Capítulo 39
KATIE FEZ COM QUE AS CRIANÇAS tomassem
banho antes de vestirem seus pijamas. Depois, ela entrou no chuveiro,
permanecendo sob os jatos de água e desfrutando da sensação deliciosa do xampu
e do sabonete enxaguando o sal do seu corpo depois de um dia sob o sol.
Preparou o macarrão das crianças e, depois do jantar,
olharam a coleção de DVDs, tentando encontrar um que os dois quisessem assistir, até que finalmente concordaram em ver Procurando Nemo. Ela se
sentou entre Josh e Kristen no sofá, com uma tigela de pipocas no colo e as
pequenas mãos deles vinham até a tigela automaticamente, de ambos os lados. Ela
usava uma calça de moletom confortável que Alex havia deixado sobre a cama e
uma camiseta velha do time de futebol americano Carolina Panthers. Estava
sentada com as pernas cruzadas no sofá enquanto assistiam ao filme, sentindo-se
relaxada pela primeira vez no dia.
Do lado de fora, o céu se tingia de várias tonalidades
diferentes, quase como num show de fogos de artifícios. As cores vibrantes do
arco-íris se esmaeceram em tons pastéis antes de finalmente darem lugar ao
azul-acinzentado do crepúsculo e ao azul-índigo da noite. As estrelas começaram a
tremeluzir no céu enquanto as últimas ondas de calor subiam do chão.
Kristen havia começado a bocejar conforme o filme
avançava, mas sempre que a personagem Dory aparecia na tela, a garota dizia:
“Ela é a minha favorita, mas eu não me lembro por quê!” Do outro lado do sofá,
Josh se esforçava para ficar acordado.
Quando o filme acabou e Katie se inclinou para
desligar o DVD, Josh levantou a cabeça e desabou no sofá. Como ele era grande
demais, ela não conseguiu carregá-lo, então cutucou-o no ombro, dizendo-lhe
que era hora de ir para a cama. Ele resmungou e reclamou antes de se sentar.
Bocejou e se levantou e, com Katie ao seu lado, cambaleou até o quarto.
Deitou-se sem reclamar e ela lhe deu um beijo de boa-noite. Sem saber se ele
preferia dormir com o abajur ligado, ela acendeu a luz do corredor e deixou a
porta entreaberta.
Kristen foi a próxima. Ela pediu a Katie que se
deitasse ao seu lado por alguns minutos e Katie o fez, olhando para o teto,
sentindo o calor e o cansaço do dia começando a tirar suas forças. A menina adormeceu logo e Katie teve que se esforçar para conseguir ficar acordada antes
de sair do quarto na ponta dos pés.
Depois, aproveitou para limpar o que havia sobrado do
jantar e esvaziou a tigela de pipocas. Olhando pela sala de estar, percebeu as
evidências da presença das crianças por toda a parte: uma pilha de
quebra-cabeças em uma estante, um cesto de brinquedos no canto da sala e sofás
revestidos em couro, admiravelmente à prova de derramamento de líquidos.
Estudou também os enfeites que estavam distribuídos pelo cômodo: um relógio
antigo, que precisava que alguém lhe desse corda todos os dias, um conjunto
antigo de enciclopédias em uma estante ao lado da poltrona, um vaso de
cristal sobre a mesa ao lado da janela. Nas paredes, fotografias em preto e
branco de antigos celeiros usados
para armazenar tabaco. Eram uma coisa típica do sul dos Estados Unidos e ela se
lembrava de haver visto várias daquelas cenas rústicas enquanto viajava pela
Carolina do Norte.
Havia também indícios da vida caótica de Alex: uma
mancha vermelha no tapete em frente ao sofá, marcas e ranhuras no piso de
madeira, poeira acumulada nos rodapés. Mesmo assim, enquanto observava os
detalhes da casa, não conseguiu deixar de sorrir, porque todas aquelas coisas
refletiam a pessoa que Alex era. Um pai solteiro, fazendo o melhor que podia
para manter uma casa organizada, mesmo que não conseguisse fazer tudo com
perfeição. A casa era um retrato de sua vida e ela gostava daquela sensação
tranquila e confortável.
Katie apagou as luzes e se deixou cair no sofá. Pegou
o controle remoto e começou a procurar algo interessante nos canais da TV a
cabo, algo que não precisasse de tanta atenção. Já eram quase 10 horas e Alex
ainda levaria uma hora para chegar. Ela se deitou no sofá e começou a assistir
a um programa no canal Discovery, um programa sobre vulcões. Percebeu que
havia um reflexo na tela da televisão e se esticou para desligar o abajur na
mesinha de canto, deixando a sala mais escura. Melhor assim.
Assistiu ao programa por alguns minutos, quase sem
notar que, toda vez que piscava, seus olhos se fechavam por uma fração de segundo mais longa que a anterior. Sua respiração ficou mais lenta e ela começou
a afundar entre as almofadas. As imagens começaram a correr por sua mente.
Incoerentes a princípio. Imagens dos brinquedos do parque de diversões, a
vista do alto da roda-gigante. Pessoas em grupos aleatórios, jovens e velhos,
adolescentes e casais. Famílias. E, em algum ponto ao longe, um homem que
usava óculos escuros e um boné de beisebol
andando entre a multidão, movendo-se com um objetivo em mente antes que ela o
perdesse de vista. Katie reconheceu alguns aspectos: o jeito de caminhar, o
contorno do queixo, a maneira como ele movia os braços.
Estava
quase dormindo agora, relaxando e se lembrando. As imagens começavam a ficar
borradas, o som da televisão ficava mais suave. Relaxou ainda mais e sua mente
insistia em se lembrar da vista que tinha do alto da roda-gigante. E, é claro,
do homem que havia visto, um homem que se movia como um caçador na floresta, à
procura de sua caça.
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