Capítulo 24 - Clayton

Clayton não queria acreditar, mas vovô tinha mesmo ido cumprimentar Thibault depois do culto. Apertou a mão dele, como se ele fosse algum herói enquanto Ben olhava para Thibault com cara de cachorrinho carente.
Fez o maior esforço para não ter de abrir uma cerveja durante o almoço; desde que havia deixado Ben na casa da mãe, já havia tomado quatro. Tinha cer-teza de que, até a hora de dormir, ia terminar todo o pacote de 12 cervejas. Tinha tomado muita cerveja nas últimas semanas. Sabia que estava abusando, mas era a única coisa que o impedia de explodir desde seu último encontro com Thibault.
O telefone tocou. Tocou novamente. Já era a quarta vez que tocava nas últimas duas horas, mas ele não estava a fim de atender.
Tudo bem, ele admitia. Tinha subestimado aquele homem. Thibault sempre esteve um passo à frente dele, desde o começo. Costumava pensar que Ben sabia direitinho como usar as armas certas para deixá-lo com raiva, mas esse cara usava bombas. "Não", pensou subitamente, "não usava bombas; lançava mísseis que atingiam precisamente seus alvos, todos eles cor: o único objetivo de destruir a vida dele." E o que era pior, Clayton nem percebeu que isso ia acontecer. Em momento algum.
Estava muito mais do que frustrado, especialmente porque a situação só estava piorando. Agora, era Thibault quem lhe dizia o que fazer. Ficava dando ordens como se ele fosse um empregado, e ele não conseguia ver uma saída. Queria acreditar que Thibault estava blefando ao dizer que tinha filmado a invasão na casa dele. Só poderia estar blefando, afinal, ninguém poderia ser tão esperto assim. Mas, e se fosse verdade?
Clayton pegou outra cerveja na geladeira sabendo que não poderia correr riscos. Quem sabe o que o cara estava preparando em seguida? Tomou um longo gole, desejando que o álcool logo fizesse efeito.
Era para ter sido uma situação fácil de ser resolvida. Ele era policial e o cara era novo na cidade. O poder deveria ter ficado com ele o tempo todo, mas, em vez disso, ele estava sentado em uma cozinha bagunçada porque não quis pedir para Ben limpar por medo de o menino contar a Thibault, o que poderia decretar o fim da vida boa de Clayton.
O que o cara tinha contra ele? Era o que Clayton gostaria de saber. Não tinha sido Clayton quem havia causado todos os problemas. Quem dificultava as coisas era Thibault e, ainda, para colocar sal em uma ferida aberta, o cara estava dormindo com a Beth.
Tomou mais um gole, imaginando como sua vida tinha se tornado um lixo tão rapidamente. Afundado em sua própria tristeza, mal percebeu que alguém batia na porta. Levantou-se e foi atender aos tropeções. Abriu e deu de cara com Tony na varanda, que parecia um rato afogado. Como se as coisas já não estivessem ruins o suficiente, ainda tinha de agüentar aquele verme.
Tony deu um passo para trás.
— Nossa, cara. Você está bem? Está com cheiro de quem bebeu todas!
— O que você quer, Tony? — não estava a fim de tolerar isso.
— Estava tentando ligar, mas você não atende.
— Vá direto ao ponto.
— Não o tenho visto muito ultimamente.
— Ando ocupado. E estou ocupado agora, então, vá embora — começou a fechar a porta, mas Tony levantou a mão.
— Espere! Tenho uma informação para você! É importante!
— O que é?
— Lembra quando eu lhe telefonei do salão de bilhar sobre um cara que estava mostrando uma fotografia da Beth?
— E?
— É isso que quero lhe falar. Eu o vi hoje. E ele estava falando com ela.
— De quem você está falando?
— Depois da igreja. Estava falando com a Beth e com o seu avô. Era o cara que estava tocando piano.
Apesar do álcool, Clayton sentiu sua mente clarear. A princípio, lembrou-se vagamente; depois, com clareza. Foi bem no fim de semana que Thibault tinha pego seu cartão de memória.
— Tem certeza?
— Claro que tenho. Eu me lembraria daquele cara em qualquer lugar.
— Ele tinha a foto da Beth?
— Já lhe falei isso. Eu vi. Só achei esquisito, sabe? E, então, vi os dois juntos hoje. Achei que fosse gostar de saber.
Clayton analisou as notícias trazidas por Tony.
— Quero que você me conte tudo o que lembrar sobre essa fotografia.
Tony, a verme, tinha uma memória surpreendentemente boa e não demorou muito para que Clayton ficasse a par de toda a história. Que a fotografia havia sido tirada na feira há alguns anos. Que Thibault não sabia o nome dela. Que estava procurando por ela.
Depois que Tony saiu, Clayton continuou refletindo sobre o que tinha acabado de descobrir.
Não havia como Thibault ter estado em Hampton cinco anos atrás e ter se esquecido do nome dela. Mas, então, como tinha conseguido a fotografia? E tinha atravessado o país para procurar por ela? E se tinha, o que isso queria dizer?
Ainda não tinha certeza, mas havia alguma coisa ali que não estava certa. E Beth, ingênua como era, não só o tinha deixado levá-la para cama, mas para dentro da vida de Ben também.
Ele franziu a testa. Não estava gostando nada daquilo. Não estava gostando mesmo e tinha quase certeza de que Beth também não ia gostar.

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