Capítulo 10

POUCO TEMPO DEPOIS, Katie trouxe uma Kristen que tremia de frio e um Josh bastante animado de volta para a toalha que Alex havia estendido sobre a areia. A churrasqueira já estava montada e os pedaços de carvão já estavam em brasa.
Alex abriu a última das cadeiras de praia sobre a toalha e observou enquanto eles se aproximavam. 
— Como estava a água, meninos?
— Ótima! — respondeu Josh. Seu cabelo, parcialmente seco, estava espetado e apontando em todas as direções. — Quando o almoço vai estar pronto?
Alex deu uma olhada nas brasas. 
— Daqui a uns vinte minutos.
— Será que eu e Kristen podemos voltar para a água?
— Vocês acabaram de sair da água. Por que não descansam por alguns minutos?
— Não queremos nadar. Queremos fazer castelos de areia — disse
Alex percebeu que Kristen estava batendo os dentes. 
— Tem certeza de que querem fazer isso? Vocês estão roxos de frio.
Kristen fez que sim com a cabeça, em longos movimentos. 
— Estou bem — disse ela, ainda tremendo. — E a praia foi feita para construirmos castelos nela.
— Tudo bem, tudo bem. Mas vistam suas camisetas, então. E fiquem num lugar onde eu possa vê-los — disse ele, apontando com o dedo.
— Eu sei, papai — disse Josh, com um suspiro. — Não sou mais criança.
Alex abriu uma sacola de viagem e ajudou Josh e Kristen a vestirem suas camisetas. Quando terminou, Josh pegou outra bolsa cheia de brinquedos de plástico e saiu em disparada, parando a poucos passos da água. Kristen o seguiu.
— Quer que eu vá até lá para ficar com eles?
Alex balançou a cabeça. 
— Não, eles vão ficar bem. Já estão acostumados com essa parte, quando eu me ocupo com o almoço. Eles sabem que devem ficar longe da água.
Indo até a caixa térmica, ele se agachou e abriu a tampa. 
 Está ficando com fome também? — perguntou ele.
— Um pouco — disse Katie, antes de perceber que não havia comido nada desde o queijo e o vinho divididos com Jo na noite anterior. Logo ela ouviu seu estômago roncar e cruzou os braços em frente à barriga.
— Ótimo, porque estou faminto.
Enquanto Alex procurava por bebidas na caixa térmica, Katie percebeu os músculos definidos em seus antebraços. 
— Estava pensando em assar salsichas para Josh, um cheeseburguer para Kristen e filés para você e para mim.
Alex retirou as carnes do meio do gelo e depois se inclinou por cima da churrasqueira, soprando as brasas.
— Posso ajudar com alguma coisa?
— Você se importa de colocar a toalha sobre a mesa? Está dentro da caixa.
— É claro — disse Katie. Ela tirou uma das bolsas de gelo da caixa térmica e ficou olhando, embasbacada. — Você trouxe comida suficiente para meia dúzia de famílias — disse ela.
— Pois é. Com as crianças, sempre penso que o melhor é trazer coisas demais em vez de deixar que algo falte, pois nunca sei exatamente o que eles vão querer comer. Você não imagina quantas vezes nós viemos até aqui e percebi que havia esquecido alguma coisa. E quando isso acontecia, tinha que colocar as crianças de volta no carro e correr para a loja. Então quis evitar que isso acontecesse hoje.
Katie abriu a toalha plástica e, seguindo as instruções de Alex, firmou os cantos da toalha com os pesos de papel que ele se lembrou de trazer.
— Pronto. E agora? Quer que eu coloque os pratos e talheres na mesa?
— Ainda temos alguns minutos. Não sei você, mas estou pronto para uma cerveja — disse ele. Enfiando a mão na caixa térmica, tirou uma garrafa.
— Acho que vou preferir um refrigerante.
— Uma diet? — perguntou ele, com a mão novamente na caixa.
— Ótimo.
Quando Alex entregou a lata à Katie, sua mão roçou de leve na dela, embora ela não tivesse certeza de que ele havia percebido.
Alex apontou para as cadeiras. 
— Quer sentar?
Ela hesitou um pouco antes de se sentar ao lado dele. Quando Alex abriu as cadeiras sobre a areia, ele deixou uma boa distância entre elas, de modo que eles não viessem a se tocar acidentalmente. Alex girou a tampa de sua cerveja e tomou um gole. — Não há nada melhor do que uma cerveja gelada em um dia quente na praia.
Ela sorriu, um pouco desconcertada por estar sozinha com ele. 
— Vou acreditar na sua palavra.
— Você não gosta de cerveja?
A mente de Katie viajou no tempo, lembrando-se de seu pai e das latas vazias de Pabst Blue Ribbon que geralmente entulhavam o chão, empilhadas descuidadamente ao lado da poltrona onde ele costumava se sentar. 
— Não muito — admitiu ela.
— Somente vinho, então?
Ela demorou um momento para se lembrar que Alex havia lhe dado uma garrafa. 
— Para falar a verdade, tomei um pouco de vinho ontem à noite. Com minha vizinha.
— É mesmo? Que bom.
Ela tentou encontrar um assunto mais seguro. 
— Você disse que nasceu em Spokane?
Ele esticou as pernas, relaxando e colocou um tornozelo sobre o outro. 
— Nasci e fui criado lá. Morei sempre na mesma casa, até o dia em que fui para a faculdade — disse ele, olhando-a de lado. — Frequentei a Universidade de Washington. O lar dos Huskies.
Ela sorriu. — Seus pais ainda moram lá?
— Sim.
— Então deve ser difícil para eles virem visitar os netos.
— Imagino que sim.
Algo no tom de voz dele chamou a atenção de Katie. — Você imagina?
— Eles não são o tipo de avós que viriam visitar, mesmo que morassem mais perto. Eles viram as crianças apenas uma ou duas vezes. A primeira foi quando Kristen nasceu e a segunda foi no funeral — disse ele, balançando a cabeça.
— Não me peça para explicar — prosseguiu Alex. — Meus pais não têm qualquer interesse pelas crianças e o máximo que fazem é mandar cartões quando eles fazem aniversário ou presentes no Natal. Eles preferem viajar ou fazer qualquer outra coisa.
— Como é?
— O que eu posso fazer? Além disso, não posso dizer que eles eram tão diferentes comigo, mesmo eu sendo o único filho deles. A primeira vez que meus pais vieram me visitar quando eu estava na faculdade foi no dia da formatura. Embora eu nadasse bem o bastante para conseguir uma bolsa de estudos integral, eles me viram competir apenas duas vezes. Mesmo que eu fosse vizinho deles, duvido que eles iriam querer ver as crianças. Essa é uma das razões pelas quais me estabeleci aqui. Afinal, não faria diferença estar perto ou longe deles, não é?
— E os outros avós?
Alex arranhou o rótulo de sua garrafa de cerveja. 
— A situação é um pouco mais complicada com eles. Eles têm duas outras filhas que se mudaram para a Flórida e, depois que me venderam a loja, também se mudaram para lá. Eles vêm nos visitar por alguns dias, geralmente uma ou duas vezes por ano, mas mesmo assim é difícil demais para eles. Além do mais, se recusam a ficar na casa, porque acho que o lugar faz com que se lembrem de Carly. Provavelmente é uma dose muito grande de lembranças, eu acho.
— Em outras palavras, você acabou ficando sozinho.
— Pelo contrário — disse ele, olhando para as crianças. — Eu tenho a eles, lembra-se?
— Mesmo assim, deve ser difícil. Administrar a loja, criar e cuidar de seus filhos.
— Não é tão ruim. Desde que eu me levante às 6 da manhã e não me deite para dormir antes da meia-noite, é fácil dar conta de tudo.
Ela riu, descontraída. 
— Você acha que o braseiro já está no ponto?
— Deixe-me dar uma olhada — disse ele. Depois de colocar a gar-rafa na areia, ele se levantou da cadeira e foi até a churrasqueira. Os pedaços de carvão estavam brancos e o calor se erguia em ondas tremeluzentes. — Você tem um timing impecável — disse ele. Alex colocou os filés e os hambúrgueres na grelha enquanto Katie foi até o lugar onde a caixa térmica estava e começou a trazer uma quantidade infindável de objetos para a mesa: potes de plástico com salada de batata e repolho, picles, vagens, frutas fatiadas, dois sacos de batatas fritas, fatias de queijo, além de molhos e temperos diversos.
Ela balançou a cabeça à medida que organizava tudo, pensando que Alex havia se esquecido de que seus filhos ainda eram pequenos. Havia mais comida aqui do que no armário da cabana onde ela morava, em Southport.
Alex cuidava dos filés e do bife de hambúrguer na grelha, acrescentando por fim as salsichas de cachorro quente. Enquanto cozinhava, ele percebeu que seu olhar se desviava para as pernas de Katie quando ela se movia ao redor da mesa, mais uma vez percebendo o quanto ela era atraente.
Ela pareceu perceber que ele a olhava. — O que foi?
— Nada — disse ele.
— Você estava pensando em alguma coisa.
Ele suspirou. 
— Estou feliz por você ter vindo conosco hoje — disse ele, finalmente. — Porque estou me divertindo muito.

***

ENQUANTO ALEX CUIDAVA da churrasqueira, os dois mantiveram uma conversa tranquila e descontraída. Alex explicou a Katie os pormenores envolvidos na administração de uma loja de conveniência. Contou também como seus sogros haviam iniciado o negócio e descreveu alguns dos clientes habituais com afeição, outros que podiam ser definidos como excêntricos e Katie silenciosamente imaginou se ela teria sido incluída naquela descrição caso Alex tivesse trazido outra pessoa à praia.
Não que aquilo tivesse qualquer importância. Quanto mais ele falava, mais ela percebia que ele era o tipo de homem que tentava encontrar o que cada pessoa tinha de melhor — o tipo de homem que não gostava de reclamar da vida. Ela tentou imaginar como ele seria quando era mais jovem, e gradualmente fez com que a conversa enveredasse por aquela direção. Alex falou sobre sua infância e adolescência em Spokane, sobre os fins de semana preguiçosos em que ele costumava andar de bicicleta pela Centennial Trail com seus amigos. Ele contou que, quando descobriu a natação, o esporte rapidamente se tornou uma obsessão. Alex nadava quatro ou cinco horas por dia e tinha o desejo de disputar uma olimpíada. Entretanto, o rompimento de um músculo do ombro durante seu segundo ano da faculdade acabou com seu sonho. Falou também sobre as festas que frequentou durante a faculdade e dos amigos que fez, admitindo que quase todas aquelas amizades foram se distanciando lentamente, até que o contato com seus colegas fosse totalmente perdido. Enquanto falava, Katie percebeu que ele não parecia aumentar ou diminuir os fatos sobre seu passado, além de não parecer estar preocupado com o que os outros pensavam dele.
Ela podia ver os resquícios do atleta de elite que Alex havia sido, percebendo seus movimentos fluidos e graciosos e a maneira tranquila com que ele sorria, como se estivesse bem acostumado com vitórias e derrotas. Quando terminou de falar, ela sentiu receio de que ele fosse lhe perguntar sobre seu passado, mas ele pareceu pressentir que aquilo a deixaria desconfortável. Em vez disso, preferiu começar a contar uma outra história.
Quando a comida ficou pronta, ele chamou as crianças e elas vieram correndo. Os dois estavam cobertos de areia e Alex fez com que eles ficassem ao lado do carro enquanto ele os esfregava. Conforme o observava, Katie via que Alex era um pai muito melhor do que ele mesmo imaginava. Ótimo de todas as maneiras que eram importantes.
Quando as crianças chegaram à mesa, a conversa mudou de rumo. Katie ouviu enquanto eles conversavam sobre o castelo de areia que haviam construído e um dos programas no Disney Channel que os dois gostavam de assistir. Quando mencionaram em voz alta sobre as guloseimas que comeriam mais tarde — marshmallows, barras de chocolate e biscoitos doces, aquecidos até que estivessem quase derretidos —, ficou claro que Alex havia criado tradições especiais e divertidas para aquelas crianças. Ele era diferente dos homens que ela havia conhecido no passado, diferente de qualquer pessoa que ela conhecera em toda a sua vida. Conforme a conversa prosseguiu, quaisquer vestígios do nervosismo que sentia começaram a desaparecer.
A comida estava deliciosa, uma mudança muito bem-vinda em relação à sua dieta austera recente. O céu continuou limpo, a imensidão azul quebrada apenas quando alguma ave marinha ocasionalmente passava voando por perto. A brisa soprava tranquila, suave o bastante para mantê-los refrescados, e o ritmo constante das ondas ajudava a manter a sensação de calma e tranquilidade.
Quando terminaram de comer, Josh e Kristen ajudaram a limpar a mesa e a guardar as porções que não haviam sido comidas. Alguns itens que não se estragariam — o pote de picles e as batatas fritas — foram deixados sobre a mesa. As crianças queriam brincar com suas pranchas de body-boarding e, depois que Alex voltou a aplicar o protetor solar neles, também tirou sua camisa e os seguiu até as ondas.
Katie levou sua cadeira até a borda da água e passou a hora seguinte observando Alex ajudando seus filhos a deslizarem pela arrebentação, posicionando um e depois o outro para que pudessem aproveitar as ondas que chegavam. Ela ficou maravilhada com o jeito que ele tinha de fazer com que cada um dos filhos se sentisse o centro das atenções. Havia um carinho no modo como ele os tratava, uma dose de paciência que ela não esperava realmente que fosse possível em um pai. Conforme a tarde chegou e as nuvens começaram a se formar, Katie percebeu que estava sorrindo, pensando que, pela primeira vez em muitos anos, sentia-se totalmente relaxada. E aquilo não era tudo. Ela sabia que estava se divertindo tanto quanto as crianças.

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