Capítulo 5

Maddox parou no meio de um abdominal invertido e suspirou.
— Você tá de brincadeira.
— Não — falei, seguindo direto para o vestiário feminino.
Ele deixou a cabeça desabar com força no banco em que estava, as pernas flexionadas e os pés plantados com firmeza no chão.
— Você quer que a gente se odeie? — ele perguntou, olhando para o teto. — Estou com a sensação de que quer.
— Você não está tão errado — falei, empurrando a porta vaivém. Depois de tirar as roupas de ginástica da pequena bolsa esportiva, me livrei de minha saia lápis azul-marinho, desabotoei a blusa azul-clara e troquei meu sutiã com bojo por um top. Era incrível como um pedaço de pano podia me transformar de alguém com curvas modestas em um garoto de doze anos.
A sala, repleta de armários enfileirados e cartazes motivacionais, não tinha o cheiro de mofo e tênis sujos que eu esperava. O aroma de água sanitária e tinta fresca dominava o ambiente.
Maddox estava terminando os abdominais quando segui até a esteira mais próxima, meus tênis gemendo a cada contato com o piso emborrachado. Subi na esteira e prendi a barra da minha camiseta branca do FBI no gancho de segurança.
— Por que agora? — ele perguntou do outro lado da sala. — Por que você tem que estar aqui durante o meu horário de almoço? Não pode malhar de manhã ou à noite?
— Você já viu esta sala antes e depois do horário de trabalho? Os aparelhos ficam lotados. O melhor horário para malhar direito sem precisar desviar de corpos suados é no seu horário de almoço, porque ninguém quer vir enquanto você está aqui.
— Porque eu não deixo.
— Você vai me pedir para sair? — perguntei, olhando para ele por sobre o ombro.
— Quer dizer, te mandar sair?
Dei de ombros.
— Semântica.
Seus olhos seguiram para a minha calça legging justa enquanto ele pensava no assunto, depois ele saiu do banco e se dirigiu para as barras duplas antes de erguer as pernas quase na altura do peito. Se ele malhava assim cinco vezes por semana, não era surpresa ter o abdome tão definido.
Suor lhe pingava dos cabelos, e todo o seu tronco brilhava. Fingi não notar enquanto pressionava o botão para iniciar o equipamento. A esteira se moveu suavemente para frente, as engrenagens provocando um tremor familiar sob meus pés. Colocando os fones de ouvido, usei a música para me ajudar a esquecer que Maddox estava atrás de mim, aperfeiçoando a perfeição; aumentar a velocidade e a inclinação da esteira também ajudou.
Depois de algumas voltas, tirei um dos fones e o deixei pendendo sobre o ombro. Virei para a parede de espelhos à esquerda e falei para o reflexo do Maddox:
— Aliás, eu já saquei você.
— Ah, é? — Maddox comentou, ofegando ao fundo.
— Pode ter certeza que sim.
— E que merda isso significa?
— Não vou deixar você conseguir.
— Você acha mesmo que eu estou tentando te sabotar? — Ele parecia entretido.
— Não está?
— Já disse que não. — Depois de uma breve pausa, ele estava de pé ao lado da esteira, a mão sobre o apoio de segurança. — Sei que causei uma impressão negativa, Lindy. Admito que foi intencional. Mas minha motivação é aprimorar os agentes, não acabar com a carreira deles.
— Isso inclui o Sawyer?
— O agente Sawyer tem uma história em nosso esquadrão sobre a qual você não sabe nada.
— Então me conta.
— A história não é minha, não posso contar.
— É só isso? — Forcei um sorriso.
— Não estou te entendendo.
— Você não vai permitir que ele fale comigo por causa da história de outra pessoa?
Maddox deu de ombros.
— Eu gosto de estragar os planos dele.
— O surto que você teve na minha sala depois que o agente Sawyer saiu se resume a você estragando os planos dele. Entendi.
Maddox balançou a cabeça e se afastou. Comecei a colocar o fone de ouvido de volta, mas ele surgiu ao meu lado outra vez.
— Por que eu sou babaca por manter um idiota como o Sawyer longe de você?
Apertei um botão e a esteira parou.
— Não preciso da sua proteção — bufei.
Ele começou a falar, mas depois se afastou de novo. Dessa vez, empurrou a porta do vestiário masculino e entrou.
Depois de oito minutos me contendo por causa dessa atitude, saí da esteira e entrei pisando duro no vestiário masculino.
Maddox estava com uma das mãos apoiada na pia, a outra segurando uma escova de dentes. O cabelo estava molhado, e ele só estava coberto por uma toalha.
Ele cuspiu, enxaguou a boca e bateu a escova na pia.
— Posso te ajudar?
Mudei o apoio do corpo.
— Você pode até ser capaz de encantar o diretor, mas eu já saquei você. Não pense nem por um segundo que não enxergo o que tem por trás desse seu papo-furado. Não vou a lugar nenhum, então pode parar com esse seu joguinho.
Ele deixou a escova de dentes na pia e veio na minha direção. Dei um passo para trás, acelerando o passo conforme ele caminhava. Minhas costas bateram na parede, e eu arfei. Maddox bateu as mãos espalmadas na parede pouco acima de minha cabeça, me cercando. Ele estava a poucos centímetros do meu rosto, a pele ainda molhada do banho.
— Eu te promovi a supervisora, agente Lindy. O que faz você pensar que quero que vá embora?
Ergui o queixo.
— Sua história furada sobre o Sawyer não faz sentido.
— O que quer que eu diga? — ele perguntou.
Eu podia sentir o cheiro de menta em seu hálito e de sabonete líquido em sua pele.
— Quero a verdade.
Maddox se inclinou para frente, o nariz contornando meu maxilar. Meus joelhos quase cederam quando seus lábios encostaram em minha orelha.
— Você pode ter o que quiser. — Ele se afastou, os olhos pousando em meus lábios.
Prendi a respiração e me preparei enquanto ele se aproximava, fechando os olhos. Ele parou pouco antes de encostar a boca na minha.
— Fala — ele sussurrou. — Fala que você quer que eu te beije.
Levantei a mão e estendi os dedos, deslizando-os por seu abdome ondulado, seguindo as gotas de água até encostar na parte de cima da toalha. Todos os nervos do meu corpo me imploravam para dizer sim.
— Não. — Eu o empurrei e saí porta afora.
Subi na esteira outra vez, optei pela velocidade mais rápida e recoloquei os fones no ouvido, mudando as músicas até que alguma coisa cheia de gritos começasse a tocar.
Quarenta e cinco minutos depois, sem fôlego e suando, diminuí o ritmo, caminhando com as mãos nos quadris. Depois de cinco minutos de menor intensidade, tomei um banho e me vesti antes de prender oscabelos num coque úmido.
Val estava me esperando do outro lado da passarela.
— Como foi? — ela perguntou, preocupada de verdade.
Continuei andando em direção ao elevador, e ela me acompanhou. Tentei ao máximo manter os ombros e a expressão relaxados.
— Eu corri. Foi ótimo.
— Mentira.
— Deixa isso pra lá, Val.
— Você simplesmente... correu? — Ela parecia confusa.
— Sim. Como foi o seu almoço?
— Eu trouxe comida: sanduíche de pasta de amendoim com geleia. Ele gritou com você?
— Não.
— Tentou te expulsar?
— Não.
— Eu não... entendo.
Dei uma risadinha.
— E o que tem para entender? Ele não é um ogro. Na verdade, neste momento, ele deve achar que eu sou a ogra.
Entramos juntas no elevador, e eu pressionei o botão do nosso andar. Val deu um passo na minha direção, se aproximando tanto que eu me inclinei para trás.
— Mas ele é... um ogro. Ele é mau e bruto e grita com as pessoas quando elas entram na academia durante a hora dele, mesmo que seja para pegar um tênis que deixaram para trás. Eu sei. Eu já fui essa pessoa. Ele gritou comigo, teve uma merda de um surto, só porque tentei pegar um maldito tênis esquecido — ela disse as últimas palavras de um jeito lento e impetuoso, como se estivesse diante de um público improvisado, em duelo de rimas.
— Talvez ele tenha mudado.
— Desde que você chegou? Em três dias? Não.
Seu tom desdenhoso me irritou.
— Você está parecendo uma criança birrenta.
— Dramática?
— Sim.
— É só meu jeito de falar.
— Dramaticamente?
— Sim. Pare de pensar em formas de me julgar e escute o que estou tentando dizer.
— Tudo bem — falei.
A porta do elevador se abriu, e eu dei um passo em direção ao corredor. Val me seguiu até a porta de segurança.
— O Joel insistiu para eu comer meu sanduíche no escritório dele.
— Quem é Joel?
— O agente Marks. Preste atenção. Ele me mandou uma mensagem ontem à noite. Disse que o Maddox está esquisito. O irmão mais novo dele vai se casar no mês que vem... Bom, não casar, recasar. Não, isso também não está certo.
Meu rosto se contorceu.
— Renovar os votos, talvez?
Val apontou para mim.
— Isso.
— Por que está me contando isso?
— Ele vai ver, você sabe... ela.
— A mulher que deu um fora nele?
— Afirmativo. Na última vez em que ele foi para casa e a viu, voltou outro homem. — Ela franziu o nariz. — Não de um jeito positivo. Ele estava devastado. Foi assustador.
— Tá bom.
— Ele está preocupado com a viagem. Ele contou para o Marks... Isso é confidencial pra caralho, tá me entendendo?
Dei de ombros.
— Continua.
— Ele disse ao Marks que estava meio contente com a sua transferência para cá.
Entrei na minha sala e, com um leve sorriso, indiquei que Val fizesse o mesmo, e ela passou rapidamente por mim. Quando a porta se encaixou no batente, fiz uma ceninha para me assegurar de que estava fechada, depois encostei na porta, a madeira fria e dura mesmo através da minha blusa.
— Ai, meu Deus, Val! O que eu faço? — sibilei, fingindo estar em pânico. — Ele está meio contente? — Fiz a cara mais horrível que consegui e comecei a ofegar.
Ela revirou os olhos e desabou no meu trono.
— Vai se foder.
— Você não pode mandar eu me foder sentada na minha cadeira.
— Posso, se você zombar de mim. — Sua calça raspou no couro escuro quando ela se inclinou para frente. — Estou dizendo, isso é uma grande coisa. Não é do feitio dele. Ele não fica contente, nem meio contente. Ele odeia tudo.
— Tudo bem, mas isso aqui é uma situação de não inteligência, Val. Mesmo que seja atípico, você está disparando o alarme de incêndio por causa de uma vela.
Ela arqueou uma sobrancelha.
— Estou dizendo, você derrubou a vela dele.
— Você tem coisa melhor pra fazer, Val, e eu também.
— Drinques hoje à noite?
— Preciso ajeitar as coisas da mudança.
— Eu te ajudo. E levo um vinho.
— Combinado — falei enquanto ela deixava a minha sala.
Sentar na minha cadeira era reconfortante. Eu estava me escondendo bem à vista, as costas protegidas, o corpo envolvido pelos braços na altura da cintura. Meus dedos tocavam o teclado enquanto pontinhos pretos preenchiam a caixa branca da senha no monitor. Na primeira vez em que me conectei ao sistema, lembro de ter visto o emblema do FBI na tela e sentir o coração disparar. Algumas coisas nunca mudam.
Minha caixa de entrada estava cheia de mensagens de todos os agentes sobre andamentos, perguntas e pistas. O nome da Constance praticamente saltou da tela, então cliquei nele.

Agente Lindy,
O ASAC Maddox solicita uma reunião às 15h para discutir um evento.
Por gentileza, libere espaço na sua agenda.
Constance

Merda.
Cada minuto que se passou depois disso era mais agonizante do que a caminhada que fiz mais cedo até a academia de ginástica. Quando faltavam cinco minutos para as três, fechei a tarefa em que estava trabalhando e segui pelo corredor.
Os longos cílios de Constance se agitaram quando ela me viu, e ela tocou a própria orelha. Palavras, baixas e inaudíveis, lhe escaparam pelos lábios vermelhos. Ela virou meio centímetro na direção da porta de Maddox. Seu cabelo loiro-esbranquiçado caiu atrás do ombro e depois quicou de volta para sua ondulação suave. Ela pareceu voltar ao presente e sorriu para mim.
— Entre, por favor, agente Lindy.
Eu assenti, notando que ela não tirou os olhos de mim conforme eu passava por sua mesa. Ela não era apenas assistente de Maddox. Era seu cão de guarda em um minúsculo pacote louro.
Respirei fundo e girei a maçaneta de metal escovado.
O escritório de Maddox era composto de mogno e carpetes exuberantes, mas as prateleiras eram vazias e patéticas como as minhas, sem fotos de família e quinquilharias pessoais que pudessem levar alguém a acreditar que ele tinha uma vida fora do FBI. As paredes exibiam suas lembranças preferidas, incluindo placas e prêmios, com uma foto dele apertando a mão do diretor.
Havia três porta-retratos sobre a mesa, inclinados e virados para o outro lado. Fiquei incomodada por não conseguir ver o que havia neles. Imaginei se eram fotos dela.
Maddox estava de pé com seu terno azul-marinho, uma das mãos no bolso, encarando a bela vista de sua sala.
— Pode sentar, Lindy.
Sentei.
Ele virou.
— Tenho um dilema que talvez você possa me ajudar a resolver.
Uma centena de declarações diferentes poderiam ter saído de sua boca. Essa não era a que eu esperava.
— Sinto muito, senhor. Qual seria?
— Tive uma reunião com o SAC mais cedo e ele acha que você pode ser a solução para um problema recente — ele disse, finalmente sentando em sua cadeira.
As persianas deixavam toda a luz da tarde entrar, criando um brilho sobre a superfície já reluzente da mesa. Era grande o suficiente para seis pessoas, e acho que pesada demais para dois homens a carregarem. Ergui os dedos dos pés para encaixá-los confortavelmente no espaço entre a madeira e o tapete. Soltei um suspiro, me sentindo ancorada o bastante para impedir que a coisa inesperada que Maddox estava prestes a lançar em cima de mim me jogasse longe.
Ele jogou uma pasta sobre a mesa, e ela deslizou na minha direção, parando quase na beirada. Quando a peguei e segurei a pilha grossa de papéis, eu ainda estava concentrada demais na declaração de Maddox para abri-la.
— O agente especial Polanski, o SAC, acha que eu sou a solução — falei, desconfiada.
Ou eu tinha subestimado demais meu valor, ou Maddox estava exagerando.
— Leia isso aí — ele disse, se levantando outra vez e seguindo em direção à janela. Pela expressão austera e postura rígida, ele estava nervoso.
Abri a grossa pasta de papelão na primeira página e continuei dando uma olhada nos vários FDs-302, fotos de câmeras de segurança e uma lista de mortos. Um relatório continha as acusações e as transcrições do julgamento de um universitário chamado Adam Stockton. Ele era algum tipo de organizador e fora sentenciado a dez anos de prisão. Passei direto pela maioria das coisas, sabendo que não era isso que Maddox queria que eu visse.
Várias das fotos eram de um homem ligeiramente parecido com Maddox — mesma altura, mas o cabelo era raspado e os braços cobertos de tatuagens. Havia mais fotos com uma moça bonita de vinte e poucos anos, um olhar com muito mais sabedoria do que deveria haver ali. Poucas fotos eram individuais, a maioria era dos dois juntos. Eu a reconheci como a garota que aparecia em algumas das fotos que coloquei na parede da minha sala — a filha de Abernathy. O cara de cabelo raspado e Abby obviamente formavam um casal, mas o modo como se abraçavam me levou a crer que o relacionamento era recente e apaixonado. Se não era isso, se amavam muito. Ele assumia uma postura protetora em quase todas as fotos, mas ela permanecia a seu lado, nem um pouco intimidada. Eu me perguntei se ele ao menos percebia que fazia isso quando estava com ela.
Todos eram alunos da Universidade Eastern. Dei prosseguimento à leitura, e o relatório agora era sobre um incêndio que havia consumido um dos prédios do campus, matando cento e trinta e dois universitários — à noite. Antes de perguntar por que tantos alunos estavam em um porão da faculdade àquela hora da noite, virei a página e encontrei a resposta: um ringue de apostas, e o cara parecido com Maddox era um dos suspeitos.
— Meu Deus. O que é isso? — perguntei.
— Continue lendo — ele disse, ainda de costas para mim.
Quase que imediatamente, dois nomes saltaram aos meus olhos: Maddox e Abernathy. Depois de mais algumas páginas, tudo fez sentido, e eu ergui o olhar para o meu chefe.
— Seu irmão é casado com a filha do Abernathy? — Maddox não virou para mim. — Você tá brincando.
Ele suspirou, finalmente me encarando.
— Queria estar. Eles vão renovar os votos no fim do próximo mês em St. Thomas... para a família poder comparecer. O primeiro casamento foi em Vegas, quase um ano atrás...
Levantei o papel.
— Só algumas horas depois do incêndio. Ela é esperta.
Maddox caminhou lentamente até a sua mesa e sentou de novo. Sua incapacidade de ficar parado estava me deixando mais nervosa do que ele parecia estar.
— O que a faz pensar que foi ideia dela? — ele perguntou.
— Ele não parece do tipo que deixa a namorada salvá-lo — falei, pensando em sua postura nas fotos.
Maddox deu uma risadinha e baixou o olhar.
— Ele não é do tipo que deixa ninguém salvá-lo, e é por isso que esse negócio vai ser particularmente difícil. O agente especial Polanski insiste que eu preciso de reforço, e eu tenho de concordar com ele.
— Reforço pra quê?
— Vou ter que dar a má notícia para ele depois da cerimônia.
— De que ela se casou para ele ter um álibi?
— Não — ele disse, balançando a cabeça. — A Abby pode ter tido um motivo para se casar com meu irmão, mas esse motivo é que ela o ama. — Ele franziu o cenho. — Descobrir a verdade vai acabar com ele mesmo que ela estivesse tentando salvá-lo.
— Você sempre faz o que é melhor para os seus irmãos?
Ele olhou para as fotos que eu não podia ver.
— Você não tem ideia. — E suspirou. — Fiz o que eu pude depois do incêndio, mas, como você pode ver pela lista de mortos, uma sentença de dez anos para o Adam não vai ser suficiente. Ele recebeu duzentas e sessenta e quatro acusações de homicídio culposo, duas para cada vítima.
— Como foi que o promotor conseguiu isso? — perguntei.
— Adam foi indiciado sob duas alegações diferentes: homicídio por negligência criminosa e por contravenção penal.
Fiz que sim com a cabeça.
— Minhas mãos estavam atadas — Maddox continuou. — Não pude ajudar meu irmão... até deixar o Polanski por dentro do que me tornou um dos ASACS mais jovens da história do FBI. Eu tinha uma carta na manga. Ele quase não acreditou em mim. Meu irmão mais novo estava namorando e depois casado com a filha de uma pessoa de interesse investigativo em um dos nossos maiores casos: Mick Abernathy. Fiz o Polanski, claro que com a aprovação do diretor, desistir das acusações se o Travis concordasse em trabalhar com a gente, mas desvendar esse caso vai levar mais tempo do que a pena dele poderia ter levado.
— Ele vai ser um informante?
— Não.
— O FBI vai recrutá-lo? — perguntei, estupefata.
— Vai. Mas ele ainda não sabe.
Meu rosto se contorceu em repulsa.
— E por que falar isso pra ele no dia do casamento?
— Não vou contar no dia do casamento, mas na manhã seguinte, antes de voltar. Tem que ser pessoalmente, e eu não sei quando vou vê-lo de novo. Não vou mais para casa.
— E se ele não concordar?
Maddox soltou uma longa respiração, magoado com a ideia.
— Ele vai para a prisão.
— Onde eu entro nisso?
Ele virou um pouco na cadeira, os ombros ainda tensos.
— Apenas... me ouça. Foi cem por cento ideia do SAC. E ele está certo.
— O quê? — Minha mente estava dando voltas, e minha paciência estava diminuindo.
— Preciso de companhia para o casamento. Preciso que mais alguém do FBI vá até lá e testemunhe a conversa. Não sei como ele vai reagir. Uma agente do sexo feminino vai suavizar as coisas. O Polanski acha que você é a candidata perfeita.
— Por que eu? — perguntei.
— Ele falou o seu nome.
— Por que não a Val? Ou a Constance?
Maddox se encolheu e então encarou os dedos, que tamborilavam no tampo da mesa.
— Ele sugeriu alguém que se encaixasse.
— Encaixasse — repeti, confusa.
— Dois irmãos meus estão apaixonados por mulheres que... não são nada sutis.
— Eu não sou sutil? — perguntei, apontando para o centro do meu próprio peito. — Você está falando sério, porra? — Inclinei o pescoço. — Você já conheceu a Val?
— Está vendo? — Maddox falou, apontando a mão toda para mim. — É exatamente o que a Abby ou... a Camille, namorada do Trent, diria.
— Namorada do Trent?
— Meu irmão.
— Seu irmão Trent. E Travis. E você é Thomas. Quem está faltando? O Tigrão e o Toad?
Ele não achou graça.
— Taylor e Tyler. São gêmeos. Nasceram entre mim e o Trent.
— Por que tantos Ts? — eu tive que perguntar, mas estava mais do que irritada com a conversa toda.
Ele suspirou.
— É uma coisa do Meio-Oeste. Não sei. Lindy, preciso que você vá comigo ao casamento do meu irmão. Preciso que me ajude a convencê-lo a não ir para a prisão.
— Não deve ser tão difícil assim convencê-lo. O FBI é uma ótima alternativa comparado à prisão.
— Ele vai trabalhar como agente secreto. Vai ter que mentir para a esposa.
— E daí?
— Ele é completamente apaixonado por ela.
— Outros agentes secretos também são — soltei, sem sentir a menor empatia.
— O Travis tem um passado. O relacionamento dele com a Abby sempre foi inconstante, e ele encara a honestidade como um compromisso com o casamento deles.
— Maddox, essas conversa está me entediando. Nossos agentes secretos simplesmente dizem aos companheiros que não podem falar do trabalho e ponto-final. Por que ele não pode fazer o mesmo?
— Ele não pode contar nada a ela. Ele vai trabalhar em uma investigação que talvez incrimine o pai da Abby. Isso certamente poderia ser um problema no casamento dos dois. Ele não vai querer se arriscar a fazer algo que possa significar perdê-la.
— Ele vai se acostumar. Vamos dar a ele um álibi simples e forte e mantê-lo.
Maddox balançou a cabeça.
— Nada disso é simples, Liis. Vamos ter que ser excepcionalmente criativos para impedir que a Abby descubra. — Ele suspirou e olhou para o teto. — Aquela ali é atenta como uma maldita águia.
Estreitei os olhos para ele, desconfiada do fato de ele ter usado meu primeiro nome.
— O SAC quer que eu vá. Você quer?
— Não é má ideia.
— Sermos amigos é uma má ideia, mas posarmos de casal durante um fim de semana inteiro não é?
— O Travis é... difícil de explicar.
— Você acha que ele vai ficar violento?
— Eu sei que vai.
— Suponho que você não queira que eu atire se ele ficar violento.
Maddox me lançou um olhar.
— Então posso atirar em você? — perguntei. Ele revirou os olhos, e eu levantei as mãos. — Só estou tentando entender meu papel nisso tudo.
— O Travis não lida bem com as coisas quando não tem opções. Se achar que pode perder a Abby por isso, ele vai brigar. Perdê-la por mentir ou porque está preso não são boas opções. Ele pode recusar a oferta.
— Ele a ama tanto assim?
— Acho que essa não é a palavra adequada para descrever o que ele sente por ela. Ameaçá-lo de perdê-la é como ameaçar a vida dele.
— Isso é terrivelmente... dramático.
Maddox pensou no que falei.
— Drama é a natureza do relacionamento dos dois.
— Anotado.
— O Trent organizou uma despedida de solteiro na minha cidade natal: Eakins, Illinois.
— Já ouvi falar — comentei. Quando Maddox me lançou um olhar confuso, continuei: — Passei de carro pela entrada algumas vezes, chegando e saindo de Chicago.
Ele assentiu.
— No dia seguinte, vamos até o Aeroporto Internacional de O’Hare e voamos de lá para St. Thomas. Vou pedir para Constance te mandar as datas e o itinerário por e-mail.
Eu me sentia confusa em relação a voltar para casa tão rápido depois de ter partido.
— Tudo bem.
— Como eu disse, vamos fingir que somos um casal. Minha família acredita que trabalho com marketing, e eu gostaria que as coisas continuassem assim.
— Eles não sabem que você é um agente do FBI?
— Exatamente.
— Posso perguntar por quê?
— Não.
Pisquei.
— Tudo bem. Suponho que vamos dividir um quarto de hotel em Eakins e em St. Thomas.
— Correto.
— Mais alguma coisa?
— Por enquanto não.
Eu me levantei.
— Tenha uma boa tarde, senhor.
Ele pigarreou, obviamente surpreso com a minha reação.
— Obrigado, agente Lindy.
Girando nos calcanhares para sair da sala dele, eu estava ciente de tudo: a velocidade a que eu andava, o modo como meus braços balançavam, até mesmo minha postura ereta. Eu não queria dar nenhuma informação a ele. Eu mesma não sabia como me sentir em relação à viagem e certamente não queria que ele especulasse.
Quando voltei para a minha sala, fechei a porta e quase desabei na cadeira. Cruzei as pernas na altura dos tornozelos e as apoiei na mesa.
Os dedos do agente Sawyer bateram na porta, e ele me encarou com expectativa através da parede de vidro. Acenei para ele ir embora.
Maddox estava contente com a minha transferência de San Diego, e o SAC não me achava sutil — menos até do que a Val Vai Se Foder ou a agente Davies, a vadia. Olhei para minha blusa de botão azul-claro e para minha saia lápis.
Eu sou sutil pra caralho. Só porque falo o que penso, não tenho tato?
Meu rosto todo ficou vermelho de raiva. Achei que os dias em que as mulheres do FBI eram chamadas de peitudas e gostosas tinham acabado. A maioria dos agentes homens que faziam observações sexistas seria rapidamente silenciada por outros agentes homens, mesmo quando não estavam na presença de outras mulheres.
Não sou sutil? Vou acabar com a sutileza dele nessa porra de sala do esquadrão. 
Cobri a boca, apesar de não ter xingado em voz alta. Eles podem ter certa razão.
O apito agudo do ramal interno berrou duas vezes, e eu levei o receptor ao ouvido.
— Lindy.
— É o Maddox.
Eu me empertiguei na cadeira, apesar de ele não poder me ver.
— Tem mais um motivo pelo qual você é uma boa candidata, um que não mencionei para o SAC.
— Sou toda ouvidos — falei em um tom monótono.
— Vamos posar de casal, e eu... acho que você é a única agente que se sentiria suficientemente confortável para interpretar esse papel.
— Não consigo imaginar o motivo.
A linha ficou muda por dez segundos.
— Estou brincando. É bom saber que não é só porque o SAC acha que eu não tenho classe.
— Vamos esclarecer uma coisa. O SAC não disse isso, nem eu.
— Você meio que disse.
— Não foi o que eu quis dizer. Eu daria um soco no estômago de alguém que dissesse algo parecido sobre você.
Agora meu lado da linha ficou mudo.
— O-obrigada. — Eu não sabia o que mais responder.
— Fique de olho naquele e-mail da Constance.
— Sim, senhor.
— Tenha um bom dia, Lindy.
Coloquei o telefone no gancho e voltei os tornozelos para a posição anterior, sobre a mesa, pensando na viagem que faríamos em sete semanas.
Eu passaria várias noites sozinha com o Maddox, posando de namorada dele, e não estava nem um pouco chateada com isso, apesar de querer estar.
Tentei não sorrir. Eu não queria sorrir, então franzi a testa, e foi minha maior mentira desde que falei para o Jackson — e para mim mesma — que eu estava feliz com ele em Chicago.
Val bateu de leve no vidro e depois no relógio de pulso. Fiz que sim com a cabeça, e ela foi embora.
Eu não sabia quanto Maddox queria que eu falasse no assunto. Manter segredo sobre nossa noite e sobre meu objetivo no Esquadrão Cinco já era bem difícil. Infelizmente para mim, Val era minha única amiga em San Diego, e a suposição era seu superpoder.

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