Capítulo 3
O despertador tocou, me tirando da inconsciência, e eu estiquei o braço para bater no botão de soneca com a palma da mão. Os lençóis estavam enrolados nas minhas pernas, e a coberta tinha caído no chão, como acontecia todas as noites.
Eu me espreguicei e sentei devagar, estreitando os olhos para o sol forte que entrava pela janela do quarto. As paredes brancas o deixavam ainda mais forte, mas eu não tinha coragem de pedir a Phaedra para mudar nada. Ela e Chuck já tinham me dado esse loft quase de graça, para eu poder economizar dinheiro.
Vesti uma das cerca de dez camisetas com gola V guardadas no meu minúsculo armário e minha calça jeans preferida, que encontrei na loja popular mais próxima. Eu tinha comprado essa calça skinny apenas alguns dias depois de me mudar para o loft, após o primeiro salário do Bucksaw e depois que Phaedra descobriu que eu estava dormindo no carro, exatamente dez dias antes de meus pais o recuperarem para vendê-lo.
Apesar de eu ter um quarto cheio de roupas e sapatos de grife na casa deles, meu armário ali ainda tinha muito espaço. Além das coisas que eu tinha colocado em uma sacola — artigos de higiene, água, petiscos e a caixa de sapatos — antes de fugir, tudo o que eu tinha era meu carro e as roupas do corpo. Cinco anos no Bucksaw tinham me dado mais cinco calças jeans, três shorts e mais ou menos uma dúzia de camisetas. Era fácil viver com pouco quando você não tinha para onde ir.
Prendi a parte de cima do cabelo com um grampo, deixando a franja cair, o que me atrapalhava cada vez que eu piscava. Sempre nos meus malditos olhos!
Já tinha passado da hora de um corte de cabelo no Salão da Falyn. Olhei para a gaveta onde eu guardava a tesoura e decidi não fazer isso agora, já que faltava pouco tempo para o encontro com o bombeiro de elite bonitinho, mas decididamente azarado. De jeito nenhum ele conseguiria competir com minha versão perfeita dele no sonho, a que conseguia me fazer gozar só com uma olhada de relance. Então minha mente já odis pensara como uma decepção.
Depois de esfregar o rosto e terminar o resto da minha rotina matinal, peguei o avental e abri a porta. Com uma girada rápida do pulso, tranquei a porta ao sair. Depois de uma curta viagem por um corredor estreito e quinze degraus, eu estava no Bucksaw outra vez.
Chuck estava na bancada e Phaedra estava contando o dinheiro no caixa, o sol matinal destacando-lhe os fios prateados na cabeça.
— É como se eu nem tivesse saído daqui — anunciei.
— Você diz isso todas as manhãs — Phaedra devolveu.
— É como me sinto todas as manhãs.
— Você também diz isso todas as manhãs — comentou Chuck. Ele colocou um prato de panquecas mergulhadas em calda, cobertas com uma pequena espiral de chantili e um morango fatiado, no passa-pratos entre a cozinha e o salão de refeições.
— Apenas para registrar, só consigo pensar em um outro lugar onde eu preferia estar — falei, pegando meu prato.
— Você vai chegar lá — disse Chuck.
— Então, o garoto — começou Phaedra, com um toque de alerta em seu tom de voz.
— Ele é muito bonito.
— Nada que eu não consiga encarar. — Minhas palavras estavam envolvidas na garfada de panquecas que eu acabara de colocar na boca.
— Ele vai te pegar aqui? — Chuck perguntou, cruzando os braços sobre o passapratos, que ficava pouco abaixo do nível do peito dele.
O espaço era grande o suficiente para acomodar pelo menos cinco pratos de comida quando estávamos movimentados.
Ele olhou para a esquerda quando Hector empurrou as portas duplas que davam na cozinha.
— Bom dia — disse Chuck.
— Olá, sr. Chuck — Hector cumprimentou, sentando em um banco na ponta do balcão. Ele rezou em agradecimento pelo omelete que trouxera da cozinha antes de enfiar um quarto dele na boca.
Cerca de três metros atrás de onde Hector estava sentado ficava a escada que levava ao meu loft.
— O que está olhando, Falyn? — perguntou Phaedra.
— Eu costumava ficar incomodada com o fato de que qualquer pessoa dentro do Bucksaw pudesse subir essa escada.
— Até você perceber que eu não tenho paciência com clientes curiosos.
Chuck riu.
— Nem mesmo com crianças. Lembra aquela vez em que você fez o filho do Morris chorar?
— Caramba, Chuck, ele já está quase no ensino médio. Será que um dia você vai deixar isso de lado?
— Não — respondeu Chuck. — Porque eu adoro sua expressão quando toco nesse assunto.
De onde estava, no passa-pratos, Chuck olhou para a frente, encarando o longo balcão repleto de bancos enfileirados. Ele separava o caixa e duas estações de bebidas da área de refeições. Para Kirby e eu, aquele estreito espaço parecia a primeira base, um local onde podíamos ter alguns segundos para nos prepararmos antes de voltar para as trincheiras.
Sentei em um dos bancos do bar, mastigando contente um pedaço de panqueca coberto com calda.
— Você fugiu da minha pergunta, Falyn — disse Chuck.
Eu não estava especialmente apressada para engolir a delícia doce e fofinha na minha boca e responder a Chuck, mas não queria ser grosseira.
— Não sei se ele vem me pegar aqui. Não tive notícias.
— Ele vem, posso apostar — disse Phaedra, fechando a gaveta do caixa. Ela cruzou os braços. — Agora, se ele não for um cavalheiro...
— Eu sei — falei. — Dou um soco na garganta dele.
— Boa garota — disse Phaedra, socando o ar. — Eles odeiam isso.
— Ela está certa — Chuck gritou da cozinha. — Odiamos mesmo!
Dei uma risada, sabendo que Chuck preferia cortar a mão de trabalho do que fazer alguma coisa com uma mulher para merecer um soco na garganta.
Chuck desapareceu do passa-pratos e empurrou as portas duplas. Ele secou as mãos no avental limpíssimo, deixando listras marrom-alaranjadas ali.
— Oh-oh — falei no meio da mastigação, notando a expressão de Chuck. — Você não vai vir com aquele discurso pra cima de mim, vai? Por favor, não.
— E esse garoto? Estou preocupado com as suas motivações, mas estou ainda mais preocupado com as intenções dele — disse Chuck.
Phaedra olhou radiante para o marido, como se quarenta e seis anos de amor tivessem duplicado com uma única pergunta.
Terminei de mastigar e limpei a boca com um guardanapo. Eu o amassei e o deixeicair no colo .
A voz tranquila, porém firme, de Blaire ecoou em minha cabeça.
Garfo errado, Falyn.
Não tomamos sopa desse jeito, Falyn.
Endireite as costas, Falyn.
Nenhum homem que valha a pena vai querer você se não se comportar, Falyn.
Não discutimos assuntos vulgares, como a sua opinião, à mesa do jantar, Falyn.
Quando eu me sentia obrigada a usar os modos que me foram impostos à força mesmo depois da minha libertação, eu me comportava mal só para contrariar Blaire. Mesmo que ela não pudesse ver, a rebelião me fazia sentir melhor.
Quase cinco anos depois de ir embora, meu sangue ainda fervia porque esses hábitos não morriam, assim como a necessidade dos meus pais de me controlarem, de me obrigarem a me encaixar no molde perfeito de como deveria ser a primeira família do Colorado.
— Falyn? — chamou Phaedra, sua voz confortavelmente grave me trazendo de volta para o Bucksaw e me afastando da minha infância. — Você está bem, querida?
Pisquei.
— Ele, humm... Não importa quais são as intenções dele. Eu só disse sim pra irritar o William.
— Então por que seguir em frente? — perguntou Chuck.
— Porque ele entrou no jogo quando eu menti para os meus pais — falei com um sorriso. — Ele não se importa, de qualquer forma. Só está procurando uma trepada fácil.
Chuck me encarou com uma expressão vazia, depois recuou lentamente pelas port asduplas até sumir de vista.
Phaedra caiu na gargalhada.
— Você vai ser a morte desse homem. Ele te ama como se você fosse filha dele. Deixe-o acreditar que você é virgem. — Assim que as palavras saíram de sua boca, ela congelou, e seus olhos se arregalaram. — Ah, querida, me desculpa.
— Acho que ele já sabe que eu não sou — comentei, fazendo questão de dispensar seu pedido de desculpas.
Claramente abalada, Phaedra voltou a preparar seu mundialmente famoso chá gelado.
Eu me levantei e contornei a ponta do balcão. Eu a abracei por trás, apoiando o queixo na dobra de seu pescoço.
— Está tudo bem — sussurrei.
— Maldita boca grande essa minha — ela fungou. — E maldito cérebro pequeno.
Eu a contornei, esperando seus olhos encontrarem os meus.
— Maldito coração mole esse seu.
Seu lábio inferior tremeu, e ela me puxou para um abraço rápido. Sua mão enrugada deu um tapinha em minhas costas.
— Não temos filhos. Você e Kirby são o que temos. Agora suma daqui. Vá trabalhar, pelo amor de Deus — disse ela, voltando para a jarra de chá.
Estendi a mão para pegar um guardanapo e lhe entreguei. Phaedra o levou até o rosto, secando os olhos, imagino, já que ela ainda estava de costas para mim.
— Eu falei sai — disse ela.
— Sim, senhora. — Eu me apressei para contornar o balcão e peguei meu prato. Enfiei os pedaços restantes de panqueca na boca enquanto seguia para a cozinha.
Pete, redondo, careca e de cenho franzido, estava de pé ao lado de Chuck, ajudando com algo relacionado à preparação, como fazia todas as manhãs.
Hector já estava na pia, lustrando os talheres.
— Bom dia, srta. Falyn — ele disse, pegando meu prato. Ele puxou o borrifador e lavou o prato branco redondo de algo entre vidro e plástico.
— Pela centésima vez, Hector...
— Não fale, senhorita. Eu sei. — E deu um sorriso tímido.
Pete sorriu. Ele estava em silêncio marinando um frango.
Os três, além de Phaedra, cujas criações eram responsáveis pela fama do Bucksaw, formavam o staff da cozinha.
Com o olhar vazio e a mente em algum lugar distante, Chuck estava misturando seu molho especial. Ele secou a bochecha molhada com o dorso da mão e continuou cortando. Então me olhou e balançou a cabeça.
— Malditas cebolas — disse ele, secando a outra bochecha.
— Ãhã — comentei, hesitante.
Phaedra não era a única manteiga derretida da família.
Com um sorriso irônico, Pete olhou de relance para o chefe e depois continuou com suas tarefas.
Ajudei Hector a enrolar os talheres. Depois enchi o compartimento de xarope deCoca-Cola na máquina de refrigerante atrás do balcão, limpei as janelas e verifiquei duas vezes se a área de refeições estava brilhando de tão limpa.
Gunnar deixou Kirby na cafeteria às oito em ponto, e ela ficou parada na porta da frente com os braços cruzados, como fazia todas as manhãs. Eu não sabia por que ela insistia em chegar tão cedo. Só abríamos às nove.
Abri a porta e, assim que ela entrou, a tranquei.
— Cheguei! — ela anunciou conforme cruzava a área de refeições, outra coisa que fazia todas as manhãs.
— Vou avisar à imprensa! — brincou Phaedra.
Kirby mostrou a língua para Phaedra e depois piscou para mim enquanto empurrava as portas duplas, deixando-as balançar violentamente depois de passar.
— Um dia você vai quebrar essas malditas portas! — Phaedra gritou.
— Desculpa. — Kirby foi rápida, mas sincera, seu rabo de cavalo escuro balançando enquanto ela carregava as latas de sal e pimenta.
Quando ela começou a encher os saleiros e pimenteiros de cada mesa, as duas trocaram sorrisos conhecidos.
— Conheço essa pirralha desde que ela era uma criança largada — disse Phaedra, balançando a cabeça para Kirby.
— Estou ouvindo — anunciou Kirby.
— Ótimo! — soltou Phaedra. — Eu preparava um panini de frango grelhado, picles e maionese apimentada para mim todo dia, bem na hora em que a Kirby passava a caminho de casa, depois da escola.
Kirby sorriu.
— E magicamente ela sempre perdia o apetite.
— Só porque eu sabia que você estaria faminta quando enfiasse essa cabeça de corvo pela porta — disse Phaedra, num misto de audácia e bobeira. — Ela sempre falava sem parar, de boca cheia, tagarelando sobre seu dia, enquanto acabava com o meu pobre panini, depois nem me agradecia antes de limpar a boca com a manga da blusa e andar alguns quarteirões até a Old Chicago, onde a mãe era garçonete.
Kirby fechou a tampa de um saleiro.
— Isso não é totalmente verdade.
— Tá bom — Phaedra soltou. — Às vezes ela usava um guardanapo.
Kirby balançou a cabeça e deu uma risadinha conforme abria a tampa do pimenteiro.
Quando vi a hora, comecei a abrir as tampas para Kirby, e ela acelerou.
— A Kirby é a única pessoa no mundo, incluindo Chuck — falei, apontando com a cabeça para a cozinha —, que consegue te mostrar a língua e continuar viva pra contar a história.
— Não. Eu tenho duas meninas, e aceito qualquer merda das duas — disse Phaedra, arqueando a sobrancelha para mim.
Engoli o nó que se formou em minha garganta. Phaedra tinha um jeito de me fazer sentir parte da família quando eu menos esperava e sempre quando eu mais precisava.
Ela pegou um pano de prato no balcão quando se aproximou de mim. Colocou o pano sobre o ombro e depois olhou para o relógio. Então me virou para encarar a parede de vidro, em direção aos três carros estacionados, cheios de gente.
Ela ergueu a minha mão com o saleiro aberto ainda ali e começou a recitar seu soneto preferido:
— Mãe dos Exílios! Do farol de sua mão. Brilha um acolhedor abraço universal; os seus suaves olhos comandam o porto.
Depois de cada verso, ela sacudia minha mão erguida, o sal caindo sobre a nossa cabeça como uma nevasca instável.
— Dai-me os seus fatigados, os seus pobres, as suas massas encurraladas!
Quando Phaedra terminou, ela soltou a minha mão, e eu sacudi os pontinhos brancos do cabelo.
Ela suspirou.
— Ninguém mais fala assim.
— Você fala — disse Kirby.
— Meu Deus, como eu amo meu país.
Kirby fez uma careta.
— Qualquer um saberia isso depois de ver sua ficha criminal pelo número de vezes que foi presa por participar de manifestações. O que esse poema tem a ver?
Phaedra pareceu chocada.
— É Emma Lazarus — falei.
A expressão de Kirby permaneceu a mesma.
Continuei:
— Esse soneto está numa placa na Estátua da Liberdade.
Quando a ficha finalmente caiu, a boca de Kirby formou um o.
Phaedra revirou os olhos.
— Querido senhor Jesus, nos ajude.
— Eu pego a vassoura — Kirby falou, se apressando até o quarto dos fundos.
Phaedra saiu resmungando até a cozinha. Não saber partes importantes da história ou ignorar temas de conhecimento geral deixava seu temperamento inflamado.
Kirby reapareceu, a vassoura e a pá de lixo na mão.
— Merda. Estou tentando esquecer essas coisas todas desde a formatura. Estamos nas férias de verão. Ela devia me dar uma folga.
— Vai ser um longo dia — falei, pegando a vassoura.
Kirby e eu limpamos a sujeira, e ela se apressou até a lata de lixo com a pá enquanto eu a abria. As pessoas dentro dos três carros estacionados na frente começaram a se agitar, e, quando Kirby retornou depois de levar a vassoura para os fundos, os clientes jáestavam es perando para sentar.
— Não terminei os saleiros — ela sussurrou para mim.
— Deixa comigo — falei, me apressando para terminar seu serviço.
Dei uma olhada no relógio, me perguntando como pudemos nos atrasar tan to.Normalmente, terminávamos com dez minutos de antecedência.
Phaedra não revelou seu humor aos clientes, mas Kirby e eu tivemos de nos esforçar muito para mantê-la sorrindo. Uma jarra de chá gelado caiu no chão, Hector quebrou uma pilha de pratos e eu não fechei direito a tampa de um dos saleiros, então Chuck teve que preparar um sanduíche de filé com o dobro de queijo para substituir o que estava com mais sal do que eu tinha no cabelo.
Kirby arrumou um lugar para a escritora e sua assistente, a segunda visita delas em alguns dias.
— Boa tarde — falei com um sorriso. — Voltaram, hein?
— É tão bom — disse a escritora. — Eu queria experimentar o cubano antes de irmos embora.
— Não foi isso que eu pedi — um homem gritou para Phaedra.
Dwayne Kaufman estava sentado sozinho no canto, lambendo o polegar depois de jogar a parte de cima do pão de seu hambúrguer no chão.
— Oh-oh — sussurrou Kirby em meu ouvido. — O Dwayne andou bebendo de novo. Devo chamar a polícia?
Balancei a cabeça. Quem fica bêbado antes do meio-dia?
— Deixa a Phaedra cuidar disso.
— Eu disse sem ketchup! E está frio pra caralho! — gritou Dwayne.
— Sinto muito, meu bem — disse Phaedra. — Vou dar um jeito nisso imediatamente, Dwayne. — Ela pegou o prato dele e passou apressada pelas portas duplas.
— Não sou seu bem! — ele gritou atrás dela. — Cafeteria de merda.
Fui até Dwayne e sorri.
— Posso trazer um café enquanto o Chuck grelha seu hambúrguer?
— Vai se foder — resmungou ele, me enfrentando, mas com os olhos no chão. — Eu só quero uma porra de um hambúrguer do jeito que pedi. É tão difícil assim?
Sua xícara de chá estava pela metade, mas eu queria mantê-lo ocupado até Phaedra voltar.
— Ela está cuidando disso. Vou trazer mais chá — falei, pegando sua xícara.
Ele agarrou meu punho.
— Tira esses peitos redondos da minha cara!
O líquido espirrou da xícara direto para os meus sapatos enquanto eu tentava me desvencilhar dele, e aconteceu de novo quando outra mão masculina envolveu o pulso de Dwayne.
Dwayne congelou, e eu também.
De repente, Taylor surgira ao meu lado.
— O que foi que você acabou de falar para a moça? — Sua voz era baixa e sinistra.
Comecei a falar, mas Dwayne soltou a minha mão e deu uma risada nervosa.
— Não quero mais chá — rosnou ele. — Só me deixem em paz!
Taylor soltou a mão de Dwayne e deu um passo para trás, abrindo caminho para Phaedra.
— Aqui está, Dwayne. Cheeseburguer direto da chapa, sem ketchup. Sinto muito — disse Phaedra, mais alto que o necessário.
Ela pôs seu corpo entre mim e Dwayne, e eu dei mais um passo para trás.
— Como está esse? Melhor? — ela perguntou.
Ele deu uma mordida. Fechando os olhos, mastigou como um animal, com pão e um pedaço de cebola caindo da boca.
— Sim, mas demorou muito.
Phaedra fez um sinal para eu voltar ao trabalho e deu uma olhada para Taylor, mas eu não tinha certeza do que isso significava.
Acompanhei Taylor até a mesa dele. Ele estava sozinho, dessa vez.
— Você está bem? — ele perguntou.
— Estou sim — respondi. — Posso te trazer uma bebida?
— Quero uma de suas famosas Cherry Cokes, por favor.
— Já volto — sussurrei.
— Ei — disse ele, dando um tapinha em meu cotovelo antes de eu dar um passo —, você está chateada?
Fiz uma pausa e dei uma olhada para Dwayne.
— Estava tudo sob controle.
— Eu acredito.
— Então não precisava se meter — sibilei.
— Provavelmente não.
— Fica longe dos meus assuntos. Não preciso da sua ajuda. Nunca.
Ele relaxou na cadeira, inabalável.
— Tá bom.
— Só isso? “Tá bom”?
Ele deu uma risadinha.
— Eu entendo.
Senti que ele me observava enquanto eu ia até o balcão de bebidas.
— Sinto muito — falei, parando na mesa da escritora. — Posso te trazer uma bebida?
Ela balançou a cabeça, os olhos radiantes.
— Eu não me divertia tanto há semanas. Quero um suco de laranja.
— Quero um mango sunrise — disse a assistente.
Eu assenti e segui meu caminho. Dwayne ergueu sua xícara na minha frente, e eu esbarrei nela, derramando chá nele e em mim.
Instintivamente, levantei as mãos, as palmas estendidas, e parei na ponta dos pés, apesar de já ser tarde demais.
— Ai, caramba, pego outro para você agora mesmo.
— Mas que porcaria. Sua vaca! — ele gritou ao mesmo tempo. A cadeira dele bateu no piso de cerâmica quando ele se levantou, assomando-se sobre mim.
— Tudo bem, agora você me deixou puto da vida. — A voz tensa de Taylor ecoou de seu assento do outro lado do salão.
No instante seguinte, ele estava ao meu lado. Ele deu uma gravata em Dwayne e olevou em direção à porta.
— Não! Para! Por favor! — eu implorei.
Cada palavra se misturava aos protestos de Dwayne.
Todos no salão ficaram paralisados, encarando Dwayne agitando os braços e tentando empurrar Taylor, sem sucesso.
Cobri a boca, e Kirby observou, perplexa, de seu posto na recepção. Pouco antes de Taylor chegar à porta, Phaedra deu seu famoso assobio, daqueles que dava para ouvir até num estádio de futebol americano do ensino médio superlotado. Eu me encolhi com o barulho estridente.
— Para com isso! — ela ordenou.
O salão ficou em silêncio. Chuck e Hector estavam observando do passa-pratos.
Dwayne parou de se debater, e Taylor soltou seu pescoço.
— Ninguém expulsa meus clientes, além de mim! — Ela marchou até Dwayne, estreitando os olhos. — Você xingou a minha garçonete?
— Ela derramou a porra do chá em mim! — disse ele, apontando na minha direção.
— Este é um estabelecimento familiar, e não dizemos porra! — explicou Phaedra, praticamente gritando a última parte. — Volta quando tiver um pouco de educação, Dwayne! — E se virou. — Quer saber? Nem assim! — E olhou para Taylor. — Leva esse lixo pra fora, garoto.
Taylor cruzou os braços, radiante. Dwayne não reagiu. Em vez disso, saiu envergonhado.
Phaedra encarou o resto da cafeteria com um sorriso iluminado.
— Alguém precisa de alguma coisa?
A maioria balançou a cabeça. A escritora e sua assistente permaneceram em silêncio, parecendo tão alegrinhas que eu achei que fossem aplaudir a qualquer momento.
Voltei para o bar.
Kirby me seguiu.
— Uau. Que merda, isso foi demais — disse ela, virando-se de costas para a parte do salão onde Taylor estava. — Você está repensando seus planos de dispensar o cara antes mesmo de começar?
— Sim — respondi, fazendo a pior Cherry Coke do mundo. Levei o copo para o outro lado do bar e marchei até ele antes de pousar a bebida com força sobre a mesa.
Taylor pareceu se divertir, o que só me deixou ainda mais irada.
— Preciso cancelar hoje à noite — falei.
— Você já tinha algum compromisso importante? — ele perguntou.
Pisquei.
— Não.
— Emergência familiar que pode esperar até você sair do trabalho?
Franzi a testa.
— Não.
— Então por que está cancelando?
— Porque você é um valentão.
Ele levou a mão ao peito.
— Eu sou um valentão?
— Sim — respondi entredentes, tentando manter a voz baixa. — Você não pode simplesmente agredir nossos clientes daquele jeito.
— Acabei de fazer isso. — Ele se recostou, satisfeito demais consigo mesmo. — Você não ouviu sua chefe? Ela que mandou.
Retorci o lábio, irritada.
— E você adorou. Porque é um valentão. E eu não saio com valentões.
— Ótimo.
— Ótimo? — Minha voz aumentou uma oitava.
— Você me ouviu. — Taylor cruzou os braços, o oposto total de chateado, ofendido ou irritado.
Eu esperava que minha rejeição pública roubasse aquele sorriso convencido de seu rosto.
— Então por que você está sorrindo?
Ele levou o polegar até o nariz, os músculos do braço enrijecendo com o movimento.
— Acho que você vai mudar de ideia.
Dei um passo à frente e mantive a voz baixa ao dizer:
— Nem se eu quisesse e, nesse momento, com certeza não quero. — Virei de costas e fui cuidar das minhas mesas.
O movimento aumentou conforme a tarde avançava, e, quando verifiquei a mesa de Taylor, percebi que ele tinha ido embora e deixado uma nota de vinte para trás. Eu a levantei. Ele tinha pedido apenas a Cherry Coke ruim, o que significava uma gorjeta de dezessete dólares.
Engoli a surpresa e a gratidão e enfiei o dinheiro no avental antes de limpar a mesa.
Levei o copo para Hector e lavei as mãos.
— Você não acha que foi meio dura? — perguntou Chuck.
— Com quem? — indaguei.
— Você sabe com quem.
— Ele é um babaca. Eu falei que estava tudo sob controle e ele fez um drama.
Ele acenou para me dispensar.
— O Dwayne mereceu. A Phaedra queria expulsar esse homem daqui há anos. Pouco antes de você começar a trabalhar aqui, ele virou uma mesa.
Fiquei boquiaberta.
O borrifador ficou em silêncio, e Hector falou:
— Não combina com a sra. Phaedra deixar alguém fazer isso e voltar sempre.
Chuck deu de ombros.
— Nem sempre ele foi assim. A esposa dele foi embora alguns anos atrás. Desde então o cara começou a beber. A Phaedra aguentava os ataques dele porque tinha pena, eu acho.
Hector e eu nos entreolhamos.
— E você não acha que o Taylor é um valentão por expulsá-lo daquele jeito? — perguntei.
Ele balançou a cabeça.
— Eu sempre sonhei em fazer exatamente isso.
— Mas ela é sua esposa. Você só estaria protegendo a honra dela. Eu entendo — falei.
Ele pressionou os lábios.
— Você está certa, mas está errada.
Franzi a testa, confusa.
— Não acho que aquele garoto, Taylor, está procurando alguma coisa fácil. Pelo contrário. Acho que ele sabe que já encontrou.
— O que isso quer dizer? — perguntei.
— Significa que é melhor se acostumar. Caras como ele não desistem facilmente quando encontram uma garota como você.
Não contive uma risada.
— Ele que experimente.
Chuck forçou um sorriso e voltou para seus afazeres no fogão.
Ele é um Maddox Falyn, ele nunca desiste
ResponderExcluirOs meninos Maddox ou amam de vdd, ou naum... e adoram um desafio kkkkk
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