Capítulo 9 - June

DENVER, COLORADO.
19H37.
-6C°.

Chego à capital de trem (Estação 42B), durante uma tempestade de neve. Há uma multidão reunida na plataforma do trem para me ver. Eu os espreito pela janela de vidro fosco, quando a velocidade vai diminuindo até que o trem pare completamente. Embora esteja terrivelmente frio lá fora, esse grupo enorme de civis se espreme atrás de uma balaustrada metálica improvisada, como se Lincoln ou outro cantor famoso tivesse acabado de chegar. Duas patrulhas militares da capital os empurram para trás. Escuto seus gritos abafados.
- Para trás! Permaneçam atrás das barreiras. Atrás das barreiras! Qualquer um que for apanhado com uma câmera será preso!
É estranho. A maioria dos civis aqui parece mais humilde. Ajudar o Day deve ter construído uma boa reputação para mim entre os moradores das favelas. Esfrego no meu dedo os delicados fios do anel de clipes de papel. Isso virou um hábito.
Thomas caminha até o corredor onde estou, e se inclina sobre os assentos para falar com os soldados sentados ao meu lado.
- Levem a moça até a porta - ele manda. - Rápido!
Seus olhos vacilantes me encaram e depois examinam o traje que estou usando (colete amarelo de prisioneira, blusa fina com gola branca). Ele age como se a conversa que tivemos ontem à noite na sala de interrogatório jamais tivesse acontecido. Eu concentro o olhar no meu colo.
O rosto dele me embrulha o estômago.
- Ela vai sentir frio lá fora - ele diz a seus comandados. – Consigam um casaco.
Os soldados apontam as armas para mim (Modelo XM-2500, alcance de 700m, balas smart round, que podem atravessar duas camadas de cimento), e me fazem ficar de pé. Durante a viagem de trem, fiquei olhando com tamanha intensidade para esses dois soldados, que seus nervos devem estar em frangalhos.
As algemas de minhas mãos refinem. Com rifles como aqueles, se eu fosse atingida uma vez, provavelmente morreria de hemorragia, independentemente do lugar no tronco onde a bala pegasse. Eles talvez pensem que estou imaginando uma forma de agarrar uma de suas armas, quando não estiverem prestando atenção. (Essa é uma suposição ridícula, porque as algemas jamais me permitiriam disparar o fuzil corretamente.)
Eles me conduzem pelo corredor até a extremidade do vagão, onde mais quatro soldados esperam na porta aberta que leva à plataforma da estação. Uma lufada de vento gélido nos atinge e respiro profundamente.
Uma vez estive na frente de combate, quando Metias e eu saímos para nossa única missão juntos, mas foi no lado oeste do Texas e era verão. Eu nunca havia posto o pé numa cidade enterrada na neve como esta. Thomas vai à frente de nossa pequena procissão, e faz um sinal para que um dos soldados ponha um casaco nas minhas costas.
Aceito, agradecida.
A aglomeração, entre noventa e cem pessoas, fica em completo silêncio ao ver meu colete amarelo vivo, e quando desço os degraus do vagão sinto que a atenção do grupo me queima as entranhas como se fosse um aquecedor. A maioria das pessoas está tremendo, são magras e pálidas, vestem roupas esfarrapadas que não podem mantê-las aquecidas neste clima, e calçam sapatos esburacados. Não consigo compreender. Apesar do frio, elas vieram até aqui para me ver saltar de um trem, e sabe-se lá há quanto tempo estão esperando. De repente, sinto-me culpada por haver aceitado o casaco.
Chegamos ao fim da plataforma e estamos quase no interior da estação quando ouço o grito de um dos espectadores. Giro o corpo antes que os soldados possam impedir.
- O Day está vivo? - grita um menino. Ele deve ser mais velho do que eu, talvez tenha uns vinte anos, mas é tão magrinho e pequeno que poderia passar por alguém da minha idade, se não olhassem atentamente para seu rosto.
Levanto a cabeça e sorrio. Então um soldado atinge o rosto dele com a coronha do fuzil, os soldados que fazem minha escolta me obrigam a virar para frente. A multidão começa um tumulto; gritos enchem o ar instantaneamente. No meio de tudo isso, ouço alguns berrarem:
- Day está vivo! Day está vivo!
- Continue andando - diz Thomas, furioso. Entoamos no vestíbulo e sinto o ar gelado desaparecer de súbito quando a porta se fecha atrás de nós.
Eu não disse nada, mas meu sorriso era auto explicativo. Sim, Day está vivo. Tenho certeza de que os Patriotas ficarão felizes se eu confirmar os boatos que parecem aumentar entre a população.
Saímos da estação; há três jipes nos esperando. Quando deixamos o local e nos dirigimos a uma rodovia abaulada, não posso deixar de me surpreender com a cidade que vejo pela janela. Normalmente é necessária uma boa razão para se vir a Denver. Ninguém, a não ser os civis nativos da cidade, podem conhecer a cidade sem permissão específica.
E raro o fato de eu estar aqui, vendo o interior de Denver. Tudo está sufocado debaixo de uma coberta de neve, mas, mesmo através da neve, posso ver os contornos esmaecidos de uma enorme muralha escura que envolve a cidade como se fossem barragens gigantes contra inundações.
A Armadura. É claro que li a respeito no ensino elementar, mas vê-la com meus próprios olhos é diferente. Os arranha-céus são tão altos que desaparecem na neblina das nuvens carregadas de neve. Cada andar avarandado está coberto por espessas camadas de neve, cada lado sendo sustentado por gigantescas vigas metálicas. Entre os prédios, consigo vislumbrar o Capitol Tower. De vez em quando, vejo holofotes percorrendo o ar, e helicópteros rodeando os arranha-céus.
A certa altura, quatro jatos de caça passam velozmente acima de nós. Paro um instante para admirá-los (são Reapers X-92, aeronaves experimentais que ainda não são produzidas fora da capital, mas devem ter sido aprovadas nos testes de vôo, considerando que os engenheiros confiam nelas para trafegarem sobre o centro da cidade de Denver). A capital é uma cidade militar como Las Vegas, e é até mais intimidante do que eu imaginara.
A voz de Thomas me traz rapidamente de volta à realidade.
- Vamos levar você para o Colburn Hall - ele diz, do assento do carona do jipe. - E um salão de jantares no Capital Plaza, onde os senadores às vezes se reúnem para banquetes. O Eleitor costuma jantar lá com freqüência.
Colburn? Ouvi dizer que é um local muito requintado para reuniões, especialmente levando em conta que antes iam me encaminhar para apenitenciária de Colorado. Essa informação deve ser novidade também para o Thomas. Acho que ele nunca esteve no Capital mas, como bom soldado, não vai perder tempo admirando o salão feito um deslumbrado.
Estou ansiosa para ver como é o Capital Plaza, se é tão grande quanto imaginei.
- De lá, minha patrulha vai deixá-la, e você vai ser transferida para uma das patrulhas do Comandante DeSoto. - Digo a mim mesma: uma das patrulhas de Razor. - O Eleitor Vai encontrá-la na sala real de audiências do Hall. Sugiro que você se comporte adequadamente.
- Obrigada pela dica - respondo, sorrindo friamente para o reflexo de Thomas no retrovisor. - Vou caprichar na reverência.
Entretanto, a verdade é que começo a ficar nervosa. O Eleitor é alguém que me ensinaram a venerar desde o nascimento, alguém por quem pensei que nunca hesitaria em dar a vida. Mesmo agora, depois de tudo que sei sobre a República, ainda sinto um senso de dever profundamente enraizado tentando vir à tona de novo, um cobertor familiar no qual quero me enrolar. Estranho. Não me senti assim quando soube da morte do Eleitor, nem quando assisti ao primeiro discurso televisionado de Anden. Isso esteve escondido até agora, quando faltam apenas algumas horas para vê-lo em pessoa. Não sou mais o prodígio valorizado de quando nos conhecemos. Que pensará ele de mim agora?

***

COLBURN HALL, CÂMARA DE JANTARES RÉGIOS.

As coisas ressoam aqui. Estou sentada sozinha em uma extremidade de uma comprida mesa (quase quatro metros de cerejeira escura, pernas entalhadas à mão, ornamentos dourados provavelmente pintados com um pincel de detalhes milimétricos sutis), encostada, reta, no estofamento de veludo vermelho da cadeira. Distante, em frente à parede oposta, uma lareira crepita e estala, sob um retrato gigantesco do novo Eleitor. Oito luminárias douradas iluminam as laterais do recinto. Soldados de patrulha do Capitol estão em todos os lugares: cinqüenta e dois enfileiram-se nas paredes, ombro a ombro, e seis, perfilados à esquerda e à direita do meu corpo.
Ainda está gélido lá fora, mas aqui dentro está quente o bastante para as criadas terem colocado em mim um vestido de tecido leve e botas de couro leves. Lavaram, secaram e escovaram meu cabelo, que cai livre e reluzente até o meio das minhas costas. Ele foi enfeitado com fios de minúsculas pérolas cultivadas (que valem, no mínimo, duas mil Notas cada uma). A princípio eu as admiro animadamente, mas então me lembro  das pessoas na estação de trem com suas roupas em frangalhos, e retiro os dedos do cabelo, aborrecida comigo mesma.
Outra criada havia aplicado um pó translúcido nas minhas pálpebras, e elas brilham sob a luz da lareira. Meu vestido, branco cremoso, realçado por tons escuros cinzentos, flutua até meus pés, em camadas de chiffon. O espartilho apertado torna difícil a respiração. Trata-se obviamente de um vestido caro, que talvez custe cinqüenta ou sessenta mil Notas.
As únicas coisas que não combinam com minha roupa e com este lugar são as pesadas algemas metálicas que prendem meus tornozelos e pulsos, e me acorrentam à cadeira. Passa-se meia hora antes que outro soldado (usando a inconfundível jaqueta negra e vermelha das patrulhas da capital) entre na sala de audiências.
Ele segura a porta aberta, perfila-se, e ergue o queixo, dizendo:
- Nosso glorioso Primeiro Eleitor se encontra no edifício - anuncia. - Levantem-se, por favor.
Ele se esforça para fingir não estar se dirigindo a ninguém específico, mas sou a única pessoa sentada. Ergo-me da cadeira e fico de pé, com um retinido das algemas.
Mais cinco minutos se passam. Então, quando começo a me perguntar se vem mesmo alguém, um rapaz atravessa calmamente a porta, e faz um sinal afirmativo com a cabeça para os soldados na entrada. Os guardas se apressam a prestar continência. Não posso bater continência com as mãos algemadas, nem me inclinar ou fazer uma reverência adequadamente, de modo que apenas continuo de pé e encaro o Eleitor.
Anden tem quase a mesma aparência que tinha quando nos conhecemos no baile de celebração: alto, majestoso e sofisticado, o cabelo escuro bem penteado. A jaqueta de gala é de um lindo tom cinza-carvão, com dragonas douradas de piloto nas mangas, e ombreiras também douradas.
Contudo, os olhos verdes estão solenes, e há uma ligeira postura relaxada dos ombros, denunciando o novo peso que havia se instalado sobre ele. Parece, afinal de contas, que a morte do pai o afetou.
- Sente-se, por favor - ele diz, estendendo uma das mãos protegidas por luvas de combate na minha direção. Sua voz é muito suave, mas se faz ouvir na grande sala. - Espero que tenha estado confortável, Srta. Iparis.
Faço o que ele pediu.
- Certamente. Obrigada.
Depois que Anden se sentou na outra extremidade da mesa, e os soldados retornaram às suas posturas habituais, ele fala de novo.
- Soube que a senhorita solicitou uma audiência comigo. Suponho que não se importe de usar as roupas que providenciei. - Ele para por uma fração de segundo, o suficiente para um sorriso tímido iluminar os traços do rosto. - Achei que a senhorita não gostaria de jantar vestindo um uniforme de prisioneira.
Há alguma coisa condescendente no seu tom de voz que me irrita.
Como ousou me vestir como uma boneca? É o que diz uma parte indignada de mim. Ao mesmo tempo, fico impressionada com seu ar de comando, com a maneira como assumiu completamente seu novo papel. Ele de repente tem poder - muito poder, por sinal -, e evidencia isso de maneira tão confiante que meus antigos sentimentos de lealdade me comprimem fortemente o peito. A insegurança que ele demonstrava antes está desaparecendo de modo rápido. Esse homem nasceu para comandar. Dizem que Anden ficou encantado com você, Razor dissera. Por isso inclino o rosto para baixo e olho fixamente para ele.
- Por que o senhor está me tratando tão bem? Pensei que agora eu fosse uma inimiga do estado.
- Eu ficaria envergonhado de tratar como prisioneira o mais famoso prodígio da República - comenta ele, ao cuidadosamente alinhar, de modo perfeito, seus garfos, facas e a taça de champanha. - A senhorita não acha isso desagradável, acha?
- De maneira alguma.
Olho furtivamente para o recinto mais uma vez, memorizando as posições das luminárias, a decoração das paredes, a localização de cada soldado e as armas que eles carregam. A requintada elegância deste encontro me faz entender que Anden não providenciou o vestido e o jantar apenas para flertar comigo. Acredito que ele queira que a notícia de que me tratou muito bem vaze para o povo. Ele quer que as pessoas saibam que o novo Eleitor está cuidando bem da salvadora de Day. Meu desagrado inicial abranda - esse novo pensamento me intriga. Anden deve ter pleno conhecimento de que sua reputação pública é desfavorável. Talvez esteja esperando conseguir o apoio popular. Se esse for o caso, então ele está se esforçando para fazer uma coisa à qual nosso último Eleitor não dava nenhuma importância. Se Anden está de fato buscando a aprovação do povo, o que pensa de Day? Ele certamente não vai conquistar as pessoas se anunciar uma perseguição ao criminoso mais amado pelo povo.
Duas criadas trazem travessas de comida (uma salada de morangos e um lombinho de porco assado, com palmito), enquanto outras duas colocam guardanapos brancos de linho nos nossos colos, e enchem nossas taças de champanhe. Essas criadas são da classe A (elas caminham com a elegância da elite), embora provavelmente não sejam da mesma classe que eu.
Acontece, então, algo muito curioso. A criada que está servindo o champanhe de Anden aproxima demais a garrafa da taça. A garrafa se inclina e o líquido derrama na toalha da mesa; depois a taça rola para fora da mesa e se espatifa no chão.
A criada emite um guincho, e cai de joelhos. Cachos ruivos se desprendem do coque bem penteado atrás da sua cabeça, e alguns fios lhe caem no rosto.
Observo que suas mãos são delicadas e perfeitas. Ela é, sem dúvida, uma moça de alta classe social.
- Mil perdões, Eleitor, mil perdões. Vou mandar trocar a toalha imediatamente, e lhe trarei outra taça.
Não sei o que eu esperava que Anden fizesse. Repreendê-la, talvez. Ou adverti-la severamente. Mostrar desgosto. Mas, para minha surpresa, ele empurra a cadeira para trás, levanta-se e estende a mão para ela. A moça parece estar paralisada. Arregala os olhos, e seus lábios tremem. Com um só movimento, Anden se inclina para baixo, pega as mãos dela, e as levanta, dizendo suavemente.
- E só uma taça de champanhe. Cuidado para não se cortar.
Anden gesticula com uma das mãos para um dos soldados perto da porta.
- Por favor, pegue uma vassoura e uma pá. Obrigado.
O soldado faz um rápido sinal afirmativo com a cabeça.
- Imediatamente, Eleitor.
Enquanto a criada se apressa e vai pegar outra taça, um zelador entra para recolher o vidro quebrado. Anden volta a se sentar, com toda a graça de sua majestade. Com impecável etiqueta, pega um garfo e uma faca, corta um pequeno pedaço do lombinho e se dirige a mim:
- Conte-me, agente Iparis. Por que queria me ver pessoalmente? E que aconteceu na noite da execução de Day?
Sigo os movimentos dele, pego meu garfo e faca, e corto a carne. As correntes nos meus pulsos têm exatamente o comprimento apropriado para que eu possa levar a comida à boca; parece que alguém perdeu tempo mensurando-as. Afasto da cabeça a surpresa do incidente com o champanhe, e começo a plantar a história que Razor inventou para mim.
- Eu ajudei Day a escapar de sua execução, e os Patriotas me ajudaram. Mas quando tudo acabou, eles não quiseram me deixar ir. Eu achava que finalmente havia conseguido fugir deles quando seus guardas me prenderam.
Anden pisca lentamente. Eu me pergunto se acredita em alguma coisa do que estou dizendo. Depois que acabei de comer uma fatia do lombinho - a comida está divina, a carne é tão macia que praticamente derrete na boca -, ele me pergunta:
- A senhorita esteve com os Patriotas nas últimas duas semanas?
- Estive.
- Entendo.
A voz de Anden endurece com a desconfiança. Ele passa o guardanapo na boca, descansa os talheres, recosta-se na cadeira, e continua a me interrogar.
- Day está vivo, ou pelo menos estava quando a senhorita o deixou?
Ele também está trabalhando com os Patriotas?
- Quando fui embora ele estava. Agora, não sei.
- Por que ele está trabalhando com eles, se sempre os evitou no passado?
Dou de ombros, tentando fingir perplexidade.
- Ele precisa de ajuda para encontrar o irmão, e é grato aos Patriotas por consertarem sua perna. Ele estava com uma ferida infeccionada por causa... Ele havia levado um tiro.
Anden faz uma pequena pausa para tomar um gole do champanhe e depois pergunta.
- Por que a senhorita o ajudou a fugir?
Flexiono os pulsos para que as algemas não deixem marcas na pele. As algemas fazem um ruído alto quando as movimento.
- Porque não foi ele que matou meu irmão.
- O Capitão Metias Iparis - o som do nome completo do meu irmão faz com que uma onda de angústia percorra meu corpo. Será que ele sabe como meu irmão morreu? - Lamento muito. - Anden inclina um pouco a cabeça, em sinal de respeito, o que me dá um nó na garganta. - Eu me lembro de ler sobre seu irmão quando era mais novo – continua ele. - Lia sobre suas notas no colégio, sobre como ele se saiu bem na Prova e, especialmente, como sabia tudo de informática.
Pego um morango que mastigo cuidadosamente, e depois engulo.
- Nunca soube que meu irmão tinha um admirador tão respeitado assim.
- Eu não era exatamente um admirador dele, embora ele, sem dúvida, fosse impressionante. - Ele pega sua nova taça de champanhe e dá outro gole. - Eu sou um admirador da senhorita.
Lembre-se, seja óbvia. Faça-o pensar que está lisonjeada. E atraída por ele. Ele é mesmo muito bonito, e tento me concentrar nisso. A luz das luminárias na parede acentua seu cabelo ondulado, fazendo com que se sobressaia. A pele morena tem um brilho tépido e dourado. Seus olhos penetrantes têm a cor de folhas primaveris. Pouco a pouco, sinto minha face quente. Muito bem, continue assim. Ele obviamente tem sangue latino, mas a levíssima inclinação de seus olhos grandes e a delicadeza de suas sobrancelhas revelam um indício de herança asiática. Assim como Day. De repente, minha atenção se desvia, e tudo que vejo é Day e eu nos beijando naquele banheiro em Vegas. Penso no seu peito nu, nos lábios no meu pescoço e na rebeldia inebriante dele que faz Anden parecer um homem qualquer. O sutil rubor do meu rosto se torna vermelho vivo.
O Eleitor inclina a cabeça para o lado e sorri. Respiro fundo e retomo minha postura normal. Graças a Deus, consegui a reação que precisava.
- A senhorita já pensou por que a República tem sido tão leniente, em vista da sua traição ao estado? - pergunta Anden com franqueza, brincando com o garfo. - Qualquer outra pessoa já teria sido executada, mas não a senhorita. - Ele se apruma na cadeira. - A República a observa desde que alcançou a contagem perfeita de mil e quinhentos pontos na sua Prova. Tomei conhecimento de suas notas, e do seu desempenho nos exercícios vespertinos na Universidade de Drake. Vários deputados lhe atribuíram tarefas políticas antes mesmo que a senhorita concluísse seu ano como caloura na universidade, mas por fim resolveram designá-la para servir nas forças armadas, porque todos os traços da sua personalidade a definem como "oficial". A senhoria é uma celebridade nos círculos internos, e se fosse condenada por deslealdade seria uma enorme perda para a República.
Conhecerá Anden a verdade sobre como meus pais e Metias foram mortos? Que sua deslealdade lhes custou a vida? Será que a República me valoriza tanto que hesita eih me executar, apesar do meu recente crime e dos laços familiares que me ligam a traidores?
Pergunto então:
- Como o senhor me viu no campus da Drake? Não me lembro de ter ouvido falar que o senhor visitou a universidade.
Anden corta um palmito no prato e comenta.
- Não era mesmo para a senhorita saber disso.
Eu franzo a testa de maneira interrogativa.
- O senhor estudava também na Drake?
Anden concorda com a cabeça.
- A direção mantinha segredo da minha identidade. Eu estava com dezessete anos, no segundo ano, quando a senhorita entrou na Drake aos doze anos. Obviamente, todos nós ouvíamos falar muito a seu respeito, e sobre suas travessuras... - Ela dá uma gargalhada ao dizer isso, e seus olhos brilham maliciosamente.
O filho do Eleitor havia sido nosso colega na Drake, e eu nem tinha noção disso. Meu peito se enche de orgulho à ideia de o líder da República ter reparado em mim no campus. Sacudo a cabeça, culpada por gostar dessa atenção.
- Bem, espero que o senhor não tenha escutado só coisas ruins sobre mim.
Anden revela uma covinha na face esquerda quando ri. E um som tranquilizador.
- Pode ficar tranqüila. Nem tudo era ruim.
- Minhas notas eram boas, mas tenho certeza de que a secretária do reitor está feliz porque eu não vou mais assombrar a sua sala - sorrio.
- A Srta. Whitaker? - Anden balança a cabeça. Por um momento ele deixa cair sua fachada formal, ignorando a etiqueta ao se largar na cadeira, e fazendo um gesto circular com o garfo. - Eu também fui chamado à sala onde ela trabalhava, o que foi engraçado porque ela não fazia idéia de quem eu era. Eu me meti em confusão por ter trocado os rifles de exercícios pesados por fuzis de espuma.
- Foi você que fez aquilo? - perguntei espantada, também ignorando a etiqueta ao chamá-lo de "você". Ele parece não ter se incomodado. Lembro bem desse incidente. Estávamos no primeiro ano, na aula de exercícios. Os rifles de espuma pareciam de verdade. Quando os estudantes se inclinaram todos ao mesmo tempo para apanhar o que pensavam se tratar de armas pesadas, todos puxaram os fuzis de espuma com tanta força que caíram para trás.
A lembrança me faz rir solto.
- Aquilo foi brilhante. O capitão que comandava o exercício ficou louco da vida!
- Todo mundo precisa se meter em encrenca pelo menos uma vez na faculdade, não é mesmo? - Anden dá um sorriso maroto e bate os dedos na taça de champanha. - Mas a senhorita é que causava os maiores problemas. Lembra quando conseguiu esvaziar uma sala inteira durante uma de suas aulas?
- Lembro. Foi a aula de História da República, na sala 302. – Tento esfregar o pescoço meio constrangida, mas as algemas me impedem. – O veterano sentado ao meu lado apostou que eu não conseguiria acionar o alarme contra incêndio com a arma de treinamento dele.
- Air! Vejo que a senhorita sempre fez as escolhas adequadas...
- Eu estava no primeiro ano. Admito que ainda era meio imatura.
- Discordo. De maneira geral, eu diria que a senhorita era muito adiantada para sua idade. - Ele sorri, e enrubesço mais uma vez. - A senhorita tem atitudes de alguém com muito mais que 15 anos. Fiquei contente de finalmente conhecê-la no baile de comemoração naquela noite.
Será que estou mesmo sentada aqui, jantando e relembrando com o Eleitor os bons tempos da Academia? Isso é surreal. Estou atônita com o fato de ser tão fácil conversar com ele, falar sobre esse tipo de coisa em uma época em que tantas coisas estranhas cercam minha vida.
Aí me recordo por que estou aqui. A comida na minha boca adquire um sabor amargo. Tudo que estou fazendo é pelo Day. O ressentimento me invade, embora eu esteja errada em senti-lo. Mas será que estou?
Eu me pergunto se estou realmente pronta para assassinar alguém por causa do Day.
Um soldado espreita pela entrada da câmera. Faz uma continência para Anden, e pigarreia constrangido, ao perceber que deve ter interrompido o Eleitor no meio da nossa conversa. Anden lhe sorri afavelmente, e faz sinal para que entre.
- O senador Baruse Kamion deseja dar uma palavrinha com o senhor - avisa o soldado.
- Diga ao senador que estou ocupado - replica Anden. - Entrarei em contato com ele depois do jantar.
- Lamento, mas ele insiste em falar com o senhor. E sobre... Bem... - O soldado olha para mim, e depois se apressa a sussurrar no ouvido de Anden, mas consigo ouvir parte do que está dizendo. - Os estádios... Ele quer dar um recado... O senhor deve terminar seu jantar imediatamente.
Anden ergue uma sobrancelha e pergunta:
- Foi isso que ele disse? Bem, eu é que decido quando terminar meu jantar. Dê esse recado ao senador Kamion quando você julgar que é a hora certa. Diga-lhe que o próximo senador a me mandar um recado impertinente vai ter de se haver comigo diretamente.
O soldado faz uma continência vigorosa; o peito está meio esbaforido à idéia de transmitir um recado desses a um senador, mas ele diz:
- Sim, senhor. Imediatamente.
- Qual é o seu nome, soldado? - Anden pergunta antes que o homem se vá.
- Tenente Felipe Gaza, senhor.
Anden sorri.
- Obrigado, Tenente Gaza. Vou me lembrar desse favor.
O soldado tenta manter uma expressão impassível, mas dá pra ver orgulho nos seus olhos, e o sorriso abaixo da superfície. Ele faz uma reverência para Anden.
- Eleitor, é uma honra poder servi-lo. Obrigado, senhor.
E sai.
Observo, fascinada, o diálogo. Razor estava certo sobre uma coisa: há sem dúvida uma tensão entre o Senado e o novo Eleitor, mas Anden não é tolo. Assumiu o poder há menos de uma semana e já está fazendo o que devia: tentando solidificar a lealdade dos militares a ele. Eu me pergunto o que fará para conquistar a confiança deles. O exército da República havia sido extremamente leal a seu pai. Na verdade, essa lealdade foi provavelmente o que tornou tão poderoso o falecido Eleitor.
Anden sabe disso, e está tomando suas providências prontamente. As reclamações do Senado são inúteis contra forças militares que apóiem Anden inquestionavelmente.
Acontecem que elas não apoiam Anden inquestionavelmente, lembro a mim mesma. Há Razor e seus soldados. Os traidores nos postos militares estão mudando de lugar.
- Quer dizer então - Anden corta delicadamente mais uma fatia do lombinho - que a senhorita me trouxe até aqui para me dizer que ajudou um criminoso a escapar?
Por um instante, há apenas o som do garfo de Anden no prato. As instruções de Razor ecoam na minha cabeça. As coisas que preciso dizer, a seqüência em que preciso dizê-las...
- Não. Vim aqui para lhe falar de uma conspiração para assassiná-lo.
Anden apoia o garfo no prato, e ergue dois dedos esguios na direção dos soldados, ordenando-lhes:
- Deixem-nos sozinhos.
- Senhor Eleitor - uma deles começa a dizer -, temos ordem de não deixá-lo sozinho.
Anden tira uma pistola do cinto - um elegante modelo que eu não conhecia - e a coloca na mesa, ao lado do seu prato.
- Está tudo bem, capitã. Vou ficar em segurança. Agora, por favor, saiam todos e nos deixem sozinhos.
A mulher a quem Anden chamou de capitã gesticula para seus soldados, que saem do salão em fila, silenciosamente. Até os seis guardas ao meu lado vão embora. Fico sozinha na sala com o Eleitor, separados apenas por quatro metros de cerejeira.
Anden encosta os cotovelos na mesa, e junta os dedos.
- A senhorita veio aqui para me alertar?
- Isso mesmo.
- Mas eu soube que a senhorita foi capturada em Vegas. Por que não se entregou?
- Eu estava a caminho da capital. Queria chegar a Denver antes de me entregar, para ter melhores chances de conseguir falar com o senhor. Eu seguramente não estava planejando ser presa por uma patrulha aleatória em Vegas.
- E como a senhorita escapou dos Patriotas? - Anden me dá um olhar hesitante e cético. - Onde estão eles agora? Com certeza devem estar perseguindo-a.
Paro um instante, abaixo os olhos, e pigarreio.
- Consegui entrar em um trem para Vegas na noite em que consegui me safar.
Anden se cala um instante, depois apoia o garfo no prato e passa o guardanapo nos lábios. Não sei direito se acreditou na história da minha fuga.
- E quais eram os planos deles para a senhorita, se não tivesse conseguido escapar?
Mantenha as coisas vagas, por enquanto.
- Não conheço todos os detalhes dos planos deles para mim, mas sei que estão planejando uma espécie de ataque durante uma de suas visitas às tropas na frente de batalha, e que eu deveria ajudá-los. Lamar, Westwick e Burlington foram citados por eles. Os Patriotas também têm pessoal no lugar, Anden, gente do seu círculo interno.
Sei que me arrisco a chamá-lo pelo nome, mas estou tentando manter nossa sintonia. Anden não parece notar; só se debruça sobre o prato e me analisa.
- Como você sabe disso? Os Patriotas confiaram isso a você? Day também está envolvido nessa história toda?
Balanço negativamente a cabeça e digo:
- Não era para eu ter descoberto. Não falo com Day desde o dia em que parti.
- Você diria que é amiga dele?
Perguntinha meio esquisita...Talvez ele queira encontrar Day.
- Sim - respondo, tentando não me distrair com lembranças das mãos de Day entrelaçadas no meu cabelo. - Ele tem suas razões para ficar, e eu tive as minhas para sair. Mas acho que sim, somos amigos.
Anden agradece com a cabeça.
-Você falou que há pessoas no meu círculo interno tramando contra mim. Quem são elas?
Apoio o garfo no prato e me debruço sobre a mesa.
- Dois soldados da sua guarda pessoal que vão tentar matá-lo.
Anden empalidece.
- Meus guardas são cuidadosamente escolhidos. Muito cuidadosamente.
- E quem os escolhe?
Cruzo os braços. Meu cabelo cai sobre um ombro, e posso ver as pérolas reluzindo pelo canto do olho.
- Não importa se você acredita em mim ou não. Investigue. Ou estou certa, e você não será morto, ou estou errada, e aí eu é que vou morrer.
Para minha surpresa, Anden se levanta da cadeira, apruma-se e caminha até a extremidade da mesa, onde estou. Ele se senta na cadeira ao lado da minha e a aproxima. Pisco quando ele analisa meu rosto.
- June - A voz dele é muito suave, quase um murmúrio. – Quero confiar em você... e quero que confie em mim.
Ele sabe que estou ocultando alguma coisa. Percebe minha trapaça, e quer que eu saiba disso. Anden se encosta à mesa, e enfia as mãos nos bolsos da calça.
- Quando meu pai morreu - começa a dizer, pronunciando cada palavra devagar e calmamente, como se estivesse pisando em terreno minado -, fiquei completamente sozinho. Eu estava sentado ao lado de sua cama quando ele faleceu. Mesmo assim, sou grato por isso; nunca tive essa oportunidade com minha mãe. Sei como a pessoa se sente, June, quando é a última a continuar viva.
Minha garganta se aperta dolorosamente. Conquistar a confiança dele. Esse é meu papel, minha única razão para estar aqui.
- Sinto ouvir isso - sussurro. - Sinto muito por sua mãe também.
Anden agradece com a cabeça, ao aceitar meus pêsames.
- Minha mãe era a Primeira Cidadã do Senado. Meu pai nunca falava sobre ela, mas fico feliz por eles estarem juntos agora.
Eu já ouvira falar sobre a falecida Primeira Cidadã, que havia morrido de uma enfermidade auto imune logo depois de dar à luz. Apenas o Primeiro Eleitor pode nomear um líder para o Senado e, desde que a mãe de Anden morreu, há duas décadas, ninguém fora indicado ao posto. Tento esquecer o prazer que senti ao conversar com ele sobre Drake, mas é mais difícil do que pensei. Pense em Day. Lembro como ele ficou empolgado com o plano dos Patriotas, e com uma nova República.
- Fico feliz que seus pais estejam em paz. Eu sei muito bem o que é perder entes queridos.
Anden ouve minhas palavras com dois dedos comprimidos contra os lábios. Sua mandíbula parece tensa e desconfortável. Compreendo que ele pode ter assumido completamente seu papel, mas ainda é um menino. Seu pai era uma figura temível, mas e Anden? Ele não é forte o bastante para manter este país unido sozinho. De repente me vêm à mente as primeiras noites após o assassinato de Metias, quando eu chorava até pouco antes da alvorada, com o rosto inanimado do meu irmão invadindo todos os meus pensamentos. Será que Anden também passa noites em claro? Como deve ser perder um pai que você não pode lamentar em público, independentemente do quão vil ele tivesse sido? Será que Anden o amava?
Fico imóvel enquanto ele me observa; meu jantar há muito esquecido no prato. Após um período que pareceu durar horas, Anden suspira.
- Não é segredo que ele estava doente há muito tempo. Quando se espera... durante anos... que uma pessoa querida morra... - Ele hesita deixando bem evidente seu sofrimento. - Bem, estou certo de que deve ser muito diferente quando a morte ocorre... inesperadamente.
Ele olha fixamente para mim quando diz a última palavra. Não sei bem se está se referindo a meus pais ou a Metias - talvez aos três – mas a maneira como ele fala não deixa dúvida. E que ele a desaprova.
- Sei qual é a sua experiência com suposições. Alguns acreditam que envenenei meu pai para assumir o lugar dele. - É quase como se ele estivesse tentando falar comigo em código. Certa vez você supôs que Day havia matado seu irmão. E que as mortes dos seus pais foram por acaso, mas agora você sabe a verdade. - O povo da República supõe que eu seja inimigo deles. Pensam que sou igualzinho a meu pai. Que eu não quero que este país mude. Acham que sou um testa de ferro incapaz, uma marionete que simplesmente herdou um trono graças ao testamento do meu pai.
Após uma breve hesitação, ele me olha com uma intensidade que me deixa sem ar.
- Eu não sou uma marionete. Mas se eu ficar sozinho, se for o único que restar, não vou poder mudar nada. Se permanecer sozinho, serei mesmo igual a meu pai.
Não me surpreende que ele tenha providenciado esse jantar para mim. Alguma força revolucionária se agita dentro de Anden. E ele precisa de mim. Não tem o apoio do povo, nem do Senado. Necessita de alguém que conquiste o povo para ele. E as duas únicas pessoas da República que têm mais influência sobre o povo somos Day e eu...
A reviravolta da conversa me confunde. Anden não é - não parece ser - o homem que os Patriotas descreveram: um testa de ferro que se interpõe a uma gloriosa revolução. Se ele de fato quer conquistar o povo, se Anden estiver dizendo a verdade... por que os Patriotas o querem morto? Talvez eu esteja por fora de alguma coisa. Talvez exista algo sobre Anden que Razor sabe e eu não.
- Posso confiar em você? - Anden pergunta. Sua expressão mudou para alguma coisa séria, com sobrancelhas arqueadas e olhos arregalados.
Ergo o queixo e o encaro. Será que eu posso confiar nele? Não tenho certeza, mas, por enquanto, dou a única resposta possível.
- Pode.
Anden se endireita e se afasta da mesa. Não sei dizer se acredita em mim.
- Vamos manter esta conversa entre nós. Vou repassar seu alerta a meus guardas. Espero que encontremos a sua dupla de traidores. – Anden sorri para mim e inclina a cabeça. - Se nós os encontrarmos, June, gostaria de que voltássemos a conversar. Parece que temos muito em comum. - Suas palavras fazem meu rosto arder.
E assim nossa conversa chega ao fim.
- Por favor, termine de jantar sem pressa. Meus soldados a levarão de volta à cela quando você estiver pronta.
Murmuro um agradecimento. Anden se vira e sai da sala quando os soldados voltam a se enfileirar no recinto. O ruído de suas botas ecoa, quebrando o silêncio que havia permeado este espaço até poucos instantes atrás. Abaixo a cabeça e finjo comer o resto do jantar. Anden é uma pessoa mais complexa do que eu havia imaginado. Só agora me dou conta de que minha respiração está mais rápida do que o normal e meu  coração está disparado. Posso confiar em Anden? Ou devo confiar em Razor? Eu me firmo na beira da mesa. Seja qual for a verdade, vou ter de jogar esse jogo com muita cautela.
Depois do jantar, ao invés de ser levada para uma cela comum, sou conduzida para um apartamento limpo e luxuoso, um quarto carpetado com portas duplas maciças e uma cama grande e macia. Não há janelas. Além da cama, o quarto não tem móveis, nada que eu possa pegar e transformar em arma. A única decoração é o infalível retrato de Anden, embutido no gesso de uma parede. Localizo a câmera de segurança imediatamente: fica bem acima das portas duplas: é um botão de controle pequeno e sutil no teto. Meia dúzia de guardas estão de prontidão no lado de fora.
Cochilo intermitentemente a noite inteira. Os soldados se revezam. De manhã cedo, uma guarda me acorda com uma pancadinha, e sussurra:
- Até aqui, tudo bem. Lembre-se de quem é o inimigo. - Ela sai do quarto e uma outra guarda a substitui.
Visto em silêncio uma camisola quente de veludo. Meus sentidos estão alertas, e minhas mãos tremem ligeiramente. As algemas nos meus pulsos tilintam baixinho. Antes eu não podia ter certeza, mas agora sei que os Patriotas vigiam todos os meus passos. Os soldados de Razor lentamente se posicionam, fechando o cerco. Eu talvez nunca mais veja aquela guarda, mas passo a analisar o rosto de todos os soldados ao meu redor, imaginando quem é leal e quem é um Patriota.

Comentários

Postar um comentário

Nada de spoilers! :)

Postagens mais visitadas deste blog

Trono de Vidro

Os Instrumentos Mortais

Trono de Vidro