Capítulo 9 - Clayton
Naquela noite, Keith Clayton estava deitado na cama,
fumando um cigarro, um tanto feliz por Nikki estar tomando banho. Gostava da
sua aparência depois do banho. Essa imagem afastava a idéia de preferir que ela
pegasse suas coisas e fosse embora.
Era a quarta vez, nos últimos cinco dias, que ela
havia resolvido passar a noite. Ela era caixa da loja Quick Stop, onde ele
comprava Doritos, e há pouco mais de um mês começou a se perguntar se deveria
convidá-la para sair ou não. Ela não tinha dentes muito bons e a pele era toda
esburacada, mas tinha um corpo fenomenal, o que já era bom demais, pois aquilo
de que ele precisava mesmo era reduzir o estresse. O fato de ter visto Beth
trazer Ben no domingo anterior tinha causado esse estresse. Estava usando
shorts e camiseta regata, parou na varanda e acenou para Ben, mostrando seu
sorriso de Farrah Fawcett. Mesmo que o cumprimento tivesse sido para Ben, fez
com que ele percebesse que estava mais bonita a cada dia.
Se soubesse que isso fosse acontecer, talvez não
tivesse concordado com o divórcio. Sendo assim, saiu de lá pensando em como ela
estava linda e acabou indo parar na cama com Nikki um pouco mais tarde. Na
verdade, não queria voltar com a Beth. Na tinha a menor chance de isso
acontecer. Primeiro, ela era exigente demais, e tinha uma tendência a discutir
quando tomava uma decisão que o deixava louco. Já sabia disso há muito tempo e,
toda vez que a via, sempre se lembrava disso. Assim que se divorciaram, a
última coisa que queria era pensar nela, e não pensou por um bom tempo. Vivia
sua vida, divertia-se com várias garotas e tudo indicava que jamais se
arrependeria. Com exceção do filho, é claro. Quando Ben tinha 3 ou 4 anos,
começou a ouvir boatos de que Beth estava namorando, e isso o deixou
incomodado. Uma coisa era ele namorar... mas a coisa mudava totalmente de
figura quando se tratava de Beth namorar. A última coisa que queria era ver um
cara qualquer dando uma de pai de Ben. Além disso, percebeu que não gostava da
idéia de pensar em Beth na cama com outro homem. Era algo que não conseguia
engolir. Conhecia os homens e sabia o que queriam, e Beth era bem ingênua nesse
sentido, até porque ele tinha sido seu primeiro parceiro. E era melhor que
fosse assim, que ele, Keith Clayton, fosse o único homem a ter levado Beth para
cama, o que era ótimo, pois estabelecia as prioridades dela. Ela
estava criando o filho deles, e, apesar de Ben ser meio mariquinha, Beth estava
fazendo um bom trabalho. Além disso, ela era uma boa pessoa, e a última coisa
que merecia era um homem que a decepcionasse. Ela sempre precisaria que ele
tomasse conta dela. Mas na outra noite...
Ficou imaginando se ela não estaria usando aquelas
roupas provocativas só porque sabia que ia vê-lo. Isso não seria demais? Alguns
meses atrás, ela até o convidou para entrar enquanto Ben estava arrumando suas
coisas. Tudo bem que estava chovendo pra caramba e Nana ficou olhando de cara
feia para ele o tempo todo, mas Beth foi absolutamente simpática, que o levou a
pensar se ele não a teria subestimado. Ela tinha necessidades; todo mundo tem.
E que mal poderia haver se ele a ajudasse a satisfazê-las de vez em quando?
Eles já tinham se visto sem roupa antes mesmo, e até tinham um filho juntos.
Como mesmo que se chama isso atualmente? Amigos com privilégios? Com certeza,
poderia se imaginar vivendo uma situação dessas com Beth. Contanto que ela não
falasse muito nem alimentasse muitas expectativas. Apagando o cigarro, ficou
imaginando com poderia propor esse esquema para ela.
Diferente dele, sabia que ela estava sozinha há muito
tempo, muito mesmo. Alguns caras tentaram se engraçar para perto dela, mas ele
sabia como lidar com esse tipo de gente. Lembrou-se do papinho que teve com
Adam uns meses antes. O cara do blazer por cima da camiseta, se achando o
garanhão de Hollywood. Garanhão ou não, ele perdeu a cor quando Clayton se
aproximou da janela do carro, depois de mandá-lo encostar ao voltar para casa.
Era a terceira vez que tinha saído com a Beth. Clayton sabia que os dois tinham
tomado uma garrafa de vinho no jantar, pois ficou vigiando os dois do outro
lado da rua, e, quando Clayton mandou fazer o teste do bafômetro, com o
aparelho que tinha preparado para esse tipo de ocasião, o cara ficou branco.
— Tomou umas a mais, não é mesmo? — perguntou Clayton,
fazendo cara de dúvida, quando o homem jurou que só tinha tomado um copo de
vinho.
Quando pegou as algemas, pensou que o cara fosse
desmaiar ou fazer xixi nas calças, o que quase o fez cair na gargalhada.
Mas não caiu. Em vez disso, preencheu a papelada, bem
lentamente, antes de passar um sermão nele — o mesmo que passava em qualquer um
que se mostrava interessado em Beth. Que ele e Beth já um sido casados, que
tinham um filho, e que era muito importante que ele entendesse que seu dever
era zelar pela segurança deles. E que a última coisa de que Beth precisava era
uma pessoa que desviasse sua atenção da criação do filho ou se envolver com
alguém que só estivesse interessado em
usá-la. Não porque eles tinham se divorciado que ele tinha deixado de se
preocupar com ela.
É claro que o cara entendeu o recado. Todos entendiam.
Não só por causa da família Clayton e de suas relações, mas também pelo fato de
ele prometer desaparecer com o teste do bafômetro e com a papelada se o cara
prometesse deixá-la em paz e não mencionasse a conversa entre eles com mais
ninguém. Porque se ela ficasse sabendo disso, não seria nada bom. Poderia
causar problemas ao menino, sabe? E ele não tratava bem ninguém que causasse
problemas para seu filho. É claro que, no dia seguinte, estacionou o carro da
polícia bem em frente ao trabalho de Adam para vê-lo sair. Assim que ele o viu
brincando com o bafômetro, perdeu a cor novamente. Mesmo antes de ir embora,
Clayton sabia que ele tinha entendido bem o recado e, da próxima vez que o
encontrou, estava acompanhado de uma ruiva que trabalhava no mesmo escritório
de contabilidade que ele. O que provava que Clayton teve razão o tempo todo,
obviamente: o cara não tinha intenção de um relacionamento duradouro com Beth.
Era só um fracassado desejando levar alguém para a cama.
Bem, esse alguém não seria a Beth.
Beth faria um escândalo se descobrisse o que ele
andava fazendo, mas, felizmente, ele não precisava fazer isso com muita
freqüência. Só de vez em quando, e a coisa ia funcionando bem.
Tudo ia funcionando muito bem, na verdade. Até o
fiasco das fotografias das estudantes tinha terminado bem também. Nem a câmera
nem o cartão de memória tinham aparecido na mesa do delegado ou nos jornais
desde o fim de semana anterior. Não tinha conseguido encontrar aquele hippie
fracassado na segunda-feira de manhã porque teve de despachar uns papéis para o
condado, mas descobriu que ele havia se hospedado no Holiday Motor Court.
Infelizmente, ou felizmente, supôs, ele já havia ido embora e não tinha sido
visto desde então, o que muito provavelmente indicava que já deveria estar bem
longe dali.
No geral, estava tudo bem. Muito bem. Especialmente a
ideia que tivera em relação à Beth — um esquema de amigos com privilégios. Não
seria demais? Levou as mãos à nuca e encostou no travesseiro quando Nikki saiu
do banheiro enrolada na toalha, deixando um rastro de vapor atrás dela. Ele
sorriu.
— Vem aqui, Beth.
Ela congelou.
— Meu nome é Nikki.
— Eu sei disso. Mas hoje
quero te chamar de Beth.
— Do que você está falando?
Os olhos dele brilhavam.
— Cale a boca e venha para cá, está bem?
Depois
de hesitar um pouco, Nikki aproximou-se da cama com relutância.
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