Capítulo 11 - Magnus Bane
Jace se inclinou para frente e bateu a mão contra a partição que os separavam do taxista.
— Vire à esquerda! Esquerda! Eu disse para tomar a Broadway, seu cérebro-morto idiota!
O taxista respondeu com vibrações no volante tão difíceis para a esquerda que Clary foi atirada contra Jace. Ela deixou sair um uivo de ressentimento.
— Por que é que estamos indo para Broadway, afinal?
— Estou com fome — Jace respondeu — e não há nada em casa, exceto sobras do chinês.
Ele tirou o telefone do seu bolso e começou digitar.
— Alec! Acorda! — ele gritou. Clary pôde ouvir um irritado zumbido na outra extremidade. — Nos encontre no Taki. Café da manhã. Sim, você me ouviu. Café da manhã. O quê? É apenas a poucos quarteirões de distância. Vem logo.
Ele desligou e meteu o telefone em um de seus muitos bolsos enquanto paravam no meio-fio. Entregando ao motorista um punhado de notas, Jace empurrou Clary para fora do carro. Quando ele saiu na calçada atrás dela, se espreguiçou como um gato e esticou os braços amplamente.
— Bem-vinda ao maior restaurante de Nova York.
Era um edifício baixo de tijolos que arqueava no meio como um suflê arruinado. Um letreiro de néon estalando e torto pendurado lateralmente indicava o nome do restaurante. Dois homens em longos casacos e chapéus de feltro se inclinaram em frente da porta estreita. Não havia janelas.
— Isso parece como uma prisão — Clary comentou.
Ele apontou para ela.
— Mas em uma prisão você poderia pedir um espaguete Fra Diavolo que faria você querer lamber os dedos? Eu acho que não.
— Eu não preciso de espaguete. Preciso saber o que é Magnus Bane.
— Não é um “o que”, é um “quem.” É um nome.
— Você sabe quem ele é?
— É um bruxo — Jace respondeu, em sua voz mais moderada. — Apenas um bruxo poderia por um bloqueio em sua mente como este. Ou talvez um dos Irmãos do Silêncio, mas claramente não foi um deles.
— Você ouviu falar desse bruxo? — Clary exigiu, já que estava rapidamente cansando da voz moderada de Jace.
— O nome soa familiar...
— Ei!
Era Alec, parecendo como se tivesse caído para fora da cama e colocado jeans por cima do pijama. Seu cabelo despenteado, arrepiado selvagemente em torno de sua cabeça. Ele correu na direção deles, os olhos sobre Jace, ignorando Clary, como de costume.
— Izzy está a caminho. Ela está trazendo o mundano.
— Simon? De onde é que ele veio? — Jace perguntou.
— Ele apareceu esta manhã. Não podia ficar longe de Izzy, eu acho. Patético — Alec pareceu divertido. Clary queria chutá-lo. — De qualquer maneira, nós vamos entrar ou o quê? Estou morrendo de fome.
— Eu também — Jace concordou — eu poderia realmente atacar algumas caudas de rato fritas.
— Algumas o quê? — Clary perguntou, certa de ter ouvido errado.
Jace riu para ela.
— Relaxe. É apenas uma refeição.
Eles foram parados na porta da frente por um homem empertigado. Enquanto ele se endireitava, Clary pegou um vislumbre do rosto sob o chapéu. Sua pele era vermelha escura, suas mãos quadradas terminavam em unhas azuis.
Clary se sentiu endurecer, mas Jace e Alec pareceram despreocupados. Eles disseram algo para o homem, que acenou e deu um passo atrás, permitindo a passagem deles.
— Jace — Clary sussurrou enquanto a porta fechava atrás deles — quem era aquele?
— Você quer dizer o Clancy? — Jace perguntou, olhando ao redor da iluminação brilhante do restaurante.
Era agradável no interior, apesar da falta de janelas. Aconchegantes cabines aninhadas uma contra outras, cada uma enfileirada com brilhantes estofados coloridos. Adoravelmente não combinando, louças de barro estavam alinhadas no balcão, atrás do qual ficava uma garota loira em um avental de garçonete rosa e branco, agilmente contando o troco para um homem atarracado em uma camisa de flanela. Ela viu Jace, acenou e gesticulou para que eles sentassem onde quisessem.
— Clancy mantém fora os indesejáveis — Jace explicou, juntando-se a ela em uma das cabines.
— Ele é um demônio — Clary sibilou.
Vários frequentadores se viraram para olhar para ela – um garoto com dreads pontudos azuis estava sentado próximo a uma bonita garota indígena com um longo cabelo preto e asas douradas como neblina brotando de suas costas. O garoto ficou obscuramente carrancudo. Clary ficou feliz por o restaurante estar quase vazio.
— Não, ele não é — Jace disse, deslizando em uma cabine.
Clary moveu-se para se sentar ao lado dele, mas Alec já estava lá. Ela sentou delicadamente no banco da cabine oposto a eles, seu braço ainda rígido, apesar da ajuda de Jace. Ela se sentia oca por dentro, como se os Irmãos do Silêncio tivessem chegado em seu interior e escavado para fora dela, deixando-a leve e tonta.
— Ele é um ifrit — Jace explicou — bruxos sem magia. Metade demônios que não podem lançar feitiços por qualquer razão.
— Pobres bastardos — Alec disse, pegando seu menu.
Clary pegou seu menu também, e olhou. Gafanhotos e mel eram retratados como o especial do dia, tal como pratos de carne crua, peixes crus e algo chamado sanduíche de morcego tostado. Uma página da seção de bebidas era devotada a diferentes tipos de sangue que eles tinham no bar – para o alívio de Clary, eles eram diferentes tipos de sangue animal, classificado como tipo A, O ou B negativo.
— Quem come peixe cru inteiro? — ela perguntou em voz alta.
— Kelpies — Alec respondeu — selkies. Talvez ocasionalmente o nixie.
— Não peça nenhuma comida de fada — Jace disse, olhando para ela por cima do seu menu — ela tende a deixar os humanos um pouco loucos. Num minuto você está mastigando uma ameixa de fada, no próximo você estará correndo nu pela Avenida Madison com galhos em sua cabeça. Não — ele adicionou apressadamente — que isso alguma vez tenha acontecido comigo.
Alec riu.
— Você se lembra... — ele começou, e se lançou em uma história que continha muitos nomes misteriosos e nomes próprios que Clary nem sequer se incomodou em tentar seguir.
Em vez disso, ela estava olhando para Alec, o observando enquanto ele estava falando para Jace. Havia uma cinética, uma energia quase febril nele que não tinha estado lá antes. Alguma coisa sobre Jace que o estimulava, trazendo-o em foco. Se estivesse desenhando os dois, ela pensou, poderia fazer Jace um pouco embaçado, quanto a Alec se destacaria, todo acentuado, planos e ângulos claros.
Jace estava olhando para baixo enquanto Alec falava, sorrindo um pouco e tocando seu copo de água. Clary sentiu que ele estava pensando em outras coisas. Sentiu uma súbita simpatia por Alec. Jace poderia não ser uma pessoa fácil de se lidar. Eu estava rindo de você porque declarações de amor me divertem, especialmente quando não são correspondidas.
Jace olhou enquanto a garçonete passava.
— Nós nunca vamos ter um café? — ele disse em voz alta, interrompendo Alec no meio da frase.
Alec cessou, a sua energia sumindo.
— Eu...
Clary interrompeu apressadamente.
— Para o que são todas essas carnes cruas? — perguntou, indicando a terceira página de seu menu.
— Lobisomens — Jace respondeu — embora não me importe ter um bife sangrento de vez em quando — ele se inclinou sobre a mesa e virou as páginas do menu de Clary — comida humana está na parte de trás.
Ela examinou as perfeitamente normais seleções do menu com uma sensação de entorpecimento. Era tudo demais.
— Eles têm smoothies aqui?
— Eles tem esse smoothie de damasco e ameixa – com mel de flor selvagem – que é simplesmente divino — Isabelle respondeu, aparecendo com Simon a seu lado — chega pra lá — pediu a Clary, que ficou tão perto da parede que podia sentir o frio dos tijolos pressionando em seu braço.
Simon deslizou próximo a Isabelle, lhe oferecendo um meio-sorriso envergonhado que ela não retornou.
— Você deveria pegar um.
Clary não tinha certeza se Isabelle estava falando com ela ou com Simon, então não disse nada. O cabelo de Isabelle fazia cócegas em seu rosto, cheirando a algum tipo de perfume de baunilha. Ela odiava perfume de baunilha. Nunca conseguiu entender porque algumas garotas sentiam a necessidade de cheirar como uma sobremesa.
— Então, como foi na Cidade dos Ossos? — Isabelle perguntou, folheando seu menu aberto. — Você achou o que tinha na cabeça de Clary?
— Nós conseguimos um nome — Jace disse. — Magnus...
— Cala a boca — Alec sibilou, dando um golpe em Jace com o menu fechado.
Jace olhou ofendido.
— Jesus — ele esfregou seu braço — qual é o seu problema?
— Este lugar está cheio de seres do Submundo. Você sabe disso. Eu pensei que você quisesse manter os detalhes da investigação em segredo.
— Investigação? — Isabelle gargalhou. — Agora nós somos detetives? Talvez devêssemos ter codinomes.
— Boa ideia — Jace disse — eu posso ser o Barão Hotschaft Von Hugenstein.
Alec cuspiu a água de volta em seu copo. Nesse momento, a garçonete voltou para pegar seus pedidos. De perto ela ainda era uma linda garota loira, mas seus olhos eram totalmente inquietantes – inteiramente azuis, sem nenhum branco ou qualquer pupila neles. Ela sorriu com afiados dentinhos.
— Já sabem o que vocês querem?
Jace sorriu.
— O de sempre — ele disse, e recebeu um sorriso da garçonete em troca.
— Eu também — Alec falou em concordância, embora ele não chegasse a sorrir.
Isabelle fastidiosamente pediu um smoothie de frutas, Simon pediu um café e Clary, após um momento de hesitação, escolheu um copo de café grande e panquecas de coco. A garçonete piscou um olho azul para ela e saiu em disparada.
— Ela é uma ifrit também? — Clary perguntou, olhando-a.
— Kaelie? Não. Parte fey, eu acho — disse Jace.
— Ela tem olhos de nixie — Isabelle falou pensativamente.
— Você realmente não sabe o que ela é? — perguntou Simon.
Jace balançou sua cabeça.
— Eu respeito a privacidade dela — ele cutucou Alec — hey, me deixe sair por um segundo.
Zangado, Alec se deslocou de lado. Clary olhava Jace enquanto ele avançava até Kaelie, que estava inclinada contra o bar, falando com o cozinheiro através de uma passagem para a cozinha. Tudo que Clary pôde ver do cozinheiro era uma cabeça inclinada em um chapéu branco de chef. Altas e peludas orelhas apareciam através dos buracos cortados em ambos os lados do chapéu.
Kaelie virou-se para sorrir para Jace, que colocou um braço em torno dela. Ela se aconchegou nele. Clary se perguntou se isso era o que Jace entendia por respeitar a sua privacidade.
Isabelle rolou seus olhos.
— Ele realmente não deveria importunar a garçonete com isso.
Alec olhou para ela.
— Você não acha que ele quer dizer isso? Digo, que ele gosta dela.
Isabelle deu de ombros.
— Ela é uma criatura do Submundo — lembrou, como se isso explicasse tudo.
— Eu não entendi — Clary disse.
Isabelle olhou para ela sem interesse.
— Não entendeu o quê?
— Toda essa coisa de seres do Submundo. Vocês não os caçam porque eles não são exatamente demônios, mas eles não são exatamente pessoas, também. Vampiros matam, eles bebem sangue...
— Apenas vampiros nocivos bebem sangue humano vindo de pessoas vivas — inseriu Jace — estes, nós temos permissão para matar.
— E lobisomens são o quê? Apenas filhotes que cresceram demais?
— Eles matam demônios — Isabelle disse. — Então se eles não nos incomodam, nós não incomodamos eles.
Como deixar aranhas vivas porque elas matam mosquitos. Clary pensou.
— Então eles são bons o suficiente para se deixar viver, bons o suficiente para fazer a comida para vocês, bons o suficiente para flertar – mas não realmente bons o suficiente? Quero dizer, não tão bons como as pessoas.
Isabelle e Alec olharam para ela como se ela estivesse falando outra língua.
— Diferente das pessoas — Alec disse finalmente.
— Melhor do que os mundanos? — Simon perguntou.
— Não — Isabelle disse decididamente — você poderia tornar um mundano em um Caçador de Sombras. Quero dizer, nós viemos dos mundanos. Mas você nunca poderia transformar um ser do Submundo em um dos da Clave. Eles não podem suportar as Runas.
— Então eles são fracos? — Clary perguntou.
— Eu não diria isso — Jace respondeu, deslizando para seu assento próximo a Alec. Seu cabelo estava bagunçado e havia uma marca de batom em sua bochecha — pelo menos não perto de um peri, um djinn, um ifrit e Deus sabe o que está escutando.
Ele sorriu quando Kaelie apareceu e distribuiu a comida.
Clary julgou suas panquecas consideravelmente. Elas pareciam fantásticas: douradas, encharcadas com mel. Deu uma mordida enquanto Kaelie se afastava sobre os saltos altos.
As panquecas eram deliciosas.
— Eu disse que era o melhor restaurante de Manhattan — Jace comentou, comendo suas batatas fritas com os dedos.
Ela olhou para Simon, que estava mexendo seu café, de cabeça baixa.
— Mmmf — disse Alec, cuja boca estava cheia.
— Certo — Jace falou. Ele olhou para Clary. — Não é uma via de mão única. Podemos não gostar sempre de seres do Submundo, mas eles não gostam de nós, também. Uns cem anos de Pacto não pode acabar com um milhão de anos de hostilidade.
— Tenho certeza de que ela não sabe o que o Pacto é, Jace — Isabelle falou, mexendo a colher.
— Sei, na verdade — Clary respondeu.
— Eu não — Simon interviu.
— Sim, mas ninguém se importa o que você sabe — Jace replicou, examinado uma batata frita antes de dar uma mordida nela — eu gosto da companhia de certas criaturas do Submundo em certas horas e lugares. Mas nós realmente não somos convidados para as mesmas festas.
— Espere — Isabelle disse de repente, sentando-se ereta — que nome você falou antes? — Ela exigiu, virando-se para Jace. — O nome na mente de Clary.
— Eu não falei. Pelo menos, eu não terminei. É Magnus Bane.
— Não pode ser, mas estou quase certa... — Isabelle procurou em sua bolsa e puxou um pedaço de papel azul dobrado. Ela sacudiu entre os dedos. — Olhe para isso.
Alec pegou o papel de sua mão, olhou-o com um encolher de ombros e o entregou a Jace.
— É um convite para uma festa. Em algum lugar no Brooklyn — ele disse. — Eu odeio Brooklyn.
— Não seja um esnobe — Jace respondeu.
Então, tal como Isabelle, ele se sentou ereto e fixou o olhar.
— Onde você conseguiu isso, Izzy?
Ela floreou a mão pelo ar.
— Foi daquele kelpie no Pandemônio. Ele disse que seria fantástico. Tinha uma pilha deles.
— O que é isso? — Clary demandou impacientemente. — Vocês vão mostrar para o resto de nós ou não?
Jace girou o convite para que todos pudessem ler. Estava impresso em um papel fino, quase um pergaminho, em uma escrita fina e elegante, com forma de aranha. Ele anunciava uma reunião na humilde casa de Magnus, o Magnífico Bruxo, e prometia aos participantes "Uma noite de delícias extasiadas além de suas selvagens imaginações".
— Magnus — Simon leu — Magnus como Magnus Bane.
— Eu duvido que haja muitos bruxos chamados Magnus na Area Tristate — Jace disse.
Alec piscou.
— Isso significa que nós temos que ir a essa festa? — ele perguntou para ninguém em particular.
— Nós não temos que fazer nada — Jace respondeu, lendo a fina impressão no convite — mas de acordo com isso, Magnus Bane é o Alto Bruxo do Brooklyn — ele olhou para Clary — mesmo eu estou um pouco curioso do por que o nome do Maior Bruxo do Brooklyn está fazendo dentro da sua cabeça.
***
A festa não iria começar até a meia-noite, então com o dia inteiro para matar, Jace e Alec desapareceram na sala de armas e Isabelle e Simon anunciaram a sua intenção de caminhar no Central Park, assim ela poderia mostrar os círculos de fadas.
Simon perguntou a Clary se ela queria vir junto. Asfixiando uma fúria assassina, Clary recusou por motivo de exaustão.
O que não era exatamente uma mentira – ela estava exausta, seu corpo continuava enfraquecido pelos pós-efeitos do veneno e também por ter acordado cedo demais.
Ela deitou em sua cama no Instituto, chutando seus sapatos, disposta a se por para dormir, mas o sono não veio. A cafeína em suas veias efervescia como água gaseificada, e sua mente estava cheia de imagens se movimentando. Ela continuava vendo o rosto de sua mãe, sua expressão de pânico. Continuava vendo as Estrelas Falantes, ouvindo as vozes dos Irmãos do Silêncio em sua cabeça.
Porque havia um bloqueio em sua mente? Porque um poderoso bruxo teria posto aquilo, e qual o propósito? Ela se perguntou quais memórias podia ter perdido, quais experiências teve que não podia evocar agora. Ou talvez todas as coisas que ela pensava que se lembrava eram uma mentira...?
Ela se sentou, incapaz de suportar os pensamentos que a tomavam. Pés descalços, ela percorreu o corredor em direção à biblioteca. Talvez Hodge pudesse ajudá-la.
Mas a biblioteca estava vazia. A luz da tarde se inclinava entre as cortinas separadas, despejando listras douradas através do piso. Sobre a mesa, descansava o livro que Hodge estava lendo mais cedo, a capa de couro reluzindo. Ao lado estava Hugo, dormindo em seu poleiro, o bico guardado debaixo da asa.
Minha mãe conhecia esse livro, Clary pensou. Ela tocou nele, leu-o. A dor por segurar algo que era uma parte da vida de sua mãe foi como um ácido em seu estômago. Ela cruzou a sala rapidamente, posicionando suas mãos no livro. Ele estava morno, o couro aquecido pelo sol. Ela levantou a capa.
Algo dobrado entre as páginas deslizou para fora e flutuou para o chão aos seus pés. Clary se curvou pare recuperá-lo, abrindo-o em reflexo.
Era uma fotografia de um grupo de jovens, nenhum muito mais velho do que a própria Clary. Ela sabia que estava segurando algo de vinte anos atrás, não por causa das roupas que eles estavam usando – que, como a maioria do vestuário dos Caçadores de Sombras, estavam indefinidos em preto – mas por que ela reconheceu sua mãe instantaneamente: Jocelyn com não mais do que dezessete ou dezoito anos, seu cabelo partido ao meio para trás e seu rosto um pouco arredondado, o queixo e a boca menos definidos.
Ela se parece comigo, Clary pensou.
O braço de Jocelyn estava ao redor de um garoto que Clary não reconheceu. Isso lhe deu um sobressalto. Ela nunca pensou em sua mãe se envolvendo com alguém que não fosse seu pai, desde que Jocelyn nunca tinha tido um encontro ou se interessado em romance. Ela não era como a maioria das mães solteiras, que perambulavam na Associação dos Pais e Mestres para provavelmente procurar por pais, ou a mãe de Simon, que estava sempre checando seu perfil num site de relacionamentos.
O garoto era bonito, com cabelos tão loiros que pareciam quase brancos, e olhos negros.
— Este é Valentim — uma voz falou no seu cotovelo — quando ele tinha dezessete anos.
Clary deu um pulo para trás, quase derrubando a foto. Hugo grasnou assustado antes de voltar para seu poleiro, penas agitadas.
Era Hodge, olhando para ela com olhos curiosos.
— Me desculpe — ela disse, colocando a fotografia sobre a mesa e indo rapidamente para trás — eu não queria bisbilhotar suas coisas.
— Está tudo bem — ele tocou a fotografia com uma cicatrizada e descorada mão – um estranho contraste com a limpa pureza do punho de seu tweed. — É um pedaço de seu passado, depois de tudo.
Clary se impulsionou de volta em direção à mesa como se a foto exercesse uma atração magnética. O garoto de cabelo branco na foto estava sorrindo para Jocelyn, seus olhos apertados de um jeito que os garotos apertam os olhos quando realmente gostam de você. Ninguém, Clary pensou, tinha olhado para ela daquele jeito.
Valentim, com sua frieza, as feições do rosto finas, parecia absolutamente o contrário do seu próprio pai, que tinha um sorriso aberto e cabelos brilhantes que ela tinha herdado.
— Valentim parece... bem legal.
— Legal ele não era — Hodge respondeu, com um sorriso torto — mas era charmoso, inteligente e muito convincente. Você reconhece mais alguém?
Ela olhou novamente. Parado em pé atrás de Valentim, um pouco a esquerda, estava um garoto magro com um cabelo espetado castanho claro. Ele tinha ombros largos para alguém que não tinha crescido em sua altura ainda.
— É você?
Hodge concordou.
— E...?
Ela teve que olhar duas vezes antes que identificasse alguém que conhecia: tão jovem que era quase irreconhecível. Os óculos e os olhos por trás deles, azul-claros como água do mar.
— Luke.
— Lucian. E aqui — inclinando sobre a foto, Hodge indicou um casal adolescente parecendo elegante, ambos de cabelos escuros. A garota era meia cabeça mais alta que o rapaz. Suas características eram estreitas e predatórias, quase cruéis. — Os Lightwood. E ali — ele indicou um rapaz muito bonito com cabelos ondulados e escuros, seu rosto emoldurado por um forte queixo quadrado. — É Michael Wayland.
— Ele não se parece nada com Jace.
— Jace lembra a mãe.
— Isso é como uma foto de turma? — Clary perguntou.
— Não é bem assim. Este é um retrato do Círculo, tirada no ano em que foi formado. É por isso que Valentim, o líder, está na frente, e Luke está em seu lado direito. Ele era o segundo de Valentim no comando.
Clary virou seu olhar para longe.
— Eu ainda não entendo porque minha mãe iria se juntar a algo como isso.
— Você precisa entender...
— Você continua dizendo isso — Clary interrompeu zangada — eu não vejo por que preciso entender coisa alguma. Você me diz a verdade, e eu decido se vou compreender ou não.
O canto da boca de Hodge contraiu.
— Como você quiser — ele pausou para levantar uma mão e afastar Hugo, que estava se empertigando ao longo da borda da importante mesa — o Pacto nunca teve o apoio de toda a Clave, principalmente das famílias mais veneráveis, as apegadas aos velhos tempos, quando seres do Submundo eram assassinados. Não apenas pelo ódio, mas porque isso os fazia se sentir mais seguros. É mais fácil enfrentar uma ameaça como um número grande, um grupo, não individualmente, que precisa-se avaliar um a um... e a grande maioria de nós conhecia alguém que tinha sido ferido ou morto por um ser do Submundo. Não há nada — ele acrescentou — nada como o absolutismo moral dos jovens. É fácil, enquanto se é criança, acreditar em bons e maus, em claro e escuro. Valentim nunca perdeu isso – nem seu idealismo destrutivo, nem sua apaixonada aversão a qualquer coisa que ele considerava “não-humano”.
— Mas ele amava a minha mãe — disse Clary.
— Sim — Hodge concordou — ele amava sua mãe. E amava Idris...
— O que há de tão grande sobre Idris? — Clary perguntou, ouvindo a irritação em sua própria voz.
— Ela era — Hodge começou, e se corrigiu — ela é, o lar para os Nephilim, onde eles podem ser verdadeiramente eles mesmos, um lugar onde não há necessidade de se esconder ou de encantamentos. Um lugar abençoado pelo Anjo. Você nunca terá visto uma cidade de verdade até que veja Alicante e suas torres de vidro. É mais linda do que você pode imaginar.
Havia um rasgo de dor em sua voz.
Clary pensou subitamente em seu sonho.
— Eles sempre... dançam na Cidade de Vidro?
Hodge piscou para ela como se estivesse despertando de um sonho.
— Toda semana. Eu nunca participei, mas sua mãe sim, e Valentim — ele riu suavemente — eu era mais um estudioso. Passava meus dias na biblioteca de Alicante. Os livros que você vê aqui são apenas uma fração dos tesouros que eles possuem. Eu achei que talvez pudesse me juntar a Irmandade algum dia, mas depois do que fiz, é claro, eles não me quiseram.
— Sinto muito — Clary disse desajeitadamente.
Sua mente ainda cheia das memórias de seu sonho. Havia uma fonte de sereia onde eles dançavam? Valentim usava branco, de modo que sua mãe podia ver as Marcas em sua pele, mesmo através de sua camisa?
— Eu posso ficar com isso? — ela perguntou, indicando a fotografia.
Um cintilar de hesitação passou pelo rosto de Hodge.
— Eu preferiria que você não mostrasse a Jace. Ele já tem o suficiente a lidar sem fotos de seu pai morto vindo à tona.
— É claro — Clary abraçou a foto em seu peito. — Obrigada.
— Não é nada — ele olhou para ela questionadoramente — você veio a biblioteca para me ver, ou por algum outro motivo?
— Eu estava me perguntando se você tinha ouvido a resposta da Clave. Sobre o Cálice. E... minha mãe.
— Eu tive uma resposta curta esta manhã.
Ela podia ouvir o entusiasmo em sua própria voz.
— Eles vão enviar pessoas? Caçadores de Sombras?
Hodge pareceu afastar-se dela.
— Sim, eles vão.
— Porque eles não ficam aqui? — ela perguntou.
— Existe uma certa preocupação de que o Instituto esteja sendo vigiado por Valentim. Quanto menos ele souber, melhor.
Ele viu a sua miserável expressão, e suspirou.
— Sinto muito, eu não poder dizer mais, Clarissa. Não sou muito confiável para a Clave, mesmo agora. Me disseram muito pouco. Eu gostaria de poder te ajudar.
Houve alguma coisa na tristeza em sua voz que a fez relutar em insistir para obter mais informações.
— Você pode. Eu não consigo dormir. Estou me mantendo pensando muito. Você poderia...
— Ah, uma mente inquieta — sua voz estava cheia de compaixão — posso te dar alguma coisa para isso. Espere aqui.
***
A poção que Hodge lhe deu cheirava agradavelmente a zimbro e a folhas. Clary mantinha aberto o frasco e o cheirava em seu caminho de volta para o corredor.
Infelizmente, o frasco ainda estava aberto quando ela entrou seu quarto e encontrou Jace estirado em sua cama, olhando para o seu caderno de esboços. Com um pequeno guincho de surpresa, ela largou o frasco e ele estornou ao longo do chão, derramando o líquido verde pálido na madeira.
— Oh, querida — Jace disse, se sentando, o caderno de esboços abandonado. — Espero que não seja nada importante.
— Era uma poção para dormir — ela respondeu com raiva, tocando o frasco com a ponta de um tênis — e agora já era.
— Se pelo menos Simon estivesse aqui. Ele provavelmente poderia aborrecê-la até você dormir.
Clary não estava com humor para defender Simon. Em vez disso, ela pegou o caderno de esboços.
— Eu geralmente não deixo as pessoas olharem isso.
— Por que não? — Jace parecia desgrenhado, como se ele próprio estivesse dormindo. — Você é uma artista muito boa. Às vezes, excelente.
— Bom, porque isso é como um diário. Exceto que eu não penso em palavras, eu penso em imagens, por isso eu desenho tudo. Mas ainda é muito privado.
Ela se perguntou se soava tão louca quanto suspeitava.
Jace pareceu ferido.
— Um diário sem nenhum desenho meu nele? Onde estão as fantasias tórridas? As capas de novela de romance? O...
— Todas as garotas que você conhece se apaixonam por você? — Clary perguntou.
A pergunta pareceu murchá-lo, como um alfinete furando um balão.
— Não é paixão — ele disse, depois de uma pausa. — Pelo menos...
— Você podia tentar não ser encantador o tempo todo. Poderia ser um alivio para todos.
Ele olhou para suas mãos. Eram como as mãos de Hodge, flocos de neve branco minúsculos como cicatrizes, mas a pele era jovem e sem marcas.
— Se você está realmente cansada, eu poderia te colocar para dormir — ele disse — te contar história para dormir.
Ela olhou para ele.
— Você está falando sério?
— Estou sempre sério.
Ela se perguntou se foi o cansaço que fez ambos ficarem um pouco loucos. Mas Jace não parecia cansado. Ele parecia quase triste. Ela colocou o caderno de esboços na mesa de cabeceira, se curvando lateralmente sobre o travesseiro.
— Ok.
— Feche os olhos.
Ela fechou. Podia ver a luz da lâmpada refletida contra suas pálpebras, como minúsculos prismas.
— Havia uma vez um menino — Jace começou.
Clary interrompeu imediatamente.
— Um menino Caçador de Sombras?
— É claro.
Por um momento, um pouco de divertimento coloriu sua voz. Mas logo tinha ido embora.
— Quando o menino tinha seis anos, seu pai lhe deu um falcão para treinar. “Falcões são aves de rapina – matam aves”, seu pai lhe disse, “como um Caçador de Sombras no céu.” O falcão não gostava do menino, e o menino não gostava dele, também. Seu bico afiado o fazia ficar nervoso, e seus olhos brilhantes sempre pareciam estar observando-o. O animal podia cortá-lo com o bico e as garras quando se aproximava: Por semanas seus pulsos e mãos estavam sempre sangrando. Ele não sabia, mas seu pai tinha selecionado um falcão que tinha vivido na selva mais de um ano, e, portanto, era quase impossível de domar. Porém, o garoto tentou, porque seu pai tinha dito a ele para fazer o falcão ser obediente, e ele queria agradar a seu pai.
“Ele ficou com o falcão constantemente, mantendo-o acordado, falando com ele e até mesmo tocando música para ele, porque um pássaro cansado é mais fácil de domar. Ele usava todo o equipamento: a cinta das pernas, o capuz para vedar os olhos, o cabo, a trela que limitavam o pássaro ao seu pulso. Ele estava mantendo o falcão cego, mas não podia continuar a fazer isso. Em vez disso, ele tentou se sentar onde a ave pudesse vê-lo enquanto ele tocava e alisava suas asas, disposto a confiar nele. Ele alimentava a ave na mão, e de primeira ela não quis comer. Mais tarde ela comeu tão selvagemente que o seu bico cortou a pele da sua palma. Mas o menino estava satisfeito, porque eram progressos, e porque ele queria que a ave o conhecesse, mesmo que a ave tivesse que consumir o seu sangue para que isso acontecesse.
“Ele começou a perceber que aquele falcão era bonito, que as asas finas eram construídas para a velocidade de voo, que era forte e rápido, feroz e suave. Quando mergulhava no chão, era como se movesse como a luz. Quando ele aprendeu a circular e voltar ao seu pulso, o garoto quase gritou com alegria.
“Às vezes o pássaro pulava para o seu ombro e colocava o seu bico no seu cabelo. Ele sabia que a falcão o amava, e quando estava certo de que não fora apenas domesticado, mas perfeitamente domesticado, ele foi até seu pai e lhe mostrou o que tinha feito, esperando que ele se mostrasse orgulhoso.
“Em vez disso o seu pai pegou o pássaro, agora manso e de confiança, nas suas mãos e quebrou o seu pescoço. “Eu lhe disse para torná-lo obediente”, seu pai disse, e largou o corpo sem vida do falcão no chão. “Ao invés disso, você o ensinou a te amar. Falcões não devem ser carinhosos animais de estimação: eles são ferozes e violentos, selvagens e cruéis. Este pássaro não foi domado; ele foi arruinado.”
“Mais tarde, quando seu pai o deixou, o garoto chorou em cima do seu animal, até que eventualmente seu pai enviou um empregado para pegar o corpo da ave e enterrá-la. O menino nunca chorou novamente, e nunca esqueceu do que aprendeu: amar é destruir, e ser amado é ser destruído.
Clary, que tinha estado deitada, respirando com dificuldade, rolou em suas costas e abriu os olhos.
— Essa é uma história horrível — ela disse indignadamente.
Jace tinha puxado as pernas para cima, o queixo apoiado nos joelhos.
— Ela é? — ele disse pensativamente.
— O pai do menino é horrível. Essa é uma história de abuso infantil. Eu deveria saber o que os Caçadores de Sombras pensam ser uma história para dormir. Tudo o que dá é pesadelos para se acordar gritando...
— Às vezes as Marcas podem dar a você pesadelos para se acordar gritando — Jace disse — se você as tiver quando for muito jovem.
Ele olhou para ela cuidadosamente.
A tarde trouxe luz através das cortinas e fez de seu rosto um estudo de contrastes. Contraste, ela pensou. A arte das sombras e luz.
— É uma boa história, se você pensar sobre isso — ele continuou — o pai do menino estava apenas tentando torná-lo mais forte. Inflexível.
— Mas você tem que aprender a se subjugar um pouco — Clary disse com um bocejo.
Apesar do conteúdo da história, o ritmo da voz de Jace a fez se sentir com sono.
— Ou você irá se quebrar.
— Não se você for forte o suficiente — Jace respondeu com firmeza.
Ele se afastou, e Clary sentiu as costas da mão dele alisarem sua bochecha, e percebeu que seus olhos estavam fechando novamente. A exaustão fez seus ossos ficarem líquidos; ela sentiu como se pudesse ser varrida e desaparecer.
Quando caiu no sono, ouviu o eco das palavras em sua mente. Ele me deu tudo o que eu queria. Cavalos, armas, livros, inclusive um falcão de caça.
— Jace — ela tentou dizer, mas o sono a pegou em suas garras, levando-a, e ela ficou em silêncio.
Ela acordou com uma voz urgente.
— Levante-se!
Clary abriu os olhos lentamente. Eles pareciam gelatinosos, colados uns nos outros. Algo fez cócegas em seu rosto. Era o cabelo de alguém. Ela se sentou rapidamente e acertou a sua cabeça em algo duro.
— Uau! Você acertou minha cabeça.
Era uma voz de garota. Isabelle. Ela acendeu a luz próxima a cama e olhou Clary com ressentimento, esfregando seu couro cabeludo.
Ela parecia brilhar à luz da lâmpada – estava usando uma saia longa prateada e uma regata enfeitada com lantejoulas, suas unhas pintadas como moedas brilhantes. Fios de contas prateadas estavam presos em seu cabelo escuro. Ela parecia como uma deusa da lua. Clary odiou-a.
— Bem, ninguém disse para você estar inclinada sobre mim desse jeito. Você praticamente me assustou até a morte.
Clary friccionou sua própria cabeça. Havia uma dor no local um pouco acima da sobrancelha.
— O que é que você quer, afinal?
Isabele indicou o céu escuro da noite do lado de fora.
— É quase meia-noite. Nós temos que ir para a festa, e você ainda não está vestida.
— Eu só tenho isso para usar — Clary disse, indicando seu conjunto de jeans e camiseta. — Isso é um problema?
— Se isso é um problema? — Isabelle olhou como se fosse desmaiar. — É claro que é um problema! Nenhuma criatura do Submundo iria usar essas roupas. E é uma festa. Você vai ficar esquisita se estiver vestida... informal — ela terminou, parecendo como se a palavra que ela desejasse usar fosse muito pior do que “informal”.
— Eu não sabia que precisava de roupas diferentes para sair — Clary disse acidamente — não tenho nenhuma roupa de festa comigo.
— Você só tem que pegar uma emprestada minha.
— Ah, não — Clary pensou na camiseta grande demais e nos jeans. — Quero dizer, eu não poderia. Realmente.
O sorriso de Isabelle era brilhante.
— Eu insisto.
— Eu realmente prefiro vestir minhas próprias roupas — Clary protestou, se contorcendo desconfortavelmente enquanto Isabelle a posicionava em frente ao espelho que ia até o chão em seu quarto.
— Bem, você não pode — Isabelle respondeu. — Você parece como se tivesse oito anos, e pior, parece como uma mundana.
Clary apertou sua mandíbula rebeldemente.
— Nenhuma de suas roupas vai caber em mim.
— Nós vamos ver isso.
Clary assistiu Isabelle pelo espelho enquanto ela vasculhava o armário. O quarto dela parecia como se uma bola de discoteca tivesse explodido dentro dele. As paredes eram negras e fracamente iluminadas com redemoinhos em tinta dourada. Havia roupas em todos os lugares, pendendo nas costas das cadeiras de madeira e se derramando para fora do armário e o alto guarda-roupa encostado contra uma parede. Sua penteadeira, com um espelho de bordas cor-de-rosa, estava coberto por glitter, lantejoulas e potes de blush e pó.
— Quarto legal — Clary comentou, pensando longinquamente nas paredes cor de laranja de sua casa.
— Obrigada, eu mesma pintei.
Isabelle emergiu de seu armário, segurando algo preto e provocante. Ela o jogou para Clary.
Clary segurou a roupa, deixando ela se desdobrar.
— Parece muito pequena.
— É assim — Isabelle disse — agora coloque-a.
Rapidamente, Clary recuou para o pequeno banheiro, que estava pintado de azul brilhante. Ela se retorceu no vestido por cima de sua cabeça. Ele era apertado, com minúsculas alças finas. Tentando não respirar muito profundamente, ela retornou para o quarto, onde Isabelle estava sentada na cama, deslizando um conjunto de anéis nos dedos dos pés em sua sandália.
— Você é tão sortuda por ter pouco peito — Isabelle disse — eu nunca poderia vesti-lo sem um sutiã.
Clary fez uma careta.
— É muito curto.
— Não é curto. Está ótimo — Isabelle respondeu, procurando algo com os pés em volta e debaixo da cama. Ela chutou para fora um par de botas pretas e algumas meias-calças.
— Aqui, você pode usar essas com ele. Vão fazer você parecer mais alta.
— Claro, porque eu tenho peito pequeno e sou uma anã.
Clary puxou a beira do vestido para baixo. Aquilo só tocava o topo de suas coxas. Ela quase nunca usava saias, muito menos minissaias, então estar vendo grande parte das suas próprias pernas era alarmante.
— Se isso é curto em mim, como deve ser em você? — ela meditou em voz alta para Isabelle.
Isabelle sorriu.
— Em mim é uma camiseta.
Clary se deixou cair em cima da cama e puxou as meias e as botas. O calçado ficou um pouco frouxo ao redor das batatas das pernas, mas não escorregava em seus pés. levantando, ela olhou para si mesma no espelho. Ela tinha que admitir que a combinação do vestido preto curto, meias-calças e as botas altas eram bastante boas. A única coisa que estragava era...
— Seu cabelo — Isabelle disse — eu preciso prendê-los. Desesperadamente. Sente-se.
Ela apontou imperiosamente em direção à penteadeira. Clary se sentou e arqueava seus olhos fechados enquanto Isabelle soltava sua trança – não muito gentilmente – escovando seu cabelo e empurrando grampos dentro dele. Ela abriu os olhos justo quando uma esponja de pó estalou em seu rosto, soltando uma densa nuvem de glitter. Clary tossiu e olhou para Isabelle acusadoramente.
A outra garota riu.
— Não olhe para mim. Olhe para si mesma.
Olhando para o espelho, Clary viu que Isabelle tinha puxado seu cabelo em uma elegante trança no topo de sua cabeça, segurando-a no lugar com grampos brilhantes. Clary se lembrou de repente do seu sonho, o denso cabelo pesando em sua cabeça, dançando com Simon... ela se mexeu impacientemente.
— Não se levante ainda — Isabelle disse — nós não terminamos.
Ela agarrou uma caneta de delineador.
— Abra seus olhos.
Clary ampliou seus olhos, o que foi bom para evitar de chorar.
— Isabelle, eu posso te perguntar uma coisa?
— Claro — Isabelle disse, empunhando o delineador com perícia.
— Alec é gay?
O punho de Isabelle contraiu. O delineador escorregou, pintando uma longa linha preta do canto do olho de Clary até perto do couro cabeludo.
— Oh, inferno — Isabelle disse, colocando o delineador para baixo.
— Tá tudo bem — Clary começou, colocando a mão em cima de seu olho.
— Não, não está.
Isabelle soou próxima às lágrimas enquanto se arrastava entre os montes de lixo no topo da penteadeira. Eventualmente ela veio com uma bola de algodão, que entregou para Clary.
— Aqui. Use isso.
Ela sentou na beira de sua cama, as pulseiras em seus tornozelos tinindo, e olhou para Clary através de seu cabelo.
— Como você adivinhou? — Isabelle perguntou finalmente. — Você não pode dizer absolutamente para ninguém.
— Nem mesmo Jace?
— Especialmente não para Jace!
— Tudo bem — Clary ouviu a rigidez em sua própria voz — acho que eu percebi por não ser lá grande coisa.
— Seria para os meus pais — Isabelle disse quietamente — eles o rejeitariam e o colocariam para fora da Clave...
— O que, você não pode ser gay e um Caçador de Sombras?
— Não há nenhuma regra oficial sobre isso. Mas as pessoas não gostam disso. Quero dizer, menos as pessoas com nossa idade, eu acho — ela adicionou, sem certeza, e Clary se lembrou como algumas outras pessoas da idade dela e de Isabelle que ela realmente tinha conhecido — mas a geração mais velha, não. Se isso acontecer, não fale sobre isso.
— Ah — Clary disse, desejando que nunca tivesse mencionado o fato.
— Eu amo meu irmão — Isabelle falou — e faria qualquer coisa por ele. Mas não há nada que eu possa fazer quanto a isso.
— Pelo menos ele tem você — Clary respondeu embaraçada, e ela pensou por um momento em Jace, que achava que o amor era algo que te fazia em pedaços — você realmente acha que Jace... se importaria?
— Eu não sei — Isabelle disse, em um tom que indicava que o tema da conversa era o suficiente — mas não é minha escolha contar.
— Eu acho que não — Clary concordou.
Ela se inclinou no espelho, usando o algodão que Isabelle tinha dado a ela para tirar o excesso de maquiagem do olho. Quando se sentou de volta, derrubou a bola de algodão com surpresa. O que Isabelle tinha feito com ela? Suas bochechas pareciam afiladas e angulares, seus olhos profundos, misteriosos, e em um luminoso verde.
— Eu pareço com minha mãe — ela disse em surpresa.
Isabelle levantou suas sobrancelhas.
— O quê? Tão meia-idade? Talvez um pouco mais de glitter...
— Chega de glitter — Clary disse apressadamente. — Não, está bom. Eu gostei disso.
— Ótimo — Isabelle saltou para fora de sua cama, os tornozelos se tocando. — Vamos lá.
— Eu preciso parar no meu quarto e pegar uma coisa — Clary lembrou, se levantando — além disso, eu preciso de alguma arma? E você?
— Eu tenho muitas — Isabelle sorriu, chutando o ar a fim de que seus tornozelos retinissem como sinos de Natal — estas botas, por exemplo. A esquerda tem ouro, que é venenoso para os demônios, e a direita é um ferro abençoado, no caso de eu correr atrás de algum vampiro não amigável ou mesmo fadas – fadas odeiam ferro. Ambos têm força das Runas esculpidas neles, então eu posso abalar um inferno com um chute.
— Caçar demônios e estar na moda — Clary comentou — eu nunca teria pensado que os dois pudessem andar juntos.
Isabelle gargalhou alto.
— Você ficaria surpreendida.
Os garotos estavam esperando por elas na entrada. Estavam todos usando preto, até mesmo Simon, em que ficou um pouco demais – um grande par de calças pretas e sua própria camisa do avesso para esconder o logotipo da banda. Ele estava de pé desconfortavelmente ao lado, enquanto Jace e Alec estavam encostados relaxadamente contra a parede, parecendo aborrecidos. Simon olhou para Isabelle enquanto ela caminhava pelo hall, seu chicote dourado enrolado no punho, suas correntes de metal vibrando como sinos. Clary esperou que ele olhasse pasmado – Isabelle parecia incrível – mas seus olhos deslizaram para ela, onde eles ficaram com um olhar de espanto.
— O que é isso? — ele exigiu, se endireitando. — O que você está usando, eu quero dizer.
Clary olhou para baixo, para si mesma. Ela tinha colocado um casaco leve para fazê-la se sentir menos nua e agarrou sua mochila no quarto. Ela a lançou sobre o seu ombro, tocando familiarmente entre as omoplatas. Mas Simon não estava olhando para sua mochila, estava olhando para suas pernas, como se nunca as tivesse visto antes.
— Isso é um vestido, Simon — Clary respondeu secamente — eu sei que eu não uso muito, mas realmente.
— É tão curto — ele disse em confusão.
Mesmo em metade de roupas de caçador de demônio, Clary pensou, ele parecia ser o tipo de rapaz que iria até sua casa buscá-la para um encontro e seria educado com seus pais e legal com seus animais de estimação.
Jace, por outro lado, parecia o tipo do rapaz que iria até a sua casa, a queimaria e a poria abaixo com chutes.
— Eu gosto do vestido — ele disse, desprendendo-se a si mesmo da parede — seus olhos corriam de cima para baixo dela, preguiçosamente, como o acariciar de patas de um gato — precisa de uma coisinha extra, apesar de tudo.
— Então, agora você é um expert em moda?
A voz de Clary saiu desigualmente – ele estava muito perto dela, perto o suficiente para que ela pudesse sentir o calor dele, cheirar o leve e quente perfume recentemente aplicado nas Marcas.
Ele tirou algo para fora da sua jaqueta e entregou a ela. Era um longo e fino punhal em uma bainha de couro. O cabo da adaga era encrustado com uma única pedra vermelha esculpida em forma de rosa.
Clary balançou a cabeça.
— Eu nem sequer sei como usar isso...
Ele a pressionou em sua mão, enrolando os dedos em torno dos dela.
— Você irá aprender — ele baixou a voz — está no seu sangue.
Ela puxou a mão para trás lentamente.
— Tudo bem.
— Eu poderia lhe dar uma bainha de coxa para colocá-la — Isabelle ofereceu — eu tenho toneladas.
— CERTAMENTE NÃO! — Simon interrompeu.
Clary deu a ele um olhar irritado.
— Obrigada, mas eu não sou o tipo de garota que usa uma bainha na coxa.
Ela mergulhou a adaga no bolso do lado de fora de sua mochila.
Clary olhou para cima enquanto fechava a mochila, e encontrou Jace observando-a através dos olhos semicerrados.
— E uma última coisa — ele disse.
Ele se aproximou e puxou os grampos de brilhantes do cabelo dela, a fim de que eles caíssem em quentes e pesados cachos em seu pescoço. A sensação do cabelo dela fazendo cócegas em sua pele nua era desconhecida e estranhamente prazerosa.
— Muito melhor — ele disse, e desta vez ela pensou que talvez a voz dele estava levemente desigual também.
jace é mais gado q tudo nessa vida kkkkjkkkjkkk
ResponderExcluirApenas verdadesKKDKADK
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