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Celaena Sardothien sabia que se aproximava das Minas de Sal quando, duas semanas depois, as árvores de Carvalhal deram lugar a um terreno cinza e pedregoso e montanhas irregulares perfuraram o céu. Estava deitada no chão desde o alvorecer e já vomitara uma vez. E agora não conseguia se levantar.
Ruídos distantes. Gritos e o estalar baixo de um chicote.
Endovier.
Ela não estava pronta.
A luz ficou mais forte quando deixaram as árvores para trás. Celaena estava feliz por Sam não estar ali para vê-la daquele jeito.
Soluçou tão forte que precisou apertar o punho contra a boca para não ser ouvida.
Jamais estaria pronta para aquilo, para Endovier e para o mundo sem Sam.
Uma brisa preencheu a carruagem, levantando os odores das duas últimas semanas. Os tremores de Celaena pararam por um segundo. Ela conhecia aquela brisa.
Conhecia o toque frio sob ela, sabia que carregava uma fração de pinho e neve, conhecia as montanhas das quais o sopro emanava. Um vento do norte, uma brisa de Terrasen.
Precisava ficar de pé.
Pinho e neve e verões dourados e preguiçosos — uma cidade de luz e música à sombra das montanhas Galhada do Cervo. Precisava levantar, ou estaria acabada antes de sequer entrar em Endovier.
O veículo reduziu a velocidade, as rodas quicavam pelo caminho áspero. Um chicote estalou.
— Meu nome é Celaena Sardothien... — sussurrou ela para o chão, mas os lábios estremeciam tanto que as palavras foram interrompidas.
Em algum lugar, alguém começou a gritar. Pela mudança da luz, a assassina sabia que estavam se aproximando do que só podia ser uma muralha gigante.
— Meu nome é Celaena Sardothien... — tentou ela de novo, puxando um fôlego irregular.
A brisa se transformou em vento, e ela fechou os olhos, deixando que o ar varresse as cinzas daquele mundo morto... daquela garota morta. Então não restou nada, a não ser algo novo, algo ainda brilhando vermelho da forja.
Celaena abriu os olhos.
Iria para Endovier. Iria para o Inferno. E não cederia.
Apoiou as palmas das mãos no chão e deslizou os pés sob o corpo.
Ainda não tinha parado de respirar e tinha suportado a morte de Sam e escapado da execução do rei. Ela sobreviveria àquilo.
Celaena ficou de pé, virou-se para a janela e olhou diretamente para a muralha de pedra monumental que se erguia à frente.
Enfiaria Sam no coração, uma luz forte para a qual se virar sempre que as coisas ficassem escuras. E assim se lembraria de como fora ser amada, quando o mundo era cheio de possibilidades. Não importava o que fizessem com ela, jamais poderiam lhe tirar isso.
Celaena não cederia.
E algum dia... algum dia, mesmo que fosse preciso seu último suspiro, descobriria quem tinha feito aquilo com ela. Com Sam. Celaena limpou as lágrimas quando a carruagem entrou nas sombras do túnel que cruzava a muralha. Chicotes e gritos e o clangor de correntes. Ela ficou tensa, já absorvendo cada detalhe que podia.
Mas esticou os ombros e a coluna.
— Meu nome é Celaena Sardothien — sussurrou ela —, e não vou sentir medo.
O carro atravessou a muralha e parou.
Celaena elevou a cabeça.
A porta foi destrancada e escancarada, inundando o espaço com luz cinza. Guardas esticaram os braços até ela, meras sombras contra a luz. Celaena deixou que a segurassem, deixou que a puxassem da carruagem.
Não terei medo.
Celaena Sardothien ergueu o queixo e caminhou para as Minas de Sal de Endovier.
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