Capítulo 14

 ― EU DISSE QUE SENTIA MUITO, ― T.J. disse, olhando para mim por baixo seus cílios.
 ― Não estou chateada.
 ― Você está um pouco chateada.
 ― Não. Realmente não estou, ― eu disse, rolando um pedaço do meu bife marinado com salada em torno do meu prato.
 ― Você não gosta de salada?
 ― Não, eu gosto, ― eu disse muito consciente das minhas expressões faciais e cada movimento que fazia. Era cansativo tentar provar que não estava fazendo beicinho. T.J. não chegou em casa até depois das oito e meia, e ele não me mandou mensagens ou ligou o tempo todo. Nem mesmo quando ele estava em seu caminho para casa.
 ― Quer experimentar um pouco do meu peixe? ― Ele estava a duas mordidas de terminar seu Alaskan Sea Bass, mas empurrou o prato para frente. Balancei minha cabeça. Tudo cheirava maravilhoso, mas eu simplesmente não tinha vontade de comer, e não tinha nada a ver com o T.J.
Estávamos numa mesa de canto, contra a parede oposta do restaurante de bairro favorito do T.J, Brooklyn Girl. A decoração cinza das paredes era simples, mas moderna, parecia muito com seu apartamento. Limpo, tudo em seu lugar, e ainda assim, convidativo.
T.J. suspirou e recostou-se contra a sua cadeira.
 ― Isso não está indo como eu queria. ― Ele se inclinou para frente, colocando os cotovelos sobre a mesa. ― Trabalho 50 horas por semana, Camille. Simplesmente não tenho tempo para...
 ― Mim, ― eu disse terminando a frase constrangedora para ele.
 ― Qualquer coisa. Eu mal vejo a minha família. Eu falo com você mais do que com eles.
 ― Ação de Graças?
 ― Está parecendo mais provável que esse trabalho siga em frente.
Ofereci um pequeno sorriso.
 ― Não me importo que você esteja atrasado. Sei que trabalha longas horas. Sabia que não iria vê-lo muito quando cheguei aqui.
 ― Mas você veio, ― disse ele, chegando do outro lado da mesa para minha mão.
Sentei-me de volta, colocando minhas mãos no meu colo.
 ― Mas não posso largar tudo cada vez que você decidir que quer me ver.
Seus ombros caíram, mas ele ainda estava sorrindo. Por alguma razão, ele estava se divertindo.
 ― Eu sei. E isso é justo.
Inclinei-me novamente para cutucar minha salada com o garfo.
 ― Ele veio ao aeroporto.
 ― Trenton?
Balancei a cabeça.
T.J. ficou em silêncio por um longo tempo, e então ele finalmente falou.
 ― O que está acontecendo com vocês dois?
Contorci-me no meu lugar.
 ― Eu disse a você. Nós temos passado muito tempo juntos.
 ― Que tipo de tempo juntos?
Fiz uma careta.
 ― Nós assistimos TV. Nós sentamos e conversamos. Nós saímos para comer. Trabalhamos juntos.
 ― Trabalham juntos?
 ― No Skin Deep.
 ― Você se demitiu do Red? Por que você não me contou?
 ― Eu não me demiti. Coby teve alguns problemas para pagar contas. Peguei um segundo emprego, até que ele se ajeite.
 ― Eu sinto muito. Sobre Coby.
Balancei a cabeça, realmente não querendo ir muito longe nesse assunto.
 ― Trenton fez isso? ― , ele perguntou, abaixando o queixo e olhando para os meus dedos.
Eu balancei a cabeça.
Ele tomou uma respiração profunda, assim como se estivesse tomando a realidade da situação.
 ― Então quer dizer que vocês passam muito tempo juntos.
Eu estremeci.
 ― Sim.
 ― Ele passou a noite?
Balancei minha cabeça.
 ― Não. Mas nós... ele...
T.J. assentiu.
― Ele te beijou. Você mencionou isso. Ele está saindo com alguém?
 ― Só comigo, principalmente.
T.J. levantou uma sobrancelha.
 ― Ele tem estado no Red?
 ― Sim. Mas não mais do que o habitual. Talvez até menos.
 ― Ainda levando garotas para casa? ― ele disse, meio brincando.
 ― Não.
 ― Não? ― ele perguntou, surpreso.
 ― Nem um pouco. Não, desde que...
 ― Ele começou a perseguir você. ― Balancei minha cabeça novamente. T.J. olhou para baixo. ― Uau. ― Ele riu uma vez em descrença. ― Trenton está apaixonado. ― Ele olhou para mim. ― Por você.
 ― Você parece surpreso. Você me amou uma vez, você sabe.
 ― Eu ainda a amo.
Fechei os olhos com força.
 ― Como? Como você poderia se sentir assim depois de tudo o que eu acabei de te dizer?
Ele manteve sua voz baixa.
 ― Eu sei que não sou bom para você agora, Camille. Não posso estar lá para você quando você precisa de mim, e provavelmente não poderei, por um longo tempo. É difícil culpá-la quando sei que a nossa relação é baseada em telefonemas esporádicos e mensagens de texto.
 ― Mas você me disse isso quando nos conhecemos. Você disse que seria desta maneira, e eu lhe disse que estava tudo bem. Que estava disposta a fazer isso funcionar.
 ― É isso que você está fazendo? Mantendo sua palavra? ― T.J. procurou meus olhos por um momento, e então suspirou. Ele bebeu o último gole de seu vinho branco, e em seguida, colocou o copo vazio para baixo ao lado de seu prato.  ― Você o ama?
Congelei por um momento, sentindo-me como um animal encurralado. Ele estava me interrogando desde que o garçom colocou nosso jantar na mesa, e eu estava ficando emocionalmente exausta. Ao vê-lo pela primeira vez, e depois de ficar sozinha com meus pensamentos durante todo o dia... foi demais. Eu estava fugindo, sem ter para onde ir. Meu voo não sairia até a manhã seguinte. Finalmente, cobri o rosto com as mãos. Depois que fechei os olhos, as lágrimas foram empurradas sobre minhas pálpebras inferiores e pelo meu rosto.
T.J. suspirou.
 ― Vou dizer que isso é um sim.
 ― Como você sabe que você ama alguém? Você fica com aquela sensação que não vai embora. Eu ainda sinto isso por você.
 ― Eu me sinto da mesma maneira. Mas sempre soube que isso seria muito duro com você.
 ― As pessoas fazem isso o tempo todo.
 ― Sim, mas eles se falam mais de oito ou nove vezes por mês.
 ― Então, você sabia que estava acabado? Por que trazer-me aqui, então? Para me dizer que estava tudo bem que eu não poderia fazer isso funcionar?
 ― Eu pensei que talvez se você estivesse aqui, comigo, nós poderíamos ter uma noção do que realmente estava acontecendo com você – se isso era muito difícil porque não nos vemos há algum tempo, ou se você realmente tinha sentimentos por Trenton.
Comecei a chorar no meu guardanapo novamente. Eu suspeitava que as pessoas estavam certamente olhando, mas não me atrevi a olhar para cima para conferir.
 ― Isso é tão humilhante, ― eu disse, tentando não soluçar.
 ― Está tudo bem, querida. É só a gente.
Baixei as mãos apenas o suficiente para olhar ao redor. Ele estava certo. Éramos os dois últimos clientes no restaurante. Eu estava tão preocupada que eu nem tinha notado.
 ― Posso pegar qualquer outra coisa para o senhor? ― disse a atendente. Eu não tinha que ver seu rosto para saber que ela estava curiosa sobre o que estava acontecendo na nossa mesa.
 ― Traga-nos a garrafa, ― T.J. disse.
 ― Do branco?
 ― É o branco, ― T.J. disse em sua voz confiante e suave.
 ― S-sim, senhor, ― disse ela. Eu podia ouvir os sapatos dela tocarem o chão, enquanto ela se afastava.
 ― Eles não vão fechar em breve?
 ― Não por vinte minutos. Podemos matar uma garrafa até lá, certo?
 ― Não é um problema, ― eu disse, fingindo diversão. No momento, tudo o que eu sentia era tristeza, culpa e vergonha.
Seu pequeno sorriso artificial desapareceu.
 ― Você está indo embora amanhã. Nós não precisamos tomar nenhuma decisão hoje à noite. Ou até mesmo amanhã. Vamos apenas aproveitar nosso tempo juntos. ― Ele estendeu a mão sobre a mesa, e entrelaçou seus dedos nos meus.
Depois de um momento de pausa, eu me afastei.
 ― Eu acho que nós dois já sabemos o que acontece.
Com tristeza em seus olhos, T.J. assentiu. Meus olhos se abriram quando as rodas de avião tocaram o chão, e olhei ao redor, vendo todo mundo em volta de mim retirando seus telefones celulares e enviando mensagens de texto para amigos, familiares ou colegas sobre a sua chegada. Não me incomodei em ligar meu telefone de volta. Raegan estaria na casa dos seus pais, e minha família nem sabia que tinha ido viajar.
T.J. e eu fomos para a cama assim que voltamos para a casa da cidade na noite anterior, sabendo que ambos tinham de acordar antes do nascer do sol para me levar ao aeroporto a tempo. Ele me segurou em seus braços toda a noite como se ele não quisesse me deixar ir, mas na manhã seguinte no aeroporto, ele abraçou e me deu um beijo de adeus como ele queria. Isso foi forçado, e triste, e distante.
Empurrei o câmbio de marchas do Smurf no estacionamento, e sai para o asfalto. Parte de mim esperava que Trenton estivesse sentado no cimento em frente à minha porta, mas ele não estava.
San Diego esteve quase agradável, e agora estava de volta onde minha respiração era visível. O ar na verdade feria meu rosto. Como o ar machuca seu rosto?
Abri a porta, empurrei-a, deixando-a bater atrás de mim, e, em seguida, marchei para o meu quarto, caindo de cara na minha cama maravilhosamente confusa. Raegan chegou pelo corredor em seus pés descalços.
 ― Como foi? ― ela perguntou da porta.
 ― Eu não sei.
O piso rangeu sob ela enquanto ela caminhou até minha cama e sentou-se ao meu lado.
 ― Vocês ainda estão juntos?
 ― Não.
 ― Oh. Bem... isso é bom, certo? Quero dizer, mesmo que T.J. não tenha falado com você até que Trent beijasse você, e de repente ele comprou-lhe uma passagem para a Califórnia...
 ― Não esta noite, Ray.
 ― Trenton foi ao Red esta noite. Ele parecia muito terrível.
 ― Sim? Ele saiu com alguém? ― Olhei para fora do travesseiro.
Raegan hesitou.
 ― Logo antes da última chamada. Ele estava bêbado e desleixado.
Balancei a cabeça, e depois enterrei meu rosto no travesseiro.
 ― Apenas... diga-lhe, ― Raegan implorou. ― Diga a ele sobre T.J.
 ― Eu não posso, ― eu disse. ― E você não pode, tampouco. Você prometeu.
 ― Eu ainda não entendo o motivo de todo este segredo.
 ― Você não tem que entender, ― eu disse, olhando para ela, diretamente em seus olhos. ― Você apenas tem que manter o segredo.
Raegan assentiu.
 ― Eu vou.
Parecia que mal tinha fechado os olhos quando Raegan sacudia-me para me acordar. Gemi.
 ― Você vai se atrasar para o trabalho, Cami! Levante sua bunda!
Não me mexi.
 ― Você só tirou dois dias de última hora. Cal vai demitir a sua bunda! Levante-se, ― ela juntou as mãos em volta do meu tornozelo e me arrastou até que eu caí da cama, dura.
 ― Ai! Droga, Ray!
Ela inclinou-se para baixo.
 ― São 11:30! Levante-se!
Olhei para o relógio e, em seguida, levantei-me, correndo ao redor do meu quarto e praguejando repetidamente. Mal escovei os dentes, recorri a um coque e óculos. O Smurf não queria funcionar, também e ele zumbia como um gato morrendo antes de finalmente ligar.
O relógio na parede da Skin Deep dizia 12:07 quando entrei pela porta. Hazel já estava no telefone, e Calvin estava ao lado dela, franzindo a testa.
 ― O que diabos você está vestindo? ― Perguntou ele.
Olhei para os meus jeans skinny ameixa e camisa de mangas compridas com listras horizontais em preto-e-branco.
 ― Roupas.
 ― Contratei você para ser um pedaço de bunda quente no balcão, e você se parece com minha prima Annette. O que é este look? ― Ele perguntou a Hazel.
 ― Hipster, ― disse ela brevemente antes de voltar à sua conversa.
 ― Sim. Tal como a minha prima moderna Annette. Da próxima vez que você entrar, eu quero ver seu decote e cabelo de sexo, ― ele disse, levantando um dedo, e depois dois.
 ― Que diabos é cabelo de sexo? ― eu perguntei.
Calvin deu de ombros.
 ― Você sabe. Bagunçado, mas sexy. Como se você tivesse acabado de ter relações sexuais.
Hazel bateu o telefone.
 ― Tudo o que sai de sua boca é ofensivo. Pedaço quente de bunda? Decote? Você é um processo de assédio sexual ambulante!
Calvin não se intimidou.
 ― São os sapatos? ― Perguntei, olhando para minhas botas de combate pretas favoritas.
 ― O lenço, ― ele disse, apontando todos os quatro dedos para mim. ― Qual é o ponto em ter um colo bonito se você ficar cobrindo?
Hazel sorriu.
 ― É um lenço bonito. Preciso de um preto como o seu.
Calvin franziu o cenho.
 ― Não é bonito! Não quero bonito! Eu contratei uma sexy bartender irritável, e tenho uma hippie num coque e sem tatuagens! Posso lidar com você saindo e chegando sempre que fodidamente você sentir vontade, mas é apenas errado andar por aqui com uma paleta limpa de pele. Parece ruim, se os nossos próprios funcionários não confiam em nós o suficiente para tatuá-los!
 ― Você está quase terminando? ― Hazel brincou. Ela olhou para mim. ― Ele começou sua menstruação hoje de manhã.
 ― Foda-se, Hazel! ― Calvin retrucou, batendo pelo corredor até seu escritório.
 ― Foda-se você também, ― ela gritou.
Calvin enfiou a cabeça ao virar a quina.
 ― Bishop veio?
 ― Puta merda, Cal, não! Pela terceira vez hoje, ele não veio! ― Calvin assentiu, e então desapareceu novamente. Hazel franziu a testa por meio segundo antes de se virar para mim com um sorriso.
 ― Acho que vou mostrar-lhe os meus dedos hoje. Pode ser que amenize.
 ― De jeito nenhum, ― disse ela. ― Deixe-o nervoso. ― Ela ficou em silêncio por um minuto, claramente trabalhando alguma coisa, e então ela me deu uma cotovelada. ― Então. Califórnia.
 ― Sim, ― eu disse, inclinando a cabeça enquanto puxei minha bolsa sobre ela. Joguei minha bolsa sobre o balcão e, em seguida, conectei ao computador. ― Sobre isso...
A porta soou, e Trenton entrou, vestindo um casaco azul-marinho inchado e um boné branco sujo que foi puxado para baixo, sombreando seus olhos.
 ― Bom dia, senhoras, ― disse ele, passando por nós.
 ― Bom dia, luz do sol, ― disse Hazel, vendo-o passar.
Ele desapareceu em sua sala, e Hazel me lançou um olhar.
 ― Você fodeu com a cabeça dele duramente.
Suspirei.
 ― Eu não tive a intenção.
 ― É bom para ele. Nenhum homem deve ter todas as mulheres que quer. Mantém sua babaquice a um nível tolerável.
 ― Eu só vou... ― eu disse, apontando para o corredor.
Hazel assentiu.
Trenton estava ocupado arrumando seu equipamento quando entrei na sala. Cruzar meus braços e encostar na ombreira da porta, enquanto ele me ignorava foi aceitável pelos primeiros minutos, mas depois comecei a me sentir estúpida.
 ― Você nunca vai falar comigo novamente? ― Perguntei.
Ele manteve os olhos em seu equipamento, e riu uma vez.
 ― Claro, bonequinha. Eu vou falar com você. O que está acontecendo?
 ― Calvin diz que preciso de mais tatuagem.
 ― Você quer mais tatuagem?
 ― Só se você a fizer.
Ele ainda não olhava para mim.
 ― Não sei, Cami, tenho um dia muito cheio.
Observei-o por um momento, enquanto ele ocupava-se com a organização de pacotes brancos cheios de várias ferramentas higienizadas.
 ― Apenas qualquer dia. Não tem que ser hoje.
 ― Sim, claro. Não há problema, ― disse ele, pegando algo numa gaveta.
Depois de um minuto de Trenton fingindo que eu não estava lá, caminhei de volta para a recepção. Ele tinha sido honesto. Ele tinha um cliente após o outro, mas mesmo quando ele teve um pouco de tempo no meio, ele só veio para o balcão uma vez, e foi para conversar com um potencial novo cliente. O resto do dia ele ficou em sua sala, ou conversando com Calvin em seu escritório. Hazel não parecia preocupada com o seu comportamento, mas ela nunca parecia ser perturbada por nada.
Trenton não veio para o Red naquela noite, e no dia seguinte foram mais seis horas da operação Ignorar Cami, assim como foi no próximo dia, e todos os dias depois desses, durante três semanas. Passei muito mais tempo em trabalhos e estudos.
Raegan estava gastando mais tempo com o Brazil, então eu fiquei grata quando Coby apareceu para uma visita uma noite na segunda-feira. Tigelas idênticas de sopa de macarrão com frango foram colocadas no balcão entre nós.
 ― Você parece melhor, ― eu disse.
 ― Eu me sinto melhor. Você estava certa, um programa tornou isso mais fácil.
 ― Como estão as coisas em casa? ― eu perguntei.
Coby encolheu os ombros.
 ― O mesmo.
Peguei o macarrão nadando na minha tigela.
 ― Ele nunca vai mudar, você sabe.
 ― Eu sei. Só estou tentando ajeitar minhas coisas para que eu possa ter minha própria casa.
 ― Boa ideia, ― eu disse, dando uma mordida.
 ― Vamos levar isso para o sofá e assistir a um filme, ―  disse Coby.
Concordei, e Coby colocou minha tigela ao lado da almofada dele enquanto eu procurava por caixas de DVD. Minha respiração ficou presa quando me deparei com Spaceballs. Trenton tinha deixado aqui a última vez que o assistimos.
 ― O quê? ― Perguntou Coby.
 ― Trent deixou um filme aqui.
 ― Onde ele tem estado? Imaginei que ele estivesse aqui.
 ― Ele não está na verdade... vindo mais aqui.
 ― Vocês terminaram?
 ― Nós éramos apenas amigos, Coby.
 ― Ninguém pensa isso, além de você.
Olhei para ele, e em seguida, caminhei até a namoradeira, pegando a minha tigela e, em seguida, sentei ao lado de meu irmão.
 ― Ele não me quer.
 ― Ele queria.
 ― Não mais. Eu estraguei tudo.
 ― Como?
 ― Realmente não quero falar sobre isso. É uma história longa e chata.
 ― Qualquer coisa a ver com os Maddoxs nunca é chato. ― Ele colocou colheradas da sopa em sua boca, e então esperou. Ele era como uma pessoa diferente, quando estava limpo.
Ele se preocupava com as coisas. Ele escutava.
 ― Nós vínhamos passando praticamente todos os dias juntos.
 ― Eu sei dessa parte.
Eu suspirei.
 ― Ele me beijou. Isso me assustou. Então, ele me disse que me amava.
 ― Ambas horríveis, coisas muito ruins, ― disse ele, balançando a cabeça.
 ― Não deboche de mim.
 ― Sinto muito.
 ― São coisas muito ruins. T.J. reservou um voo para a Califórnia depois que disse a ele sobre o beijo.
 ― Faz todo o sentido do ponto de vista de um homem.
 ― Trent me implorou para não ir. Ele me disse que me amava no aeroporto, e eu fui embora. ― Meus olhos se encheram de lágrimas, enquanto minha mente repassava a cena, e me lembrei da expressão no rosto de Trenton. ― Enquanto eu estava longe, T.J. e eu descobrimos que nos amávamos, mas não havia nenhuma maneira de fazer isso funcionar.
 ― Então, vocês terminaram?
 ― Mais ou menos. Não de verdade.
 ― Vamos, Camille. Somos adultos. Se isso estava implícito...
 ― Não importa, ― eu disse, rolando uma cenoura em cubos em torno do caldo. ― Trent mal fala comigo. Ele me odeia.
 ― Você já disse a ele o que aconteceu na Califórnia? ―
 ― Não. O que eu deveria dizer. 'T.J. não me quer, então você pode ter a mim agora?
 ― É isso o que é?
 ― Não. Quer dizer, mais ou menos, mas Trenton não é a segunda opção. Não quero que ele se sinta assim. E mesmo que de alguma forma ele me perdoe, sempre há o fato de que seria completamente errado ir de um para o outro.
 ― Eles são meninos grandes, Cami. Eles vão superar isso.
Nós terminamos nossa comida em silêncio, e então Coby pegou minha tigela e levou a pia.
 ― Tenho que ir embora. Só queria trazer-lhe isto. ― Ele puxou um cheque de sua carteira.
 ― Obrigada, ― eu disse. Meus olhos se arregalaram quando vi a quantia. ― Você não tinha que pagá-lo de uma vez.
 ― Tenho um segundo emprego. Não está me deixando mal.
Eu o abracei.
 ― Eu te amo. Estou tão orgulhosa de você, e estou tão feliz que você vai ficar bem.
 ― Todos nós vamos ficar bem. Você vai ver, ― disse ele com um pequeno sorriso.
No sábado seguinte, Trenton entrou na Skin Deep com uma hora de atraso, o rosto vermelho e apressado. O caminhão de seu pai havia quebrado e ele tentou fazê-lo funcionar. Trenton não veio com a informação. Para descobrir tudo sobre Trenton desde a Califórnia, eu tinha que pedir a Hazel.
No final da primeira semana de novembro, T.J. só tinha ligado uma vez para dizer que ele estava na cidade a trabalho, mas ele não seria capaz de dizer oi, e Trenton e eu mal tínhamos nos falado. Ele veio para o Red um punhado de vezes, recebendo suas bebidas de Raegan, Blia, ou Jorie, e todas as noites, um pouco antes da última chamada, ele podia ser visto saindo com uma garota diferente.
Tentei não me comportar de maneira diferente no Skin Deep. Tecnicamente, eu não precisava do segundo emprego, mas gostava de trabalhar lá e do dinheiro extra, e gostava demais de ver Trenton para sair, mesmo que ele estivesse me ignorando.
Era fácil enganar Calvin, mas Hazel sabia tudo. Ela iria passar o tempo com Trenton em sua sala, e, em seguida, piscava para mim, quando ela saía. Não tinha certeza se ela queriaser reconfortante ou ela pensava que nós compartilhávamos alguma informação privilegiada que eu não estava a par.
A porta soou, e Travis e Shepley entraram.
 ― Olá, rapazes. ― Eu sorri.
 ― Você está emprestando sua beleza para cada antro na cidade? ― perguntou Travis, disparando seu sorriso mais encantador.
 ― Alguém está de bom humor, ― disse eu. ― O que podemos fazer por você hoje?
 ― Não pergunte, ― disse Shepley. Ele definitivamente não estava de bom humor.
 ― Vou fazer um par de tatuagens. Onde está meu irmão de merda tatuador?
Trenton enfiou a cabeça para fora da sua sala.
 ― Cara de bunda!
Verifiquei Travis, e uma vez que ele assinou os formulários, os Maddoxes caminharam de volta para a sala de Trenton.
 ― Você está fodidamente brincando comigo! ― Trenton gritou, uivando de tanto rir. ― Você é uma marica!
 ― Cale a boca, filho da puta, e apenas faça!
Hazel saiu no corredor e parou na porta de Trenton. Logo ela estava rindo também. A máquina de tatuagem começou a zumbir, e durante a hora seguinte, a sala de Trenton estava cheia de risos e insultos brincalhões.
Quando eles se encontraram de volta no balcão, Travis tinha um curativo sobre seu pulso. Ele estava radiante. Shepley não estava.
 ― Isso tem me fodido de tantas maneiras, ― ele resmungou.
Trenton deu um tapa e, em seguida, agarrou os ombros de Shepley.
 ― Oh, Shep. Vai ficar tudo bem. Travis vai trabalhar sua magia, e Abby vai ficar bem com isso.
 ― Abby? Estou falando de América! ― Disse ele. ― E se ela ficar chateada porque eu não me marquei com o nome dela? E se Abby não ficar bem com isso, ela termina com Travis, e então isso causa problemas com Mare e eu? Estou ferrado!
Os irmãos riram e Shepley os imitou, claramente chateado com a sua falta de preocupação.
Trenton sorriu para seu irmão mais novo.
 ― Estou feliz por você.
Travis não conseguia conter o sorriso largo que iluminou todo o seu rosto.
 ― Obrigado, idiota. ― Um abraço de irmão ombro a ombro começou, e, em seguida, Travis e Shepley entraram no Charger e saíram.
Trenton estava sorrindo quando ele se virou, mas o momento em que seus olhos caíram sobre mim, o sorriso desapareceu, e ele voltou para sua sala.
Estava sentada sozinha à mesa, ouvindo os sussurros dele e de Hazel. Levantei-me e caminhei para sua sala. Ele estava apenas limpando a cadeira. Hazel se endireitou, seus olhos encontraram os de Trenton e, em seguida, olharam para mim para sinalizar que eu estava lá.
 ― Sobre o que vocês estão cochichando? ― Eu perguntei, tentando sorrir.
 ― Meu próximo cliente não está chegando em breve? ― perguntou Hazel.
Olhei para o pequeno relógio de metal na parede.
 ― Onze minutos. Trent, você não tem um compromisso tão cedo. Salvo as possíveis entradas, seria um bom momento para iniciar o esboço para aquela tatuagem que falamos há algum tempo.
Ele olhou para mim, enquanto ele limpava, e depois balançou a cabeça.
 ― Eu não posso hoje, Cami.
 ― Por que não? ― Eu perguntei.
Hazel saiu, deixando-nos ficar sozinhos. Trenton estendeu a mão e cavou da tigela doces que ficam no balcão mais próximo a ele. Ele desembrulhou um pequeno pirulito e colocou-o na boca.
 ― Jason disse que ele poderia vir esta tarde por agora, se ele saísse do treino em tempo.
Fiz uma careta.
 ― Basta dizer que você não quer, Trent. Não minta. ― Sai e sentei-me no banco por trás da recepção num acesso de raiva. Nem dez minutos depois, um caminhão entrou no estacionamento, e Jason Brazil passou através da porta.
 ― Trent está ocupado? ― ele perguntou.
Curvei e afundei de volta no meu lugar. Toda a minha cara parecia que tinha pegado fogo quando a adrenalina da pura humilhação queimou em minhas veias.
 ― Você está bem? ― Perguntou o Brazil.
 ― Sim, ― eu disse. ― Ele está lá atrás.
Dia após dia Trenton me ignorou, mas eu não ousava enfrentá-lo depois daquilo. Era particularmente doloroso porque o seu relacionamento com Hazel não tinha mudado, e ele era mais do que tagarela com Raegan quando ele ia para o Red.
Ele estava deliberadamente me dando um gelo, e eu odiava isso. O segundo sábado de novembro, Trenton entrou no Red sozinho e se sentou em seu novo banco favorito na frente de Raegan. Ela estava ocupada com seu cliente regular, Marty, mas Trenton sentou lá pacientemente, não olhando nem uma vez para mim para o serviço. Meu coração se afundou. As últimas semanas estando perto de Trenton tinham me ensinado a apreciar a miséria que Kody atravessou de toda quarta-feira a domingo à noite desde que ele e Raegan tinham terminado. Olhei para Kody, vendo-o olhar na direção de Raegan com olhos tristes. Ele fez isso dezenas de vezes a cada noite.
Meu cliente regular, Baker, tinha uma caneca gelada cheia, então eu andei para o lado de Raegan no bar, tirei a tampa da cerveja favorita de Trenton, e entreguei a ele.
Ele acenou com a cabeça uma vez e, em seguida, estendeu a mão para pegá-la, mas algo tomou conta de mim, e eu puxei-a de volta.
Os olhos de Trenton apareceram para encontrar os meus por menos de um segundo, uma combinação de choque e confusão em seu rosto.
 ― Ok, Maddox. Já se passaram cinco semanas.
 ― Cinco semanas de quê? ― perguntou Trenton.
 ― Miller Lite! ― Um cara pediu por trás de Trenton.
Concordei com um aceno de cabeça, e depois baixei o queixo para Trenton, cruzando os braços e deixando a garrafa de cerveja ficar confortavelmente na dobra do meu braço.
 ― Cinco semanas de fingimento, ― disse eu.
Trenton olhou para trás em cada lado, em toda parte, menos para mim. Ele balançou a cabeça um par de vezes.
 ― Não sei do que você está falando.
 ― Tudo bem. Então você me odeia. ― As palavras pareciam como um veneno saindo da minha boca. ― Quer que eu saia do Skin Deep?
 ― O quê? ― ele disse, finalmente olhando para mim pela primeira vez em semanas.
 ― Eu posso fazê-lo se é isso que você precisa.
 ― Por que você sairia? ― Ele questionou.
 ― Responda à minha pergunta, primeiro.
 ― Que pergunta?
 ― Você me odeia?
 ― Cami, eu nunca poderia te odiar. Mesmo que eu quisesse. Confie em mim, eu tentei.
 ― Então por que você não fala mais comigo?
Seu rosto contorceu em desgosto. Ele começou a falar, e depois mudou de ideia. Ele acendeu um cigarro e deu uma tragada.
Puxei-o entre seus dedos e quebrei-o ao meio.
 ― Ora vamos, Cami!
 ― Sinto muito, ok? Podemos, pelo menos, falar sobre isso?
 ― Não! ― disse ele, ficando mais agitado a cada segundo. ― Qual é o ponto dessa merda?
 ― Uau. Obrigada.
 ― Você se afastou de mim, Cami.
 ― Eu não mereço que você fale comigo, entendo. Vou dar o meu aviso para Cal amanhã.
O rosto de Trenton contorceu.
 ― Isso é fodidamente estúpido.
 ― Nós dois estamos miseráveis. Não gosto disso mais do que você, mas o que é estúpido é estarmos um a volta do outro, quando não temos que estar.
 ― Tudo bem.
 ― Tudo bem? ― Não tinha certeza do que esperava que ele dissesse, mas não era isso. Tentei sufocar o nó que se formou na minha garganta, mas em vez disso isso ficou maior e as lágrimas começaram a se formar em meus olhos.
Ele estendeu a mão para mim.
 ― Posso ter a minha cerveja agora?
Ri uma vez, em descrença.
 ― Você queria uma reação quando você me beijou e você teve uma.
 ― Se soubesse que você iria pegar um voo para Califórnia e foder alguém, algumas horas depois, eu poderia ter reconsiderado.
 ― Você realmente quer manter o controle de quem está fodendo quem ultimamente? ― Coloquei a cerveja no balcão e comecei a caminhar de volta para a minha estação.
 ― Estou tentando lidar com isso!
Eu virei.
 ― Bem, você está indo muito mal nisso!
Raegan estava olhando para nós, juntamente com todos os outros a uma distância de gritos.
 ― Você viu o Travis no Dia das Bruxas! Ele está fora de controle sobre essa garota! Ela se foi na manhã depois que ele transou com ela na sua primeira vez sem lhe dizer adeus, e ele destruiu a porra do apartamento! Confie em mim, eu gostaria de bater em algo ou alguém, mas eu não tenho esse luxo, Cami. Tenho que me manter inteiro! Não preciso de você para me julgar sobre o que faço para manter minha mente longe de você!
 ― Não dê desculpas. Especialmente as estúpidas, isto é apenas um insulto.
 ― Você... Eu... Senhor, puta merda, Camille! Eu pensei que era isso que você queria!
 ― Por que eu iria querer isso? Você é meu melhor amigo! ― Eu senti uma lágrima cair pelo meu rosto, e rapidamente a limpei.
 ― Porque você estava de volta com o babaca Californiano!
 ― De volta com ele? Se você apenas falasse comigo, poderíamos esclarecer isso. Poderíamos...
 ― Não que você já tenha estado com ele, ― ele resmungou, puxando a garrafa para fora do bar. Ele tomou um gole, murmurando algo baixinho.
 ― O quê? ― Eu rebati.
 ― Eu disse que se você gosta de ser um plano de reserva, tudo bem comigo!
 ― Miller Lite, Cami! ― O cara gritou novamente, desta vez menos paciente.
Eu olhei para Trenton.
 ― Plano reserva? Você está fodidamente brincando comigo agora? Tudo o que você pode lidar é com planos de reserva! Com quantos desses você já saiu daqui no último mês?
As bochechas de Trenton coraram. Ele se levantou, chutando o banquinho para trás, mandando-a pelo ar quase até a pista de dança.
 ― Você não é um plano de reserva do caralho, Cami! Por que você está deixando alguém tratá-la como um?
 ― Ele não está me tratando como nada! Não falei com ele em semanas!
 ― Ah, então agora que ele está ignorando você, eu sou bom o suficiente para ser seu amigo?
 ― Eu sinto muito, pensei que nós já éramos amigos!
 ― Miller Lite! Um de vocês poderia fazer o seu maldito trabalho? ― O cara gritou novamente.
Trenton virou, e apontou no rosto do rapaz.
 ― Você fala assim com ela de novo e vou te bater.
Começando com um sorriso irônico, o cara começou a dizer algo mais, mas Trenton não lhe deu a oportunidade. Ele lançou-se, agarrando o rapaz pelo colarinho. Eles caíram no chão, e eu os perdi de vista. Uma multidão rapidamente formou um círculo apertado em volta do local onde eles foram para baixo, e depois de alguns segundos, o público de Trenton recuou, cobriram as suas bocas e gritaram:
 ― Oh! ― em uníssono.
Em poucos segundos, Kody e Gruber desceram sobre eles. De repente, Trenton estava de pé e parecendo como se ele nunca tivesse estado numa briga. Ele nem estava respirando com dificuldade. Ele voltou para sua cerveja e tomou um gole. Sua camiseta estava rasgada a poucos centímetros no colarinho, e seu pescoço e rosto estavam salpicados com o sangue.
Gruber tirou a vítima de Trenton pela entrada lateral, e Kody estava ao lado de Trenton, sem fôlego.
 ― Desculpe, Trent. Você conhece as regras. Tenho que te que pedir para sair.
Trenton assentiu uma vez, deu um último gole, e depois foi embora. Kody o seguiu para fora. Eu abri minha boca para chamá-lo, mas não sabia o que mais dizer. Raegan ficou ao meu lado.
 ― Whoa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Trono de Vidro

Os Instrumentos Mortais

Trono de Vidro