Capítulo 9 - Este Sangue Culpado

— Eu não me lembro de ter havido um porão aqui — Jace falou, olhando além de Clary para o buraco escancarado na parede.
Ele levantou a pedra enfeitiçada, e seu brilho se arremeteu no túnel que guiava para baixo. As paredes eram pretas e lisas, feitas de uma pedra escura que Clary não reconheceu. Os degraus cintilavam como se estivessem úmidos. Um cheiro estranho foi levado pela corrente através da abertura: úmido, mofado, com um matiz estranha e metálica que acertou os nervos dela.
— O que você acha que poderia estar lá?
— Eu não sei — Jace se moveu em direção as escadas.
Colocou um pé no degrau de cima, testando-o, e então encolheu os ombros, como se tivesse tomado a decisão em sua mente. Ele começou a fazer seu caminho escada abaixo, movendo-se cuidadosamente.
Na metade do caminho ele se virou e olhou acima para Clary.
— Você vem? Pode esperar aí em cima por mim se quiser.
Ela olhou em torno da biblioteca vazia, então estremeceu e se apressou após ele.
As escadas espiralavam abaixo em mais e mais círculos apertados, como se eles estivessem fazendo seu caminho no interior de uma enorme concha. O cheiro ficou mais forte enquanto eles alcançavam o fundo, e os degraus se abriram em um largo quarto quadrado cujas paredes de pedra eram listradas com marcas de umidade – e outras manchas mais escuras. O piso era rabiscado com marcações: uma confusão de pentagramas e runas, com pedras brancas espalhadas aqui e ali.
Jace deu um passo adiante e alguma coisa triturou debaixo de seus pés. Ele e Clary olharam para baixo ao mesmo tempo.
— Ossos — Clary sussurrou.
Não eram pedras brancas, afinal, mas ossos de todas as formas e tamanhos, espalhados através do chão.
— O que ele estava fazendo aqui?
A pedra enfeitiçada cintilou na mão de Jace, lançando seu brilho misterioso sobre a sala.
— Experiências — Jace disse em uma voz seca e tensa — a Rainha de Seelie disse...
— Que tipo de ossos são esses? — A voz de Clary se elevou. — São ossos de animais?
— Não — Jace chutou uma pilha de ossos com seus pés, espalhando-os — nem todos eles.
O peito de Clary pareceu apertar.
— Eu acho que devíamos voltar.
Em vez disso, Jace levantou a pedra enfeitiçada em sua mão. Ela resplandeceu, brilhante e então mais brilhante, iluminando o ar com um brilho branco pungente. Os cantos distantes da sala aparecendo dentro do foco. Três deles estavam vazios. O quarto estava bloqueado com um tecido pendurado. Havia algo atrás do tecido, uma forma protuberante...
— Jace — Clary sussurrou — o que é isso?
Ele não respondeu. Subitamente havia uma lâmina serafim em sua mão livre. Clary não soube quando ele a puxou, mas ela brilhou na luz como uma espada de gelo.
— Jace, não — Clary avisou, mas era tarde demais...
Ele marchou a frente e puxou o tecido de lado com a ponta da lâmina, então segurou-o e o sacudiu para baixo. A cortina caiu em uma florescente nuvem de poeira.
Jace tropeçou para trás, a pedra enfeitiçada caindo de seu aperto. Enquanto a luz resplandecente caía, Clay pegou um único vislumbre do rosto dele: era uma máscara branca de horror.
Clary arrebatou a pedra enfeitiçada antes que ela pudesse escurecer e levantou-a no alto, desesperada para ver o que podia tê-lo chocado – o “inchocável” Jace – tão terrivelmente.
A primeira coisa que viu foi a forma de um homem – um homem envolvido em um trapo sujo branco, abaixado sobre o piso. Algemas circulavam seus pulsos e tornozelos, presas a grampos de metal grossos fincados no chão de pedra.
Como ele pode estar vivo? Clary pensou em horror, a bile subiu em sua garganta. A pedra de runa balançou em sua mão, e a luz dançou em trechos sobre o prisioneiro: ela viu magros braços e pernas, cicatrizados com as marcas de incontáveis torturas. O crânio de um rosto virou em direção a ela, buracos vazios onde os olhos deveriam ter estado – então houve um murmúrio seco, e ela viu que o que tinha pensado ser um trapo branco, eram asas, asas brancas subindo por trás de suas costas em dois puros arcos brancos, as únicas coisas puras nesta sala imunda.
Ela deu um suspiro seco.
— Jace. Você vê...
— Eu vejo.
Jace, em pé ao lado dela, falou em uma voz que fendia como vidro quebrado.
— Você disse que não havia nenhum anjo... que ninguém tinha visto um...
Jace estava sussurrando algo debaixo de sua respiração, uma sequência do que soou como praguejar de pânico. Ele tropeçou a frente, em direção a criatura aninhada no chão – e recuou, como se ele tivesse arremetido em uma parede invisível. Olhando para baixo, Clary viu que o anjo se encolhia dentro de um pentagrama feito de runas interligadas gravadas profundamente no chão; elas brilharam com um esmaecida luz fosforescente.
— As runas — ela sussurrou — nós não podemos passar...
— Mas deve haver algo... — Jace disse, sua voz quase falhando — algo que nós possamos fazer.
O anjo levantou a cabeça. Clary viu com uma distraída e terrível pena, que ele tinha cabelos cacheados dourados como os de Jace que brilhavam fracamente dentro da luz. Mechas se aderiam próximas dos buracos de seu crânio. Seus olhos eram covas, seu rosto retalhado com cicatrizes, como uma linda pintura destruída por vândalos. Enquanto ela olhava, sua boca se abriu, e um som se derramou de sua garganta – não palavras, mas uma aguda música dourada, uma única nota cantada, que manteve-se e manteve-se e manteve-se tão alta e doce que o som era como dor...
Uma avalanche de imagens se elevou perante os olhos de Clary. Ela ainda estava agarrando a pedra de runa, mas a luz tinha partido; ela tinha partido, não longe de lá mas em outro lugar, onde as imagens do passado fluíram perante ela em um fragmentado sonho acordado, coros, sons.
Ela estava em uma adega, vazia e limpa, uma única grande runa rabiscada no chão de pedra. Um homem estava em pé ao lado dela, ele segurava um livro aberto em uma mão e uma tocha branca ardendo na outra. Quando ele levantou a cabeça, Clary viu que ele era Valentim: muito jovem, seu rosto sem rugas e lindo, seus olhos escuros claros e brilhante. Enquanto ele lia, a runa diminuiu, e uma figura dobrada descansava entre as cinzas: um anjo, asas estendidas e sangrentas, como um pássaro atirado fora do céu...
A cena mudou. Valentim de pé perto de uma janela, ao seu lado uma jovem mulher com um brilhante cabelo vermelho. Um familiar anel prateado brilhava na mão dele enquanto ele se aproximava para colocar seus braços ao redor dela. Com um sobressalto de dor, Clary reconheceu sua mãe – mas ela era jovem, suas feições suaves e vulneráveis. Estava usando uma camisola branca e estava obviamente grávida.
— Os acordos — Valentim estava dizendo com raiva — foram não só a pior ideia que a Clave já teve, mas a pior coisa que poderia acontecer para os Nephilim. Que nós deveríamos ser obrigados aos Seres do Submundo, ligados a essas criaturas...
— Valentim — Jocelyn falou com um sorriso — chega de política, por favor.
Ela ergueu seus braços ao redor do pescoço de Valentim, a expressão dela cheia de amor – e a dele também, mas havia algo mais nisso, algo que enviou um arrepio pela espinha de Clary...
Valentim estava ajoelhado no centro de um círculo de árvores. Havia uma luz brilhante acima, iluminando o pentagrama preto que tinha sido rabiscado dentro da terra raspada da clareira. Os ramos das árvores faziam uma rede espessa acima. Onde elas se estendiam acima das pontas do pentagrama, as folhas curvavam-se e se tornavam pretas. No centro da estrela de cinco pontas sentava-se uma mulher com um longo e brilhante cabelo; sua forma era esguia e atraente, o rosto escondido na sombra, seus braços nus e brancos. Ela deixou uma mão estendida em frente a ela, e quando abriu seus dedos, Clary podia ver que havia lá um longo talho em sua palma, gotejando um lento fluxo de sangue dentro de uma taça prateada que descansava na ponta do pentagrama. O sangue parecia negro ao luar, ou talvez ele fosse negro.
— A criança nascida com este sangue nela — ela falou, e sua voz era suave e bela — excederá em poder os Grandes Demônios dos abismos entre os mundos. Ele será mais poderoso do que Asmodei, mais forte do que Shedim das tempestades. Se ele for devidamente treinado, não haverá nada que ele não será capaz de fazer. Embora eu deva alertá-lo — ela adicionou — isso irá extinguir sua humanidade, como veneno extingue a vida do sangue.
— Meus agradecimentos a você, Senhora de Edom — Valentim disse, e enquanto ele alcançava a taça de sangue, a mulher levantou seu rosto, e Clary viu que embora ela fosse indiscutivelmente bonita, seus olhos eram buracos vazios nos quais tentáculos negros se agitavam, como antenas sondando o ar. Clary reprimiu um grito...
A noite, a floresta, desapareceram. Jocelyn estava de pé na frente de alguém que Clary não podia ver. Ela não estava mais grávida, e seu brilhante cabelo estava esparramado ao redor de seu aflito e desesperado rosto.
— Eu não posso ficar com ele, Ragnor. Nem por um dia. Li seu livro. Você sabe o que ele fez a Jonathan? Eu nunca pensei que Valentim pudesse fazer isso — seus ombros tremeram — ele usou sangue de demônio – Jonathan não é mais um bebê. Ele nem mesmo é humano; ele é um monstro...
Jocelyn desapareceu. Valentim estava medindo os passos impacientemente ao redor do círculo de runas, uma lâmina serafim brilhando em sua mão.
— Por que você não fala? — ele murmurou. — Por que você não me dá o que eu quero?
Ele baixou a faca, e o anjo se contraiu enquanto um líquido dourado se derramou vindo de sua ferida como luz derramada.
— Se você não me der respostas — Valentim sibilou — pode me dar seu sangue. Isso me será mais útil do que a você.
Agora eles estavam na biblioteca Wayland. A luz brilhava através dos vitrais de diamante da janela, inundando a sala com azul e verde. Vozes vinham de outra sala: sons de risada e conversas, uma festa acontecia. Jocelyn estava ajoelhada perto da estante, olhando de um lado para outro. Ela puxou um livro grosso de seu bolso e deslizou-o na estante... E ela se foi.
A cena mostrou uma adega. A mesma adega que Clary sabia estar de pé agora mesmo. O mesmo pentagrama rabiscado no chão, e no centro da estrela, repousava o anjo. Valentim de prontidão, mais uma vez com a lâmina serafim brilhando em sua mão. Ele parecia anos mais velho agora, não mais um rapaz.
— Ithuriel — ele disse — nós somos velhos amigos agora, não somos? Eu poderia ter deixado você sepultado vivo debaixo daquelas ruínas, mas não, trouxe você aqui comigo. Todos estes anos eu mantive você por perto, esperando que um dia pudesse me dizer o que eu queria... precisava... saber.
Ele se aproximou, estendendo a espada, seu brilho iluminando a barreira rúnica com um tremular.
— Quando eu invoquei você, sonhei que você me diria o porquê. Porque Raziel nos criou, sua raça de Caçadores de Sombras, todavia não nos deu os poderes que os Seres do Submundo tem – a velocidade dos lobos, a imortalidade do Povo das Fadas, a magia dos bruxos, até mesmo a resistência dos vampiros. Ele nos deixou indefesos perante os hospedeiros do inferno com exceção dessas linhas pintadas em nossa pele. Por que seus poderes são maiores do que os nossos? Porque nós não podemos compartilhar daquilo que eles tem? Como isso pode ser justo?
Dentro de sua estrela aprisionadora, o anjo sentou em silêncio como uma estátua de mármore, imóvel, suas asas dobradas. Seus olhos expressavam nada além de uma terrível dor silenciosa. A boca de Valentim retorceu.
— Muito bem. Mantenha seu silêncio. Eu vou ter a minha chance — Valentim levantou a lâmina — eu tenho o Cálice Mortal, Ithuriel, e em breve terei a Espada – mas sem o Espelho eu não posso começar a invocação. O Espelho é tudo que eu preciso. Me diga onde ele está. Me diga onde ele está, Ithuriel, e eu deixarei você morrer.
A cena se quebrou em fragmentos, e enquanto sua visão desaparecia, Clary pegou o vislumbre de imagens agora familiares para ela de seus próprios pesadelos – anjos com asas, brancas e pretas, lençóis de água espelhada, ouro e sangue – e Jace se afastando dela, sempre se afastando. Clary se aproximando dele, e pela primeira vez, a voz do anjo falou em sua cabeça em palavras que ela podia entender.
Esses não são os primeiros sonhos que eu te mostrei.
A imagem de uma runa queimava atrás de seus olhos, como fogos de artifício, não uma runa que ela tinha visto antes; era uma forte, simples e direta como um nó amarrado.
Ela se foi em um suspiro também, e então enquanto ela desaparecia, o canto do anjo cessou. Clary estava de volta em seu próprio corpo, cambaleando em seus pés no quarto imundo e fedorento. O anjo estava em silêncio, congelado, asas dobradas, uma efígie em luto.
Clary soltou sua respiração em um soluço.
— Ithuriel.
Ela aproximou as mãos para o anjo, sabendo que não podia ultrapassar as runas, seu coração doendo. Por anos o anjo tinha estado aqui em baixo, algemado e faminto, mas incapaz de morrer...
Jace estava ao lado dela. Podia ver pelo seu rosto abatido que ele tinha visto tudo o que ela viu. Ele olhou para a lâmina serafim em sua mão e então de volta para o anjo. Seu rosto cego estava virado na direção deles em uma silenciosa súplica. Jace deu um passo a frente, e então outro. Seus olhos estavam fixos no anjo, e isso era como se, Clary pensou, houvesse alguma comunicação silenciosa passando entre eles, algum discurso que ela não podia ouvir. Os olhos de Jace estavam brilhantes como discos de ouro, cheios de luz refletida.
— Ithuriel — ele sussurrou.
A lâmina em sua mão resplandeceu como uma tocha. Seu brilho era cegante. O anjo levantou seu rosto, como se a luz fosse visível para seus olhos cegos. Ela alcançava suas mãos, as correntes que prendiam seus pulsos, chacoalhando como uma música cruel.
Jace se virou para ela.
— Clary. As runas.
As runas.
Por um momento, ela olhou para ele, confusa, mas os olhos dele encorajavam os dela adiante. Ela entregou a Jace a pedra enfeitiçada, pegou a estela dele e se ajoelhou perto das runas rabiscadas. Elas pareciam como se tivessem sido cinzeladas dentro da pedra com algo afiado.
Ela olhou para Jace. Sua expressão atemorizou-a, a chama em seus olhos – eles estavam cheios de fé nela, de confiança em suas habilidades. Com a ponta da estela ela traçou várias linhas no chão, mudando as runas de prender para as runas de soltar, aprisionamento para libertação. Elas reluziram enquanto Clary as traçava, enquanto arrastava a ponta acesa através do enxofre.
Terminado, ela se levantou em seus pés. As runas tremulavam perante ela. Abruptamente Jace se moveu para ficar ao lado dela. A pedra enfeitiçada tinha sumido, a única iluminação vinha da lâmina serafim que ele tinha chamado pelo nome de anjo, resplandecendo em sua mão. Ele a esticou, e dessa vez sua mão passou através da barreira de runas como se não tivesse nada ali.
O anjo ergueu suas mãos e tirou a lâmina de Jace. Ele fechou seus olhos cegos, e Clary pensou por um momento que ele sorriu. Ele virou a lâmina em seu aperto até que a ponta afiada descansasse num golpe em seu próprio esterno.
Clary deu um pequeno suspiro e seu moveu a frente, mas Jace agarrou o braço dela, seu aperto como de aço, e a puxou para trás – justo quando o anjo baixava a lâmina.
A cabeça do anjo caiu para trás, suas mãos largando o cabo, que se projetava de onde o seu coração devia estar – se anjos tivessem corações; Clary não sabia. Chamas explodiram do ferimento, espalhando vindo da lâmina. O corpo do anjo estremeceu dentro da chama branca, as correntes em seus pulsos queimando escarlates, como ferro deixado muito tempo no fogo. Clary pensou nas pinturas medievais dos santos consumidos em fogueira de êxtase sagrado – e as asas do anjo voaram largas e brancas perante eles, também, capturadas e inflamadas, uma rede de fogo tremulando.
Clary não podia mais olhar. Ela se virou e enterrou seu rosto no ombro de Jace. O braço dele veio ao redor dela, seu aperto firme e rígido.
— Está tudo bem — ele falou em meio a seu cabelo — está tudo bem.
Mas o ar estava cheio de fumaça e o piso parecia estar balançando debaixo de seus pés. Foi só quando Jace tropeçou que ela notou que não era a imaginação: o terreno estava se movendo. Ela se soltou de Jace e balanceou; as pedras sob seus pés estavam se remoendo juntas, e uma fina chuva de terra polvilhava vinda do teto. O anjo era uma coluna de fumaça; as runas ao redor dele cintilavam dolorosamente brilhantes.
Clary olhou para elas, decifrando seu significado, e então olhou selvagemente para Jace.
— A mansão – ela estava prendendo Ithuriel. Se o anjo morrer, a mansão...
Ela não terminou sua sentença. Jace já tinha agarrado sua mão e estava correndo pelas escadas, puxando-a depois dele. As escadas por si mesmas estavam se agitando e entortando; Clary caiu, batendo seu joelho dolorosamente em um degrau, embora o aperto de Jace em seu braço não se desprendesse. Ela correu, ignorando a dor em sua perna, seus pulmões cheios da sufocante poeira.
Eles alcançaram o topo dos degraus e explodiram para a biblioteca. Atrás deles, Clary podia ouvir o suave rugir enquanto o resto das escadas desmoronava. Não era muito melhor estar aqui; a sala estava tremendo, livros caindo de suas prateleiras. Uma estátua estava se inclinado de seu lugar, caindo em uma pilha de cacos irregulares. Jace soltou a mão de Clary, agarrou uma cadeira e, antes que ela pudesse perguntar o que ele pretendia fazer, Jace jogou-a na janela de vidro colorido.
A cadeira navegou através de uma cascata de vidro quebrado. Jace se virou e ergueu a mão para Clary. Atrás dele, através da moldura irregular que restava, ela podia ver um luar – saturado de ervas daninhas estendidas e uma linha de topos de árvore a distância. Parecia um longo caminho até lá embaixo.
Eu não posso saltar tão longe, ela pensou, e estava balançando a cabeça para Jace quando ela viu seus olhos aumentarem, sua boca moldando uma advertência. Um dos pesados bustos de mármores que se alinhavam nas prateleiras mais altas tinha deslizado livre e estava caindo em direção a ela. Clary mergulhou fora de seu caminho, e a estátua bateu no chão a centímetros de onde ela tinha estado é, deixando um amassado de bom tamanho no chão.
Um segundo depois os braços de Jace estavam ao seu redor e ele a tinha levantado de seus pés. Estava muito surpresa para lutar enquanto ele a carregava por cima da janela quebrada e se atirava sem cerimônia para fora dela.
Clary bateu em uma elevação coberta de capim bem abaixo da janela e caiu em seu escarpado inclinado, ganhando velocidade até que bateu contra um montinho com força suficiente para tirar o fôlego. Ela sentou, agitando a grama para fora de seu cabelo. Um segundo depois Jace parou próximo dela; ao contrário dela, ele rolou imediatamente em um agachamento, olhando para a colina na mansão. Clary virou para ver onde ele estava olhando, mas Jace já tinha agarrado-a, a impulsionando abaixo da depressão entre as duas colinas.
Mais tarde ela encontrou contusões escuras na parte de cima de seus braços onde Jace a tinha segurado; agora ela apenas arfou em surpresa enquanto ele a jogava e rolava por cima dela, dando-lhe cobertura com seu corpo enquanto um enorme rugido vinha. Soava como a terra se fragmentando, como uma erupção de vulcão. Uma explosão de poeira branca subiu ao céu.
Clary ouviu um acentuado ruído tamborilar ao redor. Por um desnorteante momento ela pensou que tinha começado a chover – então percebeu que eram cascalhos, sujeira e vidro quebrado: os detritos da mansão demolida sendo lançados ao redor como granizo mortal.
Jace pressionou-a duramente no chão, seu corpo achatado contra o dela, seu batimento cardíaco quase tão alto em seus ouvidos quanto o som da mansão afundando em ruínas.
O rugido do colapso perdeu a força lentamente, como fumaça dissipando no ar. Foi substituído por um alto gorjear de pássaros assustados; Clary podia vê-los acima do ombro de Jace, circulando curiosamente contra o céu escuro.
— Jace — ela falou suavemente — acho que derrubei sua estela em algum lugar.
Ele puxou-se de volta levemente, escorando-se sobre os cotovelos, e olhou abaixo para ela. Mesmo na escuridão ela podia se ver refletida em seus olhos; o rosto estava listrado com fuligem e sujeira, a gola de sua camisa rasgada.
— Está tudo bem. Desde que você não esteja machucada.
— Eu estou bem.
Sem pensar, ela se aproximou, seus dedos roçando suavemente através dos cabelos dele. Ela sentiu-o enrijecer, seus olhos escureceram.
— Há grama em seu cabelo — ela disse.
Sua boca estava seca; adrenalina cantou através de suas veias. Tudo o que tinha acontecido – o anjo, a destruição da mansão – parecia menos real do que o que ela viu nos olhos de Jace.
— Você não deve me tocar — ele respondeu.
A mão dela congelou onde estava, sua palma contra a bochecha dele.
— Por que não?
— Você não sabe por quê? — ele perguntou, e se deslocou para longe dela, rolando em suas costas. — Você viu o que eu vi, não viu? O passado, o anjo. Nossos pais.
Foi a primeira vez, ela pensou, que ele os chamou disso. Nossos pais. Ela se virou de lado, esperando estar fora do alcance dele mas sem certeza se deveria. Ele estava olhando cegamente para o céu.
— Eu vi.
— Você sabe o que eu sou — as palavras sendo ditas em um sussurro angustiado — eu sou parte demônio, Clary. Parte demônio. Você entendeu muito bem, não é? — Seus olhos perfurando-a como brocas. — Você viu o que Valentim estava tentando fazer. Ele utilizou sangue de demônio – usou em mim antes mesmo de eu nascer. Eu sou parte monstro. Parte de tudo que eu tenho tentado tão duramente extinguir, destruir.
Clary afastou da memória a voz de Valentim dizendo, ela me deixou por que eu tornei seu primeiro filho um monstro.
— Mas bruxos são parte demônio. Como Magnus. Isso não faz deles maus...
— Não parte do Grande Demônio. Você ouviu o que aquela mulher disse.
Isso vai extinguir sua humanidade, como o veneno extingue a vida o sangue. A voz de Clary tremeu.
— Isso não é verdade. Não pode ser. Não faz sentido...
— Mas faz.
Havia um desespero furioso na expressão de Jace. Ela podia ver o brilho da corrente de prata ao redor de sua garganta nua, acesa em uma chama branca de luz de estrelas.
— Isso explica tudo.
— Você quer dizer que explica porque você é um Caçador de Sombras tão incrível? Por que você é leal, sem medo, honesto e todos os demônios não são?
— Isso explica — ele disse uniformemente — porque eu me sinto do modo que eu sinto por você.
— O que você quer dizer?
Ele ficou em silêncio por um longo momento, olhando para ela através do pequenino espaço que os separava. Ela podia senti-lo, mesmo embora ele não estivesse tocando-a, como se ele ainda deitasse seu corpo contra o dela.
— Você é minha irmã — ele falou finalmente — minha irmã, meu sangue, minha família. Eu deveria proteger você — ele riu sem som e sem nenhum humor — proteger você do tipo de garotos que querem fazer com você exatamente o que eu quero fazer.
A respiração de Clary se prendeu.
— Você disse que só queria ser meu irmão de agora em diante.
— Eu menti. Demônios mentem, Clary. Você sabe, há alguns tipos de ferimentos que você pode conseguir quando se é um Caçador de Sombras – ferimentos internos vindos do veneno de demônio. Você nem mesmo sabe o que está errado em você, mas está sangrando até a morte, lentamente por dentro. Assim que é ser apenas seu irmão.
— Mas Aline...
— Eu tinha que tentar. E eu o fiz — sua voz era sem vida — mas Deus sabe, eu não quero ninguém além de você. Eu nem mesmo desejo querer alguém além de você.
Ele se aproximou, traçando seus dedos levemente através do cabelo dela, as pontas dos dedos roçando sua bochecha.
— Agora pelo menos eu sei o porquê.
A voz de Clary tinha diminuído para um sussurro.
— Eu não quero ninguém além de você também.
Ela foi recompensada pelo prender na respiração dele. Lentamente ele se ergueu para seus cotovelos. Agora estava olhando-a de cima, e sua expressão tinha mudado – havia um olhar em seus rosto que ela nunca tinha visto antes, uma luz quase mortal adormecida nos olhos dele. Ele deixou seus dedos traçarem de suas bochechas para seus lábios, delineando a forma de sua boca com a ponta de um dedo.
— Você provavelmente deve me dizer para não fazer isso — Jace falou.
Ela nada disse. Não queria dizer para ele parar. Estava cansada de dizer não para Jace – ou nunca deixar de sentir o que todo o seu coração desejava que ela sentisse. Seja qual fosse o custo.
Jace se curvou, seus lábios contra a sua bochecha, roçando levemente – e ainda aquele leve toque enviou arrepios através de seus nervos, arrepios que fizeram todo seu corpo estremecer.
— Se você quiser que eu pare, me diga agora — ele sussurrou.
Quando Clary continuou a ficar calada, ele roçou seus lábios contra o côncavo de sua têmpora.
— Ou agora — ele traçou a linha de sua maçã do rosto — ou agora.
Seus lábios estavam contra os dela.
— Ou...
Mas ela tinha se aproximado e puxado-o abaixo, e o resto de suas palavras se perderam contra sua boca. Ele a beijou suavemente, cuidadosamente, mas não era gentileza que ela queria, não agora, não depois de todo esse tempo, e Clary enlaçou seus punhos em sua camisa, puxando-o mais forte contra ela. Ele gemeu suavemente, baixo em sua garganta, e então seus braços a envolveram, unindo-a contra ele, e eles rolaram sobre a grama, emaranhados juntos, ainda se beijando.
Havia pedras escavando suas costas, e seus ombros doíam onde ela tinha caído da janela, mas ela não se importava. Tudo o que existia era Jace; tudo o que ela sentia, esperava, respirava, desejava, e via era Jace. Nada mais importava.
Apesar de seu casaco, ela podia sentir o coração dele queimando através de suas roupas e das dela. Ela puxou a jaqueta dele para fora, e então de algum modo sua camisa estava fora também. Seus dedos exploraram o corpo dele enquanto sua boca explorava a dela: a pele suave sobre os músculos firmes, cicatrizes como fios finos. Ela tocou a cicatriz em forma de estrela em seu ombro – ela era suave e lisa, como se fosse uma parte de sua pele, não saliente com suas outras cicatrizes.
Supôs que eram imperfeiçoes, aquelas marcas, mas não expressavam aquilo para ela, elas eram uma história contada em seu corpo: o mapa de uma vida de guerras sem fim.
Ele tateou os botões do casaco dela, seus dedos estavam tremendo. Ela pensou que nunca tinha visto as mãos de Jace instáveis antes.
— Eu faço isso — ela disse, e alcançou o último botão dela, enquanto se levantava, algo frio e metálico acertou sua clavícula, ela arfou em surpresa.
— O que é? — Jace congelou. — Eu machuquei você?
— Não. Foi isso.
Ela tocou a corrente de prata ao redor do pescoço dele. Em seu final pendurava-se um pequeno círculo de metal prateado. Ele tinha batido contra ela quando Clary se inclinou para frente. Ela fitou o anel agora.
Este anel – metal gasto com seu padrão de estrelas – ela conhecia aquele anel. O anel dos Morgenstern. Era o mesmo anel que tinha cintilado na mão de Valentim no sonho que o anjo mostrou para eles. Tinha sido ele, e ele o tinha dado para Jace, como tinha sempre sido transmitido adiante, de pai para filho.
— Me desculpe — Jace falou.
Ele traçou a linha de sua bochecha com a ponta de seu dedo, uma intensidade sonhadora em seu olhar.
— Esqueci que estava usando a maldita coisa.
Um súbito frio inundou as veias de Clary.
— Jace — ela disse, em uma voz baixa — Jace, não.
— Não o quê? Não usar o anel?
— Não, não... não me toque. Pare por um segundo.
O rosto dele ficou imóvel. Perguntas tinham afugentado a confusão sonhadora em seus olhos, mas ele nada disse, apenas retirou sua mão.
— Jace — ela disse de novo — por que, Por que agora?
Os lábios dele se repartiram em surpresa. Ela podia ver uma linha escura onde ele tinha mordido seu lábio inferior, ou talvez ela tivesse mordido.
— Por que o quê agora?
— Você disse que não havia nada. O que seria se... se nós sentíssemos certas coisas, nós estaríamos machucando todos com que nos importamos.
— Eu disse a você. Eu estava mentindo — seus olhos se suavizaram — você acha que eu não quero...
— Não — ela negou — não. Eu não sou burra, sei o que você quer. Mas quando você disse que agora finalmente entendia por que se sentia dessa maneira sobre mim, o que você quis dizer?
Não que ela não soubesse, ela pensou, mas tinha que perguntar, tinha que escutá-lo dizer.
Jace segurou seus pulsos e puxou suas mãos para o rosto, enlaçando seus dedos nos dela.
— Você se lembra do que eu te disse na casa dos Penhallow? — Ele perguntou. — Que você nunca pensa no que faz antes de fazer, e por que você arruína tudo o que toca?
— Não, eu me esqueci disso. Obrigada por lembrar.
Ela mal notou o sarcasmo na voz dela.
— Eu não estava falando de você, Clary. Eu estava falando de mim. Isso é o que eu sou — ele virou seu rosto levemente e os dedos dela deslizaram ao longo de sua bochecha — pelo menos agora eu sei por quê. Eu sei o que está errado comigo. E talvez... talvez seja o motivo de eu precisar tanto de você. Por que se Valentim fez de mim um monstro, então suponho que ele fez de você um tipo de anjo. E Lúcifer amava Deus, não é? Assim diz Milton, de qualquer modo.
Clary sugou em sua respiração.
— Eu não sou um anjo. E você nem mesmo sabe no que é que Valentim utilizou o sangue de Ithuriel – talvez Valentim precisasse dele para si mesmo...
— Ele disse que o sangue lhe seria útil — Jace disse quietamente — isso explica por que você pode fazer o que faz, Clary. A Rainha Seelie disse que nós dois fomos experiências. Não apenas eu.
— Eu não sou um anjo, Jace — ela repetiu — eu não devolvo livros da biblioteca. Eu baixo ilegalmente música da internet. Minto para minha mãe. Sou completamente normal.
— Não para mim.
Ele olhou abaixo para ela. Seu rosto pairava contra um fundo de estrelas. Não havia nada de sua habitual arrogância em sua expressão – ela nunca tinha o visto tão desprotegido, e mesmo aquela falta de proteção era misturada com um ódio de si mesmo que corria tão profundo quanto uma ferida.
— Clary, eu...
— Saia de cima de mim — Clary disse.
— O quê?
O desejo em seus olhos rachou em mil pedaços como os cacos do espelho do Portal em Renwick, e por um momento sua expressão era inexpressivamente surpreendida; ela mal podia suportar olhar para ele e ainda dizer não. Olhando para ele agora – mesmo se ela não estivesse apaixonada por ele, aquela parte dela que era a filha de sua mãe, que amava cada coisa bela por sua beleza própria, teria ainda querido desejá-lo.
Mas então, era precisamente por que ela era filha de sua mãe que isso era impossível.
— Você me ouviu. E deixe minhas mãos em paz.
Ela as puxou de volta, fechando-as em punhos apertados para parar seus tremores.
Jace não se moveu. Seu lábio se curvou para trás, e por um momento ela viu aquela luz predatória em seus olhos novamente, mas agora ela estava misturada com raiva.
— Eu suponho que você não quer me dizer o porquê?
— Você pensa que só me quer por que é mau, não humano. Você apenas quer algo mais para que possa se odiar. Eu não vou deixar você me usar para provar a si mesmo o quão sem valor é.
— Eu nunca disse isso. Eu nunca disse que estava te usando.
— Ótimo. Me diga agora que você não é um monstro. Me diga que não há nada de errado com você. E me diga que você me quer, mesmo que não tenha sangue de demônio.
Porque eu não tenho sangue de demônio. E eu ainda quero você.
Seus olhares se travaram, os dele cegamente furiosos. Por um momento nenhum dos dois respiraram, e então ele se lançou para longe dela, xingando, e rolou para seu pés. Arrebatando sua camisa da grama, ele puxou-a sobre sua cabeça, ainda furioso e se virou para procurar sua jaqueta.
Clary ficou de pé, vacilando um pouco. O frio agudo arrepiou os seus braços. Suas pernas pareciam como se fossem feitas de cera derretida. Ela abotoou os botões de seu casaco com dedos dormentes, lutando contra a vontade de chorar. Chorar não ajudaria em nada agora. O ar estava ainda cheio de poeira dançando e cinzas, toda a grama ao redor com entulho espalhado: pedaços fragmentados de ruínas; páginas de livros sopradas melancolicamente ao vento; lascas de madeira dourada; um pedaço de quase metade de uma escada, misteriosamente não danificada. Clary se virou para olhar para Jace; ele estava chutando pedaços de escombros com uma satisfação selvagem.
— Bem — ele disse — estamos ferrados.
Isso não foi o que ela tinha esperado. Ela piscou.
— O quê?
— Se lembra? Você perdeu minha estela. Não há chance de você desenhar um Portal agora — ele falou as palavras com um prazer amargo, como se a situação o satisfizesse de algum modo obscuro — não temos nenhum outro modo de voltar. Vamos ter que ir andando.
Não teria sido uma caminhada agradável sob circunstâncias normais. Habituada as luzes da cidade, Clary não podia acreditar no quão escuro era em Idris à noite. As espessas sombras negras que se estendiam na estrada de ambos os lados pareciam estar rastejando com poucas coisas visíveis, e mesmo com a pedra enfeitiçada de Jace ela podia ver apenas uns poucos metros a frente. Ela sentia falta das luzes das ruas, o brilho dos faróis, os sons da cidade. Tudo o que podia ouvir agora era o sólido triturar de suas botas sobre os pedregulhos e, de vez em quando, sua própria respiração ofegada em surpresa quando tropeçava sobre uma casual rocha.
Após algumas horas seus pés começaram a doer e sua boca estava seca como um pergaminho. O ar tinha se tornado muito frio, e ela arqueou tremendo, suas mãos empurradas profundamente nos bolsos. Mas mesmo tudo aquilo teria sido suportável se Jace apenas estivesse falando com ela. Ele não tinha falado uma palavra desde que deixaram a mansão, exceto para acenar direções, dizendo a ela qual caminho seguir numa bifurcação na estrada, ou ordenando a ela evitar um buraco. Mesmo então ela duvidava se ele teria se importado muito se ela caísse em um buraco, exceto que isso teria diminuído a velocidade deles.
Eventualmente o céu a leste começou a clarear. Clary, tropeçando meio adormecida, levantou sua cabeça em surpresa.
— Está cedo para amanhecer.
Jace olhou para ela com leve desdém.
— Aquela é Alicante. O sol não nascerá pelas próximas três horas pelo menos. São as luzes da cidade.
Muito aliviada que eles estavam próximos de casa para se importar com sua atitude, Clary aumentou seu ritmo. Eles circularam uma esquina e encontraram-se caminhando ao longo de um largo caminho de terra cortando em uma encosta. Eles serpentearam ao longo da curva do declive, desaparecendo em torno de uma curva a distância. Embora a cidade não estivesse visível ainda, o ar tinha crescido mais brilhante, o céu à distância com um estranho brilho avermelhado.
— Nós devemos estar quase lá — Clary observou — tem um atalho na colina?
Jace estava de cara amarrada.
— Algo está errado — ele disse abruptamente.
Ele disparou, meio correndo pela estrada, suas botas enviando flocos de poeira que brilhavam ocre na estranha luz. Clary correu para manter o ritmo, ignorando os protestos de seus pés com bolhas. Eles circularam a próxima curva e Jace derrapou em uma súbita parada, fazendo Clary esbarrar em suas costas. Em outra circunstância isso poderia ter sido cômico. Não era agora.
A luz avermelhada era mais forte agora, lançando um brilho escarlate no céu noturno, iluminando a colina que eles estavam como se fosse manhã.
Plumas de fumaça curvavam-se do vale abaixo como penas desenroladas de um pavão preto. Elevando-se no vapor negro estavam as torres demoníacas de Alicante, sua estrutura cristalina como flechas de fogo perfurando o ar. Apesar da fumaça preta, Clary podia vislumbrar o salto das chamas escarlates, dispersas cruzando a cidade como um punhado de joias brilhantes através de um tecido escuro.
Isso parecia incrível. Mas era: eles estavam em pé em uma encosta acima de Alicante, e abaixo deles a cidade queimava.

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