Capítulo 26

NO FINAL DE JUNHO, os jardins e os canteiros floridos de Dorchester, que brilhavam com as cores vibrantes da primavera, estavam começando a murchar; as flores assumiam uma coloração marrom e se retorciam sobre a terra. A umidade do ar estava aumentando e os becos na área central de Boston começavam a cheirar a comida podre, urina e mofo. Kevin disse a Coffey e Ramirez que ele e Erin iriam passar o fim de semana em casa, assistindo a filmes e cuidando do jardim. Coffey havia perguntado sobre a viagem a Provincetown e Kevin mentira, falando sobre o hotel onde haviam se hospedado e alguns dos restaurantes que haviam visitado. Coffey disse que já havia visitado todos aqueles lugares e perguntou se Kevin havia pedido o bolo salgado de carne de caranguejo em um deles. Kevin disse que não, mas que pediria da próxima vez.
Erin havia desaparecido, mas Kevin ainda procurava por ela por toda a parte. Não conseguia evitar. Quando dirigia pelas ruas de Boston e via um relance de loiro ou dourado nos ombros de alguma mulher, sentia seu coração preso na garganta. Procurava pelo nariz delicado, pelos olhos verdes e pela maneira graciosa de andar. Às vezes, ficava do lado de fora da confeitaria fingindo que estava esperando por ela.
Já deveria ter conseguido encontrá-la, mesmo que ela tivesse lhe escapado na Filadélfia. As pessoas deixavam pistas. Documentos deixavam rastros. Na Filadélfia, ela havia usado um nome e um número de seguro social fajutos, mas aquilo não poderia durar para sempre. A menos que estivesse disposta a continuar morando em hotéis baratos e trocando de emprego a cada semana. Até este ponto, porém, ela não usara seu próprio número de seguro social. Um oficial de outra delegacia, que tinha contatos importantes, verificou para ele. Aquele oficial era a única pessoa que sabia sobre Erin ter desaparecido, mas manteve a boca fechada porque Kevin também sabia que ele tinha um caso com uma garota ainda menor de idade, que trabalhava como babá de seus filhos. Kevin se sentia sujo sempre que tinha que conversar com ele, porque o policial era um pervertido e deveria estar na cadeia. Afinal, a Bíblia diz: Que não haja imoralidade sexual entre vós. Entretanto, neste momento, Kevin precisava dele para poder encontrar sua esposa e trazê-la de volta para casa. Marido e mulher devem ficar juntos, porque fizeram seus votos diante de Deus e da família.
Tinha certeza de que a encontraria em março. Estava certo de que ela apareceria em abril. Teve um forte pressentimento de que o nome dela surgiria em maio, mas a casa continuava vazia. Agora, junho havia chegado e seus pensamentos se encontravam dispersos e, às vezes, eram tudo o que ele podia manter para continuar com a rotina dos procedimentos policiais. Era difícil se concentrar e a vodca não parecia mais ajudar tanto. Ele tinha que mentir para Coffey e Ramirez e se afastar deles enquanto os dois faziam comentários maldosos pelas suas costas.
De uma coisa ele tinha certeza: ela não estava mais correndo. Não iria se mudar de um lugar para outro, ou de um emprego para o outro para sempre. Ela não tinha aquele perfil. Gostava de coisas bonitas e queria tê-las ao seu redor. E isso significava que Erin deveria estar usando a identidade de alguma outra pessoa. A menos que estivesse disposta a viver constantemente fugindo, ela precisava de uma certidão de nascimento real e de um número de seguro social válido. Hoje em dia, os empregadores exigem identificação, mas onde e como ela poderia ter conseguido assumir a identidade de outra pessoa? Kevin sabia que a maneira mais comum era encontrar alguém de idade similar que houvesse morrido recentemente e, daí por diante, assumir a identidade do morto. A primeira parte era plausível, pois, apesar de tudo, Erin continuara fazendo visitas frequentes à biblioteca. Ele podia imaginá-la examinando os obituários nos arquivos de microfilme, procurando por um nome que pudesse roubar. Ela tramava planos e artimanhas na biblioteca enquanto fingia procurar livros nas estantes e fizera essas coisas mesmo depois de Kevin tê-la levado até lá durante seu horário de trabalho. Ele lhe dava carinho e gentilezas e ela retribuía com aquela traição. Ficava furioso ao pensar em como Erin ria dele enquanto fazia coisas assim. Imaginar aquilo o enfurecia tanto que pegou um martelo e estraçalhou o jogo de pratos e xícaras de porcelana chinesa que haviam recebido como presente de casamento. Depois de se acalmar, conseguiu concentrar-se no que tinha que fazer. Durante os meses de março e abril, Kevin passou horas na biblioteca, assim como ela teria feito, tentando encontrar a nova identidade que Erin estaria usando. Mas, mesmo que encontrasse o nome, como ela poderia ter conseguido os documentos? Onde ela estaria agora? E por que não havia voltado para casa?
Aquelas eram as perguntas que o atormentavam e, às vezes, tudo era tão confuso que ele não conseguia parar de chorar. Sentia muita saudade, queria que ela voltasse para casa e detestava ficar sozinho. No entanto, outras vezes, pensar que Erin o abandonara fazia com que Kevin pensasse no quanto ela era egoísta e tudo o que queria fazer era matá-la.

***

JULHO CHEGOU E COM ELE o tempo quente como as baforadas de um dragão: quente, úmido e com um horizonte que tremulava como uma miragem quando visto a distância. O fim de semana do feriado da Independência havia passado e outra semana começara. O aparelho de ar-condicionado havia quebrado e Kevin não chamara um técnico para fazer o conserto. Sempre sentia dor de cabeça pelas manhãs, quando ia para o trabalho. Por tentativa e erro, Kevin descobriu que a vodca funcionava melhor do que os comprimidos de Tylenol, mas a dor continuava lá, fazendo suas têmporas latejarem. Não ia mais à biblioteca. Coffey e Ramirez perguntaram mais uma vez sobre sua esposa. Kevin disse que ela estava bem, mas nada além disso. E mudou de assunto. Ele ganhou um novo parceiro, Todd Vannerty, recém-promovido, que não se importava em deixar que Kevin fizesse a maior parte das perguntas quando falava com as testemunhas e as vítimas, aliás, o próprio Kevin não se importava com essa situação.
Kevin lhe disse que, quase sempre, a vítima conhecia o assassino. Mas nem sempre de maneira óbvia. Ao fim de sua primeira semana de trabalho juntos, eles foram chamados até um apartamento a menos de três quarteirões da delegacia, onde encontraram um garoto de 10 anos que havia morrido por causa de um ferimento à bala. O atirador havia emigrado da Grécia recentemente e estava celebrando a vitória da seleção grega em um jogo de futebol quando disparou sua arma em direção ao chão. A bala atravessou o teto do apartamento de baixo e matou o garoto, que comia um pedaço de pizza. A bala perfurou o topo de sua cabeça e ele tombou para frente, batendo o rosto em cima da pizza. Quando viram o garoto, sua testa estava coberta de queijo e molho de tomate. A mãe do menino gritou e chorou por duas horas e tentou agredir o grego nas escadarias, que já estava sendo levado para fora do prédio, algemado. Ela acabou se desequilibrando e rolando escada abaixo, e os policiais tiveram que chamar uma ambulância.
Kevin e Todd foram para um bar depois do expediente, e Todd tentou fingir que podia esquecer o que havia visto. Entretanto, ele bebeu três cervejas em menos de quinze minutos. Disse a Kevin que havia sido reprovado na primeira vez em que prestara a prova para ser promovido a investigador, antes de finalmente conseguir passar na segunda vez. Kevin bebeu vodca, mas, como Todd estava com ele, pediu ao barman que acrescentasse um pouco de suco de framboesas à bebida.
Era um bar frequentado por policiais. Muitos policiais, preços baixos, pouca iluminação e mulheres que gostavam de se envolver com aquele tipo de homem. O barman deixava as pessoas fumarem, mesmo que aquilo fosse contra a lei, porque a maioria dos fumantes eram policiais. Todd não era casado e já estivera naquele bar várias vezes. Kevin nunca havia estado ali antes e não tinha certeza de que gostava do lugar. Mesmo assim, não queria voltar para casa.
Todd foi ao banheiro e, quando voltou, se inclinou em direção a Kevin.
— Acho que aquelas duas no canto do bar estão olhando para nós.
Kevin se virou. Assim como ele, as mulheres pareciam ter cerca de 30 anos. A morena percebeu que ele a olhava antes de se voltar para sua amiga ruiva.
— Uma pena você ser casado, hein? Elas são bem bonitas.
Elas pareciam envelhecidas, pensou Kevin. Não eram como Erin, que tinha a pele sedosa e cheirava a limão e menta, o perfume que ele havia lhe dado de presente no Natal.
— Vá até lá falar com elas, se quiser.
— Acho que vou, sim — disse Todd. Ele pediu outra cerveja e andou até o lugar onde as duas estavam, sorrindo. Provavelmente disse algo imbecil, mas foi o bastante para fazer as duas mulheres rirem. Kevin pediu uma vodca dupla, sem suco de framboesas, e viu o reflexo delas pelo espelho que ficava atrás do balcão do bar. Os olhos da morena encontraram os seus no reflexo e ele não desviou o olhar. Dez minutos depois, ela se aproximou e sentou-se na banqueta que Todd ocupava alguns minutos antes.
— Não está a fim de conhecer pessoas hoje? — perguntou a morena.
— Não sou muito bom para puxar assunto.
A morena pareceu considerar aquelas palavras. 
— Meu nome é Amber — disse ela.
— Kevin — respondeu ele e, novamente, não soube o que dizer. Ele tomou um gole da bebida pensando que o gosto parecia quase como o da água.
A morena se inclinou em direção a ele. Cheirava a almíscar, bem diferente do cheiro de limão e menta. 
— Todd disse que vocês trabalham com homicídios.
— É verdade.
— É um trabalho difícil?
— Às vezes — disse ele. Kevin terminou a bebida e levantou o copo. O barman lhe trouxe outro. — E você? O que faz?
— Eu administro o escritório da confeitaria do meu irmão. Ele faz doces e produtos para restaurantes.
— Parece interessante.
Ela lhe deu um sorriso cínico. 
— Não parece, não, mas ajuda a pagar as contas — disse ela. O branco de seus dentes brilhou em meio à penumbra. — Nunca vi você aqui antes.
— Foi Todd que me trouxe até aqui.
Ela olhou em direção a Todd. 
— Eu já o vi algumas vezes. Ele dá em cima de qualquer pessoa que esteja usando uma saia e que ainda esteja respirando. E eu acho que nem é tão necessário que a pessoa esteja realmente respirando. Minha amiga adora este lugar, mas geralmente não suporto esse bar. Ela me força a vir aqui com ela.
Kevin assentiu e se mexeu em seu assento. Ele se perguntou se Coffey e Ramirez vinham até este lugar.
— Eu estou lhe incomodando? — perguntou ela. — Posso deixá-lo em paz se você quiser.
— Não, você não está me incomodando.
Ela mexeu o pescoço e jogou o cabelo e Kevin notou que ela era mais bonita do que ele imaginara a princípio. 
— Quer me pagar um drinque? — sugeriu ela.
— O que você quer beber?
— Um cosmopolitan — disse ela, e Kevin fez um sinal para o barman. O cosmopolitan havia chegado.
— Não sou muito bom nisso — admitiu Kevin.
— Não é bom no quê?
— Nisso.
— Estamos só conversando — disse ela. — E você está indo bem.
— Sou casado.
Ela sorriu. 
— Eu sei. Percebi sua aliança.
— Isso a incomoda?
— Como disse, estamos apenas conversando.
Ela deslizou o dedo pelo vidro do copo e ele percebeu a umidade se concentrar na pele dela.
— Sua esposa sabe que você está aqui? — perguntou ela.
— Minha esposa está fora da cidade. Uma amiga dela está doente e ela foi até lá para ajudá-la.
— E então, você achou que seria uma boa ideia ir até alguns bares? Conhecer mulheres?
— Não sou esse tipo de homem. Eu amo minha mulher — disse Kevin.
— E você deveria mesmo. Afinal, você se casou com ela.
Ele queria outra vodca dupla, mas não queria pedi-la em voz alta na presença de Amber, porque já havia feito isso. Em vez disso, como se pudesse ler sua mente, ela fez um sinal para o barman e ele trouxe outra dose. Kevin tomou um grande gole, ainda pensando que a bebida tinha gosto de água.
— Você se importa por eu ter feito isso? — perguntou ela.
— Está tudo bem — disse ele.
Ela olhou para ele, com uma expressão sensual. 
— Eu não contaria à sua esposa que você esteve aqui, se eu fosse você.
— Por que não? — perguntou ele.
— Porque você é bonito demais para um lugar como este. Você nunca sabe quem vai tentar dar em cima de você.
— Você está dando em cima de mim?
Ela demorou um momento para responder. 
— Você ficaria ofendido se eu dissesse que sim?
Ele girou o copo lentamente sobre o balcão do bar. 
— Não — disse ele. — Isso não me ofende.

***

DEPOIS DE BEBER e flertar por cerca de duas horas, os dois estavam no apartamento de Amber. Ela percebeu que ele preferia ser discreto, e então lhe deu seu endereço. Depois que Amber e sua amiga saíram, Kevin ficou no bar com Todd por mais meia hora, antes de dizer a Todd que tinha que voltar para casa e telefonar a Erin.
Enquanto dirigia, ele percebeu o mundo ficar embaçado nos limites do seu campo visual. Seus pensamentos estavam confusos e em desordem e ele sabia que estava dirigindo descuidadamente pelas ruas, mas era um bom policial. Mesmo que fosse parado não seria preso, porque policiais não prendem uns aos outros. Além disso, que problema havia em tomar alguns drinques?
Amber morava em um apartamento a alguns quarteirões de distância do bar. Ele bateu na porta e quando a porta se abriu, ela não vestia nada por baixo do lençol que havia enrolado ao redor do corpo. Ele a beijou e a levou para o quarto, sentindo os dedos dela desabotoando sua camisa. Colocou-a na cama, despiu-se e apagou as luzes, porque não queria se lembrar de que estava traindo sua esposa. O adultério era um pecado e, agora que estava ali, Kevin não queria fazer sexo com ela, mas havia bebido. O mundo parecia estar borrado. E Amber não vestia nada além de um lençol. Tudo era confuso demais.
Ela não era como Erin. Seu corpo era diferente, suas formas eram diferentes e seu cheiro era diferente. Era um cheiro adocicado, quase animalesco. As mãos dela se moviam demais e tudo o que Kevin fazia com Amber era novo. Ele não gostava daquilo, mas não conseguia parar. Ouviu Amber chamar seu nome, dizer palavras sujas. Kevin quis mandá-la calar a boca para que pudesse pensar em Erin, mas era difícil se concentrar. Tudo era confuso demais.
Apertou os braços dela e a ouviu gemer e dizer em seguida: 
— Não tão forte! — Kevin suavizou a pegada, mas logo voltou a apertar os braços de Amber, porque era aquilo que queria fazer. Desta vez, ela não disse nada. Ele pensou em Erin, imaginou onde ela poderia estar, se ela estaria bem e voltou a pensar no quanto sentia saudade dela.
Ele não devia ter batido em Erin, porque ela era doce, gentil e carinhosa e não merecia ser socada ou chutada. Kevin era o culpado por Erin haver desaparecido. Fora ele quem a afastara, mesmo que a amasse. Havia procurado por ela e não tinha conseguido encontrá-la. Esteve na Filadélfia procurando por ela. E agora estava com uma mulher chamada Amber, que não sabia o que fazer com as mãos e fazia ruídos estranhos. Tudo parecia estar errado.
Quando terminaram, ele não quis mais ficar ali. Em vez disso, levantou-se da cama e começou a se vestir. Ela acendeu o abajur ao lado da cama e se sentou. Ao olhar para ela, Kevin se lembrou de que ela não era Erin e repentinamente sentiu seu estômago embrulhar. A Bíblia diz: O homem que comete adultério é um tolo, pois destrói sua própria alma.
Tinha que sair de perto de Amber. Não sabia por que tinha ido até ali e, ao olhar para ela, seu estômago se retorcia.
— Você está bem? — ela perguntou.
— Não deveria estar aqui — respondeu ele. — Não devia ter vindo.
— Acho que é um pouco tarde para pensar nisso.
— Tenho que ir embora.
— Vai sair assim? Simplesmente ir embora?
— Sou casado — disse ele novamente.
— Eu sei — disse ela, com um sorriso cansado. — E não há nenhum problema.
— É claro que há — disse ele. Depois de se vestir, ele a deixou no apartamento e correu pela escada, descendo até a rua e entrando no carro. Dirigiu velozmente, mas não fez curvas perigosas ou cruzou as faixas de trânsito. A culpa que sentia era como um forte tônico para seus sentidos. Voltou para casa e viu uma luz acesa na casa dos Feldmans, sabendo que eles espiariam pela janela quando ele estacionasse. Os Feldmans eram vizinhos ruins. Nunca o cumprimentavam e diziam às crianças para não pisarem em seu gramado. Eles perceberiam o que ele havia feito, pois eram pessoas ruins. Ele havia feito uma coisa ruim e pessoas ruins sempre andam juntas.
Quando entrou, Kevin precisava de uma bebida. Mesmo assim, só de pensar na vodca, sentiu-se enjoado. Estava inquieto. Havia traído sua esposa e a Bíblia dizia: Sua vergonha nunca será apagada. Havia quebrado um dos mandamentos de Deus, quebrado os votos que fizera com Erin, e sabia que a verdade apareceria. Amber sabia, Todd sabia e os Feldmans também sabiam. Eles acabariam contando a alguém, que contaria a outra pessoa, até que a história chegaria aos ouvidos de Erin. Ele andou de um lado para outro na sala de estar, com a respiração acelerada porque sabia que não conseguiria explicar aquilo a Erin de uma maneira que ela pudesse entender. Ela era sua esposa e nunca o perdoaria. Ficaria furiosa e o mandaria dormir no sofá. Pela manhã, o olharia, cheia de decepção, pois ele era um pecador, e nunca mais voltaria a confiar nele. Ele estremeceu, sentindo náuseas. Havia dormido com outra mulher e a Bíblia dizia: Não te envolvas com pecado sexual, impureza, luxúria e desejos vergonhosos. Tudo era confuso demais. Queria parar de pensar, mas não era capaz. Queria beber, mas não era capaz. E tinha a sensação de que Erin apareceria repentinamente na porta da casa.
A casa estava suja e desorganizada e sua querida esposa perceberia o que ele fizera. Mesmo que seus pensamentos estivessem confusos, ele sabia que aquelas duas coisas estavam ligadas. Andou freneticamente pela sala, de um lado para o outro. Sujeira e traição estavam ligadas, porque trair era uma coisa suja. Erin saberia que ele a havia traído, porque a casa estava suja e as duas coisas estavam associadas. De repente, parou de andar pela sala e correu para a cozinha. Lá, encontrou um saco de lixo debaixo da pia. Na sala, ajoelhou-se e rastejou pelo cômodo, enchendo o saco com as embalagens vazias de comida para viagem, as revistas velhas, os talheres de plástico, as garrafas de vodca vazias e as caixas de pizza. Já passava da meia-noite e ele não teria que trabalhar na manhã seguinte. Assim, Kevin ficou acordado limpando a casa, lavando os pratos e passando o aspirador de pó que comprara para Erin. Limpou a casa para que ela não descobrisse o que ele havia feito. Sujeira e traição estavam associadas. Colocou as roupas sujas na máquina de lavar e, quando elas já estavam limpas, colocou-as na secadora. Em seguida, dobrou-as e guardou-as à medida que outra leva de roupas enchia a máquina. O sol nasceu e ele tirou as almofadas do sofá, passando o aspirador por baixo delas até que todas as migalhas desaparecessem. Enquanto trabalhava, ele olhava pela janela, sabendo que Erin poderia chegar em casa a qualquer momento. Esfregou o vaso sanitário, limpou as manchas de comida da geladeira e lavou o piso da cozinha. O alvorecer se transformou em manhã e a manhã já avançava em direção à hora do almoço. Kevin lavou os lençóis, abriu as cortinas e tirou o pó da moldura da foto do seu casamento. Aproveitou também para aparar o gramado e jogou a grama cortada na lata do lixo. Quando terminou, saiu para fazer compras. Comprou peru, presunto, mostarda Dijon e pão de centeio fresco na padaria. Comprou flores e as colocou sobre a mesa. Acrescentou velas também. Ao terminar, ele respirava com dificuldade. Serviu-se de um copo grande de vodca gelada e sentou-se na cozinha para esperar por Erin. Ficou feliz porque limpara a casa e aquilo significava que Erin nunca saberia o que ele havia feito. Teriam o tipo de casamento que ele sempre quisera. Confiariam um no outro e seriam felizes. Ele a amaria para sempre e nunca iria traí-la. Afinal, por que ele faria algo tão desprezível?

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