Capítulo 14
CAÇAR BORBOLETAS.
A ideia havia surgido em sua mente logo depois de
acordar na manhã de sábado, até mesmo antes de descer até a loja para abrir as
portas para o público. Estranhamente, enquanto ele imaginava as possibilidades
que teria para entreter seus filhos naquele dia, se lembrou de um projeto que
havia feito quando estava na 6ª série. A professora havia pedido aos alunos
que fizessem uma coleção de insetos. Sua memória voltou até uma tarde em que
ele estava correndo por um gramado durante o recreio da escola, buscando
qualquer inseto no qual conseguisse pôr as mãos, de abelhas a gafanhotos. Tinha
certeza de que Josh e Kristen gostariam de fazer aquilo e, sentindo orgulho
de si mesmo por ter pensado em algo interessante e original para ocupar uma
tarde do fim de semana, remexeu nas redes de pesca que tinha na loja,
escolhendo três que tinham o tamanho apropriado.
Quando comentou sobre a ideia com as crianças na hora
do almoço, elas não ficaram muito entusiasmadas.
— Não quero machucar
nenhuma borboleta. Eu gosto delas — protestou Kristen.
— Nós não vamos machucá-las. Podemos soltá-las depois.
— Então por que precisamos caçá-las?
— Porque é divertido.
— Não acho que seja divertido. Para mim, parece uma
malvadeza.
Alex abriu a boca para responder, mas não soube
exatamente o que dizer. Josh deu outra mordida no seu sanduíche de queijo
grelhado.
— O dia está muito quente, papai — declarou Josh,
falando enquanto mastigava.
— Tudo bem. Podemos ir nadar no riacho depois de caçar
as borboletas. E mastigue com a boca fechada.
Josh engoliu.
— Por que não vamos nadar no riacho
agora?
— Porque vamos sair para caçar borboletas.
— Não podemos ir ao cinema em vez de fazer isso?
— Isso! Vamos ao cinema!
Às vezes, Alex achava que ser pai era uma experiência
exasperante.
— O dia está lindo e não
vamos passá-lo enfurnados em um cinema. Nós vamos sair para caçar borboletas. E
isso não é tudo: vocês dois vão gostar do passeio, entenderam?
Após o almoço, Alex os levou para um campo nos
arredores da cidade que estava repleto de flores do campo. Ele lhes entregou as
redes que usariam para caçar as borboletas e mandou que entrassem em ação,
observando enquanto Josh arrastava sua rede atrás de si e Kristen segurava a
sua contra o corpo, de maneira parecida com o que fazia com suas bonecas.
Alex resolveu colocar as mãos à obra e correu na
frente deles, com sua rede preparada. Logo adiante, esvoaçando entre as flores,
ele viu dúzias de borboletas. Quando chegou perto, balançou sua rede em um
arco, capturando uma. Agachando-se, começou a manipular a rede
cuidadosamente, permitindo que o laranja e o marrom das asas da borboleta
ficassem à mostra.
— Uau! — disse ele, tentando demonstrar o máximo de
entusiasmo que conseguiu. — Peguei uma!
Em questão de segundos, Josh e Kristen vieram correndo
e olharam por cima do seu ombro.
— Cuidado com ela, papai — avisou Kristen.
— Pode deixar, querida. Olhe como as cores são
bonitas. Os dois se aproximaram ainda mais.
— Que legal! — gritou Josh para, no momento seguinte,
correr por entre as flores e balançar sua rede vigorosamente.
Kristen continuou a estudar a borboleta.
— Acho que ela está
assustada.
— Tenho certeza de que ela está bem. Mas vou soltá-la.
Ela assentiu enquanto Alex cuidadosamente virava a
rede do avesso. De volta ao ar livre, a borboleta se prendeu à rede antes de
sair voando novamente. Os olhos de Kristen se arregalaram com a surpresa.
— Pode me ajudar a pegar uma?
— Eu adoraria fazer isso.
Eles passaram pouco mais de uma hora correndo por
entre as flores e capturaram oito tipos diferentes de borboletas, incluindo uma
junônia, embora a maioria fosse de hespérias. Quando terminaram, os rostos
das crianças estavam vermelhos e molhados de suor, e Alex os levou para tomar
um sorvete antes de irem para o riacho que passava atrás da casa. Os três foram
até o atracadouro e pularam juntos na água — Josh e Kristen usando coletes
salva-vidas — flutuando com a correnteza tranquila. Era um dia como vários
que Alex havia passado em sua infância. Quando eles saíram da água, ele ficou
satisfeito ao perceber que, com exceção do passeio até a praia, aquele fora o
melhor fim de semana que eles tiveram em um bom tempo.
Mas foi cansativo também. Depois, quando as crianças
já haviam tomado banho, elas quiseram assistir a um filme. Alex colocou o DVD A
incrível jornada, um filme que eles já haviam assistido dezenas de vezes,
mas que sempre estavam dispostos a ver novamente. Enquanto estava na cozinha,
ele podia vê-los no sofá, nenhum deles movendo um músculo, olhando para a
televisão daquela maneira mesmerizada que é típica de crianças exaustas.
Alex limpou o balcão da
cozinha e colocou os pratos sujos na lava-louças. Depois, colocou um fardo de
roupas sujas na máquina de lavar, arrumou a sala de estar e limpou o banheiro
das crianças antes de finalmente se sentar ao lado deles no sofá por alguns
momentos. Josh estava enrodilhado em um dos lados do sofá e Kristen no outro.
Quando o filme terminou, Alex sentiu suas próprias pálpebras começando a pesar. Depois de trabalhar na loja, brincar com seus
filhos e limpar a casa, era bom poder simplesmente relaxar por alguns momentos.
O som da voz de Josh o fez despertar abruptamente.
— Ei, papai?
— Sim?
— O que temos para o jantar? Estou morrendo de fome.
***
NA COPA DO RESTAURANTE, Katie
olhou para o deck e depois se voltou, observando enquanto Alex e as crianças
acompanhavam a recepcionista até uma mesa aberta que ficava perto da cerca
que delimitava a varanda. Kristen sorriu e acenou assim que viu Katie, hesitando apenas por um segundo antes de correr por entre as mesas até alcançá-la.
Katie se curvou quando a garotinha colocou seus braços ao redor do seu pescoço.
— Nós quisemos fazer uma surpresa! — disse Kristen.
— Bem, vocês conseguiram. O que vieram fazer aqui?
— Meu pai não quis cozinhar para a gente hoje.
— Não quis?
— Ele disse que estava
cansado demais.
— É, mas a história não acaba aí — anunciou Alex. —
Pode acreditar.
Katie não conseguiu perceber quando ele se aproximava
e ficou em pé.
— Ah, oi — disse ela, sentindo o rosto corar contra
sua vontade.
— Como estão as coisas? — perguntou Alex.
— Bem — disse ela, sentindo-se um pouco agitada. —
Ocupada, como você pode ver.
— Parece estar bem ocupada mesmo. Tivemos que esperar
antes que eles conseguissem nos arranjar uma mesa na área onde você atende.
— Esteve assim o dia todo.
— Bem, não vamos mais atrapalhá-la. Venha, Kristen.
Vamos para a mesa. A gente se fala em alguns minutos, ou quando você vier
anotar nossos pedidos.
— Tchau, senhorita Katie — disse Kristen, acenando
outra vez.
Katie os observou enquanto eles andavam até a mesa,
sentindo- se estranhamente feliz com aquela visita. Ela viu Alex abrir o cardápio e se inclinar para a frente para ajudar Kristen a segurar o cardápio que
ela tinha nas mãos e, por um instante, desejou estar sentada à mesa com eles.
Ela arrumou seu uniforme e
olhou para seu reflexo no aço inox da cafeteira. Não conseguiu ver muito, apenas
uma imagem borrada. Mas foi o bastante para fazer com que ela passasse a mão
pelos cabelos. Depois de verificar rapidamente se sua camisa não estava
manchada — não haveria nada que pudesse fazer a respeito daquilo, mas Katie
queria se certificar assim mesmo — foi até a mesa em que Alex e as crianças
estavam sentados.
— Oi, gente — disse ela, dirigindo-se a Josh e
Kristen. — Ouvi dizer que o pai de vocês não quis fazer o jantar hoje.
Kristen deu uma risadinha, mas Josh apenas fez que sim
com a cabeça. — Ele disse que estava cansado.
— Foi o que me disseram — respondeu Katie.
Alex revirou os olhos. — Meus próprios filhos me
jogaram debaixo de um ônibus.
— Eu não jogaria você debaixo de um ônibus, papai —
disse
Kristen, bem séria.
— Obrigado, querida.
Eles pediram xícaras de chá e uma cesta de bolinhos de
chuva. Katie trouxe as bebidas para a mesa e, à medida que se afastava, sentiu que os olhos de Alex a acompanhavam. Ela lutou contra o impulso de olhar
para ele por cima do ombro, embora quisesse desesperadamente fazê-lo.
Durante os minutos seguintes, Katie anotou pedidos e
recolheu pratos das outras mesas. Ela trouxe duas bandejas com refeições até
uma outra mesa e, finalmente, veio trazer a cesta de bolinhos de chuva.
— Tenham cuidado. Ainda
estão bem quentes.
— É melhor comê-los enquanto estão quentes ainda —
disse Josh, colocando a mão dentro da cesta. Kristen pegou um bolinho também.
— Nós fomos caçar borboletas hoje — disse ela.
— É mesmo?
— Sim. Mas não as machucamos. Nós as soltamos depois
de pegá-las.
— Parece ter sido bem divertido. Vocês gostaram do
passeio?
— Foi ótimo! Eu peguei umas 100 borboletas, eu acho. E
depois fomos nadar — disse Josh.
— Deve ter sido muito bom mesmo. Não me admira que seu
pai esteja cansado.
— Eu não estou cansado — disse Josh.
— Eu também não — disse Kristen, logo em seguida.
— Talvez não, mas, mesmo assim, os dois vão para a
cama cedo hoje. O seu pobre e velho pai precisa dormir — disse Alex.
Katie balançou a cabeça.
— Não seja tão duro consigo
mesmo — disse ela. — Você não é pobre.
Ele levou um momento até perceber que ela estava
brincando e riu. Foi alto o bastante para que as pessoas da mesa ao lado percebessem, mas Alex não pareceu se importar.
— Eu venho até aqui para
relaxar e desfrutar do meu jantar e a garçonete vem tirar um sarro da minha
cara.
— A vida é assim mesmo.
— Isso é o que você diz. Da próxima vez que eu vier
aqui, você vai me mandar escolher algo do cardápio para as crianças e ainda
dizer que estou ganhando peso.
— Bem, eu não ia dizer nada — comentou Katie enquanto
olhava para a barriga de Alex. Ele riu novamente e quando voltou a olhá-la nos
olhos ela percebeu um brilho diferente em seu olhar, fazendo com que Katie se
lembrasse de que Alex a achava atraente.
— Acho que já decidimos o que vamos pedir — disse ele.
— O que posso trazer para vocês?
Alex ditou os pedidos e Katie os anotou. Ela manteve o
contato visual antes de deixar a mesa e levar o pedido para a cozinha. Enquanto continuava a trabalhar nas mesas de sua seção — assim que as pessoas
saíam, outras entravam no restaurante para ocupar as mesas — a garçonete
descobria motivos para ir até a mesa de Alex. Voltava para encher os copos de
água e as xícaras de chá, recolheu a cesta quando os bolinhos de chuva
terminaram e trouxe outro garfo para Josh quando ele deixou o seu cair no chão.
Ela conversava tranquilamente com Alex e as crianças, aproveitando cada
momento até que lhes trouxesse o jantar.
Mais tarde, depois que haviam terminado, Katie recolheu
os pratos e lhes trouxe a conta. Naquele momento, o sol já estava se pondo e
Kristen começou a bocejar. De qualquer forma, o movimento no restaurante
parecia estar aumentando ainda mais. Ela teve tempo apenas para um
rápido adeus enquanto as crianças desciam as escadas, mas, quando Alex hesitou,
Katie teve a impressão de que ele iria convidá-la para sair. Ela não sabia como
lidaria com aquela situação, porém, antes que ele conseguisse dizer qualquer
coisa, um dos clientes de Katie derrubou uma cerveja. Ele se levantou de sua
cadeira rápido demais, esbarrando nela, e outros dois copos acabaram
tombando. Alex deu um passo atrás, sentindo que o momento não era apropriado, e
sabia que ela teria que voltar ao trabalho.
— Até mais — disse ele, acenando à medida que saía
atrás das crianças.
***
NO DIA SEGUINTE, Katie abriu a porta da
loja cerca de meia hora após Alex abrir as portas para o público.
— Você chegou cedo — disse Alex, surpreso.
— Eu levantei cedo e pensei que aproveitaria para
fazer minhas compras antes das outras coisas que preciso fazer hoje.
— O movimento no restaurante diminuiu ontem à noite?
— Depois de um bom tempo, sim. Mas estamos com menos
gente na equipe esta semana. Uma delas viajou para assistir ao casamento da sua
irmã e outra ligou dizendo que estava doente. O lugar está uma loucura.
— Eu percebi. Mas a comida estava ótima, apesar de o
serviço ter demorado um pouco.
Quando ela o olhou com uma expressão irada, ele riu.
—
Isso é por ter zombado de mim na noite passada — disse Alex, balançando a cabeça.
— Você me chamou
de velho. Vou lhe contar a verdade, meu cabelo ficou grisalho antes que eu
completasse 30 anos.
— Você se preocupa demais com isso — disse ela,
tentando devolver a provocação. — Mas pode acreditar em mim. Fica bem em você. Dá um certo ar de respeitabilidade.
— E isso é bom ou ruim?
Ela sorriu sem responder e logo depois pegou uma cesta
de compras. Enquanto a retirava da pilha, ela o ouviu limpar a garganta.
—
Você vai trabalhar tanto nesta semana como trabalhou na semana passada?
— Não, nem tanto.
— E no próximo fim de semana?
Ela pensou por um momento.
— Estou de folga no sábado.
Por quê?
Ele apoiou as mãos no balcão antes de olhá-la nos
olhos.
— Porque eu estava imaginando se você gostaria que eu a levasse para
jantar. Só nós dois dessa vez. Sem as crianças.
Katie sabia que ela e Alex haviam chegado a uma
encruzilhada, uma que mudaria as coisas entre eles. Ao mesmo tempo, foi por
aquela razão que ela tinha ido até a loja tão cedo. Queria descobrir se estava
enganada em relação à expressão que vira nos olhos dele na noite anterior,
porque foi a primeira vez que soubera, com certeza, que queria que ele a
convidasse.
Em meio ao silêncio,
entretanto, Alex pareceu não compreender o que ela estava pensando.
— Deixe
para lá. Não é assim tão importante.
Katie continuou olhando nos olhos dele.
— Sim, eu
adoraria jantar com você. Mas com uma condição.
— E qual seria a condição?
— Você já fez tantas coisas por mim que eu gostaria de
poder fazer algo por você desta vez. Que tal se eu preparasse o jantar? Na
minha casa.
Ele
sorriu, aliviado.
— Vai ser perfeito.
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