Capítulo 10

— Obrigada — sussurrei.
Tentei não olhar para a faixa de pele lindamente bronzeada entre o cinto e a barra da camiseta branca de Thomas. Ele estava pendurando o quadro, uma das primeiras coisas que comprei depois do treinamento. Era uma impressão em tela com moldura de madeira, pesada demais para uma decoração de parede.
— É assustador pra caramba — Thomas comentou, descendo da minha cadeira da sala de jantar para o carpete.
— É do Yamamoto Takato. Meu artista japonês moderno preferido.
— Quem são elas? — Thomas perguntou, apontando para as duas irmãs no quadro.
Elas estavam descansando ao ar livre noturno. Uma estava curtindo em silêncio uma travessura qualquer que se passava diante delas. A outra olhava para mim e Thomas, mal-humorada e entediada.
— Espectadoras. Ouvintes. Como nós.
Ele não pareceu impressionado.
— Elas são esquisitas.
Cruzei os braços e sorri, feliz porque elas finalmente estavam onde deveriam.
— É um artista brilhante. Você devia ver outros trabalhos dele. Elas são comportadas, se compararmos com o resto.
Sua expressão me disse que ele não aprovava essa nova informação.
Ergui o queixo.
— Eu gosto delas.
Thomas inspirou, balançou a cabeça e soltou o ar.
— Cada um com seu gosto. Acho que eu vou, hum... embora.
— Obrigada pela carona. Obrigada pela bucha. Obrigada por pendurar as meninas.
— As meninas?
Dei de ombros.
— Elas não têm nome.
— Porque não são reais.
— São reais pra mim.
Thomas pegou a cadeira e a levou de volta até a mesa, mas segurou no encosto, se inclinando de leve.
— Por falar em coisas que não são reais... andei pensando num jeito de te falar sobre certos aspectos da viagem.
— Quais?
Ele veio na minha direção, se abaixando a centímetros do meu rosto, inclinando a cabeça de leve.
Eu me afastei.
— O que você está fazendo?
Ele recuou, satisfeito.
— Vendo sua reação. Eu estava certo em tocar nesse assunto agora. Se eu não demonstrar afeto, eles vão saber que tem alguma coisa errada. Você não pode se afastar de mim assim.
— Não vou fazer isso.
— Sério? Não foi uma reação instintiva que acabou de acontecer?
— Sim... mas eu já deixei você me beijar.
— Quando estava bêbada. — Thomas forçou um sorriso. Ele foi até o meio da sala e sentou no meu sofá como se fosse dono do lugar. — Não conta.
Eu o segui, o observei por um instante e então me sentei à sua direita, não deixando nem ar entre nós. Pousei a bochecha em seu peito e deslizei a mão por seu abdome rígido antes de enfiar os dedos do seu lado esquerdo, apenas o suficiente para meu braço ficar no lugar.
Meu corpo todo relaxou, e eu cruzei a perna direita sobre a esquerda, deixando a panturrilha sobre o joelho dele, de modo que todas as minhas partes estavam pelo menos levemente apoiadas nele. Eu me aninhei a ele com um sorriso, porque Thomas Maddox — o agente especial astuto e sempre no controle — estava parado feito uma estátua, o coração martelando no peito.
— Não sou eu quem precisa treinar — falei com um sorrisinho e fechei os olhos.
Senti seus músculos relaxarem, e ele passou os braços nos meus ombros, apoiando o queixo no topo da minha cabeça. Ele deixou todo o ar escapar dos pulmões, e pareceu se passar muito tempo antes de ele suspirar outra vez.
Ficamos assim, sem nenhum outro lugar para estar, ouvindo o silêncio do meu apartamento e o barulho da rua. Pneus ainda deslizavam no asfalto molhado, buzinas soavam, portas de carros batiam. De vez em quando, uma pessoa gritava, freios gemiam e um cachorro latia.
Ali dentro, sentada ao lado de Thomas — no mesmo sofá que batizamos na noite em que nos conhecemos —, parecia um universo paralelo.
— Isso é legal — ele disse por fim.
Legal? — Fiquei levemente ofendida. Achei que era maravilhoso.
Ninguém me abraçara desse jeito desde Jackson em Chicago, e, ainda assim, eu não tinha me sentido do mesmo modo.
Não achei que sentiria falta do toque de alguém, sobretudo porque eu não gostava do afeto de Jackson. Mas ficar sem isso durante menos de um mês me fez sentir solitária e talvez um pouco deprimida. Imagino que era algo normal para qualquer pessoa, mas eu estava certa de que a tristeza não teria sido tão intensa e rápida se eu não tivesse sentido as mãos de Thomas em mim na minha primeira noite em San Diego. Eu sentia falta delas todos os dias depois disso.
— Você sabe o que eu quero dizer — ele explicou.
— Não. Por que não me conta?
Seus lábios pressionaram meu cabelo, e ele soltou o ar, de maneira profunda e em paz.
— Não quero. Só quero curtir o momento.
É justo.

***

Abri os olhos, sozinha e deitada em meu sofá. Eu ainda estava totalmente vestida, coberta com a manta de lã que mantinha dobrada sobre a poltrona.
Sentei, esfreguei os olhos e fiz uma pausa.
— Thomas? — chamei. Eu me senti ridícula. Era pior que a manhã depois da transa de uma noite só.
Meu relógio indicava três da manhã, e eu ouvi uma pancada no andar de cima. Olhei para o teto com um sorriso. Era legal saber que ele estava tão perto. Mas aí ouvi mais alguma coisa, algo que fez meu estômago revirar.
Um berro.
Um gemido.
Um uivo.
Ai, meu Deus.
Um ritmo de pancadas contra a parede seguido de gemidos começou a descer para o meu apartamento, e eu olhei ao redor, sem saber o que pensar. Será que ele saiu daqui e foi para o Cutter? Conheceu uma garota? E então a levou para casa?
Mas Thomas não faria isso. Eu tinha sido a única desde... talvez eu o tenha tirado do esconderijo.
Ai, meu Deus.
— Ai, meu Deus! — um grito de mulher ecoou em voz alta meu pensamento, enchendo meu apartamento.
Não. Isso tem que parar.
Eu fiquei de pé e comecei a procurar algo comprido o suficiente para bater no teto. A vergonha que ele sentiria não importava. Eu nem estava me importando de ser aquela vizinha — a solteirona do andar de baixo que não gosta de música, risadas escandalosas nem de sexo. Eu só precisava que o orgasmo absurdamente alto da mulher parasse.
Subi na cadeira da sala de jantar, a mesma que Thomas usara mais cedo, com uma vassoura na mão. Pouco antes de eu começar a bater com o cabo no teto, alguém bateu à porta.
Mas que merda é essa?
Eu a abri, ciente de que ou eu parecia totalmente maluca ou a pessoa do outro lado da porta era a doida da história, e eu teria que usar a vassoura contra um psicopata.
Thomas estava parado sob o batente com olheiras, parecendo exausto.
— Posso ficar aqui?
— O quê?
— Por que está segurando uma vassoura? — ele perguntou. — Já passa das três da manhã. Você está fazendo faxina?
Estreitei os olhos.
— Você não está acompanhado?
Ele olhou ao redor, parecendo confuso com a pergunta, depois mudou o peso do corpo de uma perna para outra.
— Sim.
— Não devia estar na sua casa, então?
— Hum... não vou conseguir dormir lá em cima.
— Óbvio que não!
Tentei bater a porta, mas ele a segurou e me seguiu para dentro do apartamento.
— O que há de errado com você? — ele perguntou. Depois apontou para a cadeira no meio da sala. — Qual é a da cadeira?
— Eu ia subir nela e usar isto! — falei, mostrando a vassoura.
— Pra quê? — Ele franziu o nariz.
— No teto! Para fazer isso parar! Para fazer a mulher parar!
O reconhecimento iluminou seus olhos, e ele ficou com vergonha instantaneamente.
— Você consegue ouvir?
Revirei os olhos.
— Sim. O prédio todo consegue ouvir.
Ele esfregou a nuca.
— Sinto muito, Liis.
— Não sinta — fervilhei. — Não é como se a gente... não é de verdade.
— Como assim?
— Por favor, não peça desculpas! Isso só faz com que eu me sinta mais patética!
— Tá bom! Desculpa! Quer dizer...
Suspirei.
— Apenas... vai embora.
— Eu... ia perguntar se podia ficar aqui hoje à noite. Mas acho que, se você consegue ouvi-la...
Joguei a vassoura nele, mas ele saltou sobre ela.
— Que merda é essa, Liis?
— Não, você não pode ficar aqui! Volte para o andar de cima, para sua transa de uma noite só! Parece que você virou profissional no assunto.
Seus olhos se arregalaram, e ele levantou as mãos.
— Ah! Uau. Não. Isso não era... não sou eu. Lá em cima. Com ela.
— O quê? — Fechei os olhos, totalmente confusa.
— Não estou com ela.
Olhei furiosa para ele.
— Claro que não. Você acabou de conhecê-la.
Suas mãos estavam se mexendo para frente e para trás, em um movimento horizontal.
— Não. Não estou lá em cima trepando com ela.
— Sei — enfatizei a palavra. Eu podia estar falando com a parede.
— Não! — ele gritou, frustrado.
As pancadas recomeçaram, e nós dois olhamos para cima. A mulher começou a uivar, e um gemido baixo atravessou o teto — uma voz masculina.
Thomas cobriu o rosto.
— Meu Deus.
— Alguém está com uma mulher no seu apartamento?
— Meu irmão — ele resmungou.
— Qual deles?
— O Taylor. Ele vai ficar aqui por uns dias. Ele me mandou uma mensagem perguntando por que eu não estava em casa. Saí daqui para encontrá-lo no andar de cima, mas, quando cheguei lá, ele estava puto com alguma coisa e não queria ficar no apartamento. Então o levei ao Cutter. A agente Davies estava lá e...
Apontei para o teto.
— É a agente Davies?
Thomas assentiu.
— Ah, graças a Deus — falei, cobrindo os olhos com a mão.
Ele franziu a testa.
— Hein?
— Nada.
Davies gritou.
Balancei a cabeça e apontei para a porta.
— Você precisa falar para eles pararem com essa merda. Eu preciso dormir.
Thomas fez que sim com a cabeça mais uma vez.
— É. Vou lá. — Ele virou na direção da porta, mas parou, então se voltou para mim, apontando. — Você achou que era eu. Você estava puta.
Fiz uma careta.
— Não, não estava.
— Estava, sim. Admita.
— E daí se eu estivesse?
— Por que você estava com raiva? — ele perguntou, os olhos me implorando alguma coisa.
— Porque são três da manhã e eu devia estar dormindo.
— Mentira.
— Não tenho ideia do que você está falando!
Eu sabia exatamente do que ele estava falando, e ele sabia que eu estava tentando me fazer de idiota.
Ele sorriu.
— Você achou que eu estava trepando com uma mulher do bar e ficou com raiva de mim. Você estava com ciúme.
Depois de alguns segundos incapaz de inventar uma desculpa decente, soltei:
— E daí?
Thomas ergueu o queixo e levou a mão para trás, segurando a maçaneta.
— Boa noite, Liis.
Mantive o olhar mais desprezível possível até ele fechar a porta, depois fui até a vassoura, a ergui do chão e empurrei a cadeira de volta para junto da mesa.
Após mais ou menos um minuto, os uivos e as pancadas pararam.
Eu me arrastei até o quarto, tirei a roupa e vesti uma camiseta antes de cair na cama.
Eu não só não odiava o Thomas, eu gostava dele. Pior que isso: ele sabia.

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