiras a meio pau, estandartes brancos pendurados em todos os edifícios. Alguma coisa espetacular desse tipo. Acontece que eu não tinha vivido tempo suficiente para ver um Eleitor morrer. Exceto pela divulgação da indicação de sucessor do finado Eleitor, e de uma eleição nacional fraudada em nome das aparências, eu não fazia idéia de como isso funcionava.
Acho que a República apenas finge que isso nunca aconteceu, e vai direto para o próximo Eleitor. Lembro agora de ler sobre isso em uma das minhas aulas no colégio. Quando chegar a hora de um novo Primeiro Eleitor, o país deve lembrar às pessoas que se concentrem no aspecto positivo. O luto gera fraqueza e caos. Seguir em frente é a única maneira. Sei... E essas são palavras vindas de um governo que teme mostrar insegurança aos civis...
Mas tenho apenas um segundo para refletir sobre isso.
Mal acabamos o novo juramento, uma dor aguda me atinge a perna. Antes que eu possa evitar, dobro o corpo e caio em cima do joelho bom. Dois soldados viram a cabeça na nossa direção. Rio o mais alto que posso, fingindo que as lágrimas nos meus olhos são de divertimento, june entra no meu jogo, mas percebo o medo no seu rosto.
— Vamos — sussurra ela freneticamente. Um dos seus braços longos rodeia minha cintura, e tento pegar a mão que ela me estende. Na calçada, as pessoas reparam em nós pela primeira vez. — Você precisa levantar. Ande logo!
Recorro a toda a minha força para manter um sorriso no rosto. Preciso me concentrar em June.Tento me levantar, mas caio de novo. Merda! A dor é muito forte. Luzes brancas me dão estocadas no fundo dos olhos. Respire, digo a mim mesmo. Você não pode desmaiar bem no meio da rua principal de Vegas.
— Qual é o problema, soldado?
Um cabo jovem e de olhos castanho-claro está na nossa frente, de braços cruzados. Dá para perceber que tem pressa, mas aparentemente não o suficiente para que ele não nos examine. Ele ergue uma sobrancelha para mim e pergunta:
— Tudo bem? Você está branco feito neve, garoto.
Corra. Sinto um desejo forte de gritar para June: Saia daqui, dá tempo.
Ela, porém, evita que eu fale e diz:
— Peço que o desculpe, senhor. Nunca vi um cliente da Bellagio beber tanto de uma só vez. — Sacode a cabeça com pesar e faz um sinal para que o cabo se afaste. — É melhor o senhor se afastar — continua ela acho que ele precisa vomitar.
Fico surpreso — mais uma vez — com a suavidade com que ela consegue se transformar em outra pessoa. Da mesma forma que ela me enganou nas ruas de Lake.
O cabo franze a testa para ela em dúvida, antes de virar as costas para mim. Seus olhos focalizam minha perna lesionada. Embora ela esteja escondida sob uma grossa camada de calças, ele a analisa e diz:
— Não sei direito se sua acompanhante sabe do que está falando. Parece que você precisa ir a um hospital.
Ele acena com a mão para deter uma ambulância que passava. Sacudo a cabeça e consigo dizer, com um riso débil:
— Não, senhor, obrigado. Essa princesa fica me contando uma porção de piadas. Só preciso voltar a respirar direito, e depois curar meu porre dormindo. Agente...
Mas ele não está prestando atenção ao que digo. Xingo em silêncio. Se formos para o hospital, vão tirar nossas impressões digitais, e saberão exatamente quem somos: os dois fugitivos mais procurados pela República. Não ouso olhar para June, mas sei que ela também está tentando encontrar uma solução.
Nesse instante, alguém atrás do militar mostra a cabeça.
É uma garota que June e eu reconhecemos imediatamente, embora eu nunca a tenha visto com um uniforme da República. Um par de óculos de piloto está pendurado no seu pescoço. Ela anda em volta do cabo e fica em frente a mim, sorrindo com tolerância.
— Ei! — ela exclama. — Bem que eu desconfiei que era você. Eu vi você cambaleando na rua feito um doido!
O militar observa quando ela me arrasta até eu ficar de pé e me dá um forte tapa nas costas. Cambaleio, mas dou-lhe um sorriso de orelha a orelha, como se a tivesse conhecido a vida inteira.
— Senti sua falta — resolvo dizer.
O cabo faz um gesto impaciente para a moça e pergunta:
— Você conhece esse cara?
A moça dá um piparote irreverente no cabelo negro curto e lhe dá o sorriso mais sensual que já vi na vida:
— Se eu o conheço, senhor? A gente fazia parte da mesma esquadrilha no nosso primeiro ano. - Ela pisca para mim. — Parece que ele voltou a aprontar pelos cassinos de Vegas.
O cabo ri desdenhosamente e revira os olhos.
— Crias da Aeronáutica, certo? Bem, não deixe ele fazer mais escândalo. Fico quase tentado a reportá-los ao comandante de vocês...
Ele parece se lembrar do estava fazendo antes, e vai embora apressado. Respiro avaliado. Essa foi por um triz.
Quando ele se vai, a moça me dá um sorriso cativante. Mesmo debaixo de uma das mangas do seu paletó, dá pra ver que um dos braços está engessado.
— Meu alojamento é perto daqui — insinua ela. — O tom de sua voz me leva a crer que ela não está feliz de nos ver. — Que tal descansar lá um pouco? Pode até levar seu novo "brinquedinho". — A moça aponta para June com a cabeça ao dizer isso.
Kaede. Ela não mudou nada desde a tarde em que a conheci, quando pensei que fosse apenas uma bartender com uma tatuagem de parreira. Antes de eu saber que ela era uma Patriota.
— Mostre o caminho — respondi.
Kaele ajuda June a me apoiar por mais um quarteirão. Ela nos faz parar em frente às refinadas portas esculpidas do Venezia, um edifício de muitos andares de alojamentos militares, depois passamos por um entediado guarda na entrada, e entramos no vestíbulo principal do prédio. O pé-direito é alto o bastante para me dar vertigem e vejo com os cantos dos olhos as insígnias da República, e retratos do Eleitor pendurados entre as colunas de pedras. Os guardas estão apressados para substituir esses retratos por retratos atualizados. Kaede nos conduz enquanto tagarela sem parar uma porção de abobrinhas. Seu cabelo negro agora está ainda mais curto, cortado rente e à altura do queixo, e os olhos estão borrados por uma sombra azul-marinho. Nunca tinha reparado que ela e eu temos quase a mesma altura. Soldados se deslocam para cima e para baixo, e fico na expectativa de que um deles me reconheça dos cartazes de "procura-se". Eles vão reparar em June, mesmo disfarçada, ou se darão conta de que Kaede não é militar. Então, ficarão todos em cima da gente como moscas e nós não teremos a menor chance.
Mas ninguém nos interroga, e o fato de eu estar mancando até nos ajuda a nos misturarmos à multidão; vejo vários outros soldados com braços ou pernas engessados. Kaede nos leva até os elevadores; nunca andei de elevador, porque nunca estive em um prédio com eletricidade. Saltamos no oitavo andar, onde há menos soldados. Na verdade, passamos por um corredor completamente vazio.
Aqui, ela finalmente deixa cair a fachada petulante:
— Vocês dois parecem ratos de esgoto — murmura, e bate baixinho numa das portas. — Essa perna ainda incomoda, né? Tu deve ser muito teimoso, se veio até aqui atrás da gente. — Ela ri debochada para June e diz: — Essas luzes todas na tua roupa quase me cegaram.
June troca um olhar comigo. Sei exatamente o que ela está pensando.
Não dá pra entender como um grupo de criminosos pode estar vivendo num dos maiores quartéis de Vegas.
Ouve-se um barulhinho atrás da porta. Kaede a abre, e entra no lugar com os braços estendidos.
— Bem-vindos à nossa humilde residência — declara, agitando largamente as mãos. — Pelo menos pelos próximos dias. É bem maneira, né?
Não sei o que eu esperava ver. Talvez um grupo de adolescentes, ou uma atividade de baixo orçamento.
Em vez disso, entramos num cômodo onde apenas duas outras pessoas nos esperavam. Olho ao redor, surpreso. Eu nunca estive em um verdadeiro quartel da República, mas este deve ser reservado para oficiais — duvido que isso aqui seja usado para acomodar soldados comuns. Em primeiro lugar, não é um cômodo comprido com filas de beliches. Poderia ser um apartamento para um ou dois oficiais de alta patente. Há luz elétrica no teto e nas luminárias. Ladrilhos prateados e de cor creme cobrem o piso, as paredes estão pintadas em tons de gelo e vinho. Os sofás e as mesas têm as pernas forradas com uma grossa tapeçaria vermelha. Um pequeno monitor está insDay talado diretamente em uma das paredes, e a tela muda mostra o mesmo noticiário transmitido pelos telões nas ruas.
Assobio baixinho.
— É, maneiro mesmo.
Sorrio, mas fico sério ao olhar de relance para June. Seu rosto está tenso sob a tatuagem da fênix. Embora seus olhos permaneçam neutros, sem dúvida ela não está feliz, nem tão impressionada quanto eu. Bem, e por que deveria estar? Aposto que o apartamento dela deve ser tão bonito quanto este.
Seus olhos examinam o cômodo calmamente, observando coisas em que eu provavelmente jamais repararia. Ela é inteligente e astuta como qualquer bom soldado da República. Uma de suas mãos permanece perto da cintura, onde ela mantém um par de facas.
Um instante depois, minha atenção se concentra em uma moça atrás do sofá de centro que fixa os olhos em mim. Ela aperta os olhos, como se quisesse ter certeza de que está realmente me vendo. Impressionada, ela abre a boca; os pequenos lábios cor-de-rosa formam um O. Seu cabelo está curto demais para que possa ser trançado; ele cai até a metade do pescoço, em mechas desarrumadas.Espera aí! Meu coração para de bater por um instante. Eu não a reconheci logo de cara por causa do cabelo.
É Tess.
— Você está aqui! — ela exclama. Antes que eu possa responder, Tess corre até onde estou e pula no meu pescoço. Eu cambaleio para trás, lutando para manter o equilíbrio. — É você mesmo! Não posso acreditar, você está aqui, você está bem!
Não consigo pensar direito. Por um instante, nem sinto a dor na perna. Tudo que posso fazer é apertar com força a cintura dela, enterrar a cabeça no seu ombro e fechar os olhos. O peso na minha cabeça desaparece e me deixa enfraquecido de alívio. Respiro fundo, e me consolo com o entusiasmo dela, e o cheiro doce do seu cabelo. Estive com ela todos os dias desde que eu tinha doze anos, mas depois de apenas algumas semanas separados, percebo de súbito que ela já não é a garota de dez anos que conheci num beco: está diferente, mais velha. Sinto um aperto no peito.
— Estou feliz em ver você, amiga — sussurro. — Você está ótima.
Tess apenas me aperta ainda mais. Dou-me conta de que ela está prendendo a respiração, esforçando-se muito para não chorar.
Kaede interrompe nosso momento:
— Já chega. Isto aqui não é uma droga de ópera.
Nós nos separamos para rir, sem jeito, um para o outro, e Tess enxuga os olhos com a palma de uma das mãos. Ela troca um sorriso constrangido com June. Finalmente, dá as costas e corre de volta para uma pessoa, um homem, que a esperava.
Kaede abre a boca para dizer alguma coisa, mas o homem a detém, com uma das mãos enluvada. Isso me surpreende. Sabendo como a moça é mandona, estava certo que ela era a chefe do grupo. Não consigo imaginar essa garota aceitando ordens de alguém. Agora, porém, ela aperta os lábios e se atira no sofá quando o homem se levanta para falar conosco. Ele é alto, deve ter uns quarenta e poucos anos, e seus ombros são largos. A pele é ligeiramente bronzeada e o cabelo ondulado está puxado para trás num rabo de cavalo pequeno e crespo. Um par de óculos finos e de aros negros está apoiado no nariz.
— Quer dizer então que você é o famoso Day — ele diz. — Prazer em conhecê-lo.
Gostaria de ter uma postura melhor do que ficar de pé, curvado de dor:
— Igualmente. Obrigado por nos receber.
— Por favor, perdoe-nos por não termos acompanhado vocês até Vegas — ele se desculpa, e ajusta os óculos. — Pode parecer uma atitude fria, mas não gosto de arriscar meus rebeldes desnecessariamente. — Seus olhos se voltam para June e ele diz:
— E suponho que você seja o prodígio da República.
June inclina a cabeça, num gesto que revela sua educação refinada.
— Seu traje de garota de programa é mesmo muito convincente. Se importa se fizermos um pequeno teste para provar sua identidade? Por favor, feche os olhos.
June hesita um segundo, depois obedece.
O homem aponta com uma das mãos para a frente da sala e ordena:
— Atinja o alvo na parede com uma de suas facas.
Eu pisco, e analiso as paredes. Alvo? Eu sequer havia notado um tabuleiro de dardos, com três anéis numa das paredes próxima à porta pela qual passamos. Mas June nem hesita. Tira uma faca da cintura, vira-se, e a atira em direção ao alvo, sem abrir os olhos.
Afaça atinge o quadro profundamente, a apenas alguns centímetros do centro do alvo.
O homem aplaude.
Até Kaede resmunga sua aprovação, seguida por um revirar de olhos:
— Quanta palhaçada! — eu a escuto exclamar.
June se vira para nós e espera a reação do homem. Fico atônito e calado. Nunca vi ninguém manejar uma faca com tamanha perícia. Eu já tinha visto a June fazer uma porção de coisas surpreendentes, mas essa era a primeira vez que a testemunhava usando uma arma. Essa visão me causa emoção e um arrepio, trazendo de volta lembranças que havia trancado num compartimento da memória, pensamentos que preciso conservar enterrados se quiser manter o foco e seguir em frente.
— Prazer em conhecê-la, Srta. Iparis — diz o homem, pondo as mãos nas costas. — Agora me digam: o que os traz aqui?
June faz um aceno com a cabeça para mim, e então começo a falar:
— Precisamos da sua ajuda, por favor. Vim à procura de Tess, mas também estou tentando encontrar meu irmão Éden. Não sei para que a República o está usando, nem onde o estão mantendo. Achamos que vocês fossem os únicos, fora da esfera militar, que talvez pudessem conseguir essas informações.
E, por último, acho que minha perna precisa ser operada. Prendo a respiração quando mais um espasmo de dor atravessa meu corpo feito uma espada tentando me cortar pela metade. O homem olha de relance para a perna; suas sobrancelhas se franzem de preocupação.
— É uma senhora lista! — diz. — Você deveria se sentar. Parece meio desequilibrado em pé. — Ele espera pacientemente que eu me mexa, mas, quando permaneço imóvel, ele pigarreia e continua — Bem, vocês já se apresentaram.
É justo que eu faça o mesmo. Meu nome é Razor, e sou o chefe dos Patriotas. Venho liderando a organização há muitos anos, há mais tempo que vocês vêm causando problemas nas ruas de Lake. Você quer nossa ajuda agora, Day, mas lembro que recusou os convites para se juntar a nós. Várias vezes.
Ele se vira para as janelas pintadas em tons escuros que dão de frente para as plataformas de embarque em formato de pirâmides que estão na extensão da rua. A vista é impressionante. Dirigíveis deslizam para frente e para trás no céu noturno; vários deles aterram no alto das pirâmides, como peças de um grande quebra-cabeça. De vez em quando, dá para ver formações de aviões de combate, formas negras semelhantes a águias, decolando ou aterrissando nas plataformas dos aviões. Meus olhos focalizam os edifícios; as plataformas das pirâmides devem ser os locais mais fáceis por onde fugir, com ranhuras de cada lado, e sulcos semelhantes a degraus delimitando suas extremidades.
Percebo que Razor está esperando minha resposta.
— Eu não me sentia muito confortável com a quantidade de cadáveres gerada por sua organização.
— Mas agora, aparentemente, você mudou de idéia. — Suas palavras são de censura, mas seu tom de voz é simpático quando elejunta as palmas das mãos e comprime as pontas dos dedos nos lábios. — Porque você precisa de nós, certo?
É, nisso ele tem razão.
— Sinto muito, mas estamos ficando sem opções. Pode acreditar que vou entender se o senhor se recusar. Mas, por favor, só não nos entregue à República. — Forço um sorriso.
Ele dá um risinho em resposta ao meu sarcasmo. Eu me concentro na saliência torta do seu nariz e me pergunto se ele já o quebrou antes.
— No começo, fiquei tentado a deixar vocês dois perambulando por Vegas até serem capturados. — A voz dele é suave como a de um aristocrata, refinada e carismática. — Vou ser muito sincero com você. Suas habilidades já não me são tão úteis quanto antes, Day. Com o passar dos anos, recrutamos outros agentes, e agora, com o devido respeito, acrescentar mais um à nossa equipe não é uma prioridade. Sua amiga já sabe — ele para e acena para June com a cabeça — que os Patriotas não são uma organização beneficente. Você está nos pedindo muita ajuda. O que nos dará em troca? Vocês não devem ter muito dinheiro.
June lança um olhar expressivo na minha direção. Ela me alertou sobre isso na viagem de trem, mas não posso desistir agora. Se os Patriotas nos rejeitarem, vamos ficar sozinhos.
— Não temos dinheiro — admito. — Não vou falar por June, mas se tiver qualquer coisa que eu possa fazer em troca de sua ajuda, é só dizer.
Razor cruza os braços e vai até o bar do apartamento, um refinado balcão de granito embutido na parede, com várias prateleiras de garrafas de vidro de todas as formas e tamanhos. Com toda a calma do mundo, ele se serve de uma bebida. Quando termina, ele pega o copo e volta até onde estamos.
— Existe uma coisa que você pode oferecer... Felizmente, vocês chegaram numa noite muito interessante. — Razor dá um gole na bebida e se senta no sofá. — Como vocês devem ter escutado, o ex-Primeiro Eleitor morreu hoje, coisa que muitos dos círculos de elite da República já tinham previsto. De qualquer forma, seu filho, Anden, é o novo Eleitor. Ele é praticamente um menino, e não é nada estimado pelos senadores do pai. — Razor se inclina para frente, pronunciando cada palavra com cautela e vigor. — Raramente a República foi tão vulnerável quanto é agora. Não haverá melhor época para fazer uma revolução. Day, suas habilidades físicas talvez sejam dispensáveis, mas há duas coisas que você pode nos dar que nossos agentes não podem. A primeira é sua fama, seu status como campeão do povo. A segunda é sua encantadora companheira — ele aponta o copo para June.
Enrijeço ao ouvir essas palavras, mas os olhos de Razor são tão quentes quanto mel, e fico esperando o resto de sua proposta.
— Terei prazer em aceitar vocês, e ambos serão muito bem cuidados. Podemos conseguir um excelente médico para você, Day, e pagar por uma operação que tornará sua perna melhor do que nova. Desconheço o paradeiro do seu irmão, mas podemos ajudar você a encontrá-lo e, posteriormente, podemos ajudar vocês dois a fugir para as Colônias, se assim o desejarem. Em troca, pediríamos sua colaboração com um novo projeto, mas sem direito a perguntas. Entretanto, vocês vão precisar jurar sua fidelidade aos Patriotas, antes que eu revele qualquer detalhe sobre o que vocês farão. Minhas condições são essas. O que vocês acham?
June olha para mim e para Razor, levanta o queixo e diz:
— Eu aceito. Vou jurar fidelidade aos Patriotas.
Há uma ligeira hesitação em sua voz, como se soubesse que realmente abandonara de vez a República. Engulo em seco. Não esperava que June concordasse tão rapidamente; achei que precisaria ser persuadida antes de se aliar a um grupo que obviamente odiava até poucas semanas atrás. O fato de ela ter dito sim faz meu coração bater mais forte. Se June está se juntando aos Patriotas, é porque deve compreender que não temos outra opção. Ela está fazendo isso por mim. É minha vez de erguer a voz.
— Eu também aceito.
Razor sorri, levanta-se do sofá e ergue sua bebida, simulando um brinde. Depois põe o copo na mesa de centro e aperta nossas mãos com firmeza.
— Então é oficial. Vocês nos ajudarão a assassinar o novo Primeiro Eleitor.

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