Capítulo 8
Um tipo de música country tocava nos alto-falantes
de teto espalhados por todo o prédio da revista Opinião das Montanhas.
Eu encarava uma pilha de fotos da mais recente meia maratona, balançando a
cabeça.
— Você não gosta da música. Logo imaginei que você
era uma garota do rock — disse Wick, entrando na minha sala.
— Eu me desligo da música — falei, colocando as
fotos espalhadas sobre a mesa. — São as fotos. Estão péssimas, Wick. Quem
tirou?
— Ela está certa — comentou Jojo, sentada na
poltrona à minha frente. Ela cruzou as pernas, as botas ainda molhadas da
caminhada na neve. — Eu já vi. São uma droga. Você tem que parar de deixar o
Mike entregar essas porcarias. Para de trabalhar com ele. Ponto-final.
Wick franziu a testa.
— Não tem mais ninguém.
Apontei com a cabeça para Jojo.
— A cobertura dela da caminhada artística foi
sensacional. Por que não usa a Jojo?
Jojo sorriu e se levantou.
— Porque a Jojo tem um escritório para administrar.
— Quem tirou essas? — perguntou Wick, apontando para
os porta-retratos sobre a minha mesa.
— Ah — falei, virando-os devagar. — Fui eu. É só uma
coisinha para me lembrar do que estou tentando fazer.
Jojo contornou minha mesa, pegando um porta-retratos
com uma foto que eu tinha tirado na casa dos meus pais, no fim de semana
anterior. Eu tinha fotografado metade das fotos em preto e branco da Finley que
estavam penduradas no corredor principal da casa dos meus pais, tiradas quando
ela tinha apenas catorze anos. Mesmo naquela época, ela era linda.
— Quem tirou essa? Quem é ela? — perguntou Jojo.
— Minha irmã — falei, com a voz baixa. Eu não falava
com a Finley desde a vez em que eu acordara ao lado do Sterling. Ela me deixou
algumas mensagens de texto, mas possivelmente suspeitava de que eu não havia
lhe retornado porque eu não queria falar sobre suas férias na praia enquanto eu
estava presa num globo de neve.
— São muito boas, na verdade — disse Jojo. Ela olhou
para Wick, e ele concordou. Depois pegou outro porta-retratos e o colocou de
volta sobre a mesa. — Que câmera você está usando?
Dei de ombros.
— Uma automática que minha irmã comprou pra mim.
Nikon, eu acho. Está ali. — Apontei para uma bolsa no canto.
Jojo foi até lá e vasculhou minhas coisas, pegando a
câmera e a levantando.
— Eu comecei com uma dessas. Posso te ensinar o
básico durante o almoço. Você tira umas fotos hoje à noite e me mostra amanhã.
— Por quê? — perguntei.
— Porque a sua função aqui na empresa pode se
ampliar.
— Eu adoraria almoçar, mas estou com o orçamento
apertado. Trouxe um sanduíche de casa.
— É o seu quarto salário. Você ainda não consegue
comprar o almoço? — ela debochou. Como não respondi, ela continuou: — É por
minha conta. Nem tenta discutir. Vou ganhar.
Wick assentiu.
— Ela está certa.
— Está bem. Tenho só umas coisas pra fechar antes.
Jojo seguiu para a própria mesa, e Wick desapareceu
em sua sala, fechando a porta. Fiquei feliz por ele estar de bom humor.
Pensamentos sobre Sterling e as muitas reações que Finley poderia ter em
relação ao nosso momento de loucura temporária corriam soltos em meu cérebro, e
eu estava dormindo umas três horas por noite.
Terminei de responder aos e-mails de Wick, depois
afastei minha cadeira da mesa. O telefone tocou.
— Ellie, linha um — disse Jojo pelo alto-falante.
— Pra mim?
— Ãhã.
Peguei o telefone e apertei o botão da linha um, me
perguntando se era um bartender reclamando de alguma coisa que não estava
funcionando no Turk ou o Mike esperando uma boa notícia em relação a suas fotos
horrorosas.
— Aqui é a Ellie — falei, esperando vários segundos
até a voz do outro lado começar a falar.
— Eu... desculpa por te ligar no trabalho. Parabéns
pelo emprego, falando nisso.
Eu me encolhi, como se isso ajudasse a abafar a
conversa.
— Você não pode ligar pra cá, Sterling.
— Eu sei. Desculpa. Mas a Finley não está retornando
minhas ligações.
Revirei os olhos.
— Ela nunca retorna suas ligações. Deixa de ser
paranoico e para de me ligar. Não pense que eu não me lembro de você me dar
aquela pílula que eu nem sei o que era. O que você fez? Me deu um boa-noite
cinderela?
— Eu... não foi culpa minha.
— De quem é a culpa, então? — sibilei. — Eu nem
lembro o que aconteceu.
— Nem eu! — soltou ele. — Você estava chateada. Era
pra gente relaxar. Era uma coisa nova que eu peguei com o Preston.
— Com o Preston? — sussurrei. — Você me deu uma
coisa que pegou com o Preston? Você poderia ter nos matado!
— Você não precisava ter tomado. Você não pode botar
a culpa toda em mim.
— Eu confiei em você — falei, apertando o telefone e
tentando gritar com ele no tom mais baixo possível. — Mas você está certo.
Aceito minha parte no que aconteceu. Você pode amar a
Fin, mas ela é minha irmã. Estou tentando mudar tudo
pra poder provar pra ela que eu mudei. Se ela descobrir toda essa história...
— Você não pode contar pra ela — disse Sterling,
parecendo desesperado.
— Eu não vou contar. Mas você sabe muito bem,
Sterling. A Finley sempre descobre. Ela soube que fui eu que cortei o cabelo da
Barbie dela, e ela nem estava em casa. Poderia ter sido qualquer pessoa, mas
ela sabia que tinha sido eu.
Sterling deu uma risada.
— Eu me lembro dessa história. — Ele ficou calado por
meio segundo. — Você está certa. Estamos fodidos.
Fechei os olhos. Meus lábios roçaram no bocal
enquanto eu falava.
— Não se trata de nós. Não quero mais falar com
você, Sterling. Você está sozinho.
— Ellie...
Desliguei o telefone e suspirei, me afastando da
mesa e pegando minhas coisas para almoçar com Jojo.
Ela estava parada perto da porta, me esperando,
quando dobrei o corredor. Eu a segui até seu carro e me abaixei para entrar, me
abraçando para me aquecer. Jojo parecia ignorar o frio, virando a ignição como
se não estivesse usando sacos de dormir enormes como luvas.
— Você trouxe a câmera, né? — perguntou ela.
Levantei a bolsa.
— Pensei em comermos no Camp’s Café. A comida não é
orgânica nem nada assim, por isso não tem turistas, e é um dos lugares mais
tranquilos por aqui. Assim vou poder te mostrar alguns truques na sua Nikon.
Estou empolgada para ver o que você pode fazer. Parece que você tem um talento
natural.
Dei uma risada.
— Que foi? — perguntou Jojo, entrando na estrada e
apertando os botões do aquecedor com as luvas.
— Foi isso que a Finley disse. A minha irmã.
— Bem, ela estava certa. Talvez a gente possa
começar cobrindo coisas diferentes do mercado rural e da vida selvagem.
Jojo estacionou no beco, numa vaga destinada a casas
que se espalhavam pelo quarteirão todo. Ela não parecia preocupada: saltou e
bateu a porta do carro. Andamos juntas, e eu a segui passando por caçambas de
lixo e barris de óleo e atravessando uma porta de tela suja para entrar na
cozinha dos fundos.
— Jojo! — gritou um dos cozinheiros.
Jojo acenou, depois fez sinal para eu segui-la pela
área da despensa, passando pela grelha e pelo caixa.
— O de sempre! — gritou Jojo. — Em dobro!
A mulher atrás do balcão assentiu e gritou para os
funcionários:
— Dois Jojos!
Tiramos o casaco, o cachecol, as luvas e o chapéu e
os colocamos ao nosso lado, numa cabine perto da janela.
— Você tem seu próprio sanduíche? Isso é legal.
— Na verdade, não. Só que eu peço a mesma coisa
todas as vezes, e você também vai adorar.
Uma massa frita com abacate, um ovo frito no ponto
médio por cima e o molho especial da casa. É coreano ou coisa assim, o que é
estranho pra uma lanchonete com estilo country, mas é f... é bom. Confie em
mim.
Franzi a testa. Aquilo não me parecia nem um pouco
apetitoso, mas era uma refeição grátis e melhor do que peito de peru no pão
integral, então eu não ia reclamar.
Dei minha câmera a Jojo, e ela me falou tudo sobre
exposição, abertura, velocidade do obturador etc. Ela me fez brincar com os
diferentes modos criativos da câmera, me mostrou como eram usados e me explicou
por que eles eram superiores aos modos que apareciam com ícones.
Quando terminei de engolir a massa esquisita, mas
deliciosa, de Jojo, eu já estava ajustando a câmera e tirando algumas fotos do
café e do exterior.
Jojo viu as fotos e balançou a cabeça. Roí as unhas,
esperando o julgamento.
— Ridículo — disse ela. E me devolveu a câmera. —
Você realmente tem um olho bom. O
Wick vai surtar, porque ele está prestes a perder a
assistente.
— Não — falei, acenando como se não acreditasse. —
Sério?
Jojo sorriu, colocando os cotovelos sobre a mesa e
se aproximando.
— Sério. Você vai continuar ajudando no escritório e
limpando a mesa do café, tenho certeza, mas você vai ser ótima. Dá pra ver
isso.
— Não sou jornalista. Não sei escrever. Eu pagava
pra alguém fazer meus trabalhos na faculdade.
Jojo fez uma careta.
— Você teve que redigir trabalhos pra se formar em
cerâmica?
Fechei os olhos, envergonhada.
— Tive.
Jojo caiu na gargalhada, e eu ri com ela; ri de
verdade, pela primeira vez em muito tempo.
— Obrigada — falei, tentando recuperar o fôlego. —
Eu não sabia que conseguia rir desse jeito estando sóbria.
Jojo apoiou o queixo na mão.
— Sei que você é um tipo de faz-merda da família,
mas você não é tão ruim. Não consigo acreditar que você tenha mudado tanto em
um mês.
— É incrível o que a desintoxicação e a
responsabilidade podem fazer por uma garota — comentei, meio que provocando.
— Você está se saindo muito bem. Nem uma vacilada.
— É difícil beber ou comprar erva quando se está
falida. E, mesmo que eu tivesse feito isso, não ia contar para a minha chefe.
— Não sou sua chefe, e você não é mentirosa. Não é
só por causa do dinheiro, Ellie, e isso é meio triste, porque eu tenho visto
você trabalhar tanto que ainda parece estar esperando errar.
— Isso não é verdade — discordei, balançando a
cabeça e mexendo no copo de água.
Jojo soltou uma risadinha, depois começou a pegar
suas coisas.
— Vamos. Você tem trabalho a fazer.
Jojo me deixou a um quarteirão da revista, e eu me
inclinei, olhando furiosa para ela pela janela aberta do lado do passageiro. O
escapamento estava soltando fumaça na parte traseira do carro, e minha
respiração não estava muito diferente.
— Sério? Isso aqui é o programa No limite de
fotografia? Está fazendo menos doze graus!
Jojo acenou para mim.
— Tem umas coisas interessantes no caminho. Quero
ver como você as vê.
— Ótimo.
— Te vejo daqui a pouco — disse ela, com um sorriso
convencido.
Minha câmera estava gelada na pele, e eu me esforcei
para mudar as configurações com os dedos duros enquanto Jojo se afastava, indo
em direção ao estacionamento atrás do nosso prédio.
Virei para o outro lado, avistei uma casa velha, e
me inclinei para trás para ver a antena. Tirei uma foto de teste e verifiquei,
mexi nas configurações de novo e tirei outra. Quando o mostrador exibiu a foto,
sorri. Jojo estava certa. O modo automático era uma bosta. Era um mundo de diferença
saber como os ajustes afetariam a foto.
Caminhei pela estrada, me afastando da revista, me
perdendo nas fotos e observando como a qualidade mudava de acordo com as
diferentes variações de ISO, a velocidade do obturador e o tempo de exposição.
Tirei close-ups de folhas com neve, telhados com neve, carros quebrados cobertos
de neve, vidros de janelas com neve... Havia muita neve nas minhas fotos, mas
eu fiz funcionar.
— Você foi demitida? — perguntou Tyler, ou Taylor,
do outro lado da rua. — O Zeke e eu fizemos uma aposta de quanto tempo você ia
durar. — Ele estreitou um dos olhos contra o sol do fim de tarde, e eu me
virei, percebendo que o dia estava chegando ao fim. Puxei a manga do casaco
para ver o relógio. Eu estava do lado de fora, numa temperatura congelante,
havia duas horas e meia, e mal tinha percebido.
— Qual dos dois é você? — perguntei, guardando a
câmera.
Ele deu uma risadinha.
— Tyler. Você é auditora de seguros ou alguma coisa
assim? — perguntou ele com um sorriso.
— Não. Estou tirando fotos pra revista, agora.
— Eles devem estar desesperados — provocou ele.
— Vai se foder — xinguei, virando para andar os três
quarteirões de volta até o meu prédio.
Tyler estava em pé diante da sua estação. Também não
percebi que eu tinha ido tão longe.
— Ei — gritou ele. Ouvi suas botas espirrando água
na rua molhada e esmagando o sal grosso antes de ele me alcançar. — Eu estava
brincando.
— Eu também — falei, continuando pela calçada.
— Então... hum... — Ele enfiou as mãos nos bolsos da
calça cargo. — Você e a Paige...
— Não existe eu e a Paige.
— Não? Por quê? Alguém disse que você e ela poderiam
ser... Você gosta de homens, certo? Quer dizer... tem que gostar, depois da
noite que tivemos. Mas não consigo te entender.
— O que tem pra entender?
Um sorriso atravessou lentamente seu rosto.
— Você, Ellie. Estou tentando te entender.
— Você está falando comigo de novo.
— Achei que desta vez não tinha problema.
— Por quê?
Suas sobrancelhas se juntaram. Ele estava ficando
frustrado.
— Você, hum... ainda pensa naquela noite?
— Na verdade, não.
Ele suspirou.
— Já faz um mês, Ellie.
— Tô sabendo.
— Eu ainda penso naquilo tudo.
Inspirei, esperando poder expirar o modo como ele me
fazia sentir.
— Já falamos sobre isso — insisti, continuando a
caminhada até o prédio da revista.
— Ellie — disse ele, rindo de nervoso. — Você pode
parar e falar comigo só por um segundo?
Parei, levantando o queixo para encontrar seu olhar.
— Afinal, você está interessado em mim porque eu não
desapareci como suas outras garotas de uma noite só, por causa do meu pai ou
porque eu posso ou não estar interessada em homens?
— Nenhuma das alternativas. Por que você está sendo
tão difícil?
— Foi uma noite, Tyler. Eu era uma pessoa diferente.
Não quero mais me sentir atraída pelo lutador suado, disposto a levar uma
garota bêbada para a cama.
Ele enfiou as mãos nos bolsos e estreitou um dos
olhos; e aquela maldita covinha em sua bochecha apareceu outra vez.
— Você não quer, mas está.
Ele era tão excessivamente confiante que meus insultos
não o desanimavam. E arrogante demais para acreditar em mim.
Continuei andando.
— Você está dificultando as coisas. Estou tentando
ser clara. Só porque eu não estou no meu momento mais forte, isso não significa
que estou tentando emitir sinais confusos.
— Eu já te levei pra cama. Eu ia perguntar se você
queria sair.
Parei para analisar seu rosto, decidindo se ele
estava falando a verdade ou não. Havia esperança em seus olhos, talvez um pouco
de medo. Tyler era alto e musculoso e lutava contra incêndios ambientais para
ganhar a vida, mas ele tinha medo de mim, e com bons motivos. Por trás de
tantos músculos e tanta agressividade, Tyler era bom, e isso significava que eu
era ruim para ele — mesmo que agora eu estivesse tentando ser uma pessoa melhor
do que antes.
— Não posso sair com você.
Ele continuou como se não tivesse me escutado:
— Eu saio às dez da noite.
— Às dez já estou na cama.
— Que tal um café da manhã? Você só precisa chegar
ao trabalho às nove, certo?
— Porque eu gosto de dormir até tarde, gênio.
— Você é uma garota do tipo bacon com ovos? Ou do
tipo panquecas?
Franzi a testa. As duas coisas pareciam incríveis.
Um café da manhã grátis era tão bom quanto um jantar grátis, e Sally tinha
decidido que não ia deixar Maricela comprar comida até eu falar com meus pais
por telefone — algo que eu não planejava fazer... jamais. Eu não estava virando
a vida do avesso por eles; eu estava fazendo isso pela Finley, e isso
significava que em breve eu passaria a viver de Miojo, a menos que Maricela
tivesse pena de mim e fizesse um pouco dos seus famosos tamales.
Café da manhã gratuito parecia perfeito, mas usar
alguém para obter comida, sabendo que esse alguém estava interessado em mim,
não era ser a pessoa boa que eu estava tentando ser.
— Não.
— Não? — perguntou ele, surpreso.
— Estou meio ocupada comigo mesma. Tenho certeza que
você consegue encontrar outra garota pra sair com você.
Meus pés finalmente decidiram reclamar dos três
passos gelados até a sede da revista. O sino da porta tocou quando a empurrei,
parando enquanto eu batia as botas no tapete.
— Eu estava começando a me perguntar se você ia
voltar — disse Jojo. Seu sorriso amplo desapareceu. — Você sabia que o Maddox
está lá fora?
Virei e vi Tyler parado do lado de fora, com as mãos
nos bolsos do casaco, esperando. Apontei para as janelas, exigindo que ele
voltasse para o lugar de onde tinha vindo. Ele balançou a cabeça.
— O que você está fazendo? — perguntou Jojo.
— Como é que a gente se livra desses caras? Ele
parece chiclete grudado na sola do meu sapato.
— Não sei dizer. Mas tenho quase certeza que o
Maddox nunca esperou no frio por garota nenhuma. Você devia fazê-lo esperar até
ficar azul. Você sabe... por todas as outras garotas. — Ela estendeu a mão. —
Deixa eu ver o que você trouxe.
Tirei o cartão da câmera e lhe entreguei. A
empolgação iluminou seu rosto quando ela inseriu o cartão na lateral do monitor
e sentou, as rodinhas da cadeira gemendo quando puxou a cadeira para perto.
Meus dedos estavam vermelhos e congelados, e eu me
perguntei como eles conseguiam trabalhar tanto tempo lá fora, em temperaturas
abaixo de congelantes. Obter os ajustes certos e a foto adequada rapidamente se
tornou uma obsessão, e isso me fez perder completamente a noção de tempo. Mesmo
parada ao lado de Jojo enquanto ela clicava nas centenas de fotos, eu queria voltar
lá para fora e fazer tudo de novo.
Jojo balançou a cabeça e apoiou o cotovelo na mesa,
segurando o queixo com a mão. Ela cobriu a boca com os dedos, e o clique do
mouse ficou mais rápido.
— Eu nem sei o que dizer.
— A verdade. Ainda tenho o emprego de assistente se
as fotos forem ruins, né?
— Não são ruins.
— Não?
— São incríveis!
Respirei fundo.
— São?
— Pai! — gritou Jojo, parecendo mais uma
pré-adolescente impaciente do que uma jovem capaz de administrar uma empresa
inteira.
Wick saiu apressado do escritório, cambaleando, mas
motivado.
— São boas?
— Veja você mesmo — disse Jojo, ainda clicando o
mouse.
Cruzei os braços, sentindo a pele queimar enquanto
se aquecia lentamente, e mudei o peso do corpo de um pé para o outro, sem saber
como lidar com a reação dos dois. Wick colocou uma das mãos no ombro da filha,
se inclinando para ver melhor o monitor.
— Ellison — disse Wick, encarando a tela. — Não são
ruins, menina.
— É? — perguntei, fungando.
Ele se empertigou e me deu um tapinha no ombro.
— Ela precisa de uma tarefa, Jojo. Nada dessas
merdas entediantes. Alguma coisa que tanto os turistas quanto os moradores
queiram conhecer melhor. Uma coisa empolgante! Sensual!
Jojo franziu a testa.
— Eca. Não fala isso, pai.
Tyler finalmente empurrou a porta para entrar.
— Não vou embora.
Revirei os olhos.
— Você não tem trabalho pra fazer?
Wick estalou os dedos.
— Sim! É isso!
— O quê? — perguntou Jojo.
— A primeira tarefa da Ellie! — Ele apontou para
Tyler. — Ela pode acompanhar a equipe de bombeiros de elite. Sabemos o básico,
mas o que eles realmente fazem? Qual é o nível de perigo do trabalho deles? E
de dificuldade física? O que é necessário pra ser um bombeiro de elite? Quem
são eles? O que fazem no tempo livre?
— Não — falei, mais apelando do que respondendo.
— Ai, meu Deus, pai, isso é brilhante!
— Jojo — implorei. — Eu não sou jornalista.
— Eu te ajudo — disse Jojo. — Posso reescrever ou
escrever a coisa toda, se precisar. Você só faz as anotações e tira as fotos.
Wick sorriu, com todos os dentes amarelos à mostra.
Estufou o peito, orgulhoso da filha.
— Vai ser um artigo especial. Edson e Wick. Pode ser
escolhido pela Associated Press.
— Não vamos nos adiantar. Ao menos sabemos se isso é
possível? — perguntei. — Tenho certeza que existem problemas de segurança.
Wick apontou para Tyler.
— Dá um jeito nisso, Maddox. Estou cobrando um
favor.
— Não precisa cobrar um favor — falei.
Tyler deu um passo em direção à mesa de Jojo.
— Tenho certeza que posso ajeitar as coisas com o
superintendente. Tenho folga amanhã. Posso te levar pra conversar com ele.
Suspirei e passei os dedos no cabelo, implorando
para Wick e Jojo com os olhos.
— Parem. Vamos pensar nisso por dois segundos. Vocês
querem que a minha primeira tarefa como fotógrafa amadora seja um artigo
especial sobre acompanhar bombeiros de elite nos incêndios? Sério?
Jojo desligou o computador, vestiu o casaco e piscou
para mim.
— Me traz algo maravilhoso.
— É meu segundo dia tirando fotos e você quer algo
maravilhoso?
— Eu confio em você — disse Jojo. — Agora vai. Por
hoje acabou. O José já está lá fora.
Eu me arrastei até o escritório para pegar minhas
coisas. Quando voltei ao saguão, Tyler estava parado no escuro, conversando com
Jojo sobre a minha tarefa. Jojo já tinha apagado as luzes e estava me esperando
para ir embora, com as chaves na mão para trancar a porta depois que eu saísse.
Tyler andou comigo até o meio-fio, onde o Audi
estava estacionado, soprando nuvens brancas pelo escapamento. Sally não tinha
autorizado o uso do carro, mas José tinha certeza de que meus pais não iam
querer que eu andasse quilômetros na neve.
Eu não tinha essa certeza.
— Então... café da manhã amanhã, antes de irmos pra
lá? Por minha conta.
— Isso não é uma piada para mim — expliquei. —
Preciso do emprego. Se eu fizer merda...
— Você não vai fazer merda. Vou garantir que você
tenha muita coisa para fotografar. Me deixa pagar seu café da manhã antes de
irmos para a estação. A gente conversa sobre como apresentar a ideia para o meu
chefe, e eu terei uma impressão melhor do que você quer.
— Eu não sei o que eu quero.
— Está bem — disse ele, e a covinha na bochecha
apareceu. — De qualquer maneira, depois do café da manhã, você vai ter uma
ideia melhor do que quer.
A porta traseira do Audi gemeu quando eu a abri.
— Ellie...
— Só lembra o seguinte — falei. — Não foi culpa
minha. Tentei te poupar do problema.
— Sou bombeiro, Ellie. Sou eu que faço a parte do
salvamento nesse relacionamento.
Deslizei pelo banco traseiro e fechei a porta. Tyler
deu um tapinha na janela, e eu a abri.
— Isso não é um relacionamento.
— Já te falei. Estou aberto para uma amizade
colorida — disse ele, com um sorriso largo.
— Você está passando vergonha.
— Eu? — disse Tyler, tocando o próprio peito. — Que
nada!
Fechei a janela enquanto Maddox se afastava. O banco
de couro estava quentinho, e eu esfreguei os dedos sem luva.
José virou à esquerda na estrada, em direção à minha
casa, me olhando pelo retrovisor.
— Você parece feliz, senhorita.
Olhei pela janela, encarando os faróis que quebravam
a escuridão.
— Acho que o que você está vendo é irritação.
— Você tem visita hoje à noite.
— Visita? — perguntei. — Por favor, me diz que não é
o Sterling. Nem os meus pais. Merda, não são os meus pais, né?
José deu uma risadinha.
— Nenhum deles. É a garota de cabelo azul.
— A Paige?
Ele assentiu.
— Há quanto tempo ela está lá?
— Quase uma hora. Ela levou biscoitos. São bons.
— Você comeu os meus biscoitos?
— Não, srta. Ellie. Ela levou quatro dúzias.
— Ela deve saber que a Sally está tentando me matar
de fome.
José diminuiu a velocidade no portão, depois o
atravessou, dirigindo devagar pela entrada de carros e parando em frente à
casa, perto de um Hyundai hatch, modelo 1980. A tinta azul estava lascada, e um
longo arranhão com mossa se estendia desde o para-choque até o banco traseiro. O
carro era fofo, mas surrado — perfeito para Paige.
Ela me cumprimentou no vestíbulo, jogando os braços
ao meu redor. Estava enrolada numa coberta com cheiro da Finley, deixando à
mostra apenas a cabeça, as mãos e o All Star vermelho surrado.
— Espero que não tenha problema eu ter vindo.
— Não. Claro que não.
Ela me puxou para a cozinha.
— Eu trouxe biscoitos — disse ela, tirando a tampa
de um pote plástico que parecia mais velho que ela.
Pegou um biscoito doce redondo, com cobertura branca
na forma de um floco de neve. Dei uma mordida.
— Uau — falei, ainda mastigando. O biscoito derreteu
na minha boca, e a cobertura era imoral. — Você mesma fez isso?
Ela fez que sim com a cabeça.
— Receita da minha avó.
Maricela abriu a geladeira e apontou para um prato
coberto antes de fechar o casaco e pegar suas coisas para ir embora. A lanterna
traseira de José também refletiu pelo vidro jateado, tornando a visita surpresa
de Paige um alívio ainda maior.
— Como estão as coisas? Você meio que desapareceu —
disse Paige, escolhendo outro biscoito.
— Foi um mês difícil.
— O Tyler disse que seus pais cortaram sua grana. É
verdade?
— Tyler Maddox? Você o tem visto? — Uma pontada
esquisita de ciúme queimou meu estômago.
Ela deu de ombros.
— No Turk. Ele disse que você deu um pé na bunda
dele.
— Eu não dei um pé na bunda dele. Eu teria que estar
com ele pra isso acontecer.
Paige deu uma risadinha, e seu riso infantil me fez
estender a mão para ela. Em seguida, ela entrelaçou os dedos compridos nos
meus.
— Senti falta de ter você por perto.
— Ainda estou por perto.
— É verdade? Sobre os seus pais? É por isso que você
está tão diferente?
— Diferente no bom sentido, espero — falei, fazendo
uma pilha com as migalhas dos biscoitos. Paige não respondeu. — É verdade, sim.
— Bom, eu vim te salvar. — Ela se abaixou e, quando
levantou, tirou uma garrafa de um saco de papel marrom. Vasculhou os armários
até achar dois copos e os colocou sobre o balcão.
Minha boca se encheu de água ao ouvir o som da tampa
se abrindo e o respingo inicial do líquido âmbar no fundo do copo. Paige encheu
os dois copos até a borda.
— Calma — falei. — Não bebo uma gota há mais de um
mês.
Ela me deu um copo e levantou o dela.
— À sobriedade.
— Eu... — Minha garganta ardeu, ansiando pela
bebida. Tudo bem. Só um copo. Eu ia beber só um copo.
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