Capítulo 31 - Clayton
Clayton tentou, mas não conseguiu ultrapassar o lago
que havia se formado na frente da casa de Beth; suas botas nem apareciam de tão
enterradas na lama que estavam enquanto andava. Sentiu uma extrema vontade de
falar todos os palavrões do mundo. Dava para ver as janelas abertas perto da
porta da frente, e sabia que Nana ia ouvi-lo. Apesar da idade, aquela mulher
tinha o ouvido de uma coruja, e a última coisa que queria era causar má impressão.
A mulher já o detestava o suficiente.
Subiu a escada e bateu na porta. Percebeu que alguém
se movimentou dentro da casa e viu o rosto de Beth na janela, até que
finalmente ela abriu a porta.
— Keith? O que você está fazendo aqui?
— Estava preocupado. Queria ter certeza de que estava
tudo bem.
— Está tudo bem.
— Ele ainda está aqui? Quer que eu fale com ele?
— Não, foi embora. Não sei onde ele está.
Clayton mexeu os pés, tentando parecer contrito.
— Sinto muito, e detesto ter sido eu a pessoa a lhe
contar. Sei que você gostava muito dele.
Beth concordou, mordendo os lábios.
— Também queria lhe falar para não ser tão dura
consigo mesma. Como falei antes, pessoas desse tipo aprendem a esconder quem
são. São sociopatas e não tinha como ficar sabendo.
Beth cruzou os braços.
—Não quero falar sobre isso.
Clayton levantou as mãos, sabendo que tinha ido longe
demais, sabendo que tinha de retroceder.
— Imaginei. E você está
certa. Meu lugar não é esse. Especialmente depois da maneira horrorosa como
tratei você no passado — colocou a mão no cinto e forçou um sorriso. — Só
queria me certificar de que estava tudo bem.
— Estou bem. Obrigada.
Clayton virou-se para ir embora e depois parou.
— Quero que você saiba que, pelo que Ben disse,
Thibault parecia ser um cara legal. Olhou para ele surpreendida. — Só quero lhe
dizer que, se tivesse sido diferente, se alguma coisa tivesse acontecido com
Ben, Thibault ia se arrepender de ter nascido. Eu morreria antes de deixar que
algo acontecesse ao nosso filho. E sei que você sente a mesma coisa. É por isso
que você é uma mãe maravilhosa. Em uma vida em que eu cometi um milhão de
erros, uma das melhores coisas que fiz foi deixar você criá-lo.
Ela concordou, tentando conter as lágrimas, e se
virou. Quando ela enxugou os olhos, Clayton aproximou-se dela.
— Ei — disse com voz macia — sei que você não quer
ouvir isso agora, mas acredite em mim, você fez a coisa certa. E, com o tempo,
você vai encontrar alguém, e tenho certeza de que ele vai ser o melhor cara do
mundo. Você merece isso.
Ela começou a soluçar, e Clayton a abraçou.
Instintivamente, ela se deixou abraçar.
— Está tudo bem — sussurrou e, por um bom tempo,
ficaram na varanda, seus corpos unidos enquanto ele a segurava.
Clayton não ficou muito tempo. Não era preciso,
pensou. Havia conseguido o que queria. Beth agora o via como um amigo gentil,
carinhoso e compassivo, alguém que havia se arrependido de seus pecados. O
abraço havia sido só um prêmio extra, nada planejado, mas uma boa forma de
concluir o encontro.
Não ia pressioná-la. Isso seria um erro. Precisava de
um tempo para esquecer Thibault. Mesmo que ele fosse um sociopata, mesmo que o
cara deixasse a cidade, os sentimentos não podem ser ligados e desligados como
interruptores de tomada. Mas iam passar, da mesma forma que a chuva ia
continuar durante o outono. O próximo passo seria ter certeza de que Thibault
estava voltando para o Colorado.
E depois? Fazer papel de
bonzinho. Talvez convidar Beth para participar de algo que ele e Ben estivessem
fazendo, ou para um churrasco. Em princípio, deixar tudo de forma casual, para
que ela não suspeitasse de nada, e depois começar a sugerir fazer algo com Ben
durante a noite, no meio da semana. Era essencial manter a coisa toda longe dos
olhos inquisidores de Nana, o que significava ficar longe do canil. Apesar de
saber que Beth não estaria raciocinando bem nas primeiras semanas, Nana
estaria, e a última coisa que queria era que Nana ficasse buzinando na orelha de
Beth sobre o que achava que ele estava aprontando.
Depois disso, quando começassem a se acostumar um ao
outro novamente, talvez pudessem tomar umas cervejas enquanto Ben estivesse
dormindo, algo feito no calor do momento. Talvez ele temperasse sua cerveja com
um pouco de vodca para que ela não pudesse voltar para casa dirigindo. Então,
oferecesse sua cama para ela dormir enquanto ele dormiria no sofá. Faria tudo
como um perfeito cavalheiro, mas manteria a cerveja fluindo. Falaria sobre os
velhos tempos, os bons tempos — e a deixaria chorar por Thibault. Permitiria
que as emoções dela aflorassem e colocaria seu braço ao redor do ombro dela
para oferecer conforto.
Ele
sorriu ao ligar o carro, certo de que sabia muito bem o que aconteceria em
seguida.
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