Capítulo 25
Luzes brancas incandescentes pendiam do no teto,
presas ao longo da musselina enrolada nas vigas. Velas votivas largas eram
cercadas por elaborados centros de mesa florais verdes e brancos.
Abby e Travis dançavam uma música lenta no centro do
salão, sussurrando e sorrindo, delirantemente felizes. Eu estava deitada no
chão, tirando fotos e procurando novos ângulos. Eu já tinha tirado fotos da
festa de casamento, das famílias, dos casais e da primeira dança. A seguir seria
o corte do bolo, mas Travis e Abby não pareciam estar com pressa.
Eu me levantei, sentindo alguém dar um tapinha no meu
ombro. Tyler estava parado atrás de mim, barbeado e maravilhoso usando um
smoking, com o botão de cima da camisa aberto e a gravata-borboleta pendurada
desleixadamente.
— Quer dançar? — perguntou ele.
— Acho melhor me concentrar. Eu odiaria perder alguma
coisa.
Ele colocou as mãos nos bolsos da calça e fez que sim
com a cabeça.
— Ah, vai lá! — disse Camille, puxando minha câmera
até a alça deslizar pela minha cabeça.
— Eu tiro foto de vocês.
— Prefiro estar do outro lado da câmera — falei.
— Por favor — pediu Tyler, me conduzindo em direção à
pista de dança.
Eu o segui, mas Camille clicando minha câmera como um
paparazzo era enlouquecedor.
Tyler e eu sorrimos para algumas fotos, depois
Camille decidiu experimentar suas habilidades como fotógrafa nos pais de
Shepley e em Trenton.
Tyler encarou nossas mãos enquanto se balançava
comigo a poucos passos dos não-tãorecém- casados. Ele encostou o rosto macio no
meu, me cheirando e saboreando o momento.
— Essa música é boa — disse ele. — Já ouvi umas cem
vezes e nunca pensei que ia dançá-la com você em St. Thomas.
— É lindo aqui. Eu tinha me esquecido. Se eu ainda
não falei... obrigada.
— Se eu não tivesse pago, os pais da America teriam
feito isso pra você.
— Talvez eles tivessem reservado um quarto só pra mim
— falei com um sorriso cínico.
— Duvido. Ninguém acredita que somos só amigos,
apesar da sua insistência.
Olhei para o copo de “água gelada” que eu tinha
deixado na nossa mesa. Antes do casamento, esvaziei uma garrafa de água e desci
para enchê-la com vodca. Cada gole que tomei durante o dia me fez sentir
fisicamente melhor e emocionalmente pior.
— No instante em que eles jogarem o bolo na cara um
do outro, vou parar. Catorze horas são suficientes para um dia. Isso é mais
estressante do que estar nas montanhas diante de um incêndio.
A boca de Tyler se curvou para formar um meio
sorriso, e ele beijou minha têmpora. Não me afastei, mal pensando duas vezes.
Mais cedo, a família dele tinha falado que eu cederia ao Tyler em algum
momento. Eu nem sabia mais o que éramos. Tínhamos dado início a uma série de dois
passos para a frente e quatro passos para trás desde o começo, e não
conseguíamos parar com isso.
Gotas de suor se formavam entre minha pele e meu
vestido, umedecendo minha nuca. Não estava tão quente, mas estava úmido. O ar
estava denso e pesado, caindo sobre a minha pele como um cobertor elétrico.
A música acabou, e Travis conduziu Abby pela mão até
a mesa do bolo. Deixei Tyler na pista de dança para procurar Camille e minha
câmera, tentando não ficar irritada demais por ela ter tirado mais de cem fotos
nos cinco minutos que ficou com ela.
Ajeitei o foco da lente enquanto Travis e Abby
empurraram a faca para cortar a primeira fatia.
Todo mundo riu enquanto Abby o ameaçava e ele levava
o bolo bem devagar até a boca da esposa. Um instante depois, tudo acabou,
selado com um beijo. Todos bateram palmas, e a música começou a tocar de novo.
Tirei mais algumas fotos e fui para nossa mesa, pegando minha bebida e
terminando-a antes de chegar ao pequeno bar no canto.
— Rum? — perguntou o bartender, com o suor escorrendo
pela têmpora.
— Vodca com amora. Dupla, por favor... mais vodca. —
Eu o observei de perto enquanto ele servia, fazendo um sinal de satisfação com
a cabeça quando serviu três quartos de vodca e o resto de suco de amora.
Percebi que vodca era uma bebida barata, deixava pouco cheiro, e era fácil de misturar
à maioria das coisas, o que facilitava para levar para o trabalho. — É melhor
se adiantar e fazer mais um — falei, olhando por sobre o ombro. Terminei o
drinque antes de sair e virei com um sorriso no rosto, esperando que, se alguém
estivesse olhando, eu parecesse ter saído com apenas um drinque.
Esconder, disfarçar e criar estratégias para parecer
normal. Eu não sabia até quando a parte funcional do meu alcoolismo continuaria
sendo verdade.
— Calma — disse Tyler. — Tudo certo?
— Só relaxando — falei, observando Travis beijar a
esposa e depois levantá-la nos braços, se despedindo de todos. Peguei minha
câmera e capturei esse momento, feliz por eles e por mim, por eu finalmente
poder guardar a câmera de vez.
Não demorou muito para Camille e Trenton, Taylor e
Falyn, e Tyler e eu sermos os últimos convidados restantes do casamento. Os
pais tinham se recolhido cedo, e Thomas e Liis pareciam estar brigando.
Sentei à mesa, colocando gelo no pescoço com uma das
mãos e segurando um novo drinque com a outra. Trenton e Taylor estavam girando
ao som da música com suas acompanhantes, brincando e dando risadas. A cobertura
da parte externa do restaurante, que tinha sido estendida para proteger da
chuva, sacudia com a brisa. Levantei a cabeça, deixando o ar rolar pela minha pele
úmida e o álcool penetrar.
Tyler tirou alguns fios de cabelo da minha testa.
— Tudo bem?
— Estou bem, sim — sussurrei, mantendo os olhos
fechados. Eu não podia ficar bêbada com tanta frequência. — Quero nadar no mar.
Ele acendeu um cigarro, mas, antes que ele pudesse
soprar, segurei seu rosto e inspirei, enchendo meus pulmões com a fumaça. Eu me
recostei, expirando no ar denso.
Ele apoiou o cotovelo na mesa e segurou o queixo,
balançando a cabeça.
— Você torna tão difícil fazer a coisa certa, porra.
— Me leva pra nadar — falei, mordendo o lábio.
— Que tal amanhã? — perguntou ele. — Foi um dia
longo. Não sei se nadar à noite no meio de uma tempestade é uma boa ideia, já
que estamos bêbados e cansados.
— Tanto faz — falei, me recostando e fechando os
olhos de novo. O ar refrescado pela chuva acariciou minha pele, e o peso da
vodca era reconfortante. Estendi a mão para ele, encontrando cegamente seu
braço.
— O que você está fazendo? — perguntou ele, achando
engraçado.
— Só estou me certificando de que você ainda está
aqui.
— Estou aqui. Pelo tempo que você me permitir.
Minhas pálpebras se abriram, e eu deixei minha cabeça
cair para a frente, olhando para ele com os olhos secos e sonolentos.
— Quero fazer uma cama no nosso chão e deitar nua com
você.
— Parece uma brincadeira obscena — disse ele,
sorrindo.
Levantei a mão para o garçom, pedindo outro drinque.
Ele olhou para Tyler, que eu percebi, pelo canto do olho, que balançou a
cabeça.
— Ei — falei num momento de clareza.
— Ellie... você está bêbada. Você já bebeu tipo uns
dez drinques... sem falar na merda que você bebeu o dia todo. Você vai se
machucar.
— Melhor eu me machucar do que machucar alguém.
Ele franziu a testa.
— Uau. Estamos na fase de pena da noite? Ou você só
está sendo uma bêbada amarga?
Camille estava mostrando o anel de noivado para Falyn
pela décima vez na noite, e eu revirei os olhos.
— É uma porra de diamante, e é pequeno. Para de se
mostrar.
— Ellie, já chega — disse Tyler.
Meu rosto se contorceu.
— Ela não me ouviu.
— Você está falando mais alto do que pensa. Vem.
Vamos pro quarto.
— Estou me divertindo.
— Não, você está sentada num canto enchendo a cara.
Suspirei.
— Eu vou. Você fica aqui com a sua família. Não quero
que você perca isso.
— Pra você acabar no mar? Não. Vem.
Eu me levantei relutante, afastando-me quando Tyler
tentou pegar minha mão. Ele acenou para os irmãos e suas namoradas e só
encostou em mim quando tropecei na calçada.
Subimos uma quantidade excessiva de degraus até nosso
quarto, e eu me apoiei na parede enquanto Tyler abria a porta. A fechadura
clicou, a porta se abriu e, se Tyler não tivesse me segurado, eu teria caído lá
dentro.
Ele me pegou nos braços, me carregou até a cama e me
colocou delicadamente no colchão.
— Vem cá — falei, estendendo a mão para ele.
Tyler tirou meus sapatos e depois me virou de lado
por tempo suficiente para abrir o zíper nas costas do meu vestido. Ele deslizou
o tecido para baixo, depois vestiu uma camiseta em mim.
— Bem melhor — falei. — Agora vem cá. — Estendi a mão
para ele outra vez, mas ele apagou a luz e fechou a porta do banheiro. Os canos
gemeram quando ele ligou o chuveiro.
Pensei em me juntar a ele, mas eu estava tão
confortável, e tonta, e talvez um pouco enjoada. Depois de alguns minutos, o
calor ficou maior, e o conforto desapareceu. O enjoo tomou conta de mim, e eu
rolei para fora da cama, engatinhando até o banheiro e estendendo a mão para a maçaneta.
Mal consegui chegar ao vaso sanitário antes de meu
estômago rejeitar um dia inteiro de vodca. A cortina se abriu, e a voz profunda
de Tyler ocupou o ambiente.
— Meu Deus, Ellie. Você está bem?
— Ãhã. Pronta pra segunda rodada daqui a pouco.
A cortina se fechou bem a tempo de eu vomitar
novamente. Tyler desligou o chuveiro, e eu o ouvi jogando uma toalha sobre o
corpo antes de começar a encher a banheira. Ele segurou meu cabelo até eu
terminar de vomitar, depois tirou minha roupa, me levantou do chão e me colocou
na banheira.
Usou um pano para lavar meu rosto, depois suspirou.
— Isso deixou de ser empolgante, né? — perguntei,
sentindo o rímel espetar meus olhos.
— É — ele respondeu, parecendo triste. — Acho que
está na hora.
Fiz que sim com a cabeça, tirando a tinta preta do
rosto.
— Tudo bem, Tyler. Eu sabia que isso ia acontecer.
— Você sabia que ia acontecer o quê?
— O adeus.
Ele balançou a cabeça.
— Já te falei... não vou a lugar nenhum. Talvez não
seja perfeito, mas vou adorar passar pelo inferno com você do mesmo jeito. Só
não quero te ver piorando. Está na hora de começarmos a ir na outra direção.
— Acho que nós dois sabemos que eu já passei da fase
do grupo de apoio e dos doze passos.
Ele limpou minha testa com o pano.
— Talvez. O que quer que seja, estou com você.
Meu lábio inferior tremeu, e eu fiz que sim com a
cabeça.
***
Cutuquei as unhas, me sentindo esquisita por ter
suado na umidade das Ilhas Virgens de manhã e estar com o aquecedor da
caminhonete de Tyler soprando no meu rosto para combater o frio do ar do
Colorado doze horas depois. Os limpadores de para-brisa crepitavam no vidro,
tirando os flocos de neve que caíam silenciosos do céu noturno.
— Não estou tentando ser difícil. Acho que só preciso
de um tempo pra dar um jeito nas minhas merdas.
Ele suspirou, frustrado.
— E por que não podemos fazer isso juntos?
— Porque tudo que eu tentei até este fim de semana
não funcionou. Já faz um ano. Acho que é hora de algo novo.
— Ou alguém novo? — ele perguntou.
Pisquei, me sentindo ofendida.
— Não acredito que você disse isso.
— Eu só quero ajudar com a sua bagagem. Nada de mais.
— Quando você chegar lá em cima, vou querer que você
fique.
— Isso é tão ruim assim? — Como não respondi, ele
apertou o volante com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos. — Você
quer beber e não quer que eu veja.
— Alguma coisa assim.
— Então essa é a coisa nova que você vai tentar?
Preferir ficar bêbada a ficar comigo?
— Não.
— É isso que está parecendo.
— Você não vai entrar — soltei.
— Por quê?
— Você sabe por quê!
Ele bateu a palma da mão no painel.
— Que maldição, Ellie! Estou exausto, porra!
— Então vai pra casa!
— Não quero ir pra casa! Quero ficar com você!
— Que pena, porra!
Ele trincou os dentes, olhando direto para a frente.
Os faróis da caminhonete destacavam o prédio da revista e os flocos de neve que
aumentavam o tapete branco que já estava no chão.
Ele colocou marcha à ré.
— Não consigo fazer isso.
Peguei minha mochila e coloquei a mão na maçaneta.
— Já era hora de você admitir.
— Você só estava esperando isso, né? Eu desisto, e aí
não é culpa sua. Ou talvez você possa subir e fingir que está bebendo porque
está com pena de si mesma. Que brilhante, caralho!
Abri a porta, peguei minha mala de rodinhas e a puxei
até o chão. Bati a porta traseira com violência, depois a do passageiro.
Tyler abriu a janela.
— Eu aguentei muita merda pra fazer isso dar certo, e
você não dá a mínima, porra.
— Eu te avisei!
— Isso é palhaçada, Ellie! Só porque eu aviso a um
banco que vou roubá-lo, não significa que o banco estava preparado pra isso!
— Conta isso pra todo mundo no bar, quando você
estiver chorando com uma cerveja — eu me irritei.
— Não preciso ir para o bar toda vez que alguma coisa
na minha vida dá errado. Isso se chama ser adulto. E tenho certeza que não vou
chorar por sua causa — disse ele, fechando a janela. Em seguida pisou fundo no
acelerador, cantando pneu em marcha à ré e fazendo um semicírculo. Depois saiu
do estacionamento e foi para a rua, saindo a toda velocidade em direção à
rodovia.
Fiquei parada sozinha por um tempo, surpresa. Ao
longo do ano que eu o conhecia, Tyler nunca tinha falado comigo daquele jeito.
O amor fazia as pessoas odiarem de um jeito que nunca teriam odiado.
A neve deixava o mundo silencioso, mas até o silêncio
produzia um som. Puxei minha bagagem pela neve, subindo o meio-fio em direção à
porta dos fundos. Minha chave estava gelada, queimando meus dedos enquanto
minha mão tremia. Num ritmo constante, as rodinhas bateram em cada degrau, e eu
deixei tudo cair para a frente quando cheguei ao topo.
Dei alguns passos até a geladeira e peguei a última
lata de cerveja, percebendo que a única coisa que restava era queijo mofado e
um pote de mostarda. A cerveja sibilou para mim quando abri a tampa, e o
líquido amargo pareceu gelado e reconfortante na minha garganta. Havia meio litro
de vodca no armário, mas faltava uma semana para o dia do pagamento.
Meu celular zumbiu no bolso de trás, e eu me
atrapalhei para atender.
— Alô?
— É a Jojo. Já voltou?
— Já — respondi, tirando a neve do cabelo.
— Entediada?
— O que você tem em mente?
— Drinques baratos num bar vagabundo? — disse ela. —
Eu te pego.
— Perfeito.
Comentários
Postar um comentário
Nada de spoilers! :)