Capítulo 4

América

Meus dedos do pé brilhavam ao sol, recém-pintados com o esmalte Pretty in Pink. Eles se mexiam enquanto eu curtia a fina camada de suor na pele e o calor saindo em ondas do calçamento que rodeava a água azul-turquesa. Eu certamente estava queimando sob os raios fortes, mas continuei deitada nas ripas de plástico branco da espreguiçadeira, feliz por estar mergulhada em vitamina D, mesmo com os pestinhas do 404B espalhando água como bárbaros.
Meus óculos de sol caíram pela décima vez, as gotas salgadas na ponte do nariz fazendo-os deslizar como um pedaço de manteiga derretida.
Abby levantou a garrafa de água.
— Um brinde ao nosso dia de folga juntas.
Levantei a minha e encostei na dela.
— Saúde.
Nós duas bebemos, e eu senti o líquido gelado descer pela garganta. Coloquei a garrafa ao meu lado, mas ela deslizou da minha mão e rolou para baixo da espreguiçadeira.
— Droga — falei, protestando, mas sem me mover. Estava quente demais para me mexer. Estava quente demais para fazer qualquer coisa além de ficar no ar-condicionado ou deitada ao lado da piscina,
mergulhando de vez em quando para não entrar em combustão espontânea.
— A que horas o Travis sai do trabalho? — perguntei.
— Cinco — sussurrou ela.
— Quando é que ele sai da cidade de novo?
— Só daqui a duas semanas, a menos que surja alguma coisa.
— Você é incrivelmente paciente com isso.
— Com o quê? Com ele ganhar dinheiro? Não tem outro jeito — disse ela.
Virei de bruços e a encarei, com o rosto achatado nas ripas.
— Você não fica preocupada?
Abby baixou os óculos e me olhou por cima deles.
— Deveria?
— Não. Que idiotice a minha. Esquece.
— Acho que o sol está fritando o seu cérebro — disse Abby, colocando os óculos de volta. Ela se recostou na espreguiçadeira, relaxada.
— Eu falei pra ele.
Não olhei para ela, mas senti Abby encarando a lateral do meu rosto.
— Falou o que pra quem? — ela perguntou.
— Para o Shep. Eu falei pra ele... mais ou menos... que eu estava preparada.
— Por que você não disse claramente que está preparada?
Suspirei.
— Acho que eu mesma vou fazer o pedido.
— Vocês dois me cansam.
— Ele falou alguma coisa pro Travis?
— Não. E você sabe que qualquer coisa que o Trav me conta em segredo é assunto proibido.
— Isso não é justo. Eu te contaria, se soubesse que é importante. Você é uma amiga de merda.
— Mas sou uma ótima esposa — disse ela, sem uma gota de arrependimento na voz.
— Eu falei para ele que devíamos visitar os meus pais antes do início das aulas. Uma viagem de carro.
— Divertido.
— Espero que ele entenda a insinuação pra fazer o pedido.
— Quer que eu plante uma sementinha?
— Já está plantada, Abby. Se ele não me pedir em casamento, é porque não quer...
mais.
— É claro que ele quer. Vocês vão completar três anos juntos em agosto. Daqui a menos de três meses. Definitivamente não é o maior tempo que uma garota esperou por uma aliança. Acho que parece que é muito tempo porque o Trav e eu fugimos muito rápido pra casar.
— Talvez.
— Tenha paciência. Rejeição é algo difícil para o ego deles aceitar.
— O Travis não pareceu se importar.
Ela ignorou minha insinuação.
— Duas vezes leva o dobro do tempo.
— Joga na cara mesmo, sua malvada — soltei.
— Eu não quis... — Abby deu um grito quando foi tirada da espreguiçadeira pelos braços de Travis.
Ele deu dois passos largos e pulou na piscina. Ela ainda estava gritando quando eles saíram da água.
Eu me levantei e fui até a borda, cruzando os braços.
— Você chegou cedo.
— Teve uma desistência na academia.
— Oi, baby — disse Shepley, envolvendo os braços ao meu redor.
Diferentemente de Travis, ele estava vestido, então eu estava em segurança.
— Oi — comecei.
Mas Shepley se inclinou e, em pouco tempo, estávamos caindo na piscina como uma coluna em ruínas.
— Shepley! — gritei quando atingimos a superfície da água, antes de afundarmos.
Ele subiu e me puxou junto, me envolvendo em seus braços. Em seguida balançou a cabeça e sorriu.
— Você é doido! — falei.
— Não foi planejado, mas está quase quarenta graus. Estou cozinhando — disse ele.
Os pestinhas do prédio ao lado jogaram água em nós, mas, depois de apenas uma olhada de Travis, eles se embolaram para sair da piscina.
Dei um beijo em Shepley, saboreando o cloro em sua boca.
— Você pensou sobre a viagem? — perguntei.
Ele balançou a cabeça.
— Dei uma olhada na previsão do tempo. Parece que tem um negócio embaçado a caminho.
Franzi a testa.
— Sério? Eu cresci no Caminho dos Tornados. Você acha que eu me importo com o clima?
— E se chover granizo? O Charger...
— Tudo bem, a gente vai com o Honda.
— Até Wichita? — Ele franziu o nariz.
— Ele aguenta! Ele já fez essa viagem! — falei, na defensiva.
Shepley arrastou as pernas pela água até a borda, depois me levantou e me colocou sentada no concreto. Tirou a água do rosto e olhou para mim, com os olhos semicerrados.
— Você quer dirigir o Honda até a casa dos seus pais, nesse fim de semana, com uma tempestade a caminho? Por que a pressa?
— Por nada. Só achei que seria legal sair um pouco daqui.
— Só vocês dois. Uma viagem especial — disse Abby.
Quando Shepley virou para olhar para ela, lancei um olhar de alerta para minha melhor amiga. Sua expressão séria não entregava nada, mas eu ainda queria afogá-la.
Ele trocou olhares com Travis e depois virou para me encarar, a confusão evidente em seu rosto.
— Vamos ter tempo pra conversar, eu acho. Andamos ocupados. Vai ser legal.
— Exatamente — falei.
Depois que eu disse essas palavras, alguma coisa se iluminou nos olhos de Shepley, e um milhão de pensamentos pareceram girar em sua mente.
O que quer que o estivesse perturbando, ele afastou e se impulsionou para cima, me dando um beijinho nos lábios.
— Se é isso que você quer, vou pedir uma folga.
— É o que eu quero.
Ele saiu da piscina, com a camiseta branca transparente, a calça jeans ensopada, os tênis guinchando a cada passo.
— Vou telefonar. Mas nós vamos com o Charger. Ele pode ter vinte e cinco anos a mais que o Honda, mas é mais confiável.
— Obrigada, baby — falei, sorrindo, enquanto ele se afastava. Depois que ele estava fora do alcance da voz, virei para Abby, sem nenhuma emoção no rosto. — Você é uma idiota.
Ela caiu na gargalhada.
Travis olhou de Abby para mim e de novo para ela.
— Que foi? Qual é a graça?
Ela balançou a cabeça.
— Eu te conto mais tarde.
— Não conta, não! — falei, chutando água na direção dela.
Com a mão, Travis limpou a água do rosto, depois beijou a têmpora de Abby. Ela o deixou, nadando até a lateral da piscina e subindo a escadinha. Pegou a toalha na espreguiçadeira e se secou. Travis a observava como se fosse a primeira vez que a visse.
— Estou surpresa de você ainda não estar grávida — falei.
Abby congelou.
Travis franziu a testa.
— Por favor, Mare! Não fala a palavra com G. Ela vai surtar!
— Por quê? Vocês já conversaram sobre isso? — perguntei à minha amiga.
— Algumas vezes — respondeu Abby, olhando diretamente para Travis. — Ele acha que eu vou parar de tomar pílula no instante em que me formar.
Minhas sobrancelhas se ergueram.
— E você vai?
— Não — respondeu ela rapidamente. — Só quando comprarmos uma casa.
A expressão de Travis se intensificou.
— Temos um quarto extra.
— Obrigada, Mare — resmungou Abby, se inclinando para esfregar a toalha nas pernas.
— Desculpa — falei. — Vou entrar. Temos uma viagem pra planejar.
— Ei, se vocês forem mesmo, tenham cuidado. O Shep está certo. Parece que o clima vai ficar bem ruim. Talvez vocês devessem esperar até o fim da temporada de tempestades.
— Se não formos agora, vai ficar complicado. Depois que as aulas começarem, vai ser tarde demais. Vamos ter que esperar um feriado. — Olhei para baixo. — Pelo jeito como ele está agindo, não sei se vai ter paciência por muito mais tempo.
— Ele vai esperar pra sempre, Mare — disse Abby.
— Tarde demais pra quê? — perguntou Travis, saindo da piscina. — O que ele está esperando?
— Nada. — Lancei um olhar de alerta para Abby antes de pegar minhas coisas e empurrar o portão para sair. Ele se fechou depois que eu passei, e mantive a mão no
metal quente. — Fica de boca fechada. Você pode ser mulher dele, mas era minha amiga antes.
— Tudo bem, tudo bem — disse Abby, se acovardando sob o meu olhar.



Shepley

— Obrigado, Janice. Agradeço muito. — Apertei o botão vermelho e coloquei o celular na cama.
Janice me adorou desde o instante em que entrei em seu escritório para a entrevista.
O que começara como um emprego de auxiliar tinha se transformado em um trabalho administrativo; depois, de alguma forma, eu tinha ido parar no departamento financeiro.
Janice esperava que eu permanecesse lá depois de me formar na faculdade, me prometendo promoções e oportunidades a rodo, mas meu coração não estava ali.
Encarei a gaveta quase vazia da minha mesa de cabeceira. É ali que está meu coração.
Quando a luz da tela do celular se apagou, a escuridão do quarto me envolveu. O sol da tarde de verão se esgueirava pelas laterais das cortinas, criando sombras fracas nas paredes.
Morávamos ali havia menos de um ano, e as paredes já estavam lotadas de molduras com nossas lembranças. Não tinha sido difícil misturar nossos pertences, porque os últimos dois anos tinham sido nós e nosso. Agora, eu não tinha certeza se era um símbolo da nossa vida juntos ou um memorial do casal que éramos.
Eu me arrependi de pedi-la em casamento no instante em que América disse “não”.
Depois disso, ficamos diferentes.
Esfreguei o músculo entre o ombro e o pescoço. Estava duro de tensão. Eu já tinha tirado as roupas molhadas e enrolado uma toalha na cintura. Era felpuda, algo que eu não exigia antes de morar com a minha namorada, mas eu tinha aprendido a curtir tudo isso, além do cheiro de sua loção nos lençóis e as caixas de lenço de papel em todos os cômodos do apartamento. Até mesmo a bagunça na sua mesa de cabeceira tinha se tornado reconfortante.
Eu me tornei agudamente consciente da gaveta na mesa de cabeceira. Ela guardava um único item — uma pequena caixa vermelho-escura. Dentro estava o anel que eu fantasiara colocar no dedo dela, o anel que ela usaria no dia do nosso casamento, combinando perfeitamente com uma aliança. Eu o comprara dois anos antes e o tirara da caixa duas vezes.
Tínhamos uma longa viagem de carro pela frente, e eu ia levá-lo comigo. Nossa viagem até o Kansas marcaria a terceira vez que a caixa seria vista fora daquela gaveta, e eu me perguntei se ela voltaria para o seu lar. Eu não tinha certeza do que significava se ela voltasse, mas não podia continuar me perguntando e esperando.
Minhas mãos estavam ásperas e secas quando entrelacei os dedos e olhei para o chão, me questionando se deveria fazer um pedido floreado, como na última vez, ou simplesmente perguntar. Pedi-la em casamento
desta vez levaria a muito mais. Se ela dissesse “não”, teria que falar sobre o que viria depois. Eu sabia que América queria se casar um dia, porque ela já tinha falado sobre isso comigo, e com Abby quando eu estava perto.
Talvez ela não queira se casar comigo.
A preocupação de que nunca seria o momento certo para América dizer “sim” se tornou um tormento diário. Não era uma palavra tão minúscula, mas me afetara. Afetara a nós dois. Mas eu a amava demais para forçar a barra. E tinha muito medo de que ela dissesse alguma coisa que eu não queria escutar.
Mas então havia os fragmentos de esperança — como ela falar do futuro — e as confirmações mais profundas, como morarmos juntos. Mas, enquanto abríamos as caixas da mudança, eu me perguntava se ela tinha simplesmente concordado em arrumar um apartamento porque era teimosa demais para admitir para os pais que eles estavam certos sobre não estarmos preparados.
Mesmo assim, o medo da verdade continuava me impedindo de fazer o pedido. Eu a amava demais para deixá-la escapar com tanta facilidade. Ela teria de brigar para ir embora, do mesmo jeito que eu brigaria para mantê-la comigo. Questionei minha sanidade por sequer considerar fazer o pedido pela terceira vez, e temi que fosse o primeiro dia agonizante de muitos em que eu teria de aprender a viver sem ela.
Mas, se ela dissesse “sim”, teria valido a pena afastar todo o medo.
— Baby? — chamou América. A porta da frente se fechou depois que ela falou.
— No quarto — respondi.
Ela abriu a porta e acendeu a luz.
— Por que você está no escuro?
— Acabei de falar com a Janice por telefone. Ela não ficou feliz com a notícia em cima da hora, mas me deu a sexta-feira de folga.
— Legal! — disse ela, deixando a toalha cair. — Vou tomar banho. Quer vir comigo?
Ou você vai pra academia?
— Posso ir de manhã — falei, me levantando.
América puxou um fio enquanto andava, e a parte de cima do biquíni caiu no chão.
Parou alguns passos depois para escorregar a parte de baixo pelas coxas, então a deixou cair.
Segui atrás dela, pegando as peças de roupa enquanto andava. Ela colocou a mão atrás da cortina para abrir a torneira e franziu o cenho para mim quando joguei suas roupas no cesto.
— Sério? Você está arrumando minha bagunça?
Dei de ombros.
— É só um hábito, Mare. É compulsivo. Não consigo evitar.
— Como foi que você conseguiu morar com o Travis? — ela perguntou.
Pensar em Travis fez o início da minha ereção desaparecer.
— Era muito trabalho.
— Morar comigo é muito trabalho?
— Você não é tão ruim. Eu prefiro. Confie em mim.
Ela abriu a cortina e depois segurou minha toalha, puxando até a parte presa se soltar.
O algodão felpudo estava no chão e, em seguida, América também estava.
Com uma das mãos, agarrei a borda da fórmica que cercava a pia e, com a outra, enterrei delicadamente os dedos em seu cabelo ainda molhado. Sua boca era incrível. Ela usou uma das mãos para segurar minha circunferência e, com um pouco de sucção e um roçar de dentes, me provocou e me chupou até eu começar a achar que arrancaria a fórmica do gabinete.
Pouco tempo depois eu estava gozando, mas ela não cedeu, sua boca trabalhando em mim até a última gota. Eu a levantei e puxei a cortina, empurrando-a para trás e depois a virando. Com uma das mãos entre suas pernas e a outra segurando a pele macia da sua cintura, beijei seu ombro enquanto me enterrava fundo nela. O som que ela emitiu seria suficiente para me fazer gozar pela segunda vez, mas eu esperei por ela.
Trabalhei com os dedos num círculo em sua pele molhada, sorrindo quando ela começou a se contorcer na minha mão, pedindo mais num sussurro. Enquanto eu metia dentro dela, agonizando lentamente, América continuava gemendo e sussurrando.
A água escorria em suas costas, empurrando seus cabelos para o lado, e eu passei a palma da mão em sua pele bronzeada, saboreando cada centímetro, esperando que ela lembrasse como éramos bons juntos quando chegasse a hora de tomar uma decisão.
O tom de seus gritos ficou mais agudo, aqueles gritinhos adoráveis que ela dava quando chegava ao clímax. Sem conseguir parar, eu a estoquei repetidas vezes até gozar mais uma vez, ficando mais lento enquanto ela gozava, ofegando, apesar de não ter durado mais que vinte minutos.
América virou para me olhar, vestindo nada além de um sorriso paquerador. Ela se ergueu, se afastando de mim — o pior sentimento do mundo — e envolveu os braços ao redor do meu pescoço enquanto a água escorria pela nossa cabeça.
— Eu te amo — sussurrou.

Passei as mãos em seus cabelos, deslizando a língua para dentro de sua boca, na esperança de que isso fosse suficiente.

Comentários

  1. Eu não entendo pq provocar tanto assim um parceiro (a).
    Se ela sabe que o cara não gosta de bagunça, então se esforça caralho. Larga tudo no chão e fica chateada quando ele pega. Tnc!
    Ele já provou que não se importa em limpar as merdas dela. Então, ela tem dias opções: Ou melhora e faz algo a respeito para participar da limpeza e tudo mais, ou fica de boca fechadinha e aprende a apreciar a boa vontade dele em limpar o ambiente.
    Chata do caralho. Estou detestando América! Chata do ca-ra-lho!

    ResponderExcluir
  2. Não sabe o que quer. Típica mimadinha filhinha de papai e mamãe. Abby tem mais fibra.
    Belo desastre eu cheguei a admirar América. Mas, nesse livro a cada capítulo me dá uma irritação. Só Shep pra aturar essa quenga.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Nada de spoilers! :)

Postagens mais visitadas deste blog

Trono de Vidro

Os Instrumentos Mortais

Trono de Vidro